O que aconteceu com o emprego de carteira assinada no Grande ABC nos últimos quatro anos, entre maio de 1998 e maio de 2002? Em outra pesquisa inédita da Editora Livre Mercado, com base no banco de dados do Ministério do Trabalho, a conclusão é contrastante: no setor industrial, nenhum Município do Estado de São Paulo perdeu mais postos de trabalho em relação à população do que São Bernardo. E no setor de comércio e serviços, São Caetano só perde em índice de emprego formal no Estado para o paraíso fiscal de Barueri, na Grande São Paulo.
A liderança negativa de São Bernardo no emprego industrial e positiva de São Caetano no emprego terciário são faces de uma mesma moeda do perfil econômico esculpido no Grande ABC e também na Grande São Paulo desindustrializados principalmente ao longo da última década. A expectativa dos mais otimistas de que os últimos quatro anos teriam amenizado as perdas de empregos industriais na região não se converteu em fatos: nenhuma área paulista, inclusive o restante da Região Metropolitana da qual o Grande ABC faz parte, acusou tantos golpes.
Contrariamente à visão otimista de que os setores de comércio e serviços teriam compensado em parte as perdas de empregos industriais, a realidade também é dura: não fosse a exceção de São Caetano, espécie de aprendiz de Barueri na arte de atrair empresas com rebaixamento de alíquotas de impostos municipais, o Grande ABC também teria desempenho apenas discreto na atividade terciária.
A base da análise de LivreMercado, além das estatísticas do Ministério do Trabalho, são os números mais recentes da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. O mapa do emprego com carteira assinada dos setores industrial, comercial e de serviços abrange 59 dos 66 municípios mais representativos da economia paulista, os quais envolvem 67% da população e 75% do PIB do Estado, como pode ser chamado o Valor Adicionado -- indicador econômico que estabelece o valor monetário da diferença entre a matéria-prima que entra e o produto acabado que sai no processo de transformação industrial.
Sete dos 66 municípios economicamente mais importantes do Estado não constam do estudo porque estão fora do sistema de dados do Ministério do Trabalho e Emprego. A ausência não prejudicou a análise. O conjunto dos 66 municípios gerou R$ 196,6 bilhões de Valor Adicionado no ano 2000. Sem os sete municípios, o total sofre pequena redução, para R$ 178,6 bilhões. Paulínia, Cajamar, Jaguariúna, São Sebastião, Vinhedo, Hortolândia e Ilha Solteira exerceriam pouca influência no resultado final. Por isso, o levantamento pode assegurar mais que uma tendência da realidade econômica do Estado mais rico da Federação: é a própria constatação do movimento migratório de indústrias para o Interior com a consequente abertura de postos de trabalho, bem como a avalanche de empregos do terciário na Capital e na Grande São Paulo. Trata-se de dicotomia preocupante e que ajuda a entender por que a Região Metropolitana de São Paulo virou barril de pólvora, já que o emprego industrial é enfaticamente muito mais gerador de riquezas do que o emprego terciário.
LivreMercado adotou medidor análogo ao utilizado por organismos nacionais e internacionais que elaboram ranqueamento de criminalidade e de indicadores sociais diversos. A lógica é simples: há estreita relação entre o número absoluto de emprego ou desemprego e as consequências econômicas e sociais. Utilizou-se para o trabalho a escala de 100 mil habitantes como espécie de régua e compasso do esquadrinhamento do emprego formal.
São Bernardo lidera -- Um exemplo específico de que os números absolutos podem induzir a erros de interpretação está no confronto entre a cidade de São Paulo, que perdeu 25.741 empregos formais do setor industrial entre maio de 1998 e maio de 2002, e São Bernardo, que perdeu 13.065 no mesmo período. Quem sofreu mais com o esfriamento industrial? O índice de São Bernardo, o maior de todo o Estado de São Paulo, é de 1.865 novos desempregados industriais para cada 100 mil habitantes, contra 247 da cidade de São Paulo. São Bernardo soma 700.405 habitantes, contra 10.406.166 da Capital.
Nenhuma região viu evaporar mais empregos industriais formais do que o Grande ABC. Os cinco municípios locais que constam da lista dos 66 maiores do Estado perderam 22.708 postos de trabalho em 48 meses, o que dá a média de 473 baixas a cada 30 dias. A velocidade média mensal de perda de emprego industrial na região nos últimos quatro anos apresentou desaceleração em relação à média mensal dos 96 meses anteriores, isto é, entre 1990 e 1997, que atingiu a quebra de 692 postos de trabalho a cada mês. Como os cinco municípios do Grande ABC que constam da pesquisa dos últimos 48 meses representam população de 2,2 milhões, a média por grupo de 100 mil habitantes alcançou 1.028 empregos a menos. Mauá é exceção: o incremento do Pólo de Sertãozinho, principalmente com empresas que migraram do próprio Grande ABC, traduziu-se em novos 1.271 postos de trabalho.
A perda relativa de empregos industriais do Grande ABC é 4,6 vezes mais elevada do que a média registrada pelos demais 12 municípios da Região Metropolitana de São Paulo que estão entre as 66 maiores economias paulistas. Com 13,2 milhões de habitantes, 10,4 milhões só na Capital, o conjunto desses 12 municípios registrou perda de 221 empregos por grupo de 100 mil habitantes no setor de transformação nos 48 meses pesquisados. Guarulhos contabilizou as maiores baixas relativas, com 6.621 empregos formais destruídos para população de 1,071 milhão de pessoas; ou seja, 618 desempregados para cada grupo de 100 mil habitantes. A média de Guarulhos é inferior à média individual dos quatro municípios do Grande ABC que colecionaram prejuízos no mercado de trabalho com carteira assinada.
Enquanto os 17 municípios da Grande São Paulo que estão entre os 66 maiores do Estado somaram perda de 52.021 postos de trabalho, os 16 municípios da Região Administrativa de Campinas igualmente listados entre os 66 maiores apresentaram saldo positivo de 10.948 postos de trabalho. Com 3,4 milhões de habitantes, a média positiva de contratações industriais para cada 100 mil habitantes da região de Campinas atingiu 314 postos de trabalho.
Os seis municípios do Vale do Paraíba que constam do ranking dos mais importantes do Estado e que totalizam 1,2 milhão de habitantes contabilizaram 1.221 novos postos de trabalho, o que dá a média positiva de 95 para cada grupo de 100 mil pessoas.
Interior industrial -- Centros regionais como Franca, Araçatuba, Presidente Prudente, Marília, Bauru e São José dos Campos, também entre as 66 cidades mais poderosas de São Paulo, apresentaram a melhor média de postos de trabalho por 100 mil habitantes: 515. Em conjunto, esses municípios totalizam 1,5 milhão de pessoas e 7.818 postos de trabalho formais. O grande destaque é Franca, com 6.079 empregos industriais, depois de passar por grandes perdas, atingida em cheio pela crise no setor calçadista.
A perda líquida de 27.936 empregos industriais com carteira assinada no bloco das cidades mais importantes do Estado que foram analisadas por LivreMercado estratifica duas realidades paralelas: enquanto na Grande São Paulo o emprego industrial protegido pela legislação trabalhista continua a cair, no Interior do Estado apresenta indicadores positivos, embora sem fartura. Dos 17 municípios da Grande São Paulo, apenas Mauá, Osasco, Mogi das Cruzes, Barueri, Taboão da Serra e Carapicuíba conseguiram aumento de postos de trabalho do setor produtivo. Nos 27 municípios do Interior, apenas Jundiaí, Moji-Mirim, Mogi-Guaçu, Araras, Itu, Salto, Jacareí, Guaratinguetá, Caçapava, Araçatuba e Bauru estão na relação dos perdedores. O saldo positivo do Interior de 24.996 postos de trabalho industriais contribuiu para reduzir o déficit predominantemente da Região Metropolitana de São Paulo. Perderam-se, no conjunto do Estado, 27.936 postos de trabalho na indústria. Esse balanço já considerou a Baixada Santista, com quatro cidades entre as mais importantes do Estado e que perdeu 1.262 empregos.
Embora o setor terciário tenha apresentado bom desempenho no Grande ABC no período da pesquisa, com saldo positivo de 23.347 empregos com carteira assinada, o resultado precisa ser relativizado. Primeiro, porque tanto comércio quanto serviços não geram riqueza na proporção do setor industrial. Em muitos casos, praticamente não acrescentam riqueza alguma. Segundo, porque a equivalência de empregos formais entre as perdas industriais e os ganhos do terciário no Grande ABC significa que os cinco municípios da região que constam do ranking estadual não conseguiram superar nem numericamente o rebaixamento do setor produtivo. Terceiro, porque a média de 1.057 novos empregos do terciário para cada grupo de 100 mil habitantes induz a erro de interpretação, já que São Caetano investiu maciçamente numa espécie de guerra fiscal para atrair empresas das atividades e gerou mais de um terço dos empregos.
A distorção que São Caetano proporciona na avaliação do quadro de empregos formais do terciário do Grande ABC pode ser melhor qualificada com simples comparação: em todo o Estado, entre as principais economias listadas no mapa da riqueza, São Caetano só perde para Barueri na geração de empregos formais do terciário na média por grupo de 100 mil habitantes.
A melhor média regional de novos postos de trabalho do comércio e de serviços nos 48 meses analisados é da Região Administrativa de Campinas, que criou 46.464 empregos, ou 1.336 para cada 100 mil habitantes. Os 12 maiores municípios da Grande São Paulo, exceto o Grande ABC, atingiram a média de 920 empregos por 100 mil habitantes, contra 670 da região de Sorocaba, 523 do Vale do Paraíba, 526 da região de Ribeirão Preto e 428 dos sete municípios que lideram várias regiões paulistas, casos de Franca, Araçatuba, Presidente Prudente, Marília, Bauru e São José do Rio Preto.
A Baixada Santista de Santos, Cubatão, Guarujá e São Vicente é a única região do Estado representada pelos maiores municípios que sofreu perda líquida do emprego formal do terciário, com 438 postos de trabalho a menos para cada 100 mil habitantes.
No conjunto, o Estado de São Paulo -- que perdeu 27.936 empregos formais da indústria em 48 meses -- contratou 212.406 postos de trabalho no terciário. O saldo positivo em atividades que não são capazes de garantir riqueza ajuda a explicar a permanente queda dos paulistas no ranking da economia nacional.
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