Santo André deixou de ser o “viveiro industrial” do hino oficial e se transformou em “enxame de microempreendedores”. Cidade que passou pelo mais intenso e contínuo processo de desindustrialização no Estado de São Paulo, caindo sistematicamente em todos os rankings de competitividade, Santo André conta com universo semelhante de microempreendedores individuais (MEI) e trabalhadores industriais com carteira assinada. Para cada 100 empregos formais contabilizados em abril último pelo Ministério do Trabalho há 83,10 microempreendedores individuais.
A síntese dessa equação para um Município que vem de passado de riqueza industrial tem uma marca social rigorosamente tenebrosa: empobrecimento. Que também pode ganhar outra configuração, agora sociologicamente mais densa: quebra acentuada da mobilidade social, conceito que define a capacidade de miserável virar pobre, de pobre virar proletário, de proletário virar classe média e de classe média virar rico.
Há distinção evidente entre emprego industrial com carteira assinada e microempreendedores individuais. Emprego industrial tem valor agregado de conquistas sociais e superioridade salarial em relação a outros setores da economia regional. Microempreendedor individual é, em larga espécie, espécie de desempregado que virou patrão de si mesmo e exerce vida profissional errática. São, em muitas situações, fazedores de bicos. Os vencimentos de quem se enquadra na categoria de microempreendedor individual não podem ultrapassar a R$ 60 mil por ano. Poucos atingem esse limite.
Chumbo grosso
A derrocada de Santo André ao longo das três últimas décadas até por volta do ano 2000, seguida de estabilização nos anos falsamente dourados do presidente Lula da Silva, está sendo retomada nestes anos de chumbo grosso de Dilma Rousseff. Há novas ameaças de perdas industriais. Se pequenas e médias indústrias fecharam as portas em Santo André mais que outro endereço municipal da região nos anos 1970, 1980 e l990, a debandada das grandes corporações se deu de forma dissimulada. Muitas empresas esvaziaram atividades gradativamente. E ao que tudo indica, retomam a iniciativa.
Contar com 83,10 microempreendedores individuais para cada grupo de 100 trabalhadores formais do setor industrial é um recorde entre os municípios que integram o G-22 e têm histórico de poderio no setor de transformação. O G-22 é um agrupamento selecionado por CapitalSocial com base na grandeza econômica no Estado de São Paulo. O agrupamento é formado pelos 20 maiores municípios paulistas -- exceto a Capital -- dos quais cinco da Província do Grande ABC, além de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que completam a representação regional.
Santo André só é superada na relação de microempreendedores individuais versus empregos formais industriais por três municípios sem tradição industrial: Santos, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto.
Goleada interna
Na competição interna com os demais municípios da Província do Grande ABC, Santo André expõe sequelas mais profundas da desindustrialização. Enquanto aparece com 83,10% de microempreendedores individuais no confronto com o estoque de empregos industriais formais em abril último, São Bernardo não passa de 28,64%, São Caetano de 34,92%, Mauá de 33%, Ribeirão Pires de 41,04% e Diadema de 19,50%. Rio Grande da Serra é pequena demais para ser levada em conta: registra índice semelhante ao de Santo André, com 83,28%.
Do total de microempreendedores individuais registrados em abril último na Província do Grande ABC (74.742) 30% estão em Santo André. A correlação entre empregos industriais formais e microempreendedores individuais em Santo André indica que o esquartejamento da economia é mais inquietante do que se imaginava: são 27.487 trabalhadores industriais contra 22.843 microempreendedores individuais. É possível que a crise econômica encaminhe esse jogo nada divertido ao empate técnico.
Nos demais municípios da região, exceto Rio Grande da Serra, os números são muito mais contrastantes: em São Bernardo são 83.021 trabalhadores industriais contra 23.768 microempreendedores, em São Caetano 24.411 contra 8.524, em Mauá 21.859 contra 7.212, em Ribeirão Pires 7.102 contra 2.914 e em Diadema 45.627 contra 8.898. Rio Grande da Serra conta com 700 trabalhadores registrados na indústria e 583 microempreendedores.
Incidência bem maior
Quando se colocam os números de Santo André em confronto com a média dos demais municípios da região tem-se ainda mais clareza da situação que fragiliza a antiga capital industrial da região. Enquanto Santo André registra 83,10% de taxa de participação de microempreendedores individuais em contraponto ao número de trabalhadores na indústria, a média do que poderia ser chamado de G-6 é de 28,4%. Ou seja: Santo André apresenta taxa 65,82% superior de empreendedorismo largamente ditado pela necessidade de superar as altas taxas de desemprego.
A possibilidade de os números retratados aqui serem interpretados de forma manipuladora não pode ser descartada quanto se sabe que eleições costumam transformar verdades em meias verdades. Uma campanha que transforme Santo André no centro regional de microempreendedoríssimo individual como suposta prova de dinamicidade da economia local poderia levar muita gente a acreditar na lorota. Afinal, estatísticas oficiais mostram que ao se estabelecer uma comparação entre o total de micropatrões em relação à população Santo André conta com o maior índice na região – são 3,21% de micros empreendimentos individuais.
Nada seria mais falso. O estoque de patrões de si mesmos (embora possam contratar até um funcionário sem deixar a classe prevista pela Lei Geral das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) integra coreografia de desajustes econômicos que vêm de longe e estão não só registrados mas também analisados nesta revista digital.
Média mais elevada
A média do índice de microempreendedorismo individual nos demais municípios que compõem o Clube dos 22 é mais elevada. Integrado por 15 cidades, e seguindo o mesmo critério de confronto entre empregos formais industriais e microempreendedores individuais, o G-15 do G-22 apresenta média de 55,46%. Ou seja: para cada 100 trabalhadores formais industriais existe a participação de 55,46% microempreendedores individuais. A marca mais elevada do G-15 em relação ao G-7 do Clube dos 22 se deve ao fato histórico de que vários municípios fora da Província não são dependentes demais da indústria de transformação. Ou seja: não passaram pelo processo de perda industrial mais acentuada de Santo André mas que também impacta os demais municípios da Província.
Santos detém o maior índice de microempreendedores individuais em relação aos trabalhadores industriais: para cada grupo de 100 empregados do setor de transformação há 278 microempreendedores. Ribeirão Preto tem índice de 141,50% e São José do Rio Preto de 116,44%. Em comum, esses três municípios têm a centralidade econômica regional. São espécies de capitais de áreas metropolitanas.
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