Economia

Dois lados da
mesma moeda

VERA GUAZZELLI - 05/11/2003

O festejado anúncio de que Mauá captou R$ 50 milhões nos últimos sete meses para instalação e ampliação de indústrias é notícia alentadora mas incompleta. O importante papel prospectivo da Prefeitura no redirecionamento da vocação industrial da cidade ameniza as perdas econômicas, mas ainda é insuficiente para reverter o quadro de desindustrialização que se arrasta há mais de duas décadas no Grande ABC. Apesar da chegada de 70 novas empresas desde 1997, Mauá registra queda de 20,1% no Valor Adicionado (transformação de riqueza) entre janeiro de 1996 e dezembro de 2002. 

Os índices revelados pelo principal indicador de riqueza industrial de um município remetem aos dois lados da moeda. Mauá foi a cidade da região que menos perdeu Valor Adicionado e o interesse pelo Pólo de Sertãozinho -- principal reserva local de áreas industriais -- cresce a olhos vistos. As estatísticas da Prefeitura, entretanto, ainda não conseguiram identificar as razões da diminuição da atividade produtiva. Uma das causas é óbvia e está relacionada ao cenário recessivo econômico que patrocina a ociosidade nas linhas de produção. A outra está ligada a empresas que fecharam ou deixaram a cidade.

"Ainda não temos uma medição mais apurada, mas queremos qualificar as informações porque é importante trabalhar com cenário cada vez mais realista" -- entende o secretário de Desenvolvimento Econômico, Paulo Sérgio Suares. Por enquanto, a Prefeitura só tem dados para traçar diagnóstico quantitativo da atividade industrial. Eram 550 indústrias em 1996, contra 746 até setembro de 2003. Os números, no entanto, levam em conta apenas registros de abertura e fechamento de empresas, sem traçar perfil da dimensão dos negócios.

De concreto, a Prefeitura detectou que os R$ 50 milhões em investimentos referem-se a 14 instalações e quatro ampliações, a maioria no Pólo do Sertãozinho. O montante também é responsável pela criação de 500 empregos diretos, número que ajudou o Município a manter o melhor desempenho da região na criação de postos de trabalho formais. Dados do Caged (Cadastro Geral de Emprego e Desemprego) do Ministério do Trabalho aponta crescimento de 9,2% de vagas na cidade entre janeiro de 2002 e junho de 2003. Do total de 3.117 postos registrados no Município, 1.187 vieram da indústria de transformação. Mas o índice não significa que a taxa de desemprego decresceu porque leva em conta apenas a movimentação dos postos de trabalho, sem estabelecer qualquer relação entre as vagas e a PEA (População Economicamente Ativa). Também não houve melhoria na renda, já que o potencial de consumo da cidade, segundo a Target Marketing, despencou 24,1% nos últimos sete anos. 

Se o reflexo das novas atividades é quase imediato nos registros do Ministério do Trabalho, os resultados produtivos demoram dois anos para chegar aos cofres públicos em função do cronograma de repasse de ICMS. Por isso, o secretário Paulo Suares nutre a expectativa de que a arrecadação volte a subir. Histórico recente aponta aumento médio de 7% deflacionados no repasse do ICMS de 2000 para 2001 e de 2001 para 2002. Os dois períodos foram os melhores dos últimos sete anos e refletem o boom registrado em 1998 e 1999, época em que 40 empresas instalaram-se no Pólo de Sertãozinho e foram anunciados grandes investimentos no Pólo Petroquímico de Capuava, preponderantemente na Refinaria de Capuava da Petrobras e na Polibrasil. Mas, mesmo assim, houve queda na produção industrial, medida pelo Valor Adicionado.

A exemplo do que ocorreu em anos anteriores, as empresas que chegaram a Mauá em 2003 seguem a tendência de migração interna. A maioria estava em outras cidades da região ou mesmo em bairros não industriais de Mauá. A moveleira Squadroni vai transferir-se de São Caetano para Sertãozinho, a Sandré, do ramo de alumínio, já estava em Mauá e a transformadora de plásticos Ingeplastec deixou a Vila Califórnia, em São Paulo, há três meses. Nenhuma recebeu incentivo fiscal e praticamente todas foram atraídas pelo preço mais barato dos terrenos e pelo zoneamento industrial que permite fracionar lotes a partir de 500 metros quadrados. O Pólo de Sertãozinho dispõe de cinco milhões de metros quadrados de área a um custo médio de R$ 65 o metro quadrado.

"Preço da terra e zoneamento contam muito no momento da escolha" -- acredita o secretário de Desenvolvimento Econômico, Paulo Suares. O executivo público reforça a importância de o Município ter aprovado legislação de uso do solo que permite às empresas adquirir áreas compatíveis com as necessidades de produção, e agrega à política pública as vantagens logísticas do local. Se tudo correr dentro do programado, Sertãozinho estará a meio caminho dos futuros trecho sul do Rodoanel que leva ao Porto de Santos e da ligação Jacu-Pêssego que conduz ao Aeroporto de Cumbica. A última informação oficial dá conta de que as obras da alça sul do Rodoanel e que terá Mauá como um dos acessos serão iniciadas em outubro de 2004. 


Obras continuam -- Enquanto espera que o governo do Estado cumpra prazos para grandes obras de infra-estrutura que colocariam de vez a cidade no mapa industrial da Região Metropolitana, Mauá decidiu fazer intervenções no sistema viário local para desafogar o trânsito na área central. As obras de rebaixamento da Avenida Capitão João -- principal via de ligação com Santo André e Ribeirão Pires -- foram iniciadas em meados de outubro e devem estar concluídas em oito meses.  

A modificação está orçada em R$ 1,8 milhão, valor que será rateado com a iniciativa privada em modelo de parceria ainda em formatação e que já despertou interesse das concessionárias de transporte público do Município. A Prefeitura pretende ainda iniciar a construção do ginásio de esportes em área contígua ao Paço Municipal, além de quatro campos distritais. As obras foram mantidas no cronograma de 2004, apesar da constante ameaça de sequestro de receita para pagamento de precatórios. Recentemente a Prefeitura teve de desembolsar R$ 20 milhões para pagar dois credores e convive com o fantasma de dever outros R$ 200 milhões que podem ser cobrados a qualquer momento. A previsão orçamentária para 2004 é de R$ 305 milhões.


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