São Bernardo perdeu nos últimos sete anos, entre 2012 e 2018, uma fábrica da Ford de empregos com carteira assinada por ano. São, portanto, sete fábricas da Ford que foram para o espaço sideral. Sete fábricas da Ford, não esqueçam esse número. Pode ser um pouco mais ou um pouco menos. Depende do número de trabalhadores que a fábrica da Ford vai perder com o fechamento anunciado nesta semana pela direção mundial da companhia norte-americana.
Essa contagem, portanto, é flexível e contraditória. Quanto menos trabalhadores da Ford forem demitidos com o encerramento das atividades da fábrica de caminhões e de um único modelo de carro de passeio, mais fábricas da Ford teremos perdido. Essa variável vai depender do conjunto de trabalhadores dos setores administrativos. A Ford garantiria a manutenção de 1,2 postos de trabalho. Assim, o prejuízo seria menor. Mas o número de demissões relacionadas às dimensões da Ford seria maior.
Queda de avião
Cheguei à conclusão de que São Bernardo perdeu uma fábrica da Ford de emprego formal por ano nos últimos sete anos tendo como referencial o rebaixamento 3.969 empregos por ano, resultado da perda líquida de 27.785 postos de trabalho industrial no período.
Se a conta que fiz desconsiderasse os terceirizados da Ford, que são 2,8 mil trabalhadores conforme dados do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, a divisão dos 27.785 empregos que desapareceram das fábricas de São Bernardo desde 2012 significaria praticamente 10 fábricas Ford. Portanto, mais de uma fábrica por ano.
Um pouco mais ou um pouco menos não faz diferença conceitual. E o conceito da desgraça repetida a cada ano não só ganha amplitude como choca. Fechar uma fábrica da Ford de supetão impacta o ambiente municipal e regional muito mais que fechar sete fábricas da Ford em forma do universo de fábricas de São Bernardo. E foi isso o que aconteceu. A fábrica da Ford fechada significa um Boeing de passageiros no mar. As sete fábricas fechadas em sete anos são algo como as mortes no trânsito, que se banalizaram.
Na linguagem do “f” eu poderia construir uma força-tarefa de significados que colocariam a Ford de São Bernardo como referencial de muita coisa recheada de segundas intenções, como um recado reto e direto sem meias palavras. É claro que não vou usar o verbete que o leitor está imaginando, que, claro, começa com “f”, porque sou educado. Mas é isso mesmo o que o leitor está pensando.
Escolha a definição
A situação poderia ser resumida a um punhado de letras que formam uma palavra que já foi palavrão, mas cujo uso frequente no dia a dia, inclusive em famílias mais que conservadoras, significa o estado geral da Nação deixada pela Nova República, incubadora do governo eleito em outubro passado.
Mas vamos ao que interessa e que coloca o prefeito Orlando Morando numa sinuca de bico. O tucano faz das tripas do marketing coração de empenho para se livrar da enrascada que recebeu de antecessores que não se deram conta dos ricos embutidos no perfil econômico do Município.
Mas é bom Orlando Morando ir se acostumando. O saldo negativo do estoque de empregos formais da indústria de São Bernardo nos últimos sete anos de 27.785 trabalhadores deserdados não é nada diferente do verbete que não ouso escrever.
Emprego valioso
O emprego industrial de São Bernardo é o mais valioso na composição de riqueza não só do Município, mas também da região. As montadoras de veículos e as autopeças de ponta garantem salários e benefícios complementares muito acima do mercado regional e nacional. E é exatamente isso que tem atrapalhado a vida de quem quer continuar a ter ascensão social em São Bernardo.
Em valores de dezembro de 2017 (os valores de dezembro do ano passado ainda não foram liberados pelo Ministério do Trabalho e do Emprego), a média salarial dos trabalhadores industriais de São Bernardo era de R$ 5.839,71. Muito acima da média salarial do comércio (R$ 2.271,13) e serviços (R$ 2.851,85). Também os servidores públicos (R$ 4.018,82) não fazem frente aos industriários de São Bernardo.
Por isso, quando se apresentam saldos positivos no conjunto de empregos formais em São Bernardo no período de vacas magras do setor industrial, o melhor é se precaver. Mais empregos de baixa qualidade salarial significam menos dinheiro na praça. Mas esse não foi o caso no período de sete anos vasculhado para dar o devido tom de gravidade à situação de São Bernardo. Além de perder 27.785 empregos industriais, houve queda suplementar de 8.272 postos de trabalho nas demais atividades (comércio, serviços, construção civil, administração pública).
Vantagem imensa
Quer uma comparação entre o salário médio do setor industrial de São Bernardo com vários dos demais municípios da região? Os (nunca é demais repetir) R$ 5.839,72 de São Bernardo estão muito acima dos R$ 2.869,89 de São Caetano, dos R$ 4.007,27 de Mauá do Polo Petroquímico e dos R$ 2.992,87 de Ribeirão Pires, dos 3.638,23 de Diadema e dos R$ 4.154,23 de Santo André.
No G-22, o grupo dos 20 maiores municípios do Estado de São Paulo (exceto a Capital e com a inclusão de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra para completar o time do Grande ABC), a média salarial do trabalhador industrial de São Bernardo só perde para casos específicos da indústria aeronáutica de São José dos Campos e da indústria petroquímica de Paulínia, setores menos suscetíveis à concorrência nacional.
Depender demais do setor automotivo, como é o caso de São Bernardo, é um tiro no pé. Já se foi o tempo em que o Estado de São Paulo representava mais de 70% da produção de veículos. E que o Grande ABC passava de 50% dessa contabilidade. Há mais de 70 fábricas de veículos no Brasil desde que inventaram o fake news produtivo de que o País poderia consumir sem sustos até cinco milhões de unidades por ano.
Não deu outra. Excesso de oferta, crise prolongada, custos locais altíssimos – e o desastre consumado. Ironicamente, tudo isso ocorreu durante o governo petista egresso de São Bernardo, Lula da Silva à frente.
Perdas ano a ano
Para que não haja dúvida sobre os números oficiais do Ministério do Trabalho e Emprego, veja os resultados de São Bernardo de cada ano durante o período em que o saldo negativo se estabeleceu no setor industrial, e também nos demais:
Em 2012 foram decepados 2.286 empregos industriais e o saldo geral de empregos foi de 664 negativos.
Em 2013 foram eliminados 1.475 empregos industriais com carteira assinada e o saldo geral de empregos em todos os setores foi positivo em 4.558 postos de trabalho.
Em 2014 foram eliminados das indústrias 5.717 trabalhadores formais e o saldo geral envolvendo todas as atividades foi negativo em 7.283 postos formais.
Em 2015 foram destruídos 8.968 empregos formais no setor industrial e o saldo geral em todas as atividades foi negativa em 18.654 postos de trabalho.
Em 2016 foram destruídos outros 8.046 empregos formais na indústria e o saldo geral de empregos formais em todos os setores atingiu 15.406 negativo.
Em 2017 foram eliminados 1.474 postos de trabalhos com carteira assinada no setor industrial enquanto no cômputo geral, em todas as atividades, o saldo negativo foi de 1.803 postos.
No ano passado o saldo de postos de trabalho no setor industrial foi finalmente positivo, de 181 carteiras assinadas, enquanto o saldo em todas as atividades alcançou 3.195 postos de trabalho.
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