Economia

Um teste sobre novos estragos
do sindicalismo na Província

DANIEL LIMA - 04/05/2017

Desafio o leitor a apontar, logo abaixo, o enunciado que corresponde à verdade dos fatos. A exposição correta é olimpicamente ignorada na região como insumo de uma agenda emergencial para recolocar a economia nos trilhos, entre tantas outras medidas que precisam ser tomadas. Medidas que autoridades públicas ignoram porque exigem muito esforço além de massa cinzenta. É muito mais fácil vender quinquilharias marquetológicas – como lemos a cada dia nas publicações impressas e digitais da região. 

O enunciado que tem compromisso com a região é mais que ignorado. É vilipendiado no sentido ético. Vendem-se mentiras em forma de meias-verdades ou verdades mais que insolventes. 

Está o leitor pronto a participar dessa gincana de conhecimento regional atrelada à estrutura funcional da indústria de transformação no País? Então, passemos ao trabalho de registrar os fatos, não as versões:

1. O sindicalismo regional, notadamente o sindicalismo da CUT (Central Única dos Trabalhadores), vinculada ao Partido dos Trabalhadores, herança do sindicalismo lulista do final dos anos 1970, garante a estabilidade do emprego nas indústrias locais. Trata-se de exemplo de atuação e de articulação entre capital e trabalho que o Brasil inteiro deveria mimetizar, porque, assim, tudo seria diferente. Seríamos o paraíso industrial do mundo. 

2. O sindicalismo regional, cutista, não cheira nem fede quando se trata do comportamento dos indicadores de emprego formal na indústria de transformação. Suas atividades não incomodam as empresas e tampouco oferecem aos trabalhadores o conforto de relacionamentos mais saudáveis com o empresariado.

3. O sindicalismo regional, notadamente cutista, ainda não parou para pensar o quanto é danoso à estrutura econômica e social da Província do Grande ABC. Seus métodos, seu seletivismo nas montadoras de veículos, seus interesses predominantemente pouco transparentes, seu engajamento político-partidário que afeta o conjunto dos trabalhadores não necessariamente petistas, tudo isso e muito mais compõem as ramificações do que se convencionou chamar de Custo ABC (expressão preciosíssima do empresário Fausto Cestari em meados dos anos 1990) e explica em grande parte o esvaziamento industrial e econômico da região.   

Virtude de origem 

Cá entre nós: não há como se equivocar na escolha. Desde o título deste artigo, não deixo dúvidas de que há uma virtude de origem, não um vício de origem. A terceira alternativa é a mais pura síntese do ambiente regional no campo trabalhista. E como não gosto de produzir informações e interpretações utilizando a chutometria, e muito menos traquinagens típicas de bandidos sociais, eis que passo às explicações. 

Sabe o leitor (pense bem antes de responder) o quanto o trabalhador industrial com carteira assinada em São Bernardo carrega de potencial de demissão no confronto com a média brasileira? Estou me referindo especificamente aos 12 meses encerrados em março, mas poderia retroceder a temporadas outras. Mais precisamente desde que as vacas gordas do setor automotivo entraram em recessão. Quando o setor automotivo bomba no País, nós avançamos em emprego, mas sempre em proporções médias inferiores aos principais concorrentes. Perdemos competitividade econômica em todos os sentidos. Estou cansado de provar com dados invioláveis.

Pois bem: quando se compara a queda do estoque de emprego industrial com carteira assinada em São Bernardo nos últimos 12 meses com a média brasileira, o corte de cabeças locais chega é 274% superior. Não há erro de digitação. E traduzo em termos claros: o trabalhador industrial de São Bernardo tem quase três vezes mais possibilidades de ser demitido quando comparado à média dos trabalhadores brasileiros.  Essa é a conta certa, em substituição a uma conclusão inicial menos dramática.

Aos números, portanto

Vamos aos dados para que não paire dúvida. No Brasil, em março deste ano, houve um acúmulo de perda do estoque de emprego industrial formal nos últimos 12 meses de 3,13%. Ou seja: de cada 100 trabalhadores que estavam empregados em abril do ano passado, 3,13% foram expulsos do campo econômico. Em números absolutos foram 235.165 demissões (contando inclusive com as demissões na região). O estoque geral do emprego industrial no País caiu de 7.513.258 para 7.278.093.

Em São Bernardo do sindicalismo contraditoriamente mais conservador do Brasil tivemos no mesmo período rebaixamento do estoque de emprego industrial formal de 8,59%. Os 274% de diferença estão numa aritmética sem artimanhas. São Bernardo contava com estoque de 81.932 empregos industriais em abril do ano passado e como perdeu no período 7.038, restaram 74.894. 

O leitor mais exigente e crítico possivelmente argumentará que comparar São Bernardo industrial com o Brasil industrial não é medida acertada. Argumentaria esse leitor que a concentração industrial de um Município supostamente provocaria estresse maior que a diluição do quadro de trabalhadores industriais no País. Não concordo, porque o ambiente médio comporta a inclusão de dados de municípios e regiões semelhantes. Mas como sou democrático, fecho um pouco os limites geográficos.

Vamos então ao comportamento do emprego industrial formal dos 12 meses aos quais me referi tomando a base de dados dos 39 municípios da Região Metropolitana de São Paulo. Sabem o resultado final? A média de quebra de estoque sobe um pouco quando confrontada com a média brasileira. Vai a 4,06% (sempre incorporando números da Província). A diferença é de 211,33% de risco adicional em São Bernardo na comparação com a Região Metropolitana de São Paulo.  

Se o leitor ainda não está convencido de que o emprego industrial com carteira assinada em São Bernardo é uma roubada para os trabalhadores em geral que querem ter a certeza de que não vão ficar desempregados, lanço mão também de dados da Capital, aqui vizinha. Sabem quanto caiu o estoque em 12 meses? Apenas 3,34%, ou 256,88% menos que São Bernardo. 

Derrotas na região 

Para completar: quer o leitor restringir ainda mais a geografia? Pois peguem os dados de Santo André. Em 12 meses, foram para a cucuia 4,76% dos empregos industriais. Mais que a média nacional, que a média da Região Metropolitana de São Paulo e também que a média da Capital. Mas muito menos que a média de São Bernardo, que contamina a região com o evangelho cutista. 

Em São Caetano perderam-se apenas 2,38% dos empregos industriais registrados durante 12 meses. Em Mauá foram 4,68%. Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra também estão abaixo dos estragos em São Bernardo, mas o universo de trabalhadores é pouco numeroso, por isso as oscilações são mais constantes. Resta Diadema, vizinha de São Bernardo e sob a mesma terapia de choque do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Ali foram decepados em 12 meses 5,39% dos empregos industriais formais. A contaminação é evidente. 

Quando reitero que o futuro da região passa obrigatoriamente pela reestruturação dos relacionamentos entre capital e trabalho, o que quero dizer é tão transparente quanto a lente de meus óculos: joguem na lata do lixo essas tralhas sindicais que enxergam o mundo pelo retrovisor e, então, começaremos a encontrar alguma saída de verdade.



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