Economia

Para estancar a
fuga empresarial

VERA GUAZZELLI - 05/05/2002

Um dos desdobramentos mais importantes do Plano de Desenvolvimento Sustentado lançado por Ribeirão Preto em meados do ano passado rende os primeiros resultados. A cidade de 505 mil habitantes e 24º PIB do Brasil se prepara para instalar o primeiro distrito industrial às margens da Via Anhanguera. A iniciativa é arma de grosso calibre para brecar a fuga de empresas registrada nos últimos anos, sobretudo por causa da guerra fiscal e da pouca disponibilidade de áreas industriais, o que encarece o valor dos terrenos. Nada menos que 1,5 milhão de metros quadrados foram desapropriados e agora aguardam as empresas.

Ribeirão Preto se notabilizou com o título de Califórnia brasileira porque é a maior região produtora de cana-de-açúcar do mundo e tem fama do melhor chope do Brasil. Empenha-se agora para atrair indústrias sem oferecer incentivos fiscais. A cidade é também considerada o maior pólo de comércio e serviços do Interior paulista, mas reconhece o valor que a atividade produtiva pode agregar à economia local. Por isso, deposita fichas no potencial natural e na possibilidade de potencializar cadeias produtivas principalmente nos setores médico e odontológico.

O distrito industrial de Ribeirão Preto será implantado gradativamente. A Prefeitura investe R$ 1 milhão na infra-estrutura dos primeiros 855 mil metros quadrados que serão disponibilizados e já anunciou o preço do metro quadrado: R$ 6. O valor pode ser parcelado em até 60 meses, com 24 de carência, e promete ser um dos principais chamarizes do empreendimento. O pré-cadastro da Prefeitura registra 135 empresas que já declararam intenção de investir R$ 90 milhões, gerar 2.978 empregos e ocupar 780 mil metros quadrados da área.

A euforia inicial tem justificativa. Ao oferecer preço entre 500% e 800% menor que o praticado pelo mercado, a Prefeitura tomou o cuidado de diminuir o impacto do valor da área nos custos de instalação ou de ampliação das empresas. O preço da terra tem peso relevante para a indústria e em Ribeirão Preto o metro quadrado das áreas industriais está cotado no mercado imobiliário entre R$ 35 e R$ 55, até três vezes superior ao cobrado em cidades vizinhas. "As áreas da Prefeitura serão negociadas a preço de custo porque o objetivo não é obter lucro, mas fomentar o desenvolvimento" -- enfatiza o prefeito Antonio Palocci, preocupado em evitar especulação imobiliária. 

As áreas do distrito industrial foram desapropriadas em 1996, durante seu primeiro mandato. Quem comprar terrenos no local não terá posse definitiva até que tenha obedecido os prazos pré-acordados para implantação do negócio. Em caso de desistência, a Prefeitura terá preferência na recompra. Também serão estabelecidos níveis mínimo e máximo de ocupação para evitar ociosidade do terreno. "Temos de estabelecer critérios para filtrar as segundas intenções" -- alerta o coordenador do departamento econômico da Coderp (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Ribeirão Preto), Guilherme Moreira. Os critérios de ocupação serão formalizados em audiência pública.


Todas as atividades -- A expectativa de que o distrito industrial abrigue indústrias ligadas ao agronegócio parece mais do que lógica para uma cidade que respira cana-de-açúcar e sedia a Agrishow, uma das maiores feiras agrícolas do mundo. Ribeirão Preto também é forte na produção de equipamentos médico-odontológicos, mas as empresas que já manifestaram intenção de mudar-se para o distrito apresentam atividades variadas.  Os nomes ainda não podem ser divulgados em função de restrições legais. Só a Comfrio, de Bebedouro, especializada em armazenagem frigorífica, já tornou público que é candidata a um dos lotes. Como a Rodovia Anhanguera é um dos mais importantes entroncamentos viários do Estado, há expectativa de que outras empresas de logística seduzam-se com o distrito industrial. 

A chegada de novas empresas é imprescindível para a economia de Ribeirão Preto porque muitas indústrias deixaram a cidade patrocinadas por terra mais barata e pela guerra fiscal dos vizinhos. A Produtos Veterinários Ouro Fino trocou Ribeirão Preto por Cravinhos. A Cicopal, tradicional fabricante de móveis para escritório, fez o mesmo caminho. Juntas levaram para o Município vizinho impostos sobre faturamentos que ultrapassam R$ 50 milhões. Também a Mabel, de biscoitos, está partindo de Ribeirão Preto para Goiás e a Antarctica desativou a tradicional cervejaria na cidade por causa de reestruturação interna. 

O volume de divisas que deixou de entrar nos cofres públicos com a fuga de empresas ainda não foi calculado pela Prefeitura. Mas estatísticas oficiais sinalizam a dimensão do rombo. Dados da Secretaria da Fazenda do Estado mostram que Ribeirão Preto perdeu 31% de Valor Adicionado entre 1995 e 1999. O indicador é o mais preciso sinal da atividade industrial porque apura a diferença entre o valor da matéria-prima que entra e do produto acabado que sai de uma localidade, entre outros componentes de formação de riqueza econômica. A indústria representa 29,5% da arrecadação de Ribeirão, mas já chegou a 36,1%. O setor terciário fica com quase 65%.

Apesar de estudiosos como o economista do Instituto Maurílio Biagi, Vicente Golfeto, reconhecerem que a prestação de serviços caminha a passos largos para ser a principal atividade de uma metrópole como Ribeirão Preto, ainda é possível correr atrás do prejuízo. Com matrizes econômicas forjadas na própria região, a economia da cidade depende muito pouco da decisão de terceiros e da volatilidade do capital internacional. Com empreendedores locais diretamente envolvidos com o desenvolvimento, fica mais fácil planejar, principalmente quando se pode contar com conhecimento tecnológico. A cidade detém um campus avançado da USP, onde está um dos maiores centros de pesquisas acadêmicas do Estado e desenvolve duas incubadoras em parceria com a Universidade de São Paulo: uma totalmente de base tecnológica e outra ligada à área de física-médica para desenvolvimento de equipamentos clínicos e hospitalares.   


Sertãozinho -- A disputa para atração de indústrias não está limitada a Ribeirão Preto. A vizinha Sertãozinho já estuda a ampliação do distrito industrial Maria Lúcia Biagi Americano implantado durante os anos de 1996 e 2000. A área de 121 mil metros quadros tem 77 lotes ocupados por indústrias.  Sede das quatro maiores usinas de cana-de-açúcar do Estado, Sertãozinho registra a maior concentração industrial da região e é um dos únicos municípios do Interior paulista a ter representação do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado) fora das sedes administrativas do Estado. A regional engloba Pitangueiras, Pontal, Pradópolis, Barrinha, Viradouro e Guariba e soma 114 empresas associadas. 

"O fato de sermos pólo industrial já consolidado, com indústrias que fabricam desde peças para o setor sucroalcooleiro até turbinas, ajuda na atração de novos empreendimentos" -- acredita o secretário de Indústria e Comércio, Marcelo Pelegrini. Mesmo assim e diferentemente da vizinha Ribeirão Preto, Sertãozinho não quer apostar apenas nos atrativos naturais para seduzir novos empreendedores. Caso o distrito industrial seja mesmo ampliado, a Prefeitura deve manter benefícios semelhantes aos concedidos às empresas que se instalaram na primeira fase do projeto: água gratuita por dois anos e isenção de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) por cinco. Também é cogitado repasse do terreno a preço de custo, com pagamento parcelado. 

Preço reduzido do metro quadrado e incentivos fiscais também têm sido atrativos de outros dois distritos industriais da região. Em Jardinópolis, cerca de 60 lotes de medidas variáveis foram comercializados pela Prefeitura a R$ 2,50 o metro quadrado. A Ford Diesel Embreagens, de empresários de Ribeirão Preto, não esconde que o baixo custo do terreno foi o principal motivo da mudança.  As 60 indústrias, 25 das quais já em atividade, terão ainda isenção de impostos municipais e de cobrança de água por 10 anos. Já Taquaritinga vai doar áreas e isentar de impostos municipais as empresas que integrarem o Centro Empresarial Nadir de Paula Eduardo. A cidade também aposta na mão-de-obra farta para atrair empreendimentos. Os últimos dados dão conta de que entre 15% e 17% da População Economicamente Ativa está desempregada.


Leia mais matérias desta seção: Economia

Total de 1894 matérias | Página 1

21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?
12/11/2024 SETE CIDADES E SETE SOLUÇÕES
07/11/2024 Marcelo Lima e Trump estão muito distantes
01/11/2024 Eletrificação vai mesmo eletrocutar o Grande ABC
17/09/2024 Sorocaba lidera RCI, São Caetano é ultima
12/09/2024 Vejam só: sindicalistas agora são conselheiros
09/09/2024 Grande ABC vai mal no Ranking Industrial
08/08/2024 Festejemos mais veículos vendidos?
30/07/2024 Dib surfa, Marinho pena e Morando inicia reação
18/07/2024 Mais uma voz contra desindustrialização
01/07/2024 Região perde R$ 1,44 bi de ICMS pós-Plano Real
21/06/2024 PIB de Consumo desaba nas últimas três décadas
01/05/2024 Primeiro de Maio para ser esquecido
23/04/2024 Competitividade da região vai muito além da região
16/04/2024 Entre o céu planejado e o inferno improvisado
15/04/2024 Desindustrialização e mercado imobiliário
26/03/2024 Região não é a China que possa interessar à China
21/03/2024 São Bernardo perde mais que Santo André
19/03/2024 Ainda bem que o Brasil não foi criado em 2000