O modelo do Fórum da Cidadania está esgotado. Quem participou e ainda participa do movimento carrega o peso da decepção porque foi desprezada a lógica de que voluntarismo sem a contraface de profissionalismo é bicicleta sem rodas. Tem quadro, selim, catraca e guidão, mas não é uma bicicleta. O grande equívoco de lideranças que idealizaram o Fórum da Cidadania foi acreditar que o Grande ABC corporativista teria cidadania.
Na origem, quando ganhou forma de movimento para valorizar o voto em favor de candidatos locais e acabou se transformando em algo potencialmente revolucionário na relação de forças entre sociedade e administradores públicos, a entidade era menos pretensiosa. Tanto que optou nos primeiros ensaios pela grife Fórum pela Cidadania. Quando resolveu rebatizar-se de Fórum da Cidadania, transmitiu a idéia de que consolidara a massificação dos ideais. Ultrapassou o limite da cautela em nome do marketing.
O paradoxo dessa história é que, se antes do lançamento do Fórum da Cidadania o Grande ABC era um povoado sem eira nem beira institucional, com todos os pecadilhos que a situação pode gerar, depois do fracasso agravou-se a orfandade comunitária. Como se justifica essa tese aparentemente esdrúxula se, bem ou mal, o Fórum da Cidadania sacudiu o Poder Público a ponto de retirar administradores municipais e assessores mais imediatos do buraco imenso do comodismo onde também se meteram seus mais remotos antecessores?
A explicação é simples: na medida em que as organizações governamentais se prepararam para ocupar espaços que lhes pareciam ameaçados pela comunidade aparentemente organizada com seu exército de combatentes, mais o Fórum da Cidadania se esvaziou. Entre outras razões, a entidade se perdeu porque não soube construir relações criticamente produtivas com o Poder Público sem cair na armadilha da cooptação. A diferença que separa a comunidade das administrações públicas elevou-se após quase sete anos de surgimento do Fórum da Cidadania porque ao refluxo pós-sucesso da entidade, e da dispersão que a abate hoje, a esfera oficial respondeu com reação claramente ascendente, embora muito mais municipal do que regional.
Democracia e democratismo
A sucessão de erros táticos e estratégicos que levaram o Fórum da Cidadania a tornar-se uma organização não-governamental a mais na selva multiforme do chamado Terceiro Setor derivou da bobagem de confundir democracia com democratismo. Ao transferir para assembléias geralmente recheadas de atores sociais díspares a deliberação dos passos que deveria empreender, o Fórum da Cidadania virou uma embarcação bizarra na qual havia mais comandantes do que tripulantes e passageiros. Brincou tanto de pulverizar decisões que não enxergou o iceberg da improdutividade. Recente balanço sobre os efetivos resultados práticos do Fórum da Cidadania é um choque anafilático no pragmatismo que deveria nortear suas ações.
Mesmo considerando que durante muito tempo o Fórum da Cidadania manteve grupo de notáveis a lhe dar suposta cobertura, o fato é que o deslumbramento dos primeiros anos entorpeceu a capacidade do gerenciamento institucional, enquanto se teimou em eleger voluntários à gestão operacional. À medida que o Fórum da Cidadania trocou a praticidade de agenda factível por marketing grandiloquente de empreendedorismo político-institucional, instalou ambiente de desestímulo que floresceu no terreno fértil de algumas posturas imperiais. O envolvimento político-eleitoral explícito ou dissimulado de vários integrantes da entidade não teria tido os efeitos negativos observados se a pauta construída no nascedouro da entidade não se transformasse em miragem.
O embicamento do Fórum da Cidadania chegou ao extremo de não sustentar milagres. O recomeço é tarefa árdua e quase inglória. É melhor a comunidade da região imaginar e construir uma nova grife para equilibrar as forças com representantes governamentais, que deram uma virada no jogo e estão vencendo de goleada.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!