Economia

Pequenos reagem
em bloco setorial

ANDRE MARCEL DE LIMA - 05/07/2003

O fortalecimento de micro e pequenas empresas por meio de mobilização setorial entrou para a ordem do dia em São Bernardo. Em iniciativa que envolve Acisbec (Associação Comercial e Industrial) e Sebrae (Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa), empreendedores de setores como confecção e alimentação são estimulados a deixar o velho isolamento para discutir e buscar soluções conjuntas. O associativismo de resultados é a plataforma do Projeto Empreender, que chega à região depois de aplicado em centenas de cidades brasileiras pelas mãos do Sebrae e da Confederação das Associações Comerciais do Brasil. 

Se por um lado a união dos pequenos negócios de um Município não toca nem superficialmente a origem do empobrecimento regional que, todos sabem, remonta à perda de riqueza industrial do setor metal-mecânico exposto às feras da globalização, por outro é positivo que uma associação comercial deixe de se preocupar exclusivamente com assuntos relacionados a crédito para voltar o foco à competitividade empresarial, mesmo que com visão limitada.     

Em São Bernardo dois núcleos setoriais foram consolidados desde que o Projeto Empreender foi lançado, em fins de 2002. Um com empresas de confecção e outro na área de alimentação, cada qual com quase 20 participantes. Além dos pioneiros, cujos resultados já começaram a aparecer, estão em formação outros três grupos nas áreas de oficinas mecânicas, autopeças e materiais de limpeza. "Também pretendemos envolver o setor moveleiro" -- comenta o consultor Marcos Fernandes Ribeiro.

A mecânica do Empreender é tão simples quanto eficiente. Em vez de contratar pesquisadores a peso de ouro para traçar diagnósticos setoriais, o projeto coloca empresários do mesmo segmento para trocar experiências sobre os obstáculos à frente de cada um. As chamadas reuniões de núcleo lembram um divã coletivo e são realizadas na sede da Acisbec. "O consultor é apenas um facilitador das discussões, já que ninguém conhece os desafios melhor do que quem está diretamente envolvido" -- explica Marcos Fernandes.


Central de compras -- Problemas em comum viram alvos de ações práticas concebidas em conjunto. No núcleo de alimentação, formado por pizzarias, casas de massa e restaurantes, foi constatado que o achatamento das margens de lucro estava asfixiando muitas empresas. "Numa economia estagnada, a impossibilidade de repassar aumentos de custos em dólar aos preços dos produtos emergiu como a principal queixa" -- afirma Carlos Gomes, proprietário do restaurante e pizzaria Império da Gula, em São Bernardo, e um dos principais articuladores do núcleo de alimentação. 

Os empreendedores decidiram criar uma central de compras para melhorar o resultado financeiro via redução de custos. As compras conjuntas proporcionam descontos de 10% em mussarela, 5% em carnes e 4% em embutidos. "Estamos em tratativas para comprar farinha direto do moinho e assim ganhar ainda mais" -- comenta Carlos Gomes. Ele explica que o pulo-do-gato da economia está na previsibilidade de vendas. O pré-volume mensal acertado com os fornecedores é de 1,5 tonelada de mussarela e uma tonelada entre carnes e embutidos. Embora as compras sejam realizadas em conjunto, a entrega é fracionada, feita em cada estabelecimento. Carlos Gomes comenta que o próximo passo é criar um selo que distinga empresas engajadas em programas de treinamento e qualidade.

Empresários do núcleo de confecção também colecionam ações integradas. Fizeram visita à Fenatec (Feira Nacional de Tecidos) e à Emip (Escola Municipal de Iniciação Profissional de São Bernardo) para fornecer diretrizes sobre as necessidades do setor em relação à formação de mão-de-obra. Também conheceram o projeto Beach Fashion, pelo qual 30 empresas da Baixada Santista exportam em consórcio para Europa e Estados Unidos. A maior contribuição conjunta no plano administrativo foi o aprimoramento do controle de custos com base na abertura das planilhas dos participantes.

Além proporcionar ações setoriais específicas, o Projeto Empreender aproxima os participantes do mix de serviços no portfólio do Sebrae. Empreendedores dos núcleos de confecção e autopeças assistiram a palestras sobre as implicações do novo Código Civil nos negócios e sobre taxas e impostos para micro e pequenas empresas, além de terem participado de curso de capacitação e empreendedorismo com carga de 16 horas. 

Os grupos de alimentação e confecção já passaram por mais de 15 reuniões semanais. Agora é a vez de empreendedores dos ramo de oficinas mecânicas e autopeças, que começaram a se reunir na Acisbec em meados de maio.  "Trata-se do embrião de dois novos núcleos que começarão a tomar forma quando cada um tiver no mínimo 12 participantes assíduos" -- planeja o consultor Marcos Fernandes. A formação dos núcleos não poderia ser mais democrática. O interesse em aprimorar o próprio negócio é a única moeda de troca, já que a participação é gratuita. "No começo enviamos convites às empresas com base no cadastro. Mas os próprios participantes trazem outros empreendedores para participar" -- comenta o consultor. 

As constatações que vieram à tona na primeira reunião de oficinas mecânicas e autopeças sinalizam que há muito por se fazer. Proprietário da oficina Quatro Rodas, instalada há 25 anos no Bairro Assunção, Cláudio Castilho lembrou que a união das empresas pode ajudar a equilibrar o relacionamento com montadoras e grandes fornecedoras de peças. "Um dos maiores desafios é acompanhar a vertiginosa evolução tecnológica dos automóveis. As montadoras favorecem as concessionárias e não democratizam informações relacionadas a orientação técnica, equipamentos e ferramental" -- observa. Com ele concorda Antônio José Lino, proprietário de uma pequena oficina no Jardim Cláudia. "Podemos nos reunir para que os fornecedores venham dar curso sobre as peças que vendem" -- sugere.

Já o núcleo de empresas de material de limpeza, com 14 participantes, pretende seguir a trilha da economia de custos por meio de compras conjuntas.

Consórcio de autopeças -- O setor regional de autopeças também está em evidência pela recente oficialização do consórcio de exportação articulado pela Agência de Desenvolvimento do Grande ABC e que envolve uma dezena de empresas como Galutti, de Mauá, e A.Pedro, de São Caetano. Para decolar para valer, porém, o apoio da Apex (Agência de Promoção às Exportações) ajuda, mas não basta. É preciso que entidades e empresas envolvidas também empenhem contrapartidas financeiras previstas no projeto.


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