Economia

Vida própria
entre gigantes

VERA GUAZZELLI - 05/08/2002

A receita do desenvolvimento econômico de Jundiaí reúne ingredientes essenciais para manter a sustentabilidade, mas foi acrescida com pitada caseira de perspicácia. A cidade assiste a chegada de US$ 100 milhões em média por ano de investimentos privados desde 1997, porque optou por crescer com base no equilíbrio que descarta a guerra fiscal e privilegia o planejamento estratégico. O parque industrial forte e diversificado, a rede de serviços cuja área de influência extrapola as fronteiras municipais e um segmento agrícola consolidado conferem a Jundiaí o privilégio de caminhar com os pés no chão nestes tempos infindáveis de turbulência econômica. 

Localizada entre a Grande São Paulo e Campinas, Jundiaí praticamente conseguiu manter-se imune à periferização das duas regiões metropolitanas do Estado que mais escancaram o cenário de contraste social e suas cruéis consequências. Como sempre teve o cuidado de não incorporar a condição de recheio para não se ver no papel de apenas administrar as sobras dos vizinhos, construiu vida própria subsidiada pelas potencialidades naturais. Resultado: 77 novas empresas e 22 grandes expansões criaram 14,2 mil empregos diretos em cinco anos e um confortável orçamento de R$ 380 milhões para 2002, que figura entre os maiores per capita do Estado. 

Os indicadores favoráveis são resultado de política de continuidade administrativa que segue a lógica cartesiana de que geração de empregos e equilíbrio das finanças públicas são fatores preponderantes para o crescimento. O prefeito Miguel Haddad (PSDB), em segundo mandato, herdou do antecessor um conjunto de ações que não precisaram de modificações radicais para continuar na trilha desenvolvimentista. Assim, enquanto a maioria se embrenhou pelo escorregadio caminho da guerra fiscal ou pelo impopular aumento de impostos para compensar perdas de receitas, Jundiaí acenou com as vantagens do conquistador, que além da boa aparência física tem também as finanças equilibradas. 

"Não procuramos empresas interessadas apenas em benefícios fiscais e que amanhã podem seguir pelo caminho de quem oferecer vantagens melhores. Optamos por quem realmente quer empreender na cidade" -- expõe o secretário de Desenvolvimento Econômico, Jamil Giacomello. "O empresário encontra qualidade de vida, infra-estrutura e custos atrativos em Jundiaí" -- assegura o prefeito Miguel Haddad. Os dois gerenciadores públicos referem-se a quesitos que certamente pesam mais nos custos das empresas do que as doações de área e isenção temporária de impostos utilizadas em larga escala por cidades do Interior para seduzir empreendedores. 

É fato que já seria motivo natural de atratividade a localização de Jundiaí, a meio caminho entre São Paulo e Campinas, rota que abriga o maior mercado consumidor da América Latina e a região mais emergente do Interior paulista. Mas a Prefeitura propagandeia junto a esse fator a infra-estrutura de saneamento básico, viária e de telecomunicações e a disponibilidade de gás natural. Outro ponto alto é a qualidade de vida entre as cidades com mais de 200 mil habitantes no Estado: O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,8688 é considerado alto pela ONU. "O ISS e o IPTU têm alíquotas mais vantajosas do que as cobradas em cidades de porte semelhante" -- expõe o secretário Jamil Giacomello. A administração também garante que o custo da água tornou-se menor desde que foram investidos R$ 100 milhões na construção de represa que dobrou a capacidade de abastecimento. Isso livra a cidade de qualquer problema relacionado à falta desse insumo indispensável à produção até 2020.   

Jundiaí conta ainda com seis milhões de metros quadrados de áreas disponíveis para instalação de indústrias. São terrenos com infra-estrutura completa e em concordância com a lei de zoneamento cujo preço oscila entre R$ 25 e R$ 50 o metro quadrado. A expectativa de que parte desse território venha a ser ocupado por empresas de logística é tão real quanto as estimativas de que a inauguração total do trecho oeste do Rodoanel deve deslocar o eixo de desenvolvimento para aquelas paragens. A distância de apenas 20 quilômetros que separa Jundiaí de um dos acessos ao complexo do megaanel viário subsidia as contas do secretário Jamil Giacomello. Ele acredita que em dois anos será possível dobrar de 500 mil para um milhão de metros quadrados a área ocupada por empresas ligadas à logística e distribuição. 

Equilíbrio financeiro -- A atividade industrial responde por metade da arrecadação do Município. Apesar da forte dependência do segmento fabril na composição de receitas próprias, Jundiaí tem conseguido manter-se em 12º lugar no ranking do Valor Adicionado do ICMS desde 1994. A estabilidade é atribuída à diversificação do parque industrial, composto por 33 tipos de atividades, o que teoricamente livra a cidade de crises setoriais. 

Entre as 480 empresas instaladas no Município estão Coca-Cola, Brahma, Parmalat, Sadia, Siemens, Klabin, Aga, Cereser, Fleischmann & Royal, Duratex, Incepa, Dow Química, Ideal Standard, Corn Products, Vinagre Castelo, Meias Aço, CBC e Solvay. A cidade abriga também o centro de distribuição das Casas Bahia, considerado o maior depósito da América do Sul, além dos call centers Softway e Certegy. Jundiaí ainda viu o setor terciário crescer no rastro da industrialização e hoje mantém rede de comércio e serviços que extrapola o atendimento aos 340 mil habitantes locais para suprir mais 600 mil moradores de cidades do entorno, como Bragança Paulista e Atibaia. 

"Acredito que estamos no caminho certo" -- considera o prefeito Miguel Haddad ao apressar-se em dividir méritos com a equipe que o ajuda a manter as contas sob controle desde 1997, três anos antes da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal. O cuidado com o dinheiro público permite que a Prefeitura mantenha a dívida sob controle e destine 65% do orçamento a projetos sociais e 12% para obras. O mais recente exemplo de como é possível fazer o dinheiro público render está no Compra Certa, programa que cadastra pela Internet interessados em fornecer para a Prefeitura produtos de escritório, higiene e manutenção, cujos valores dispensam licitação. Os participantes fazem as ofertas por meio de espécie de leilão virtual. Se forem escolhidos, têm a garantia do pagamento na data acordada. O sistema foi implantado em abril e já contabiliza economia de 15,3%.

Cinturão verde -- O equilíbrio urbano e econômico que confere a Jundiaí o conforto de ter a segunda menor população do Estado vivendo abaixo dos índices de pobreza, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, tem uma peculiaridade. Apesar da forte industrialização, a cidade manteve o cinturão verde que produz frutas e hortaliças em 12 bairros periféricos. Isso evitou que 20 mil trabalhadores agrícolas engrossassem o pelotão de mão-de-obra desqualificada em busca de emprego nos centros urbanos.  

A Festa da Uva reforça a imagem institucional da cidade: atrai 150 mil visitantes por ano e é a principal referência da atividade. Mas Jundiaí também produz pêssego, morango, lixia (fruta considerada nobre) e todo tipo de verduras e legumes. São 30 mil toneladas de uva colhidas todo ano sob metas de produtividade que passaram de um para três quilos por pé em uma década. Tudo resultado da parceria entre Poder Público, agricultores e a Casa da Agricultura para melhorar o acesso à tecnologia e tornar a atividade cada vez mais rentável. "A fixação do homem no campo não nos deixa imunes ao crescimento desordenado. Mas funciona como uma vacina, já que essas áreas certamente estariam ocupadas por loteamentos clandestinos e bolsões de pobreza" -- ensina o prefeito Miguel Haddad.



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