Em menos de 30 dias vai estourar uma bomba mais que prevista por esta revista digital. O PIB dos Municípios, uma formulação do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) vai ser conhecido antes do Natal. Os dados se referem a 2014. Naquele ano, o PIB Nacional cresceu 0,5%. O PIB desta Província em 2014 possivelmente não chegará a cair dois dígitos, em termos absolutos, não per capita, mas vai dar um mergulho e tanto. Fosse Londres, não uma Província, a bolsa de apostas sobre a queda seria disputadíssima.
Quem quiser conhecer os estragos de 2015 e deste ano – que serão muito maiores que os de 2014 -- vai ter de esperar. O PIB dos Municípios do ano passado só será anunciado no ano que vem. E o deste ano só aparecerá nos radares em 2018. É assim que funciona a máquina de atualização do governo federal quando se trata do comportamento da riqueza produzida por Município.
Sobre o PIB dos Municípios de 2014, ao qual me refiro, o resultado será mesmo de lascar para a Província do Grande ABC. Só não chegaremos ao tetra de rebaixamento sequencial porque mudanças metodológicas impediram que o resultado fosse negativo no ano passado, quando emplacaríamos o tricampeonato.
Nada com as estrelas
A projeção inicial de que o PIB da Província será uma calamidade não é trabalho para cartomantes. Basta conhecer a região e macrodados nacionais. Entre os quais a produção industrial do País em 2014. A Província ainda é extremamente dependente do setor de transformação industrial – em média, três vezes maior que o País. E precisa rezar para que a perda contínua de produção do setor que vem de um passado que persiste tenha alguma compensação mais substantiva no setor de serviços com valor agregado. Como não vem tendo, porque nosso setor de serviços é pobre em tecnologia, a degringolada seguirá adiante.
A produção industrial do País caiu 3,2% em 2014 quando confrontada com o ano anterior, segundo o IBGE. A perda geral foi discreta, mas não serve de conforto à população da Província. Quando se desce a detalhes setoriais a desgraceira está alavancadíssima. A nossa Doença Holandesa Automotiva foi duramente atingida naquela temporada. O setor de automotores, reboques e carrocerias perdeu nada menos que 16,8% de produção em 2014. Tratou-se do pior resultado desde o início da série de estudos do IBGE, em 2002.
Outras atividades de transformação industrial ligadíssimas ao solo regional também desabaram em 2014. A metalurgia perdeu 7,4%, produtos de metal 9,8%, máquinas e equipamentos 5,9%, máquinas, aparelhos e materiais elétricos perderam 7,2% naquela temporada. Com um inferno astral desses não há esperança e torcida que resistam. Por isso, quem acredita numa reviravolta, tire o cavalinho da chuva.
Como não sou econometrista e muito menos economista, não pretendo especificar numericamente o tamanho do rombo no casco do navio da Província na temporada de 2014. Poderia arriscar, mas não o faço. Posso garantir que vai ser um tranco terrível. Provavelmente acima de 5% e abaixo de 7%? É possível. Sugiro os dois percentuais apenas para que o leitor vá se preparando para o pior. Ou para o melhor, que seria o menos ruim.
Falta monitoramento
Tudo isso que estou a escrever neste artigo não deveria ser surpreendente para quem acompanha o andar da carruagem da economia regional nas páginas desta revista digital. A conexão da regionalidade com o mundo externo do País e do mundo produtivo é uma obrigação de quem ocupa algum cargo de relevância, principalmente nos organismos públicos municipais da região.
Houvesse, por exemplo, um Clube dos Prefeitos minimamente decente no monitoramento da economia regional para, a partir daí, planejar e executar medidas corretivas ou inovadoras, possivelmente a margem de erro no apontamento do quanto perdemos de PIB em 2014 não seria tarefa de risco.
Se perguntarem aos atuais secretários de Desenvolvimento Econômico dos sete municípios da região sobre o que nos reservou 2014, um ou outro certamente estará próximo de alguma avaliação respeitável, embora pouco aprofundada. Não duvido que um ou outro não tenham a menor ideia sobre o assunto.
O comportamento do emprego com carteira assinada na Província do Grande ABC em 2014 é um dos indicadores que auxiliam a mensurar o que vai ser oficialmente consumado no próximo mês quando o IBGE lançar os números bombásticos.
Naquele ano, conforme artigo que escrevi em 26 de janeiro do ano passado, perdemos 15.093 empregos industriais formais. Sempre dou destaque ao emprego industrial porque é o emprego industrial que segura as pontas do restante dos empregos na região. Quem procura minimizar a dramática situação econômica da região usa preferencialmente a totalidade de empregos formais. Comércio e serviços atenuam a gravidade do quadro porque são atividades de baixa remuneração e geração de riqueza. Dependem demais da indústria.
Em média os empregos industriais pagam por volta de 40% acima da média dos demais empregados formais. Sem contar os ganhos indiretos. E sem contar a dependência de serviços e comércio de uma atividade que ainda é o centro catalisar e difusor de riqueza. Como se vê, estamos encalacrados. Se corrermos (da dependência industrial) o bicho pega; se ficarmos (na dependência industrial) o bicho come.
Marinho quebrou a cara
O prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, é a prova provada de que projeções sem ações não valem nada. Ele cansou de declarar que daria ao Município em oito anos de mandatos algumas variáveis de produção de riqueza. Falou em indústria de gás e óleo, em indústria de defesa e em tantas outras saídas. Vai deixar o Paço Municipal com queda de pelo menos 20% de PIB per capita quando o IBGE concluir as estatísticas desta temporada, daqui a dois anos.
São Bernardo e Diadema, que representam 60% do PIB da Província, foram os municípios que mais sofreram com as perdas de empregos industriais com carteira assinada em 2014 – o ano do PIB que vem aí, é sempre bom lembrar. Dos 15.093 postos de trabalho que desapareceram da região naquela temporada, 9.943 foram registrados em São Bernardo e em Diadema. Quem mais perdeu foi justamente São Bernardo de sindicalismo mais combativo: 5.699 novos desempregados. Diadema registrou 4.344 baixas, Santo André 1.695, São Caetano 742, Mauá 1.990 e Ribeirão Pires 777. A pequena Rio Grande da Serra, com 0,2% de participação no PIB Regional, aumentou o efetivo de trabalhadores industriais em 54 profissionais.
A indústria automobilística que nos embala e nos apunhala começou a declinar e chegou ao ponto que está nestes tempos justamente na passagem de 2013 para 2014, que nos interessa em termos do PIB a ser divulgado.
Em 2013 (portanto, a base dos macrodados referentes a 2014), a indústria automobilística brasileira produziu 3.712.736 veículos leves, de passeio e pesados. Em 2014 (sempre é interessante reiterar que é o ano que nos interessa neste artigo), a produção nacional caiu para 3.146.386 veículos. Ou seja: rebaixamento de 15,25%.
Decréscimo continuado
Quanto teriam registrado de perda relativa as montadoras da região? Faltam dados municipais e regionais nos balanços da Anfavea, o Clube das Montadoras. Têm-se apenas dados estaduais e nacional. A indústria automotiva paulista representa 33% da produção nacional. A Província do Grande ABC não teria mais que 17% do volume geral.
A última vez (primeira e última, para ser mais correto) que alguém se meteu a medir o tamanho da participação da Província no bolo nacional foi o jornalista André Marcel de Lima. Ele fez, para variar, densa matéria publicada na revista LivreMercado, predecessora de CapitalSocial. Era o começo dos anos 2000. Não passaria de 22%. Houve explosão de novas fábricas e redistribuição de produção. Perdemos certamente alguns pontos percentuais, mesmo com o avançar da produção no período falsamente dourado de Lula da Silva -- aquele que, segundo os acadêmicos esquerdistas, criou uma nova classe média no País. Pura bobagem.
Para quem quer imagina o que acontecerá com a Província do Grande ABC quando for conhecido o PIB dos Municípios de 2015, basta comparar a produção automotiva regional em 2014 com a que vem na sequência. De 3.146.386 veículos produzidos no País em 2014, caímos para 2.429.421 no ano passado.
E quem quiser ir mais longe ainda nesse exercício de masoquismo, basta imaginar o que teremos em 2018 quando sair o PIB dos Municípios deste ano, já que a produção de veículos no País nesta temporada mal chegará a 2,1 milhão de unidades. O emprego industrial na região em 2015 registrou um buraco ainda mais profundo que o do ano anterior -- foram para o chapéu 24.495 postos de trabalho com carteira assinada.
Também não custa lembrar que existe nesta temporada, com início na temporada passada, o mascaramento da derrocada do emprego industrial na região, predominantemente na forma de adiamento de demissões com a adoção do Programa de Proteção ao Emprego, bancado em parte pelas grandes empresas e em parte pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
Trata-se de distorção nas relações entre capital e trabalho por ordem de um sindicalismo que insiste em comparar o Brasil sempre adiando o futuro e a Alemanha sempre aperfeiçoamento o presente. Os custos empresariais com folhas de pagamentos excessivas serão de alguma forma transferidos ao conjunto da população da região, principalmente, com a redução de investimentos que procurarão outras localidades. Como, aliás, vem se verificando há muitos anos.
Estragando a festa
Então, ficamos assim: nosso PIB de 2014 vai estragar as festas de fim de ano daqueles que vivem no mundo da lua ou acreditam em agentes públicos que desfilam lantejoulas informativas. É verdade que, quando se confronta o ambiente regional destes últimos anos com meados dos anos 1990, há muito menos resistência à constatação de que perdemos a trilha do desenvolvimento econômico. Já há mais consciência – até porque é impossível não sentir os efeitos no próprio bolso – sobre a extensão e a profundidade da crise econômica regional a bordo do setor industrial.
O que era uma ofensa, algo como crime de lesa-região nos anos 1990 (eu sei bem o quanto quiserem me cortar a cabeça por ser o primeiro maluco que bateu na tecla de desindustrialização) se tornou assimilável nos anos 2010.
Entre um extremo e outro o balanço é que estamos sempre no vermelho, porque ainda não caiu a ficha de que é preciso reagir coordenadamente, planejadamente, cuidadosamente, indignadamente.
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