Imprensa

É melhor, ainda, não mexer no
vespeiro de eleições municipais

DANIEL LIMA - 31/03/2016

Prometi no começo desta semana que faria até amanhã incursão panorâmica para retratar o momento político e possíveis desdobramentos nas eleições municipais desta temporada. Quando prometo, cumpro rigorosamente. Mas há exceções mais que justificáveis.

Decidi esperar porque a situação nacional, da política à economia, não recomenda outra coisa senão muita cautela. Tudo pode acontecer, inclusive com fortes repercussões na região. Até mesmo atritos sociais, para ser brando, não estão fora dos radares das autoridades de Segurança Pública.

A presidente Dilma Rousseff está fazendo de tudo, principalmente no Palácio do Planalto, para criar ambiente de vitimização, embalada nos bastidores por gente inconformada com o tratamento dado ao PT nos casos de corrupção. Tratamento bem diferente da tradição nacional de panos quentes com subsequente multiplicação de roubalheiras.

Como escrevi anteriormente, tenho planejamento para destrinchar o que poderia acontecer na Província do Grande ABC em outubro próximo. São vetores estruturais, consolidadamente estruturais, e vetores circunstanciais, sujeitos a chuvas e trovoadas. O que me leva a adiar por algum tempo a incursão pretendida é que aspectos circunstanciais podem prevalecer a tal ponto que solapariam os pontos consolidados.  Um desequilíbrio que colocaria todo o arrazoado interpretativo a nocaute.

Brasil em chamas?

Como vou discorrer sobre as disputas municipais da região que, mais uma vez, terão como centro de operações o arranca-rabo entre avermelhados e azulados, se o bicho está pegando em Brasília?

Prestem atenção às manifestações de Dilma Rousseff. Ouçam os oposionistas que querem cassar seu mandato. Procurem as entrelinhas. A coisa está brava, muito brava.

Até a Rede Globo está muito mais cuidadosa – e mais sutilmente inteligente – no tratamento do noticiário político. Os dois lados dos combatentes passaram a ter prioridade absoluta no Jornal Nacional. Não que antes não o tivessem. Mas agora está mais cuidadosamente tratado. A Globo não quer ser taxada de antipetista, embora o seja, porque o antipetismo, nestas alturas do campeonato, é um grande marketing. Basta ver as pesquisas sobre o que o eleitorado está a dizer sobre a gestão Dilma Rousseff.

Em situação inversa, da esquerda no poder e com o controle das principais mídias, o outro lado de coberturas jornalísticas seria solenemente ignorado. Basta ler o que temos de expressão máxima da ideologia divisionista na região, o jornal ABCD Maior. Nas páginas digitais e impressas do jornal, mantido pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e pela CUT, não existe escândalo da Petrobras. Prevalece a máxima do golpe. Até parece que a maior empresa nacional não foi saqueada.

Parte de um jogo amplo

Não condeno a linha editorial do ABCD Maior. Apenas faço uma constatação. O jornal toma partido.  Os leitores é que devem escolher o que lhes serve ou não, estabelecendo o devido juízo de valor se assim pretenderem. A mim serve tudo como insumos de informação. Ao ler a publicação, posso ter a disposição um conjunto de posicionamentos contrários ao de vários veículos. Tudo que me favorece a organizar o contraditório negado pelo jornal.

Mas não é o jornal ABCD Maior nem a Rede Globo que me levam a reconsiderar a ideia de que devo mesmo adiar a prometida incursão pelo mundo eleitoral da região. É uma coleção de leituras, de observações, de tudo que forma um ambiente preocupantemente instável no País, a indicar, acreditem, que tudo pode desandar.

O PT e os movimentos sociais e sindicais não pretendem aceitar a lógica demissionária de Dilma Rousseff, a mais sofrível comandante do Estado nacional de que se tem notícia. Muitos avanços ideológicos da esquerda e muitas mordomias proporcionadas pelo mesmo Estado poderiam ir para a cucuia.

Do outro lado temos um conjunto de agentes políticos enredados em investigações, mas agem com a desenvoltura dos inocentes. Está certo que a ficha corrida da maioria deles é menos dramaticamente sofrível que as do PT e de aliados mais próximos. A roubalheira foi sistematizada pelos petistas, em contraste com a roubalheira individualista ou grupal dos oposicionistas. Isso faz uma tremenda diferença, embora não limpe a barra de ninguém.

A contaminação nos indicadores sociais e econômicos, que já desabam, é uma marca indelével do petismo. Tanto quanto o populismo fiscal, do qual todos usufruíram. Agora até a Gol está batendo lata nos céus do País. Acabou a farra do consumo e, com isso, as vicissitudes fiscais e econômicas, além de político-partidárias, afloraram.

Diante de tudo isso e, certamente, das repercussões que poderão estilhaçar vidraças na Província do Grande ABC, com a Operação Lava Jato atingindo fortalezas locais que pareciam inexpugnáveis, o melhor mesmo é brecar a proposta de especular sobre as eleições municipais porque a consecução do projeto o tornaria uma obra de chutometria.

Possivelmente o Brasil está a viver o momento político e econômico mais grave da história. Nada por acaso, é claro. A omissão generalizada da sociedade no acompanhamento das ações de gestores públicos e suas relações com agentes privados, como tenho cansado de expor neste espaço ao me referir aos bandidos sociais da região, só poderia mesmo desembocar em tragédia.



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