Deu outro dia no jornal ABC Repórter que uma pesquisa realizada por instituição de respeito apontou que 68,2% dos moradores do Grande ABC não se sentem seguros. Os pesquisadores do Inpes/USCS (Instituto de Pesquisas da Universidade de São Caetano do Sul) foram a campo e entrevistaram 1067 pessoas nas sete cidades. Seguiu-se todo o ritual recomendado pelo cientificismo da operação. O resultado poderia ser traduzido como enorme ponto de interrogação. Afinal, por que se teme tanto pela segurança pessoal e patrimonial numa região que nos últimos 15 anos baixou o índice de homicídios de perto de 1,4 mil casos por ano para menos de 400?
Sim, durante a segunda metade da última década do século passado (faltam números da primeira metade, mas é provável que não sejam diferentes) o que tivemos no Grande ABC foram verdadeiras carnificinas. A desindustrialização combinada com o despreparo tecnológico e de pessoal dos organismos de Segurança Pública do governo do Estado elevou às alturas da insanidade os números de homicídios na região. Viramos uma Baixada Fluminense.
Escreveu George Garcia, do ABC Repórter, que o estudo revelou ainda que entre os entrevistados, 14% disseram ter sido vítimas de roubo ou furto no período de um ano que antecedeu a pesquisa. O índice é pouco diferente do apurado na pesquisa de agosto do ano passado, ainda segundo o jornal, quando 14,9% dos entrevistados sofreram com roubos ou furtos.
Não faltam tentativas de explicações para a insegurança da população. Tanto que Leandro Campi Prearo, coordenador da pesquisa, disse: “De uma forma geral o sentimento é de insegurança. A opinião pode ser influenciada pelas notícias sobre a violência, mas também por fatos reais que aconteceram com vizinhos ou parentes”.
Particularizar os dramas da segurança pública ao território do Grande ABC seria exagero. Integrada à Região Metropolitana de São Paulo, essa área sofre as consequências dos próprios erros e também do ambiente concorrencial de 20 milhões de moradores, população que é o dobro do Estado do Rio Grande do Sul ou que equivale aos mais de 800 municípios mineiros.
Como é possível compreender o encaixotamento da tranquilidade social numa situação econômica das mais confortáveis no País nas últimas décadas, de emprego farto e de renda em ascensão?
Não faltarão justificativas dos responsáveis pela Segurança Pública, tampouco incursões de acadêmicos. E todos provavelmente terão razões de sobra, o que, paradoxalmente, elevam os níveis de dúvidas.
A mesma pesquisa desenvolvida num ambiente macroterritorial diferente da Grande São Paulo possivelmente rebaixaria os indicadores de alerta.
A instabilidade emocional de quem vive numa Grande São Paulo recheadíssima de armadilhas aparentes ou sugestionadas é a contrapartida de oportunidades que se oferecem à mobilidade social, mesmo que mais no passado do que no presente.
De qualquer forma, os estudos apresentados pela Universidade de São Caetano deveriam ser mais destrinchados por instâncias regionais, principalmente pelo Clube dos Prefeitos, hoje um grande consórcio temático com participação de representantes de secretariais municipais.
A medida iria ao encontro de possíveis soluções que tenderiam a esquadrinhar a psicologia coletiva em novos patamares. A queda do índice de homicídios ao longo dos anos não encobre outros problemas criminais. Como, por exemplo, o balanço anunciado ainda esta semana pelo Diário Regional. O jornal contabilizou o tamanho da encrenca de roubos e furtos de veículos no Grande ABC nos primeiros quatro meses desta temporada: foram 6.335, o que representa média de 53 ocorrências por dia.
Relegar à banalidade estatística um problema que afeta diretamente a auto-estima da população é a pior das opções. Fechar os olhos para o sentimento social significa dizer que se está pouco lixando para os padrões de qualidade de vida da sociedade regional. Os dados são graves demais para serem simplesmente lançados ao fundo de gavetas oficiais. Contamos com uma população que reprova as instituições responsáveis pela Segurança Pública, independentemente dos esforços e das competências acumuladas ao longo dos últimos anos.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!