Economia

O Interior paulista
segundo investidores

ANDRE MARCEL DE LIMA - 05/02/2002

O estudo A Força do Interior de São Paulo produzido recentemente pela auditoria e consultoria internacional PricewaterhouseCoopers traz informações que endossam a atratividade do Interior em contraposição às dificuldades sistêmicas que comprometem a competitividade da Região Metropolitana de São Paulo. O resultado do levantamento -- produzido com base em respostas de 86 líderes empresariais à frente de negócios que empregam 50 mil funcionários e faturam US$ 6 bilhões -- também reforça o caminho editorial trilhado por LivreMercado, que entre outros assuntos se especializou em esclarecer as iniciativas que estão por trás do crescimento da economia do Interior de São Paulo, ao mesmo tempo em que suscita reflexão sobre os obstáculos a serem superados pela Região Metropolitana de 39 municípios. 

Entre informações relacionadas a temas como conjuntura macroeconômica, ação social, desafios empresariais, preocupações dos executivos, e-business e expectativas em relação à Alca (Área de Livre Comércio das Américas), salta à vista de quem quer entender aspectos de competitividade regional o capítulo que diz respeito às vantagens de se implantar ou manter operações no Interior. As vantagens em questão não são novas. Constam de estudos de economistas, administradores e outros especialistas. Mas ganham sentido especial na medida em que são fruto de dissertação de empresários dos mais diversos setores, que sentem na prática o peso das especificidades regionais. 

"Os dados mostram que os desafios das empresas do Interior são similares aos das grandes metrópoles, como a elevada carga tributária, a redução das margens de lucro e o custo financeiro" -- explica Luís Alexandre Marini, sócio do escritório regional da PricewaterhouseCoopers em Campinas, responsável pelo estudo.    "A diferença é que o Interior tem peculiaridades que favorecem a competição" -- conclui o consultor. Dados da Fundação Seade indicam que o Interior atraiu 71% -- ou US$ 50 bilhões -- dos investimentos privados feitos no Estado entre 1995 e 1998.


Mais espaços -- A disponibilidade de espaços físicos para implantação ou expansão industrial é identificada por empresários ouvidos pela Coopers como um dos principais aspectos que desequilibram o jogo em favor do Interior. E disponibilidade, no caso, quer dizer áreas dimensionalmente mais amplas e também mais baratas, porque o fenômeno da valorização imobiliária que tornou o custo excessivamente salgado na Região Metropolitana de São Paulo ainda está distante -- ou pelo menos não incide com a mesma intensidade -- nas cidades do Interior. Isso sem levar em conta que muitos poderes públicos interioranos acenam com oferta de terreno e isenção de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) no afã de magnetizar negócios que gerem empregos e receitas. 

Os investidores pesquisados também apontaram a boa qualidade da malha viária e da mão-de-obra como aspectos favoráveis do Interior de São Paulo. Essas duas respostas são sintomáticas das fundas alterações que transformaram a face produtiva do Estado nas últimas décadas, a ponto de o Interior paulista ter superado a Região Metropolitana em geração de riqueza. Décadas atrás, quem sustentasse esses dois motivos para investir no Interior paulista seria imobilizado em camisa de força, porque o Estado de São Paulo podia ser segregado em duas bandas muito distintas: a Grande São Paulo industrializada, com o maior mercado de consumo do País e até então bem estruturada sob o ponto de viário, e o Interior paulista rural, longínquo e pouco representativo em geração de receitas. Mas esses dois mundos deixaram de ser tão diferentes. Regiões na órbita de cidades como Campinas, São José dos Campos e Sorocaba estão cada vez mais cosmopolitas e parecidas com a Capital paulista e municípios satélites. Da mesma forma, regiões agro-industriais como São José do Rio Preto, Ribeirão Preto, Marília, Bauru e Araçatuba atraíram investimentos e adquiriram feições mais urbanas e modernas. 

O principal motivo da equalização econômica entre Grande São Paulo e Interior paulista está na facilidade de deslocamento proporcionada pela multiplicação de rodovias intra-estaduais nas últimas décadas. Distâncias foram encurtadas com novas vias de acesso que ligam praticamente todas as cidades à Capital e também entre si. Integrado à metrópole, o Interior paulista deixou de ser um planeta distante e passou a magnetizar investimentos. A ainda mais recente onda de privatização das rodovias contribuiu para facilitar o fluxo de ida e volta ao Interior e o Rodoanel que circundará a Capital tornará o Estado ainda menor e acessível. "O desenvolvimento das rodovias na história recente do Estado anulou as vantagens comparativas logísticas da metrópole em relação ao Interior" -- considera Luís Alexandre.

A facilitação do acesso fez com que muitas indústrias optassem por endereços interioranos nos quais os espaços são mais baratos e a carga de impostos mais leve -- afinal, a demanda por serviços públicos não tem a mesma intensidade das inchadas cidades da Região Metropolitana. Centros de formação e qualificação profissional como o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem industrial) foram criados para atender a aglomeração de empresas. Assim, falta de mão-de-obra qualificada ou sem cultura industrial passou a ser um mito nos principais municípios. Daí os empresários ouvidos pela Coopers terem apontado a boa qualidade da mão-de-obra como outro ponto positivo.

Os empresários consultados também destacam a presença de boas universidades e de institutos de alta tecnologia e telecomunicações. Os institutos de tecnologia dizem respeito especialmente à Campinas, considerada o Vale do Silício brasileiro em razão da concentração de empresas e escolas nessas áreas. Foi salientada ainda na pesquisa a proximidade de fontes de matéria-prima e da cadeia de fornecedores. Esses aspectos também têm origem no encurtamento relativo das distâncias intra-estaduais que levaram empresas para além das fronteiras da Grande São Paulo. E é fácil compreender o porquê.

Aglomerações industriais proporcionam facilidades e ganhos de escala conhecidos no jargão econômico como externalidades positivas. Contratar na mesma região funcionários qualificados, fornecedores de peças, prestadores de serviços especializados e parceiros produtivos ou comerciais é exemplo de externalidade positiva encontrada apenas em localidades com massa crítica de atividades empresariais. 

As regiões interioranas só precisam acautelar-se para não cair na espiral de externalidades negativas, ervas daninhas do desenvolvimento não-planejado, como tráfego congestionado, poluição e criminalidade. As externalidades negativas geram custos adicionais e inibem o desenvolvimento econômico da mesma maneira que as externalidades positivas favorecem a produtividade e estimulam o crescimento regional. Prevenir o florescimento de externalidades negativas torna-se ainda mais prioritário ao se constatar que qualidade de vida foi o fator mais importante citado pelos empresários pesquisados, que traduzem a expressão com o binômio mais segurança e meio ambiente mais adequado. 

Há ainda um aspecto cultural em favor da competitividade empresarial longe da metrópole. "No Interior as empresas sentem que os funcionários se dedicam mais, que podem contar mais com a força de trabalho. No Interior a cultura local é mais forte, menos fragmentada, e isso tende a refletir positivamente na produtividade" -- interpreta Luís Alexandre Marini. Os empresários consideram também que no Interior há mais comprometimento dos governos municipais, bem como o que definiram como uma cultura sindical mais positiva, segundo a pesquisa.


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