O professor Ricardo Alvarez fez da terceira rodada deste Debate Digital um festival de anacronismos em defesa de uma instituição sem a menor importância regional, porque inútil, arrogante e totalmente deslocada do desenvolvimentismo por si pobre e modorrento. Fosse moderna, não haveria dúvida de que a UFABC multiplicaria o protagonismo de uma regionalidade minguante.
Selecionar os pontos frágeis do arrazoado do acadêmico, também dirigente do PSOL de Santo André, é tarefa fácil, mas desafiadora. O limite regulamentar de mil palavras pode se tornar incompatível com a profusão de equívocos a desmascarar.
A ojeriza de Ricardo Alvarez ao empreendedorismo privado não surpreendente. O professor faz parte de uma agremiação partidária cuja ideologia sintetiza-se na figura caricata de Guilherme Boullos. A pífia votação do líder de ocupação de terras urbanas nas eleições presidenciais reproduz o quanto a sociedade despreza suas teses e ações que a pretexto de ajustes de direitos constitucionais, subvertem a ordem pública.
Messianismo radical
Não vou me fixar no partidarismo e na ideologia de Ricardo Alvarez para dinamitar os parágrafos que esgrimiu com a profundidade e o conhecimento de alguém que se rivalizaria na brutalidade de insumos intelectuais com um Alexandre Frota de sinais trocados.
Não se sustenta como regra geral o messianismo do professor. Ele prega insuperável incompatibilidade entre empreendedorismo e universidade pública por conta de possibilidades de contravenções éticas dos primeiros. Tão perniciosas como as vantagens espúrias dos maus capitalistas, que temos às pencas inclusive na região sem que ninguém os combata, exceto este jornalista, são estripulias de instituições beneficiárias de fartos orçamentos públicos, gerados pela economia capitalista que o autor tanto execra. Aliás, não se conhece outra maneira de criar riqueza senão no regime capitalista. Exceto, e mesmo assim temporariamente, com custos elevadíssimos, quando os governos perdulários acionam a maquinaria da casa da moeda.
Exemplo esclarecedor
A revista Exame de duas semanas atrás mostra bem o quanto universidade e empreendedorismo desencadeiam benefícios à sociedade. O exemplo tratado pela Exame é comum no mundo inteiro. Novidade só mesmo nas universidades públicas brasileiras, irmãs siamesas em despudores corporativistas.
Escreveu a Exame que o professor da faculdade de Farmácia da Universidade de São Paulo, Humberto Gomes Ferraz, é autor, junto com o laboratório farmacêutico Biolab Sanus, de uma patente que permitiu criar o remédio contra enjoo Vonau Flash. “Essa patente, sozinha, respondeu no ano passado por 58% de toda a receita de royalties da maior universidade do país. No total, as 1.299 patentes de todos os departamentos da USP renderam 2,49 milhões de reais; o Vonau Flash foi responsável por 1,44 milhão de reais desse montante. E os números devem crescer” – escreveu Exame.
Não vou me estender sobre a reportagem da Exame. O mundo inteiro convergiu para uma aliança de responsabilidade social e ganhos econômicos entre academia e empresas privadas.
Mesmo apertado, vou tentar chegar ao máximo de contraposições, além do núcleo já mencionado e esmiuçado. O professor coloca em dúvida a capacidade de redução de desigualdade e da pobreza na esteira do capitalismo. Exemplos internacionais históricos tratam de demolir esse preconceito. Mais: peguem dados sociais deste País, em variáveis imensas, e observem a localização mais incidente da pobreza e da desigualdade.
Estado gera desigualdade
O Brasil é desigual em larga margem porque o Estado corrupto e desorganizado, muitas vezes em parceria com empresários amigos, é obstáculo quase intransponível. Onde o capitalismo sem vícios maiores se manifesta, a riqueza se espraia. O Grande ABC só não é um imenso Nordeste porque o capitalismo, bem ou mal, aqui se plantou. Fossem mais competentes os dirigentes do Estado em suas três dimensões, prefeituras, Estados e União, os resultados seriam muito melhores.
A defesa do enclausuramento acadêmico da UFABC é uma associação de escravagismo ideológico e acinte econômico. Uma relação próxima entre universidade e empreendedorismo na região não significaria submissão se o capital social com que sonhamos se manifestasse. Um capital social sem distorções movidas por interesses políticos, claro. Estado, Mercado e Sociedade cabem perfeitamente num mesmo compartimento mutuamente vigilante e cooperador.
Uma das características do texto do professor Alvarez é colocar no mesmo saco de gatos de interpretação o capitalismo produtivo e o capitalismo financeiro. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Aliás, o capitalismo financeiro tem muito mais a ver com o Estado inchado e ineficiente.
Capitalismo financeiro
Grande parcela dos ganhos financeiros neste País resultam do esfacelamento das contas públicas, entre outras razões porque o funcionalismo público, especialmente o federal, é um dos principais agentes de desigualdades sociais. O estrabismo esquerdista não deixa o professor enxergar o principal, nem o complementar.
Pergunta o professor por que motivo o empresariado local não busca relação e apoio nas universidades e faculdades privadas. Sugere que não haveria resposta a um questionamento supostamente monolítico. Bobagem de quem comemora gol quando a bola bate na trave: da mesma forma que a maioria das universidades privadas se tornou balcão de negócios, em contraponto a incubadoras ideológicas das universidades públicas, pequenos empreendedores estiolados pelo Estado não têm recursos sequer para pensar em contratar pessoal, quanto mais a investir em produtividade.
Além disso, grandes empreendimentos da região, quase todos multinacionais, preferem buscar nas matrizes a base a novos produtos e serviços, ou, também, como mostram os números da USP, aproximando-se de instituições universitárias que começam a acordar do sono profundo do alheamento social, disfarçado de aversão ao capitalismo.
Chave do progresso
O verniz social do professor Alvarez, que dá conta de que a produção de conhecimento é conquista civilizatória de toda a sociedade e seu foco está nos interesses e necessidades sociais coletivos e difusos e não privados, não passa de arrematada extravagância filosófica: o sincronismo entre social e econômico que as relações mais sensíveis entre universidade e empreendedores no mundo inteiro cultua é a chave de ignição ao progresso
Um progresso que será expandido amplamente também aos vetores sociais com a quebra de barreiras de desigualdades e pobrezas na medida em que o Estado for menos ladrão e mais responsável com os recursos orçamentários de fontes empreendedoras que geram riqueza com produção e serviços, não com impostos agressivamente arrecadados.
Já passou da hora da direção da Universidade Pública do Grande ABC, entre outras obrigações sociais, tentar explicar as razões de estar na última fileira de empregabilidade dos alunos, conforme destaca o Ranking Universitário Folha. Uma colocação bem distante da liderança da USP que, como se sabe, ainda é aprendiz em empreendedorismo consorciado.
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