Economia

Lorenzini prova: sindicalismo
obscurece empreendedorismo

DANIEL LIMA - 22/06/2016

A cultura sindicalista permeia o cotidiano da Província do Grande ABC. Não à toa somos uma incubadora de dirigentes sindicais que viram políticos de carreira e chegam inclusive à Presidência da República. Já nossos maiores símbolos de empreendedorismo dão no pé aos primeiros sinais de agigantamento. Guilherme Paulus, da CVC, é nosso maior exemplo. Ele e tantos outros sabem que o ambiente na região é inóspito à livre-iniciativa.

A Construtora Lorenzini, que completa 60 anos de atividades, é prova de que não damos o devido valor aos empreendedores da região de pequeno e médio porte. O noticiário de hoje e mesmo de passado recente dos jornais impressos e digitais praticamente ignora a trajetória da empresa de São Caetano. Limitam-se a notas curtas, se tanto.

O que chamaria de Caso Lorenzini é sintomático da aversão da mídia regional – e dos agentes políticos principalmente, exceto em busca de dinheiro para financiamento eleitoral – à livre-iniciativa. Escrevo com conhecimento e prática. Sou favorável ao capitalismo de pequenos e médios negócios desde que me conheço por gente.

Sou fruto de um homem que sempre se virou para sustentar oito filhos. Fez de tudo na vida. Atuou em várias áreas de comércio no Interior de São Paulo. Vivi minha infância e parte da juventude sob o signo do empreendedorismo de sobrevivência. Meu pai é meu herói. Graças a ele, também, pude continuar minha carreira profissional, depois da largada aos 15 anos em Araçatuba. Ao chegar a Santo André, em 1968, tive a sorte de meu velho pai Gabriel me arranjar um emprego no jornal Gazeta da Mooca. Quase, pouco antes, fui trabalhar num escritório. Já imaginaram que desastre viver a rotina da rotina?

Acordo de escravidão

Possivelmente por conta do passado é que fiz da revista LivreMercado e do Prêmio Desempenho meu acordo de escravidão durante duas décadas. Nesse período, esqueci completamente o que era família. Aliás, como o fizera durante 15 anos de segunda a segunda no Diário do Grande ABC. Fui um pai relativamente distante, embora jamais irresponsável. LivreMercado me tomava tanto tempo e paixão que nem frequentava shopping. E só assistia a filmes em casa. Suspendi o amor pelos animais, especialmente cachorros, durante décadas de jornalismo insano.

Fazer LivreMercado repleta de histórias de sucessos empresariais – e também de cases sociais e públicos – foi uma missão sofrida, portanto. Não a repetiria jamais, mas não abro mão da herança bendita que me deixou. A herança de uma história de sucesso editorial. Quem viu viu, quem não viu que trate de lamentar.

A mídia regional não tinha a menor vocação a jornalismo que contasse a razão do sucesso de quem arrisca o pescoço para gerar empregos e riquezas. Ainda hoje são raros os jornalistas e praticamente nenhum dono de jornal ou revista que tenha de fato a vocação que sempre tive pelo empreendedorismo dos outros.

Meu pai povoava minha consciência profissional a cada novo case ou microcase que publicava. Lavei muitos copos e garrafas de vidro em bares e padarias de meu pai. Sei o que a relatividade do tempo quando se torce desesperadamente pela chegada do próximo freguês.

Conceitos definidos

LivreMercado não se tornou a melhor publicação regional do País por acaso. Tudo foi planejado como conceito de valorização da livre-iniciativa desde os primeiros tempos, num processo de amadurecimento profissional e editorial que liderei com orgulho. Calculo que produzimos ao longo de 18 anos perto de 10 mil cases, principalmente com empreendedores privados. Pelo menos um quarto desses cases pertencia a um grupo especial, preparado para concorrer ao Prêmio Desempenho Empresarial -- que na sequência também se tornou Prêmio Desempenho Social, Prêmio Desempenho Cultural e outros filhotes mais.

Insatisfeito com o Prêmio Desempenho, versão corporativa, acrescentamos ao portfólio daquele evento honras individuais. Aí surgiram o que chamei de “Imortais do Grande ABC”. A relação de empreendedores privados que subiu aos palcos ou foram homenagens pós-vida é imensa. Vai de Abraham Kasinski, fundador da Cofap, a gente menos conhecida. Todos eleitos pelo Conselho Editorial daquela revista. O mesmo grupo de formadores de opinião que decidia a sorte das organizações nas disputas por setores de atividades.

Valorização da individualidade

Aos Imortais do setor empresarial se juntaram esportistas, agentes culturais e agentes assistenciais. O capitalismo não pode prescindir da força e da capacidade de inventividade e regeneração social de profissionais de outras áreas. O mundo dos negócios não pode ser um mundo à parte do mundo social como um todo. Nem tampou o mundo social como um todo pode divorciar-se do mundo empreendedor.

Não me lembro de ter sido a Construtora Lorenzini participante do Prêmio Desempenho. Se não o foi se cometeu grande pecado.

Nenhuma organização privada chega a 60 anos de atividades sem muitos méritos quando, principalmente, não se tem manchas.  Aliás, não se alcança mesmo poucos anos de manutenção sem que disso decorram esforços coletivos.

Empreender neste País de Capitalismo de Estado que industrializa bandidos sociais – como prova o escândalo da Petrobras – e também de caudalosa gulodice fiscal é mesmo uma ação a ser reverenciada. Principalmente quando a meritocracia dá sustentabilidade aos negócios – não os acertos de bastidores que surrupiam valores de meritocracia.

Quando leio declarações e também artigos de representantes do esclerosado esquerdismo brasileiro, notadamente de sindicalistas que só olham para o próprio umbigo e de acadêmicos que só conhecem a academia e os sindicalistas que só olham para o próprio umbigo, tenho vontade de chorar.

Mas, ao contrário dos dogmáticos de direita e de esquerda, consumo tudo o que dizem e escrevem. Não se pode perder uma oportunidade sequer de saber o que pensam espertíssimos dirigentes sindicais e intelectuais enferrujados. Geralmente eles têm uma capacidade incomum de esquecer o presente e o passado recente. Escrevem e falam sobre um mundo que não existe. São fantasias para disfarçar a enrascada em que se meteram como pretensos deuses de representação da vontade social.

Combate esquerdista

O empreendedorismo privado é um alvo constantemente combatido pelos esquerdistas anticapitalistas e pelos direitistas oportunistas. Pequenos e médios negócios pagam o pato com níveis de mortalidade alucinantes nestes tempos. A explosão de microempreendedores individuais é uma fuga à caracterização de desempregado associada a tentativas de superar o corredor polonês da sobrevivência dos mais fortes que, mais adiante, vão encontrar um Estado absolutista na economia. Um Estado que agora, com um presidente interino, distribui benesses a governadores irresponsáveis sem que a maior parte da sociedade se dê conta de que é destinatária da conta final.

Fosse a Província do Grande ABC cultivadora do capitalismo privado de verdade, o aniversário de fundação da Construtora Lorenzini seria uma data especial para o conjunto da sociedade. Em situação análoga, de números redondos de data de fundação, os sindicalistas fazem o diabo para vender a ideia de que são os grandes empreendedores da região. Nada pior que uma sociedade burra para comprar gato por lebre. E por ignorar quem de fato faz a diferença ao superar todos os obstáculos.

Somos, portanto, uma Província Socialista de Terceira Classe. Nosso sindicalismo trabalhista é o que existe de mais nefasto ao desenvolvimento econômico sustentável.



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