À frente do Clube dos Construtores, o empresário Milton Bigucci se esbaldou com especulações estatísticas durante o boom do mercado imobiliário a bordo do consumismo desenfreado do governo petista de Lula da Silva. Dizia Milton Bigucci que a região era o paraíso a investimentos no setor. Milton Bigucci incorporava o espírito do menino do rio que chamava a atenção da vizinhança gritando por socorro. Supostamente estava se afogando. O menino mentiu tanto que quando gritava a verdade todos imaginavam ser mentira e ele morreu afogado.
Milton Bigucci está encalacrado à frente da MBigucci com estoque considerável de unidades. Estoque é força inadequada de conclusão. Trata-se mesmo de encalhe, verbete aterrorizador do mercado imobiliário. Bigucci acreditou nas bobagens que plantou, todas denunciadas por este jornalista na santa obrigação de relatar fatos.
A MBigucci não virou uma imobiliária, segundo seus próprios executivos, todos da família Bigucci, mas tem na locação um bocado de apartamentos e salas comerciais para reduzir custos fixos e eventuais compromissos bancários.
Mudando a situação
Vender imóveis está difícil numa região destruída aos poucos pela monocultura automotiva e por uma gentinha sem competência à frente de instituições importantes, inclusive Milton Bigucci durante duas décadas e meia no Clube dos Construtores.
Clube dos Construtores e Clube dos Prefeitos são irmãos siameses. A diferença é que, dois anos para cá, o Clube dos Construtores deixou de ser uma caixa de ressonância dos desvarios manipuladores de Milton Bigucci, enquanto o Clube dos Prefeitos tornou-se pior do que já era.
O paraíso desenhado por Milton Bigucci durante um período em que nadou de braçadas na mídia sempre servil virou um inferno das torres comerciais e residenciais. A situação está tão caótica que o presidente atual do Clube dos Construtores, Marcus Santaguita, ainda não teve coragem de divulgar balanço parcial desta temporada que está para se encerrar.
Qualquer chamamento à imprensa para divulgar dados de uma consultoria especializada que atende ao setor no Estado de São Paulo (nos tempos de Bigucci os dados oficiais eram jogados no lixo e o dirigente criava as próprias estatísticas para dourar a pílula ou promover o festival de cordas nas quais ele mesmo se enforcou) seria antimarketing. Tem-se que más notícias, embora verdadeiras e inadiáveis, desestimulariam ainda mais o que se tenta esconder. Mas a conta sempre chega, como chegou para Milton Bigucci.
Não preciso recorrer a dezenas de artigos que escrevi ao longo dos anos de aquecimento natural e principalmente artificial do mercado imobiliário para os leitores entenderem o quanto seguia rigorosamente práticas constitucionais. Às vezes sou obrigado a voltar ao passado porque os leitores de primeira viagem desta revista digital são cada vez mais volumosos, como efeito da invasão das redes sociais.
Leitores de primeira viagem, aliás, voltam a frequentar esse ambiente porque sabem que aqui não há espaço a conchavos e os bandidos sociais são tratados como merecem – ou seja, com todos os rigores que o jornalismo profissional exige.
Até que veio a recessão
Muita gente se deu bem temporariamente com as maquinarias estatísticas na região, mas agora está comendo o pão que o diabo amassou. Faltou combinar com os russos da recessão econômica mais que cantada em prosa e verso, tais os disparates do no governo Dilma Rousseff.
Lembro que não faltaram no cenário nacional arautos do mercado imobiliário em estado de êxtase permanente, tal qual Milton Bigucci na região, embora as motivações não fossem exatamente as mesmas. Uns se excediam em confiança por suposto domínio de informações macroeconômicas e microeconômicas. Outros queriam mesmo surfar na onda da irresponsabilidade social.
Em junho de 2014 o especialista Ricardo Amorim, consultor especializado, declarou num encontro com empresário que quem estava esperando pelo estouro de uma possível bolha imobiliária para comprar residência por um preço mais atrativo estaria adotando estratégia equivocada.
Durante evento de lançamento da parceria entre a Bloomberg e o InfoMoney, em São Paulo, Amorim disse que o setor imobiliário – e os preços dos imóveis – tendiam a ganhar força após a Copa do Mundo, “já que muita gente que está adiando a decisão de compra por causa desse tipo de temor terá de rever essa posição, o que vai reforçar ainda mais a demanda”.
O que se viu em seguida, todos sabem. Os principais bancos comerciais do País criaram incorporadoras ao reaverem imóveis de inadimplência indomável. Sem contar que construtoras e incorporadoras de diversos calibres entraram em convulsão. Ou seja: o mundo imobiliário badaladíssimo pela mídia sempre dependente de investimentos publicitários virou de cabeça para baixo.
Falta de cautela
O que teria faltado ao consultor Ricardo Amorim para não conduzir os investidores a uma senhora roubada? Se levasse mais a sério o que disse o economista Luis Carlos Ewald ao mesmo portal InfoMoney em dezembro do ano anterior, 2013, Amorim teria tomado as devidas cautelas. Conhecido como “Sr. Dinheiro”, Luis Carlos Ewald se juntou ao coro então desqualificado que acreditava na bolha brasileira. “Quem não quer ouvir os mais experientes depois não vai poder reclamar. Eu também já estou avisando faz tempo“, alertou. E continuou: “Essa crise está ocorrendo porque não se vende nada e tem muita oferta. Quem comprou, não consegue vender. Está desesperador”.
Antes das declarações do Luis Carlos Ewald, o prêmio Nobel de Economia de 2013, Robert Shiller, declarou ter uma suspeita de que “está se formando uma bolha imobiliária no Brasil e nada justifica o preço dos imóveis no País. Anteriormente, Shiller previu bolhas da Nasdaq do Subprime.
Errando o alvo
Voltando a Ricardo Amorim, no encontro de junho de 2014 ele procurou dar embasamento técnico à afirmativa opositora à bolha imobiliária: “Comparei o preço dos imóveis com a renda da população e constatei que um brasileiro precisa gastar 13 anos de salário para comprar uma casa atualmente. Em uma lista com 123 países, o Brasil aparece apenas na 48ª posição nesse quesito. Outro forte indicador de que não há bolha imobiliária é que estudei quase 100 casos e percebi que nunca houve um estouro de bolha em um país onde o crédito imobiliário representasse menos de 50% do PIB. No Brasil, não chega nem a 10% do PIB. Há três anos que muita gente fala que a bolha imobiliária vai estourar depois da Copa. Então há uma enorme quantidade de brasileiros que está segurando a compra, pensando em aproveitar a queda dos preços quando ela ocorrer. Mas isso não vai ocorrer” – disse o consultor.
Ricardo Amorim caiu do cavalo entre outras razões porque a maioria dos brasileiros que financiou imóveis estava endividadíssima com outras compras e, em seguida, muita gente perdeu o emprego. Nada que não estivesse no horizonte de análises de quem observava com atenção o quadro nacional e internacional. Principalmente o populismo fiscal petista. No caso da região, prevaleciam a acentuada dependência do setor automotivo e a estrutural debacle econômica de um território que perdeu o bonde da modernidade.
Muito antes dos dois especialistas, um a favor e outro contra a explosão da bolha imobiliária, em abril de 2012, me posicionei claramente sobre o assunto que, aliás, ventilara anteriormente nesse espaço. Sob o título “Olha a bolha imobiliária aí gente! Quem acredita nessa advertência”, leia alguns parágrafos que selecionei:
Em quem o leitor botaria fichas sobre a possibilidade de o Brasil estar vivendo uma bolha imobiliária? Faça a escolha: de um lado William Eid Júnior, doutor em administração pela Fundação Getúlio Vargas e professor titular de finanças. Do outro, Claudio Bernardes, engenheiro civil, presidente do Secovi-SP (Sindicato da Habitação) e reitor da Universidade Secovi. Vamos ao debate? Vamos sim, mas antecipo posicionamento: estou com o professor da FGV e não abro. Aliás, William Eid Júnior é um dos raros representantes da sociedade que tem coragem de enfrentar as manipulações de mercadores imobiliários que só enxergam os próprios bolsos. Os argumentos que esgrime são cortantes, enquanto o adversário desse debate traveste-se de garoto-propaganda. Aliás, esse é o padrão dos empreendedores imobiliários incrustados em organizações de classe que enxergam apenas o próprio umbigo.
Cadê os corretores?
Recorro a outro texto que produzi, agora em julho de 2014 (portanto, pouco depois das declarações de Ricardo Amorim) sob o título “Cadê os corretores de imóveis que frequentam bons restaurantes? ”. Leiam alguns parágrafos:
(...). Não acreditem em pesquisas de supostos especialistas em detectar o preço do metro quadrado de imóveis novos e usados. Não caiam na armadilha do lobby imobiliário. Há gente séria na praça, que atua com responsabilidade social, mas larga maioria transforma o setor num salve-se quem puder. Transformam em preço de venda anúncios de imóveis em sites específicos. Não há acompanhamento das vendas que se dão com redução de valores. (...). Não esperem que jornais de papel e digitais mostrem a realidade do mercado imobiliário. A arte da dissimulação é vergonhosa. Engana-se descaradamente o distinto público consumidor de informações. Um setor com ampla influência e abrangência socioeconômica segue protegidíssimo pela mentira e pelo engodo. (...) O mercado imobiliário está em baixa, com viés de baixa ainda maior. Os preços desabam. (...). Já imaginaram os leitores se o Clube dos Construtores e Incorporadores incluísse em seus arranjos estatísticos um índice de frequência em restaurantes por corretores imobiliários? (...). Os garçons sabem das coisas. E, numa conversinha num canto, discretamente, contam tudo. De mercado imobiliário e tantas outras coisas menos publicáveis.
Retaliações judiciais
Por desmascarar permanentemente o então presidente do Clube dos Construtores do Grande ABC e também presidente da MBigucci (além de denunciar irregularidades no arremate fraudulento do terreno em que se construiu o condomínio Marco Zero da Vergonha) passei a ser perseguido judicialmente e sofri condenação de um meritíssimo que atuou como algoz em detrimento da liberdade de expressão com fundamentação.
O tempo passa e a verdade sempre emerge. Num País sério as patifarias estatísticas de Milton Bigucci (amplamente esmiuçadas neste espaço e jamais contestadas pelo mandachuva imobiliário) as consequências criminais seriam duríssimas.
Não à toa o dirigente foi qualificado pelo Ministério Público do Consumidor de São Bernardo como campeão regional de abusos contra a clientela no campo corporativo. No campo institucional, à frente da entidade de classe, cometeu barbaridades jamais alcançadas pelas autoridades judiciais. Nem mesmo diante das denúncias deste jornalista, pária de uma sociedade acomodatícia.
O menino do rio virou o empresário das torres numa morte metafórica de credibilidade como agente informativo de respeito de um setor importantíssimo. A tragédia das estatísticas fraudulentas fez milhares de vítimas na região, mas também alcançou os próprios manipuladores.
A diferença é que o setor imobiliário é tão protegido pelo Estado e tão propício a ações heterodoxas no âmbito municipal (lembram as empreiteiras colhidas pela Operação Lava Jato), além de contar com uma demanda reprimida tão vergonhosa num País de tantas desigualdades, que é preciso ser muito incompetente para perecer.
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