Em agosto do ano passado expus uma ideia inédita para evitar que o jornalismo verde e amarelo seja cada vez mais demolido pelas novas tecnologias em termos de emagrecimento bariátrico das receitas publicitárias.
Propus em entrevista à revista República, com sede na região, e reproduzi nesta revista digital para autoridades de vários calibres, que os administradores públicos incentivassem a produção de matérias investigativas e denunciatórias que devassassem os cofres públicos e desbaratassem quadrilhas ou individualidades que agem impunemente.
Parte dos recursos financeiros devolvidos, uma parte pequena mas importantíssima à multiplicação de novos esforços para geração de novas reportagens premiadas, seria repassada ao veículo de comunicação que fez a denúncia. Não entrei em detalhes sobre como se dariam os desdobramentos legais, porque não cabia então essa profundidade e há especialistas que resolvem tudo isso com facilidade.
Mais tarde, a Associação dos Juízes Federais anunciou em Brasília a iniciativa de estimular a participação dos contribuintes no desbaratamento de roubalheiras na administração pública em geral. A contrapartida seria a premiação dos denunciantes.
A pergunta que faço é simples e direta: como os prefeitos e os vereadores da região, com poder constitucional de apresentar projeto de lei no sentido de introduzir o sistema de reportagem premiada em âmbito da administração pública municipal, não ergueram um dedinho sequer para apoiar a proposta? Cadê os vereadores? Cadê os prefeitos?
Quem tem coragem?
Certamente eles estão muito ocupados com questões bem mais importantes. Tapar os buracos de ladroeiras nos orçamentos públicos locais não é nada interessante, não é verdade? É muito mais fácil uns e outros utilizarem evasivas, por exemplo, sobre a Operação Lava Jato. Os avermelhados excomungam todos aqueles que ousam sugerir que dinheiro sujo alterou a ordem democrática nas últimas eleições em todas as esferas de governo. Azulados bradam contra os vendilhões da pátria, mas estão muito ocupados com a própria individualidade para se meterem numa empreitada de derretimento das espessas camadas de corrupção nas gestões municipais.
O silêncio dos políticos da região em resposta à sugestão deste jornalista é sintomático do estado degenerativo da classe que a Operação Lava Jato expõe sem nó nem piedade em nível nacional. Teve-se, portanto, um silêncio agressivamente vadio, interesseiro, cúmplice de maracutaias que, todos sabem, é lugar-comum nos gestões públicas municipais não só da região. A disseminação da roubalheira é generalizada no País, mas particularmente na Província do Grande ABC chega a ser acintosa.
Será que não existe na praça um vereador sequer, um prefeito sequer, para dar o pontapé inicial nessa iniciativa de reportagem premiada?
Será que o prefeito dos prefeitos da região, Luiz Marinho, titular do Clube dos Prefeitos, encara com naturalidade o espelho seu de cada dia quando a lembrança de alguém para que apresente a proposta aos demais titulares lhe surge diante dos olhos? Que exemplo de moralidade e ética da atividade política repassarão Luiz Marinho e os demais prefeitos da região quando o tempo lhes cobrar uma medida sequer de intervenção republicana que de alguma forma os remetessem à Operação Lava Jato?
Ciumeira provinciana
Esperar por repercussão, quando não por adoção, da mídia regional, extremamente ciumenta, desses ciúmes doentios de fazer de conta que não sabe de nada quando se trata de assunto escrito por alguém que não é da própria casa, é pura perda de tempo.
Reportagem Premiada é um cruzado tão forte e certeiro de jornalismo sério na mandíbula de prevaricadores que não se deve mesmo estranhar que a reação de gente que detesta transparência tenha sido exatamente a que se vê.
Esse joguinho sórdido que se acompanha todo santo dia na imprensa regional, de gente que se diz de oposição, mas que não passa de encenação para justificar a imagem de independente, esse joguinho sórdido é a regra geral das instituições políticas da região.
E também de instituições em geral. Querem um exemplo reto e direto? Cadê as unidades da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), cuja direção nacional agora se coloca a favor do impeachment, porque o impeachment virou moda (sem juízo de valor sobre a questão), cadê as unidades da OAB que não se posicionam a favor de medidas legislativas que incrementem a luta da imprensa para, ao mesmo tempo em que os veículos de comunicação invistam recursos em reportagens especiais sobre o submundo da gestão pública, tenham a compensação de premiações que retroalimentarão novas reportagens?
Escândalos não faltam
Ainda outro dia listei uma série de escândalos que fizeram da Província do Grande ABC campo de exposições da marginalidade sem a contrapartida de punibilidades judiciais. São casos e casos mais que consumados de roubalheiras envolvendo o setor público e a inciativa privada. E há muitos outros escândalos a serem denunciados, desde que iniciativas para fortalecer o jornalismo independente sejam aprovadas.
Infelizmente, até agora ninguém entre os que estão nos podres poderes públicos da região, e tampouco os que estão fora, decididos a entrar, resolveram botar o dedo na ferida. O modelo de obscuridades que está aí seduz a classe política que está no poder ou pretende estar no poder. Trata-se na maioria dos casos de uma carreira de extraordinários resultados. Até, pelo menos, aparecer uma Lava Jato no caminho. Como a perspectiva de uma Lava Jato genuinamente regional é bastante remota, já que as institucionalidades locais estão flertando com a eficiência produtiva das cigarras, grande parte de quem dá as cartas e também de quem pretende tomar conta da mesa de jogos de faz de conta de seriedade não quer nem ouvir falar em jornalismo premiado.
Leiam também:
Jornalismo premiado é saída para impressos
Dinheiro da corrupção pode ajudar a salvar futuro de jornais impressos
República do ABC perde feio para República de Curitiba
Faz muita falta à Província uma Lava Jato com força-tarefa local
Total de 1884 matérias | Página 1
13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)