Chegamos à penúltima edição da newsletter OmbudsmanDiário. Era 15 de julho de 2004. Estava expirando a primeira experiência na história do Diário do Grande ABC. Que se repetiria uma década depois, de novo com este jornalista. Naquela oportunidade, a função que exerci foi temporária, porque fora contratado de fato para atuar como diretor de Redação. Função que passei a exercer logo em seguida. Aliás, deveria assumir numa segunda-feira, 19 de julho. Adiei por três dias. Perdera meu pai numa tarde de domingo, 18 de julho, sem futebol. Ou seja: três dias depois do texto que se segue. O Diário do Grande ABC resistia bravamente à desindustrialização empobrecedora. Veja a edição número 35. E aguarde a última daquela safra.
Edição número 35
Vamos em frente com mais uma edição desta newsletter que, necessariamente, não vai dar conta de tudo o que está nos jornais de hoje, especificamente do Diário do Grande ABC. Mas há condimentos suficientes para se compreender que não deixamos a peteca cair.
O volume do noticiário de política local, mais precisamente sobre as próximas eleições, está muito aquém da importância do que o calendário eleitoral nos reserva. Creio que parte da explicação esteja na dificuldade de compatibilizar demanda informativa e quadro de profissionais da redação, em permanente descompasso. Não tenho dúvidas em dizer mais uma vez que o banco de horas é mais que uma pedra no sapato da estrutura da redação -- é autêntica metralhadora a atingir simultâneos alvos e a subverter princípios elementares de produtividade e qualidade.
Primeira página
A chamada de primeira página "STF acata liminar e liberta Sérgio Gomes" mantém o viés discricionário do jornal manifestado ao longo desse caso. Ao mencionar que o empresário é acusado pelo Ministério Público de ser um dos mandantes do sequestro e assassinato do prefeito Celso Daniel, o jornal relata apenas uma face da informação correta. Aliás, uma face obscura, já que omite, novamente, que tanto a Polícia Civil quanto a Polícia Federal promoveram inquéritos e concluíram que o caso Celso Daniel foi um acontecimento ocasional. Como temos registrado seguidamente preocupação com a multilateralidade da informação, o mínimo que posso concluir sobre o assunto é que existe deliberado interesse em mascarar a verdade.
Se o jornal comprou a tese de assassinato encomendado -- como consta de várias matérias em meus arquivos -- depois de, quando do acontecimento, assim como todos os demais veículos, incluir o caso na lógica de uma Região Metropolitana infestada de sequestradores (escrevo a respeito no Capital Social Online de hoje), o mínimo que posso afirmar é que está na hora de curar-se dessa esquizofrenia. E que se informe corretamente os leitores.
Caso Celso Daniel (I)
Está correta a matéria da página interna "Jobim manda libertar Sérgio Gomes". Talvez o título mais adequado fosse "Tribunal" ou "STF" em vez de "Jobim". A ressalva sobre a configuração da prisão de Sérgio Gomes da Silva é menos intensa porque o texto faz referência aos inquéritos policiais. Mesmo sem dar tratamento isonômico em relação à denúncia do Ministério Público.
Celso Daniel (II)
Nem Estadão nem Folha de S. Paulo deram tanto destaque ao outro lado da libertação de Sérgio Gomes da Silva como o Diário do Grande ABC. O outro lado no caso é um texto auxiliar, com destaque, para o pronunciamento do promotor Wider Filho. O Diário tem propensão impressionante de transformar figurantes circunstanciais em co-protagonistas, principalmente quando se trata dos titulares do Gaerco em Santo André. Essa retranca (texto auxiliar) poderia ser mais adequadamente redigida se alçasse para a abertura tanto o depoimento do promotor quanto a interpretação do advogado de Sérgio Gomes. Relegada ao pé da página, a declaração de Podval sofre os efeitos da minimização.
Trânsito em Diadema
Oportuna a matéria "Alça ligará Av. Papaiz ao Km 16 da via Imigrantes", de Setecidades. Creio que a pauta decorreu de um trecho da matéria de ontem que acompanhou um comício do prefeito José de Filippi Júnior. Uma prova provada de que é preciso estar mesmo atento ao que se fala nos palanques. Saem muitas bobagens, muitas idiossincrasias, mas também emergem informações preciosas. O que se lamenta é que tenham demorado tanto para fazer obra tão essencial à logística do Município. Sinal de que as lideranças empresariais são mesmo devagar-quase-parando e que a administração municipal petista está acordando, depois de priorizar o social durante mais de duas décadas.
Eleições municipais (I)
Não creio -- aliás, tenho informações em contrário -- que o monopólio de visitar grupos de famílias pertença ao candidato José Auricchio, em São Caetano, como pretende fazer crer a matéria "Auricchio prioriza visita a famílias". Essa é antiga tradição que envolve políticos iniciantes ou experientes. O corpo-a-corpo familiar é algo disseminadíssimo, por exemplo, em Diadema. A impressão que a matéria transmite é de que os demais concorrentes ao Paço Municipal não têm preocupação com as famílias do Município. Inclusive -- ou principalmente -- porque não foram ouvidos pela reportagem.
Eleições municipais (II)
"Moacyr Franco rouba a cena de Vicentinho em São Bernardo", também de Política Grande ABC, poderia ter sido mais interessante ainda se acoplasse na abertura (e também no título) informação que está no terceiro parágrafo: "(...) a estratégia de trazer o popular artista pode render bons resultados para o petista. A começar pelas fotos tiradas com a população e que serão entregues gratuitamente, no máximo, daqui 15 dias".
Ora, até prova em contrário, temos uma inovação em matéria de sensibilizar o eleitorado, porque além dos efeitos imediatos dos cumprimentos físicos, o candidato petista absorverá os ganhos da memória de cada flagrante, já que, como afirma a matéria, "um carro de som irá passar pelas ruas para avisar o dia da entrega (das fotos), que será aqui mesmo na feira", segundo afirmou Vicentinho. Mesmo que apareça na foto como papagaio de pirata, como sugere corretamente o Diário, Vicentinho será beneficiado pelo "efeito fotografia". Quem será que orientou essa tática?
Caberia um título na linha do "Vicentinho posa ao lado de Moacyr Franco e garante foto da lembrança a eleitorado".
Eleições municipais (IV)
Aliás, outra sugestão: para que o jornal não caia na vala comum de descrever até outubro a mesmice dos comícios, que tal iniciar uma blitz para detectar a quais modelos os concorrentes às prefeituras da região recorrem para conquistar o eleitorado? O que há de inovação em marketing na campanha que já está nas ruas? É uma matéria para ser feita com vagar, sem sacrificar o dia-a-dia.
Universidade pública
A situação das universidades públicas estaduais não é diferente do padrão em que se encontram as universidades públicas federais. A Folha de S. Paulo mostra hoje que o governador Geraldo Alckmin não está cedendo às pressões. Seria interessante que o profissional incumbido de cobrir a Universidade Federal do Grande ABC não perdesse de vista essas informações.
Bailarino de papel
Está numa das páginas de hoje de Cultura & Lazer breve perfil do bailarino de Santo André que faz sucesso nos Estados Unidos. Matei a curiosidade de conhecer melhor o filho do Ruslan.
Paranapiacaba
O Festival de Inverno de Paranapiacaba chegou ao ano que vem, com a perspectiva de novidades. Muito bom.
Febre de emprego
A Folha de S. Paulo empacotou todos os novos indicadores de emprego divulgados por diferentes fontes. Transformou o que os demais jornais deram de forma dispersa em um único produto informativo, sob o título "Dados mostram recuperação do emprego". Esse é um exemplo que não podemos perder de vista. Não é a primeira vez, aliás, que a Folha sai do lugar-comum da falta de sistematização de dados. Jornais que racionalizam espaço e qualidade informativa não podem abrir mão de, em situações análogas, adotarem essa prática.
Campeonato Brasileiro (I)
O enfoque do noticiário do Santo André ("Santo André vira hospital para o jogo com o Vila Nova") é modelo de cobertura diária de equipes de futebol que rompe com a mesmice. A apresentação do jogo de amanhã contra o Vila Nova deveria, acredito, ser focada nas consequências técnicas e táticas de tantos problemas de ordem física. O que tudo isso vai mexer na estrutura da equipe? E quais os efeitos de tantos problemas?
Campeonato Brasileiro (II)
Está imprecisa a projeção de pontos necessários para o Santo André livrar-se do rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro citada em "Ramalhão seria oitavo com os 12 pontos": não é necessário 40% de aproveitamento e sim 34%, levando-se em conta a classificação atual que coloca a linha de corte do 19º colocado com 12 pontos ganhos em 36 pontos (33,3333%). Pode parecer irrelevante, mas 40% dos pontos sugeridos significa que o Santo André precisará somar 28 pontos (ou mais 21 em relação à pontuação atual), enquanto que 34% significam apenas 24 pontos. Como se trata de uma linha de corte móvel, por causa do balanço do navio de pontos de todos os concorrentes, acredito que o leitor deveria ser informado sobre essas nuances.
Aliás, seria interessante ouvir o técnico Péricles Chamusca para saber com que pontuação mínima ele trabalha de forma a retirar o clube da zona do rebaixamento. É uma matéria interessantíssima.
Campeonato Brasileiro (III)
A cobertura do São Caetano de hoje não apresenta nada que possa retirar os enunciados do lugar-comum e de um noticiário próprio de programas de rádio. Ainda espero pelo esquadrinhamento da crise de resultados da equipe.
Do leitor (I)
De Nilton Pugliesi: "Ombudsman: palavra sueca que significa representante do povo. Na imprensa, o termo é utilizado para designar o representante dos leitores dentro de um jornal. O ombudsman é um profissional dedicado a receber, investigar, encaminhar as críticas dos leitores e realizar a crítica interna do jornal (Folha de São Paulo, set. 1986). Antes que o Sr. pense que se trata de algum louco ou alguém do meio jornalístico pretensiosamente querendo aparecer, deixe-me explicar o motivo deste contato.
No último domingo, na coluna do jornalista Ademir Medici, tive o privilégio de contribuir com o artigo referente ao primeiro elenco de profissionais do hoje E.C. Santo André. Além da profunda emoção que a matéria proporcionou a mim e a meus familiares, não tenho a menor capacidade técnica de avaliá-la como um ombudsman. Como o seu cargo recebe e interpreta a satisfação dos leitores, você poderia me considerar muito suspeito, uma vez que fiz parte do artigo.
Caro Daniel, desculpe o prolongamento do assunto. Na verdade o que quero? Registrar o tratamento atencioso, educado e cordial que recebi dos inesquecíveis Carlos Serrão e Ademir Medici. Não encontrei na definição do cargo de ombudsman (acima) a palavra elogiar. Caso o elogio não faça parte de suas atribuições -- o que acho pouco provável -- por favor, abra uma exceção e faça-o por mim a todos que integram o nosso querido Diário. Não é por acaso que ele é um dos mais importantes jornais do Brasil. Muito obrigado.
Do leitor (II)
De Walter Perin: "Senhores, esta é a terceira vez que envio um e-mail para a seção "Setecidades" (e não tenho resposta), com a seguinte mensagem: "Gostaria de saber se o jornalista Ademir Medici, responsável pela coluna Memória, tem um canal direto (e-mail) de comunicação. Meu interesse específico é sobre a história de São Caetano. Agradeço um pronunciamento, ou do Diário ou do jornalista".
Do leitor (III)
De Edélcio Cândido: "Daniel Lima, bom dia/boa tarde:
Se o Diário está em fase de ênfase ao noticiário regional, o que é ótimo, não entendi por que nesta edição do dia 14/7, na primeira página, aparecem fotos dos jogos do Santos e Corinthians. Nada contra os dois times de massa, obviamente, mas na mesma noite jogaram São Caetano e São Paulo (0-0) no Campanella. Você não acha que deveria ter uma foto do Azulão? Afinal, a equipe está em 14º lugar na tabela, à frente de muitos grandes. É apenas um detalhe sob a minha ótica.
Em tempo: enviei para o Ximenes, Evenson e Osawa há alguns dias um projeto (Raízes do Futebol) de elaborar uma página semanal no caderno de Esportes enfocando os campeonatos e copas dos campeonatos amadores do Grande ABC. Não sai nada do amadorismo no dia-a-dia. Seria página semelhante ao que faz o Rigotti na Pesca. Será que não tem mais futebolistas na região do que pescador?
Você sabe. São sete ligas, cerca de 800 times filiados no total, além dos campeonatos envolvendo indústrias. É para pensar. Se puder lembrar de tal projeto a eles, conto com sua força que sempre é de peso".
Da redação
De Ana Lúcia Moraes: "Daniel, eu sempre me perguntava se você não lia o Dia-a-Dia, porque nunca havia lido um comentário seu a respeito. Pensei até que você não gostasse do caderno... Mas gostei de saber que acha a leitura do mesmo agradável. Concordo com você que o tratamento dado à foto do bumbum tenha ficado pouco claro, mas tivemos de dar esse acabamento para não ficar muito explícito. Ah! Trabalho com a Rosângela, que está de férias. Um abraço".
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)