Economia

Estância começa
na praça central

WALTER VENTURINI - 05/08/2001

O sonho de Ribeirão Pires é ser pólo turístico. Com localização privilegiada à beira da Represa Billings e encravada na Serra do Mar, a cidade conseguiu passar à categoria de estância turística em 1998. Falta agora desenvolver atrativos para turistas e o primeiro passo é ser atraente para os próprios 105 mil moradores. Vítima da proximidade com grandes magazines e shoppings das cidades vizinhas, o destino de Ribeirão Pires era ter o comércio atrofiado e se tornar aos poucos mais um dormitório da Grande São Paulo, caso não valorizasse o diferencial de preservação da natureza. Para concretizar o sonho de estância, a solução é sair do ritmo e do perfil do Grande ABC e realçar o que outras cidades perderam no decorrer do crescimento industrial e imigração desordenada: a tranquilidade urbana e o passeio na praça. 

É o que Ribeirão Pires vem desenvolvendo nos últimos anos ao tentar revigorar o Centro e o comércio local. Pesquisa patrocinada pela Prefeitura indica que o consumidor ainda quer grandes magazines e variedade de produtos, mas começa a dar preferência às compras na cidade. Também o comércio está acreditando no potencial turístico local e investe em melhorias. O começo da sedução de turistas e moradores passa pelo projeto Centro com Qualidade, que reviveu o hábito tradicional de sair de casa para fazer footing na praça. O núcleo da transformação é a Praça Central reformada, que busca estimular o comércio local. A mudança de comportamento do consumidor serve para mostrar que o sonho do pólo turístico, entretanto, só virá com planejamento e políticas urbanas que façam Ribeirão Pires uma estância de verdade. Nem mesmo a verba anual de quase R$ 1 milhão que tem direito junto ao governo do Estado foi repassada.

A pesquisa da Prefeitura de Ribeirão Pires mostra que o comércio local reagiu às intervenções urbanas realizadas nos últimos anos. Denominada Análise de Demanda Residente, Comércio e Serviços, o levantamento feito entre março e abril deste ano pela Graffit Assessoria e Planejamento teve por base 300 entrevistas em residências e igual número em estabelecimentos comerciais e de serviços. O objeto do desejo dos consumidores locais ainda é ter na pacata Ribeirão Pires maiores e melhores supermercados. É o item mais citado (32%) na pesquisa, junto com a necessidade também de lojas maiores (32%). A pequena variedade de produtos também foi questão apontada pelos consumidores (25%). Por outro lado, 45% dos entrevistados citam como ponto positivo o bom atendimento das lojas. A proximidade da área comercial do local da residência também é lembrada por 21%. Outro item a ser destacado é o fato de 19% dos consumidores apontarem a segurança como vantagem ao se comprar na cidade, detalhe precioso em um Grande ABC que cada vez mais se notabiliza por sequestros-relâmpagos e outras atividades de banditismo.

"Em Ribeirão Pires, tinha-se o hábito de fazer compras fora da cidade, até porque o Centro não era atrativo. Por exemplo, não tinha estacionamento" -- explica o secretário de Desenvolvimento Sustentado, Luciano Roda. Hoje, além de a Prefeitura ter implantado Zona Azul na área central, surgiram 10 estacionamentos particulares, num processo de dinamização comercial que se realimenta com o aparecimento de novos empreendimentos. As primeiras considerações numéricas mostram que o movimento comercial da cidade tem crescido. Comparação da pesquisa feita pela Graffit este ano com a realizada em 1997 pelo Imes (Centro Universitário de São Caetano) indica mudança do curso do comércio de Ribeirão Pires em cinco dos nove itens de produtos pesquisados nos dois períodos. O consumo evoluiu nos setores de eletrodomésticos (de 65% para 71%), produtos eletrônicos (de 49% para 73%), cama, mesa e banho (de 74% para 91%) e móveis (de 49% para 59%). Os setores que registraram redução da participação do comércio local foram em margens quase sempre inferiores a 10 pontos percentuais: vestuário (de 38% para 30%), calçados (de 51% para 47%), papel e material de escritório (de 88% para 86%) e automóveis (de 48% para 35%).

A mudança de hábito do consumidor entusiasma principalmente os comerciantes, pois 44% dos 221 entrevistados fizeram investimentos nos negócios nos últimos 12 meses. Da parcela que apostou no crescimento, que não pode ser desprezada num momento de crise da economia, 39% investiram na ampliação ou mudança da linha de produtos, 38% na reforma e decoração das lojas e 26% na divulgação dos produtos. O incentivo ao turismo é visto como tema que poderá contribuir para aumentar o movimento comercial por 35% dos entrevistados. Os comerciantes parecem estar definitivamente otimistas com o futuro econômico do Município, pois 81% dos entrevistados disseram acreditar que o movimento melhorou. "É uma reação em cadeia, que começou com a melhora do aspecto da cidade e que agora chega ao comércio com a reforma e decoração nas lojas" -- acredita o secretário Luciano Roda. Outro indício apontado como aumento da confiança do comércio é a instalação de magazines como Casas Bahia. "Antes a rede tinha loja em imóvel alugado e agora construiu prédio próprio. Isso mostra que perceberam o potencial da cidade" -- comenta Roberto Rusticci, gerente de turismo da Prefeitura.


Preço competitivo -- O desafio para os otimistas é convencer os potenciais clientes que o comércio de Ribeirão Pires não pratica preços acima da média verificada no Grande ABC ou mesmo em São Paulo. Na pesquisa da Graffit, 64% dos consumidores entrevistados disseram que os preços em Ribeirão Pires são maiores do que em outras cidades da região. A Aciarp (Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Ribeirão Pires) discorda e vai fazer convênio com o curso de Administração de Empresas da Faculdade de Ribeirão Pires para um estudo comparativo dos preços praticados na cidade e nos municípios vizinhos de Mauá e Santo André. "Queremos mostrar que isso não existe mais. O pessoal tem a idéia dos preços altos na cabeça porque nos anos 60 e 70 era mesmo uma realidade. Agora o comerciante não é mais pára-quedista e tem claro que é preciso se adaptar e investir" -- afirma Eduardo Nogueira, presidente da Aciarp.

Se não é pára-quedista, o comerciante de Ribeirão também deixa de ser tradicional, conforme revela a pesquisa deste ano. Boa parte dos estabelecimentos comerciais, 24%, tem menos de um ano de atividades. Deve-se levar em conta também a recessão econômica que fechou parcela significativa dos negócios, pois na cidade apenas 17% dos estabelecimentos pesquisados têm mais de 15 anos. Entre o comércio que soma entre seis e 14 anos de atividades foram contabilizados 27% dos entrevistados e outros 24% ficam na faixa de dois a cinco anos. São cerca de 700 funcionários contratados, numa média de 3,2 empregados por estabelecimento. Do total, 9% dos estabelecimentos não têm nenhum funcionário. 

Nos últimos 12 meses, os estabelecimentos contabilizados na pesquisa contrataram 115 funcionários e demitiram 48, uma marca favorável em tempos de desemprego. O salário médio dos comerciários ficou em torno de R$ 400, embora a maior incidência fique em R$ 350, considerada a mediana de salário. Se o otimismo começa a ser fundamentado com perspectivas de investimentos, a formação da mão-de-obra, ainda precisa ser desenvolvida. A pesquisa Graffit revela que dos comerciantes entrevistados, 84% não tinham implantado qualquer programa de treinamento. Dos que realizaram cursos, 25% o fizeram em São Paulo, 14% com a Prefeitura de Ribeirão Pires e 8% com o Sebrae (Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa).


Nova Ribeirão -- Para o secretário de Desenvolvimento Sustentado de Ribeirão Pires, Luciano Roda, os números da pesquisa indicam a disposição tanto do consumidor como de comerciantes locais de valorizar a cidade. Também seriam resultado de um trabalho de planejamento urbano que começou há cinco anos com o Fórum de Desenvolvimento Sustentado, realizado pela Prefeitura para servir como agenda com agentes sociais locais e apontar atribuições para construir o que deveria ser uma nova Ribeirão Pires. Na alça de mira do Poder Público, de empresários e de movimentos sociais que participaram do evento estava a efetivação da cidade como estância turística verdadeira. "Percebemos que Ribeirão Pires não tinha nenhum plano para se transformar em estância" -- conta Luciano Roda. 

Do Fórum de Desenvolvimento saiu uma ação prioritária: a intervenção no Centro, com implantação de calçadões e reformas na estação rodoviária e na Praça Central. Era a implantação do projeto Centro com Qualidade, que continua na segunda gestão da prefeita Maria Inês Soares. Na reurbanização da Praça Central foi possível iniciar a reversão do hábito da população de sair da cidade nos finais de semana. "Após a reforma, o local ficou mais movimentado porque antes não existia o hábito de se encontrar na praça" -- conta o secretário de Desenvolvimento Sustentado. A Prefeitura também apostou na feira de artesanato na praça, agora realizada às sextas, sábados e domingos. Desenvolve ainda a partir deste ano a Mostra Integrada de Arte. 

Se Ribeirão não tem shopping centers, pode aproveitar o perfil urbano para criar um centro comercial que cumpra o papel de aglutinar a comunidade sem descaracterizar a cidade. "A praça pode desempenhar o papel de centro recreativo de um shopping, que seria o próprio Centro da cidade. É possível dizer que hoje a praça começa a cumprir esse papel" -- acredita o secretário Luciano Roda. As iniciativas para dinamizar o Centro fazem parte do que o executivo público chama de construção da auto-estima da população local para que a cidade tenha condições mínimas de atrair turistas e principalmente identidade própria, um diferencial preservacionista em relação ao Grande ABC industrial.

Não se trata de uma discussão psicológica sobre o perfil de Ribeirão Pires, mas de potencializar a capacidade em atrair turistas. Luciano Roda ressalta que o Município atrai de outras cidades um consumidor pontual, que se desloca apenas para determinado empreendimento de lazer, e 65% vêm do Grande ABC, de acordo com o censo turístico realizado pela Administração Pública no ano passado. O censo mostra que Ribeirão recebe 10 mil pessoas em fins de semana ensolarados. São visitantes que se dirigem, por exemplo, para o Centro Hípico Amarelinho, Clube Náutico Tahiti ou para algum pesque-pague e depois retorna direto para casa sem parar na cidade ou conhecer outras atrações locais. Para afirmar a identidade turística do Município, a Prefeitura iluminou o trevo de acesso à cidade pela Rodovia Índio Tibiriçá e fez pressão para a Sabesp investir R$ 1,3 milhão em obras de saneamento que aumentariam a capacidade de preservação dos mananciais. "Queremos transformar o turista pontual num consumidor da estância. Os efeitos serão sentidos ao longo do tempo e o trabalho continua, pois o projeto Centro com Qualidade foi realizado em apenas 60%" -- cita o secretário Luciano Roda.

Para completar a plástica cultural e urbana de Ribeirão Pires, entretanto, é necessário mais. O problema principal é conhecido: recursos para novos projetos e iniciativas. O orçamento municipal deste ano é de cerca de R$ 52,1 milhões. Como estância, a cidade tem direito a uma cota do Estado. O dinheiro já deveria ter chegado a Ribeirão Pires vindo da Secretaria de Esportes e Turismo, que desde 1999 tem em mãos projetos da Prefeitura para requalificação de pontos turísticos como implantação de coleta seletiva e reforma do Centro do distrito de Ouro Fino Paulista. As propostas foram encaminhadas ao Departamento de Apoio e Desenvolvimento das Estâncias do governo estadual e previam repasse de R$ 917 mil no ano passado, o que acabou não ocorrendo. Este ano, durante a Feira Regional de Turismo realizada em junho pelo Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC), o secretário de Esporte e Turismo do Estado, Marcos Arbeitman, prometeu que a verba seria repassada ainda este ano para a cidade. "Se a gente tivesse a garantia de que o dinheiro viria todo ano, de forma regular, Ribeirão Pires não teria projetos pontuais, mas toda uma política de incentivo ao turismo" -- assegura Roberto Rusticci, gerente de Turismo da Prefeitura.


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