Economia

PREFEITOS SABEM QUE
ESTÃO NUM TITANIC?

DANIEL LIMA - 27/11/2024

Vamos trocar de guarda no Poder Executivo do Grande ABC pela sétima vez neste século. Novo conjunto de sete prefeitos foi eleito para dirigir o bicho de sete cabeças resultante do esquartejamento territorial e administrativo da região em meados do século passado. As perspectivas que essa troca de guardas enseja são preocupantes. O marketing infesta as redes sociais em dissonância com o ambiente de profunda preocupação social.  O PIB Geral Municipal e o  PIB Regional têm sofrido uma barbaridade. Sem que vozes se levantem. Vamos dar números estatísticos aos bois do desleixo irrestrito.

Tenho anotado declarações dos novos prefeitos e dos dois prefeitos eleitos. Estou abismado. Eles, na maioria dos casos, não traduzem em palavras e ações a realidade tanto presente quanto histórica  de que vão embarcar num Titanic. Estão em lua-de-mel com as vitorias alcançadas. Perderam o senso de dramaticidade que o quadro econômico e social enseja.

O advento de tecnologias portáteis e de redes sociais os tornam pretensas estrelas municipais e até regionais, embora tenham sido consagrados por apenas um terço dos eleitorais habilitados. Abundam aparições espetaculares com o suporte de entrevistas encomendadas.

TUDO É FESTA

Acho que os prefeitos que tomam posse em janeiro deveriam participar de um curso rápido para entenderem o que vão dirigir. Mas que não contratem ilusionistas nem charlatões, ou seja marqueteiros que dominam paços municipais. O doutorado está em Santo André, claro.

Pior que estar num Titanic econômico e social comprovadamente Titanic é saber que estão mesmo num Titanic econômico e social mas desprezam o painel de controles de dados e estatísticas que não só os deveriam alertar como os obrigariam a ser diferentes dos antecessores de agora e de antes de agora.

Não é o que transparece nas intervenções preliminares dos prefeitos que se tornarão prefeitos efetivos a partir de janeiro. E tampouco, sempre é bom lembrar, dos prefeitos que são prefeitos e que continuarão sendo prefeitos por mais quatro anos, casos de Marcelo de Oliveira em Mauá e Guto Volpi em Ribeirão Pires.

Vamos fazer breve recapitulação do que cada Município do Grande ABC fez neste século em termos econômicos? Que tal pegar o PIB Geral de 1999 como plataforma de embarque e comparar com  PIB Geral de 2021, o mais atualizado do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)?

PREFEITO APÓS PREFEITO

Pegar o PIB Geral pelo chifre de uma curadoria rigorosa é um bom começo à alfabetização econômica de prefeitos que eventualmente, ou certamente, não se deram conta do que se passa com cada pedaço territorial da região.

E insisto na afirmação: se os prefeitos eleitos ou reeleitos em outubro soubessem o que se passa com o navegar do Titanic, eles não estariam aqui e ali desfilando afirmações, promessas e tudo o mais. Estariam correndo feito loucos atrás de gente que entende do riscado econômico. Fariam do fator competitividade econômica regional o mantra de todos os minutos.

Vamos começar com o prefeito eleito em Santo André,  Gilvan Júnior, que, segundo a assessoria de imprensa da mídia dita profissional vai viajar à China. Vou deixar esse assunto para outra edição, porque comporta muito mais que alguns parágrafos. O que Gilvan Júnior, prefeito eleito que usurpou a autoria do Poupatempo da Saúde de Aidan Ravin,  sabe sobre as razões de o  PIB de Santo André desastre?

Vou ser breve. Neste século, entre 2000 e 2021, Santo André viu a participação relativa do PIB Geral ter caído 31,43% ante a média estadual? A participação relativa no Estado de São Paulo foi rebaixada de 1,75% para 0,83% no período.

A queda de São Bernardo foi semelhante no mesmo contexto temporal: queda de 30,52% na participação relativa estadual, passando de 3,08% para 2,14%.

MAIS PREFEITOS

São Caetano teve desempenho um pouco pior ainda entre 2000 e 2021: a participação relativa no PIB Geral no Estado de São Paulo caiu 35,37%, de 0,885% para 0,572%.

Diadema conseguiu superar o trio mais tradicional da economia regional com perda relativa no mesmo período de 39,29%. Contava com 1,12% do bolo estadual de PIB Geral e caiu para 0,680%.

Mauá, mesmo com suporte enganoso do Polo Petroquímico, que concentra produção e não gera empregos formais industriais de monta, caiu no período apenas 8,40% em participação no PIB Geral estadual. Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que não chegam a 3% do PIB do Grande ABC, também foram mal nos confrontos com o desempenho médio do Estado de São Paulo. Ribeirão Pires caiu de 0,090% para 0,014% e Rio Grande da Serra ficou com residuais 0,002%.

CAINDO PELAS TABELAS

No conjunto da obra das sete prefeituras, do bicho de sete cabeças, o Grande ABC dos primeiros 22 anos deste século sofreu perda relativa média de 33,25% no PIB Geral do Estado de São Paulo. Caímos de 8,30% para 5,54%. Não vou puxar o gatilho comparativo esticando um pouco mais a distância entre o que tivemos em 2021 e o que tivemos em 1990, por exemplo, porque desistiria desta análise e passaria a chorar. Titanic, portanto, não é uma forçada de barra jornalística.

Em qualquer confronto interespacial, o Grande ABC se dá muito mal neste século. Não vou traduzir neste texto os números do PIB Geral do Grande ABC e dos municípios do Grande ABC em termos quantitativos puramente locais, ou seja, comparando os sete municípios com os mesmos sete municípios. Essa é uma contabilidade fajuta quando se pretende observar atentamente os motores que conduzem o Titanic. E mesmo assim vamos muito mal.

Comparar o Grande ABC desses 22 anos com o mesmo Grande ABC é cegueira estatística. Os números relativos ditam com precisão a diferença entre determinados territórios.

Por exemplo? Quando se pegam os dados do Grande ABC entre a base de 1999 e a linha de chegada de 2021 tendo o Grande Oeste e o Grande Norte da Região Metropolitana de São Paulo, nossos vizinhos, portanto, a situação é para lá de ruim. 

COMENDO POEIRA

Os 18 municípios que formam os dois territórios rivais da região (Barueri e Osasco à frente de um conglomerado de municípios à Oeste e Guarulhos à frente dos municípios à Norte) avançaram 18,92% em participação relativa no PIB Geral diante do Grande ABC. A participação relativa da região nesse conglomerado de 25 municípios (os sete do Grande ABC, os sete do Grande Oeste e os 11 do Grande Norte) era de 38,91% do PIB Geral em 1999 (R$ 28.239.480 bilhões ante R$ 72.579.313 bilhões) na largada estatística. E passou para 31,55% na chegada, em 2021 (R$ 150.576.376 bilhões do Grande ABC ante 477.248.687 bilhões em 2021.

Se o leitor entendeu o riscado e considera que a situação do Grande ABC no interior da Região Metropolitana de São Paulo é mesmo inquietante, como o é, a comparação com a média estadual, como está registrada, de queda relativa de 33,25%, expõe ainda mais as vísceras da baixa competitividade econômica que nos atinge.

Prefeito eleito ou prefeito reeleito que não traduzir tudo isso em fonte de permanente preocupação é prefeito desleixado, é prefeito sem alma, é prefeito sem conexão com a sociedade.

MUITOS OBSTÁCULOS

Os prefeitos desse Titanic têm obrigação moral diante da população do Grande ABC de tornarem as relações com essa mesma sociedade permanente estado de comprometimento. Nada que se confunda com desespero, com desanimo, como alguns urubus poderiam interpretar. Precisamos de um choque emocional no campo político para que se desencadeiam princípios básicos de restruturação orgânica.

Precisamos conter a rota do Titanic com metodologia pautada por transformações que já ultrapassaram o limite da demora. Não se deve vender ilusão à sociedade. A literatura social e econômica é radicalmente contrária a fetiches e lantejoulas  num ambiente de destruição continuada da qualidade de vida em várias dimensões.

Tudo bem (ou tudo mal) que as atenções da sociedade supostamente mais engajada em questões básicas de cidadania estejam voltadas ao ambiente nacional. Tudo bem que há dispersão do foco municipal e regional. Tudo bem que há muitas torcidas organizadas a garantir aplausos nas redes sociais. Tudo bem que a maioria da mídia se tornou assessoria de imprensa. Tudo bem, senhores prefeitos.

Mas o tudo bem que vem de longe e é incrementado por tudo isso, não passa de fato de tudo mal. Para não escrever alguma expressão menos diplomática. Os senhores têm de entender que há dois destinos adiante: a mediocridade da maioria dos antecessores, incapazes de enxergar o óbvio, ou a perenidade como referencias a novas turmas de prefeitos que virão.



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