Economia

Só faltou a revista Exame dizer
que vivemos bolha imobiliária

DANIEL LIMA - 12/08/2016

A competentíssima (mas nem por isso infalível) revista Exame, da Editora Abril, elevou à Reportagem da Capa desta quinzena um assunto cujo desfecho antecipamos há muito tempo nesta revista digital. O título “Imóveis: o sonho virou pesadelo” demorou para ganhar destaque daquela publicação. Quem acompanha CapitalSocial sabe disso.

Anteriormente, quando o mercado imobiliário foi assunto da Exame em várias reportagens de capa, tivemos a lubrificação de uma engrenagem de triunfalismo que combatemos neste espaço.

Podem me rotular de presunçoso, como um ou outro idiota me chama só porque jogo limpo. Entre ser suposto presunçoso com responsabilidade social e falso humilde com engajamento quadrilheiro, é claro que estou no primeiro pelotão. Remar contra a maré do politicamente correto é minha especialidade.

Esta não foi a primeira nem terá sido a última vez que cantei uma caçapa que se confirmou. Sei muito bem o que me custa enfrentar correntezas de sem-vergonhices, bandidagens e tudo o mais.

O que se passa no mercado imobiliário brasileiro (e a Província do Grande ABC é prova disso) não deveria ganhar outra etiquetagem senão “bolha imobiliária”. Não vou esmiuçar agora o conceito de bolha imobiliária, que, ao contrário do que muitos imaginam e alguns esgrimem, tem múltiplas faces interdependentes. O fato é que vivemos estágio de depressão no setor – cuja extensão temporal não se dissipará antes de 24 meses.

A revista Exame não utilizou uma vez sequer a expressão que sintetiza o quadro nacional na área imobiliária, mas isso não faz diferença. Vivemos sim os estragos de uma bolha imobiliária não de padrão norte-americano, como ficou conhecida a última calamidade do setor, mas tropicalizada à moda PT, de consumismo desenfreado sem sustentabilidade de geração de riqueza. Como tantas outras bolhas que estão na praça – caso da automotiva, por exemplo.

Profusão de alertas

Nesta revista digital, desde 2010, escrevi 23 artigos que fizeram referência direta ou indireta à bolha imobiliária. A primeira das quais datada de 26 de abril daquele ano, sob o título “Bolha imobiliária ameaça ou não ameaça mercado brasileiro?”.

Se fosse fazer referências a todos os textos que escrevi sobre os riscos que corria o mercado imobiliário na região nos últimos anos teria de me estender demais.

Por exemplo: em 17 de abril de 2012 escrevi uma análise com o seguinte título: “Olha a bolha imobiliária aí gente! Quem acredita nessa advertência?”.

Querem mais? Em 1º de agosto de 2012 resumi o conteúdo do texto de preocupação com o seguinte título: “Alerta do FMI chega atrasado: bolha imobiliária já é realidade na Província”.

Querem mais deste presunçoso? Pois tomem, em 17 de setembro de 2012: “Bolha imobiliária: alerta do Ipea confirma gravidade na Província”.

Querem mais ainda? Pois vejam o título de 22 de novembro de 2012: “Liquidações de apartamentos e salas comerciais já assustam”.

Em 18 de março de 2013, quando me referi ao Domus, megaempreendimento residencial e comercial no quintal do Paço Municipal de São Bernardo, produzi um título poético: “Aquelas luzes que acendem devagar, à espera de vizinhança”. Antes, no dia 11 de dezembro, tasquei o seguinte título: “Domo é um mico que contamina shopping e mercado imobiliário”.

Procurem, procurem

Chega de exemplos, embora pudesse utilizar muitos outros. Agora, faço um desafio aos leitores: procurem nos jornais impressos e eletrônicos da região e também nos da Capital, procurem para valer, porque o Google facilita a tarefa, e vejam se encontram algo semelhante em matéria de jornalismo independente e comprometido com a sociedade.

Procurem mesmo, mas se preparem, porque vão quebrar a cara. O mercado imobiliário tem por mania acreditar que é possível tapar o sol da realidade com a peneira da especulação. Quem paga a conta são os compradores de imóveis e também as pequenas e médias empresas do setor, cujos insumos, os espaços físicos para atuar, são superavaliados artificialmente pelos grandes conglomerados do setor, inclusive por ação ou omissão da mídia.

Exame, em trechos

Vou reproduzir, na sequência, para em seguida voltar à regionalidade propriamente dita, trechos da Reportagem de Capa da revista Exame que está nas bancas. Aquela publicação poderia ter colaborado com o conjunto da sociedade se não houvesse caído na lábia dos famintos mercantilistas que imperam nas grandes corporações imobiliárias a ditar regras do jogo da informação pública que deveria ser isenta. Afinal, estamos lidando com um dos ativos mais relevantes na vida de cada família brasileira. Leiam, portanto: 

 Comprar na planta foi o grande negócio do mercado imobiliário brasileiro até poucos anos atrás. Os preços são cerca de 30% menores do que os de casas e apartamentos já prontos – e muita gente ganhou dinheiro explorando essa diferença, investindo em imóveis em construção para vendê-los quando fossem entregues. Só que o preço é menor por uma razão: comprar na planta é, por definição, mais arriscado do que comprar pronto. As obras podem atrasar, podem ser mal executadas e, como milhares de brasileiros estão descobrindo da pior forma possível, podem simplesmente não terminar. Especializado em reunir informações sobre empresas em dificuldades, o Instituto Nacional de Recuperação Empresarial estima que quase 25 mil famílias sejam “donas” de casas e apartamentos que não foram entregues”. (...). “Dada a natureza do mercado imobiliário, que depende de crédito e de projetos que levam anos para ser concluídos, não surpreende que a situação esteja difícil”, diz Eduardo Zylberstain, pesquisador da Fipe responsável pelo mais completo estudo imobiliário do pais que EXAME publica anualmente: “O mais complicado é que não dá para prever quando a recuperação vai começar”. (...). A recessão pode ser culpada por boa parte dos problemas das incorporadoras. O número de falências de empresas de construção chegou a 557 nos últimos 12 meses – não somaram 50 nos 12 meses anteriores. (...). Mas talvez o maior problema seja o número de clientes que fecham negócio e desistem mais tarde. Um levantamento da agência de classificação de risco Fitch Ratings mostra que 36% dos imóveis em construção foram devolvidos em 2015, um recorde”.

Repercussão social

Acho que esses trechos são suficientes para dar a ideia da situação nacional. Sobre o quadro regional não há endereço melhor à avaliação da realidade senão CapitalSocial. Os títulos acima e tantos outros disponíveis mostram o quanto nos preocupamos com o equilíbrio social em forma de investimentos em moradia. Quantos sonhos foram desfeitos e quantos pesadelos dominam famílias da região que caíram na conversa fiada de gente inescrupulosa que ocupou páginas de jornais para propagar mentiras?

Diferentemente do que imaginam os simplórios, a antecipação do quadro regional de insolvência do mercado imobiliário não é uma obra metafísica deste jornalista.

Fórmula técnica

Em resumo, primeiro é indispensável que se tenham dados estatísticos sistemáticos sobre a economia da região e as variáveis sociais. Segundo, é necessário acompanhar a macroeconomia e a microeconomia do País. Terceiro, deve-se estar atento ao andar da carruagem da economia internacional, permeada de remelexos políticos que podem determinar o comportamento de mercados financeiros mundo afora.

Esse tripé sustenta qualquer iniciativa que pretenda evitar incursões que deem com os burros nágua em informação confiável. Dependo de terceiros (jornais, revistas, livros, blogs e o escambau) para não perder o controle da economia nacional e da economia internacional. Sobre a economia regional, sou o maior especialista da praça. Presunçosamente ou não, sou. Isso custa caro, tanto em termos de retaliações dos bandidos sociais travestidos de mandachuvas e mandachuvinhas quanto em dedicação total ao suprimento de informações.

Mas vale a pena tudo isso – porque, conscientemente, não viro um trouxa nas mãos dos prevaricadores, como a maioria dos incautos representantes da sociedade regional.

O mercado imobiliário da região, felizmente, começou a viver nova realidade institucional, sob o comando do engenheiro e construtor Marcus Santaguita e uma equipe igualmente comprometida com o futuro que não passa apenas pelo balanço financeiro de suas empresas. Até porque, convenhamos, o balanço financeiro de suas empresas estão provavelmente a pagar o preço da mentira deslavada de ontem porque, todos sabem, não existe almoço de graça.



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