Economia

Imigrantes fortalece
a regionalidade

FERNANDO BELLA e VERA GUAZZELLI - 05/01/2003

O amadurecimento dos caminhos para efetivar a gestão regional na Baixada Santista pegou carona na segunda pista da Rodovia dos Imigrantes. A discussão do impacto da obra nas atividades portuária e de turismo reuniu mais uma vez Poder Público e sociedade civil em torno da difícil missão de encontrar soluções conjuntas para o desenvolvimento econômico das nove cidades da região. A recente inauguração da rodovia orçada em US$ 300 milhões fez crescer a veia prospectiva dos que apostam no crescimento imediato de cargas e turistas com a vantagem logística que o litoral acaba de receber de presente de Natal. 

A obra que consumiu concreto suficiente para erguer nove estádios do Morumbi deixa a Baixada Santista rodeada de expectativas e boas intenções. A região aposta nos diagnósticos positivos apresentados durante o seminário Imigrantes — Nova Pista de Oportunidades para conseguir lugar de destaque no mapa geoeconômico do Estado, ocupado com predominância pelas cidades do Interior. A primeira conclusão é bastante óbvia: com a facilitação do acesso ao Litoral, tanto turistas quanto mercadorias que chegam ou saem do Porto de Santos atingirão mais rápido o destino. A economia de tempo promete injetar precioso componente de competitividade a essas duas principais matrizes econômicas da Baixada. 

“O momento é propício, mas somente a ação regional pode potencializar realmente esse quadro favorável” — alerta o pesquisador do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), João Pizysieznig Filho. O estudioso pesquisa as potencialidades da Baixada Santista e sabe o quanto é difícil fazer a comunidade se dar conta da importância da regionalidade em tempos de globalização. A Baixada Santista é Região Metropolitana legalmente constituída desde 1996, mas avança devagar em direção à gestão integrada. 

As tentativas para a regionalização do Porto de Santos são o exemplo mais emblemático dessa dificuldade. A transferência do comando portuário da União para o Estado de São Paulo e as cidades de Santos, Cubatão e Guarujá era considera questão de honra para o governo FHC, mas ficará para Lula da Silva resolver. Apesar dos esforços, as partes ainda não conseguiram acertar cláusulas polêmicas do contrato que envolvem o próprio modelo de concessão e principalmente a dívida da Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo) estimada em R$ 800 milhões.

O assunto sempre se sobressai na pauta de discussões econômicas porque é justamente no Porto de Santos que estão as maiores oportunidades de negócios, potencializados pela segunda pista da Rodovia dos Imigrantes. Os 21 novos quilômetros prometem eliminar a sofrível operação 5X2 que confinava o tráfego de caminhões a somente duas pistas da Via Anchieta. O transporte de cargas também deve melhorar com a construção da perimetral que margeia o Porto de Santos, cuja verba já está prometida pela União. Há também o trecho Sul do Rodoanel que ligará as principais rodovias do Estado ao sistema Anchieta-Imigrantes. A obra enfrenta objeção dos ambientalistas, mas o governador Geraldo Alckmin é categórico na afirmação de que não atrasará o início previsto para o segundo semestre. 

Os investimentos no Porto de Santos atingem R$ 1 bilhão desde 1994, época da privatização. A modernização baixou tarifas, elevou a produtividade e levou a recordes de movimentação de cargas — em 2002 foram 51 milhões de toneladas. Mas a situação ainda não é tranquila, porque a concorrência, principalmente do Porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro, está de olho na movimentação de contêineres, uma das especialidades de Santos. “O Porto de Santos é uma das marcas mais importantes do País e temos de usar esse diferencial a nosso favor” — acredita o presidente da Codesp, Fernando Vianna. 

A Codesp e o Ciesp de Santos juntaram forças e querem tirar do papel o projeto de retroporto. A expectativa é povoar o entorno da região portuária com empresas interessadas em importar componentes com isenção fiscal para montar produtos destinados exclusivamente à exportação. A atividade permite manusear mercadorias em área alfandegada e foi legalizada há dois anos. É o pulo do gato para transformar Santos num porto capaz de agregar valor às exportações. A iniciativa também é vital para absorver a mão-de-obra que ficou à deriva com a mecanização dos processos de embarque e desembarque do porto. A massa salarial em Santos caiu 12,12% entre 1995 e 2000, período em que o porto declinou do papel de grande empregador local. 

A Codesp já colocou à disposição área de 245 mil metros quadrados para as empresas interessadas em se engajar no projeto da indústria alfandegada. Também a Alemoa e a Mesquita, empresas ligadas à operação portuária e logística marítima, manifestaram intenção de utilizar áreas remanescentes para a mesma finalidade. O Ciesp de Santos identificou seis potenciais atividades para formar a retaguarda portuária: metalmecânica, transformação de plástico, eletroeletrônicos, calçados, confecção e alimentos. “Não estamos propondo que as empresas transfiram suas plantas para Santos. Queremos que montem plataformas de exportação para aproveitar as vantagens legais e de logística” — esclarece o diretor do Ciesp, Mário Lubliner.


Mais consumidores — Se parece óbvio que o Porto de Santos é o pólo de atração para o aumento da atividade produtiva, também está claro que comércio e serviços ganham impulso com a inauguração da segunda pista da Imigrantes. A pesquisa Hábitos e Preferências do Novo Consumidor realizada pela Ipsos-Marplan mostra exatamente o que já se imaginava: a frequência de turistas na Baixada Santista vai aumentar. O estudo com base em 541 entrevistas com a população flutuante das cidades de Santos, Guarujá e Praia Grande detectou que 50% dos proprietários de imóveis e 43% dos que ainda não têm casa de veraneio pretendem aumentar a frequência às praias.

A pesquisa abordou somente quem chega ao Litoral de carro para analisar as variáveis frequência, consumo e demanda habitacional. Entre os resultados mais expressivos para sinalizar aumento de demanda nos estabelecimentos comerciais e de serviços está o fato de o turista dessas três cidades ser frequentador assíduo dos supermercados e quiosques da praia. A constatação justifica o fato de apenas 20% frequentarem restaurantes, 23% lanchonetes e fast-foods e 13% pizzarias. A ida a danceterias e cinemas é menor ainda, 6% e 8%, respectivamente. Somente 2% visitam museus e espaços culturais. A Ipsos Marplan detectou que o turista quer mesmo aproveitar a beleza da praia — fator destacado por 80% dos entrevistados —, de preferência numa cidade urbanizada e limpa. “Os percentuais são reveladores porque sugerem nichos de mercado a serem ocupados” — avisa o diretor da Ipsos-Marplan, José Iolando Mallegni Filho. 

A pesquisa desmistificou também as projeções apressadas de que a população fixa de cidades como Praia Grande poderia aumentar até 50% após a liberação da segunda pista. A idéia de que levas de paulistanos e moradores do Grande ABC trocariam de endereço já tirava o sono de prefeituras e ambientalistas preocupados com a sobrecarga de infra-estrutura e de serviços municipais. Apenas 23% dos entrevistados responderam que certamente ou provavelmente fixarão residência na Baixada. O percentual desaquece um pouco as expectativas de explosão imobiliária, mas o setor tem a favor o fato de 25% da população flutuante que já é proprietária de imóvel manifestar intenção de trocar de casa ou adquirir outra propriedade. Há outro dado que deve ser analisado com atenção: apenas 3% dos visitantes que frequentam Santos, Guarujá e Praia Grande costumam recorrer a hotéis e pousadas. 

Mesmo que seja necessário algum tempo para acomodar expectativas e realidade, a Baixada Santista já começa a colher os primeiros frutos da melhoria viária. Santos acaba de ser considerada a 10ª melhor cidade do Brasil para se fazer negócios no ranking anual da Revista Exame e da Simonsen & Associados, consultoria que atribui pontos preciosos ao fator logística quando realiza estudos para indicar cidades propícias à instalação de empresas. Além da localização, Santos também entrou para o pelotão de elite dos 10 mais, ao lado de Curitiba, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis, Belo Horizonte, Brasília, Campinas e São José dos Campos, porque tem metade das famílias nas classes A e B — renda variável entre 10 e mais de 25 salários mínimos — e foi classificada pela ONU como a primeira cidade de São Paulo e a terceira do País em qualidade de vida. 


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