Anotem e me cobrem no futuro o real significado da construção inapelável e inadiável para não dizer indispensável do trecho de monotrilho da Linha 18-Bronze, que colocará três municípios do Grande ABC na cara do gol do sistema metroviário da Capital: teremos a atividade sobretudo trabalhista de muita gente potencializada, como o é para os usuários do trólebus e da chamada linha ferroviária, mas o preço econômico regional será tão salgado quando o traçado do Rodoanel Sul, que liga alguns municípios da região ao Porto de Santos, à Capital e ao Interior.
O que quero dizer com isso é que se trata de patacoada desenvolvimentista o que foi longamente apregoado por um jornalismo propagandístico. O traçado do monotrilho vendido como metrô não tem ínfima correspondência com as previsões apregoadas.
Venderam à sociedade incauta, quanto não servil, o céu do desenvolvimento econômico na esteira do metrô que é monotrilho. Só esqueceram de combinar com os russos da sensatez e da racionalidade geoeconômica. Não somos uma ilha autossustentável. Bem distante disso: somos quase um acampamento quando a referência é a vizinha Capital do Estado, nossa parceira e nosso algoz econômico, social e cultural.
Gataborralheirismo
Para quem tem dúvida sobre essa conclusão, basta uma leitura atenta de “Complexo de Gata Borralheira”, que lancei em 2002, e cujos capítulos estão disponíveis neste site.
Um estudo não muito aprofundado, mas suficientemente emblemático dos estragos econômicos que impactarão do Grande ABC do monotrilho que dizem ser metrô foi divulgado há alguns anos pela Universidade Metodista de São Bernardo. Ali estava sacramentada a síntese de um debate desnecessário: o traçado do monotrilho vai levar mais gente a trabalhar e a consumir em São Paulo do que o inverso. Muito mais gente, para ser preciso.
Basta verificar mesmo sem qualquer acuidade empírica, porque desnecessária, a fluidez do trânsito em direção à Capital quando a jornada de trabalho se inicia e o completamente reverso ao fim de cada dia.
A força de atratividade da Capital economicamente exuberante em relação a esta Província não deixa dúvida de que o monotrilho será mais um polo de evasão e de riqueza de moradores da região, como se não fossem suficientes os quase 30% da População Economicamente Ativa que já se deslocam diariamente às terras paulistanas.
Atratividade desigual
Exibir dados econômicos que separam uma Província de uma Capital, uma Gata Borralheira de uma Cinderela, é desnecessário também. Exceto num texto específico que não estou com vontade alguma de produzir. Até porque, nesse momento, dispensável.
Mas como sempre existe quem queira um exemplo prático, eis que tenho um na ponta da língua, ou nas pontas dos dedos que toca no teclado à minha frente como se pianista fosse: o mercado imobiliário do Grande ABC de quase três milhões de habitantes representa apenas 10% do mercado imobiliário de São Paulo, que conta com 11 milhões de habitantes. Os dados estão ao alcance de quem tem um mínimo de curiosidade e discernimento.
A força de atração de investimentos e de consumidores exercida pela Capital é fator desequilibrante para os vizinhos metropolitanos. Nesse ponto, quanto mais facilidades de mobilidade urbana para chegar à Capital, melhor para a Capital. Quantos não deixarão de gastar no corredor popular da Rua Marechal Deodoro em São Bernardo ou do Calçadão da Coronel Oliveira Lima em Santo André (menos neste caso porque distante do monotrilho que virá) para frequentar a 25 de Março e o entorno, em São Paulo?
Goleada ainda maior
Ora bolas, se há tanta disparidade assim entre o cinderelesco e o gataborralheiresco numa atividade que permeia a sociedade de cabo a rabo, o que esperar de outros indicadores? Vai aumentar a goleada que sofremos historicamente. Seguiremos engolidos pela Capital. O monotrilho será mais um fator de desencaixe do desenvolvimento econômico. Diferentemente, portanto, do que andam apregoando os construtores de ilusões.
Aliás, foi o mesmo festival de besteiras que assol0u o Grande ABC quando do anúncio do trecho sul do Rodoanel. Cansei de ler bobagens que colocavam a região num patamar de grandes conquistas. A desindustrialização ainda negada seria definitivamente um fenômeno sufocado porque o território regional viraria um oásis com desembarque de grandes investimentos.
Venderam os céus, como se sabe. O que tivemos, como mostrei ao longo dos anos com dados oficiais ao acompanhar o movimento das pedras da região em relação à chamada Grande Osasco, foi um estrondo que abriu ainda mais crateras no PIB Industrial Regional, com subsequentes efeitos sociais.
Logística estrangulada
O monotrilho chamado de metrô, repito, é essencial à mobilidade urbana de uma região encalacrada em termos logísticos porque a Avenida dos Estados virou um trambolho, a Anchieta se tornou uma Avenida e a Imigrantes prioriza mais a passagem do que a interação. Mas, por mais eficiente que seja, o monotrilho que virou metrô não atenuará nossas dores de mobilidade geradoras de deseconomias de escala.
O peso relativo da obra será bastante restrito, porque vai se exaurir praticamente no campo da mobilidade em direção ao paraíso da Capital.
O monotrilho chamado de metrô não compensará de forma alguma a fuga de cérebros, de braços e de consumidores em direção à Capital. Tanto é verdade que as entupidas vias que nos conectam à Capital desde metade dos ano 1950 determinaram esse escravagismo econômico.
Século de infortúnios
Os vendedores de ilusão são repetitivos porque não estão na praça circunstancialmente por conta dos benefícios populares do monotrilho chamado de metrô. São agentes permanentes de enrolação associada à promoção de um triunfalismo que não se sustenta.
Os números deste século provam. Os municípios do Grande ABC praticamente ficaram congelados no PIB Geral, com queda expressiva no PIB Industrial, enquanto outros municípios que compõem o G-22 (o grupo dos 20 maiores municípios do Estado de São Paulo, acrescido de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra e sem a Capital) atingiram resultados relativamente expressivos para um País cujo futuro morre no lamaçal dos corruptos.
Comemorar a prometida chegada do monotrilho também chamado de metrô é o mínimo para quem quer ver, sobretudo a população dominante de classe média baixa a ganhar algum tempo a mais de conforto e rapidez (mesmo que o conforto não seja de metrô de verdade). O outro lado da moeda de esvaziamento econômico, irresponsavelmente omitido, quando não enganosamente subvertido, tem peso considerável.
A classe política sempre oportunista tem motivos para levar o povo no bico, como a levou no caso do trecho sul do Rodoanel. Bem diferente dos políticos da região de Osasco, por exemplo, contemplados com um traçado do Rodoanel previamente cantado em prosa e verso como redentor à economia local por motivos que já cansei de esmiuçar.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?