Economia

Ribeirão Preto dá
show de marketing

RAFAEL GUELTA - 05/06/2000

A verdadeira Califórnia norte-americana produz vinhos de excelência mundial que rivalizam com similares franceses. Ribeirão Preto, a Califórnia brasileira, é conhecida nos quatro cantos do País pela excelência do chope servido no seu bar mais famoso, o Pinguim. A Califórnia dos Estudos Unidos assistiu na segunda metade do século passado à lendária corrida do ouro, celebrizada em romances e filmes de Hollywood. Tem praias frequentadas por turistas do mundo inteiro, a monumental ponte pensil Golden Gate e sólo tão frágil que está permanentemente ameaçado por erosão. A Califórnia tupiniquim, mais ensolarada que a do Hemisfério Norte, tem o chão tão firme que acolhe canaviais a perder de vista. Simboliza corrida do ouro em tempo presente, Brasil rural que evolui com novas tecnologias. É sede de uma das regiões que mais crescem no Estado de São Paulo. São 84 municípios que somam três milhões de habitantes. Responde por 33% do álcool e 29% do açúcar produzidos no País.

Ribeirão Preto transpira riqueza e progresso. Expõe-se por inteiro ao motorista de primeira viagem que a avista do alto pela bem-conservada Via Anhanguera -- rodovia que liga a cidade a São Paulo e ao Sul de Minas Gerais. À noite, o cenário é deslumbrante. Vê-se o Município iluminado de ponta a ponta, de Norte a Sul, Leste a Oeste. Já no Centro Urbano identifica-se no aglomerado de edifícios o histórico Teatro D. Pedro II, construído pelos barões do café numa época em que esse fruto era propulsor da economia local. 

Quase 500 mil pessoas moram em Ribeirão Preto, quarta praça financeira do País em compensação de cheques. Com PIB (Produto Interno Bruto) calculado em US$ 3,1 bilhões, abriga três universidades e dois centros universitários. O destaque é um campus da USP (Universidade de São Paulo).

Prova de que Ribeirão Preto tem solo fértil não apenas para canaviais foi dada no mês passado, com a realização da 7ª Agrishow (Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação). Realizada durante uma semana na Fazenda Experimental da Secretaria Estadual da Agricultura, a feira foi superlativa. Fechou negócios que somam quase R$ 1 bilhão, recebeu mais de 120 mil visitantes -- agricultores e pecuaristas de todo o País -- e lançou a idéia da criação do Instituto de Desenvolvimento Agrícola, cujo objetivo é abastecer de informações a bancada ruralista do Congresso Nacional. 

Ribeirão deu show de marketing durante a Agrishow. Num mesmo evento estimulou negócios e parcerias, disseminou novos conhecimentos e tecnologias e arrebanhou força política. Poucas cidades brasileiras teriam condições de dar tamanha ressonância a uma feira. O Grande ABC, que nem mesmo nos anos dourados da indústria conseguiu emplacar feira de negócios, tem muito o que aprender com Ribeirão Preto em marketing. A começar pelo fato de a cidade do Interior de São Paulo tornar-se parada obrigatória para quem trafega pela Via Anhanguera, na rota São Paulo -- Minas Gerais, simplesmente por ter transformado em mito o chope servido pelo Pinguim, hoje com quatro endereços. Entre os anos 60 e início dos 80 a Rota do Frango com Polenta, em São Bernardo, à margem da Via Anchieta, era ponto de encontro obrigatório de turistas de várias partes do Estado que se dirigiam à Baixada Santista. Milhares de pessoas superlotavam restaurantes como São Judas e São Francisco ávidas por se fartar com o prato trazido ao Brasil pelos imigrantes italianos. Incompetente no marketing, São Bernardo deixou que a Rota do Frango com Polenta praticamente sumisse do mapa. Da mesma forma que não sabe gerar pólo de negócios, lazer e diversão sediando a maior concentração de motéis no sistema Anchieta/Imigrantes.

Uma particularidade da Agrishow dá toque de ironia na relação Grande ABC, empreendimentos --, negócios e eventos. O presidente da feira agropecuária de Ribeirão Preto é o engenheiro mecânico Sérgio Magalhães, um dos muitos empresários que embarcaram na onda da evasão industrial que marcou o Grande ABC a partir da segunda metade da década passada. Sócio-diretor da Enaplic, fabricante de fornos para a indústria cerâmica que conta com 120 funcionários, mantém apenas escritório de representação comercial em São Caetano. Magalhães transferiu a produção industrial da empresa em 1995 para Mogi Mirim, na Grande Campinas. Presidente da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) por duas vezes -- seis anos consecutivos --, Magalhães driblou o elevado Custo ABC da época com benefícios oferecidos pela cidade do Interior.


Até helicóptero -- Inspirada na Farm Progress Show (Fazenda Progresso Show), feira realizada seis vezes por ano em diferentes regiões dos Estados Unidos, a Agrishow é um dos mais expressivos símbolos do progresso de Ribeirão Preto. Na primeira edição, sete anos atrás, o evento reuniu apenas 68 expositores e atraiu pouco mais de 10 mil visitantes. No ano passado foram 350 expositores e 102 mil visitantes. Em maio de 2000 extrapolou, com 400 expositores, 10% estrangeiros. Itália e Argentina estiveram presentes com megaestandes nos quais expuseram seus principais empreendimentos em agribusiness. Vendeu-se de tudo na feira: de sementes desenvolvidas pela biogenética a tratores e máquinas colheitadeiras de última geração, de souvenirs com grifes de fabricantes como a New Holland (fábrica de tratores da Fiat) a helicópteros.

Mesmo distante do mundo rural, o Grande ABC esteve presente na Agrishow com nove expositores. Bridgestone Firestone e Pirelli apresentaram pneus para tratores e colheitadeiras. Ford e General Motors expuseram linhas completas de caminhões e picapes, com ênfase para uso na agricultura e pecuária. A Scania aproveitou para lançar o novo motor D12 industrial. A Corr Plastik, de Diadema, exibiu tubos e conexões em PVC para irrigação, poços profundos, obras de infra-estrutura, sistemas de telefonia e eletrodutos. A Dana Albarus, com três unidades na região, expôs cardans agrícolas, filtros de ar, combustível e óleo, anéis de pistão e componentes de suspensão, entre outros produtos. A Mannesmann Rexroth, de Diadema, especializada em automação, lançou válvulas compacto control. Um tanque horizontal para pulverização foi o produto apresentado pela Resiplastic, de Mauá.

Com pavilhão dedicado à difusão tecnológica patrocinado pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), órgão do governo de São Paulo, a Agrishow foi uma mostra do que será o setor agropecuário -- cada vez mais automatizado e plugado na Internet. Estandes de sites da rede mundial de computadores que oferecem de e-commerce a todo tipo de serviços informativos e suportes estratégicos. Foram listados entre os mais visitados da feira. Numa área de 200 hectares, agropecuaristas puderam testar eficiência de máquinas e equipamentos na preparação do solo, plantio direto, fenação e colheita. No design de tratores e colheitadeiras transparecerem sinais dos novos tempos: máquinas com traços modernos e sofisticados dispositivos de conforto.

A Agrishow mexeu tanto com a vida de Ribeirão Preto que o principal jornal local, A Cidade, estampou em manchetes conflitos envolvendo o governo federal e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra). O governador de Mato Grosso, Dante de Oliveira, visitou a feira e recebeu carta de agricultores de Ribeirão Preto que possuem fazendas em seu Estado e enfrentam problemas com sem-terras. "As invasões, principalmente de propriedades rurais, é fator inibidor de investimentos nesse Estado. Somente Vossa Excelência pode fazer cumprir a determinação da lei na reintegração de posse e na ordem pública, amenizando em muito esse problema" -- relata o documento.

Ribeirão Preto é, aos 144 anos, o maior centro de consumo do Nordeste do Estado de São Paulo, para onde convergem moradores de municípios vizinhos do porte de São Carlos, Araraquara, Pirassununga, Leme, Araras, Sertãozinho e Franca, entre outros. Reúne 14 mil lojas comerciais, 1.250 indústrias e mais de 20 mil prestadores de serviços. Com alto padrão de qualidade de vida, destaca-se por abrigar um médico para cada grupo de 160 habitantes -- número que supera a exigência mínima da Organização Mundial da Saúde, que é de 12,6 médicos para cada grupo de 10 mil moradores.


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