É certo que um povo apaixonado por carro como o brasileiro não pensaria duas vezes para eleger seu modelo preferido. Mas será que essas mesmas pessoas identificariam com igual riqueza de detalhes fabricantes de frisos e molduras que diferenciam os designs dos veículos? A dificuldade em responder a pergunta explica a razão da Fris-Moldu-Car, um dos fornecedores de elite da indústria automobilística, ser pouco conhecida do público, apesar de equipar quase todos os automóveis nacionais. Instalada há 42 anos em São Bernardo, a empresa é espécie de coadjuvante que dispensa os holofotes, mas sem o qual o ator principal não tem tanto destaque. No cenário dos negócios mundiais é assim: mesmo nos bastidores, só sobrevive quem investe em capacitação, estratégia e diversificação. Lição que a Fris-Moldu-Car segue à risca para aumentar a participação no mercado entre 10% e 12% nos próximos cinco anos.
A ousadia tem muito pouco de empírico. Desde 1997 a empresa vem seguindo um planejamento estratégico que resultou em acréscimo de 25% no faturamento dos últimos anos. Uma das causas foi o investimento de US$ 1 milhão em modernização e novos equipamentos, primeiro passo para permanecer no ranking dos negócios mundiais e estar no poderoso marketing boca-a-boca das grandes corporações. Uma indicação ou uma referência positiva pode significar muitos contratos lucrativos.
A injeção de capital -- outros US$ 700 mil estão programados em investimentos para ainda este ano -- é condição primordial para atender ao aumento de produção e aos novos negócios projetados para os próximos anos. Longe de soar pretensiosa, a atitude está em sintonia com os indicadores do mercado que sinalizam para o aumento da produção automobilística e com os projetos dos clientes, elaborados no mínimo dois anos à frente de qualquer lançamento. Como a Fris-Moldu-Car não se enquadra na classificação de sistemista, porque seus produtos se aplicam mais em acabamento e estilo, pode promover as transformações que considerar necessárias sem se preocupar, pelo menos por ora, com tendência que parece irreversível no setor. Nem por isso, descuida da logística e sabe tirar proveito de localização privilegiada às margens da Via Anchieta e próxima das principais montadoras instaladas no Grande ABC.
A Fris-Moldu-Car e as montadoras são parcerias inseparáveis: a maior parte dos projetos é fornecida pelos clientes e a Fris-Moldu-Car participa como co-designer em alguns. Tem flexibilidade para sugerir mudanças que facilitam o trabalho de colocação da peça no veículo e até diminuem o custo.
Outro procedimento é a nacionalização do produto, já que os projetos originais são geralmente desenvolvidos no Exterior. A Fris-Moldu-Car tem adaptado suas peças para as condições nacionais. Essa intervenção foi tão positiva que a empresa passou a exportar para diversos países. O diretor industrial Andonios Ikonomidis explica que as peças feitas no Brasil levam algumas vantagens sobre as importadas em função do preço e que a nacionalização permite participar com mudanças para melhoria do projeto original. "A própria montadora precisa desse comprometimento para ganhar cada vez mais competitividade. É uma via de mão-dupla" -- avalia Ikonomidis.
O gerente técnico-comercial, Alberto Galiassi, complementa o raciocínio. "O Brasil está se tornando independente em engenharia e em desenvolvimento e a Fris-Moldu-Car segue a tendência" -- reforça. Com departamentos próprios de Engenharia e de Desenvolvimento de Produtos, a empresa inova em matéria-prima e em sistemas e aprimora o controle de qualidade. São 1,2 milhão de peças produzidas mensalmente para praticamente todos os modelos de automóveis brasileiros em linha e índices respeitáveis de market share: 90% do mercado nacional de molduras e 100% das molduras body color, que são pintadas na mesma cor dos veículo.
Quality One -- Com a recente conquista do Q1 (Quality One) -- prêmio Ford para fornecedores preferenciais --, as portas para o mercado externo abriram-se um pouco mais. A empresa está agora credenciada a fornecer para qualquer planta da montadora americana no mundo. A Fris-Moldu-Car já exporta direta e indiretamente para Itália, Polônia, México e Mercosul. "O mercado mexicano se tornou potencial e com a queda das tarifas alfandegárias previstas pelo Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte) até 2002, é visto por grandes corporações como a porta de entrada para os Estados Unidos. Mercosul é só um pretexto. As empresas enxergam a América Latina como um todo" -- acredita Galiassi.
Dentro desse contexto, exibir certificados como QS 9000, ISO 9002 é pura obrigação. Já, ser classificado como fornecedor de elite da Ford e Mérito GM por dois anos consecutivos convida a novos desafios, porque acomodar-se na contemplação dos prêmios não leva a lugar nenhum. Para ampliar a galeria de conquistas é preciso envolver a equipe em algo bem maior do que o simples sentimento de orgulho.
Por isso, capacitação tem lugar de destaque no planejamento estratégico da Fris-Moldu-Car. Além do treinamento fornecido internamente, a empresa utiliza recursos do Senai para cursos de reciclagem. A programação anual prevê 45 horas de treinamento para cada funcionário e todos precisam ter Ensino Médio (antigo Segundo Grau) completo. A escolaridade é tão significativa para os padrões de excelência almejados pela empresa que 20% dos 430 funcionários, ainda sem o grau de ensino considerado satisfatório, participarão de cursos supletivos a partir do segundo semestre, na própria sede.
São quatro divisões distintas de produção: pintura, injeção, extrusão e metalúrgica, que fabricam peças metálicas em aço carbono, inox, alumínio com superfície zincada ou pintada, além dos componentes termoplásticos perfilados e injetados em superfície natural ou pintada. Caixilharia para portas e janelas, quadros e guias de portas, estribos de pick-up e moldura para carros estão entre os componentes de identificação mais visível em catálogo que se renova conforme as novidades que chegam anualmente ao mercado.
A tecnologia na pintura é um dos diferenciais da Fris-Moldu-Car. O gerente técnico-comercial Alberto Galiassi explica que nesse caso a questão não é chegar à tonalidade exata, já que os fabricantes de tintas abastecem tanto as montadoras quanto a empresa. Como a maioria dos componentes é flexível, a cobertura tem de ser elástica, durável e não pode descascar. Para se chegar ao estágio atual de durabilidade e resistência foram necessários 15 anos de pesquisas. O know-how não é exclusivo da Fris-Moldu-Car, mas a empresa conseguiu excelência no processo.
A Fris-Moldu-Car foi criada em 1958 no Bairro Ipiranga, na Capital, para fabricar máquinas perfiladeiras e em 1966 mudou-se para São Bernardo, onde iniciou a produção de perfilados metálicos. A diversificação da atividade em quase meia década é referência histórica da transformação e evolução do mercado produtivo no mesmo período. Apenas algumas coisas demoram a mudar no Brasil. Dos US$ 700 mil de investimentos previstos para este ano, parte virá de recursos próprios e parte de linhas de crédito. Apesar de apostar na saúde financeira para ter acesso a financiamentos, a empresa sabe bem o que a espera. "O governo deveria olhar com mais carinho para o médio produtor nacional. Ninguém quer benesses, apenas menos burocracia para obter crédito, além de carga tributária justa, para sermos mais competitivos no mercado externo" -- analisa o diretor de Assuntos Corporativos Luís Carlos Corrêa.
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