Está literalmente saindo do armário a linha com a qual a indústria moveleira do Grande ABC sonha ser conhecida internacionalmente. A Intercasa de Ribeirão Pires, especializada em dormitórios, é a primeira das nove empresas do consórcio MóvelAção a finalizar os protótipos do roupeiro com gaveteiro, cama de casal e criado-mudo com os quais participa do pool exportador. A entrega dessa espécie de rascunho de peças é importante para o projeto porque permite entrar na fase de testes de qualidade e funcionalidade, características perseguidas pelo Disque Tecnologia da USP, que dá mão forte ao Sindicato dos Moveleiros da região e à agência São Bernardo do Sebrae (Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa), mobilizadores da empreitada.
Os móveis made in Grande ABC estão planejados para ser de madeira, estilo contemporâneo e modulados, a fim de permitirem composições para uso em escritório, dormitório ou salas. Mas a mais básica das características é que serão desmontáveis, tipo automóveis CKD, o que facilita o acondicionamento para exportação e o conceito junto ao consumidor de compre-e-monte, nos moldes dos eletroeletrônicos pluge-e-use. "Precisamos ocupar espaços mínimos dentro do contêiner e pensar na comodidade do consumidor de fora, pois não teremos estrutura de técnicos que montam os móveis em casa. Isso encareceria o projeto" -- comenta Luiz Fernando Buffolo, coordenador do Disque Tecnologia.
Dentro do princípio de baratear custos, já que são todos pequenos empresários, o MóvelAção programa exportar uma casa inteira. Os 10 participantes estão mobilizados em produzir pelo menos quatro ambientes: além do dormitório, há sala de jantar, sala de estar e cozinha. O projeto foi lançado em maio de 2000, mas estruturado na prática em março deste ano, quando começaram os diagnósticos das empresas, a definição das linhas de produtos e a concepção dos projetos. Entre armários, camas, aparadores e sofás, só a cozinha não teve os protótipos finalizados em setembro último. A fase de testes e revisão de protótipos se estenderá por outubro e novembro. Se tudo correr conforme o cronograma, Luiz Fernando Buffolo está otimista: acredita que em dezembro será possível preparar a documentação para produção seriada e o manual dos produtos. Logo depois será a vez do lançamento e da divulgação em feiras, inclusive internacionais.
O coordenador acadêmico do trabalho e gestor da idéia básica do MóvelAção, o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP João Bezerra de Menezes, acredita que a maior virtude dos móveis do Grande ABC para concorrer com mercados tops de linha no Exterior será a desmontabilidade. "Projetamos uma mesa de centro cujo pacote tem seis centímetros por 80, com vidro e tudo dentro" -- conta. É grande também a aposta na flexibilidade, ou seja, um móvel que permita intercambiar componentes. Isso quer dizer que um armário, em tese uma grande caixa aberta, poderá acoplar gaveteiro, calceiro e prateleiras ao gosto do freguês. Para isso, o terceiro pilar -- o da qualidade -- não pode falhar. "Cada parafuso tem de se encaixar milimetricamente" -- diz João Bezerra Menezes. "Design não é fazer um desenho bonitinho, mas buscar a relação entre forma e função de uma peça".
Aposta no novo -- Ainda não se sabe o custo da grife MóvelAção para o consumidor brasileiro e estrangeiro. A linha, de qualquer forma, é uma aposta no novo, já que dentro do consórcio apenas a Elem de Diadema tem alguma experiência com mercado externo. A Intercasa de Ribeirão Pires, com mais de 50 anos no ramo de dormitórios para a classe média, sempre atuou em lojas de shoppings no Sudeste do País e está apreciando a novidade, conta o gerente de produção Yoshiaki Mukai.
Outra das características do pool é que não foi preciso comprar equipamentos especiais, já que o móvel tipo exportação utiliza a mesma chapa plana de madeira. Todos os participantes continuarão a produzir para seus nichos no mercado interno. Até agora, entre treinamento dos empresários, cinco oficinas de design e registro da marca, o projeto consumiu R$ 128 mil, 70% custeados pelo Sebrae/Finep e 30% pelas empresas. Também fazem parte Móveis Bonatto, Dailan, R&C, LArt, Tirmis, Tutti Belli e Felicitá.
Exportar é só um dos desafios aos quais se propôs a cadeia moveleira do Grande ABC, que tem estimadas 450 empresas. Desde que se tornou um dos grupos temáticos da Câmara Regional, em 1998, o setor procura se reposicionar do ponto de vista da competitividade para resgatar a fama perdida para pólos como o de Votuporanga, no Noroeste Paulista, e Bento Gonçalves (RS), mais avançados em tecnologia e design. A produção caiu em desuso no Grande ABC sobretudo a partir dos anos 80, quando a tradição manufatureira cedeu lugar ao comércio lojista, em muito dominado por móveis de fora.
O Sebrae São Bernardo é um dos agentes nessa recuperação. A gerente Silvana Pompermeyer cita que, nos últimos três anos, 900 funcionários e empresários fizeram cursos e treinamentos de capacitação e outros 800 participaram de palestras e cursos de sensibilização. Só de empresários envolvidos, 170 se inscreveram em projetos de mobilização tecnológica. Agora o setor tenta fazer decolar o Centro de Apoio & Difusão Tecnológica, para formação de mão-de-obra, assessoria técnica de gestão e manufatura, laboratórios e centro de maquinários modernos. O governo do Estado se dispôs a ceder área da ETE Lauro Gomes em São Bernardo, mas a mobilização ainda depende de arregimentar R$ 3 milhões e parceiros como IPT, Senai, Prefeitura e fornecedores de madeira e maquinário.
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