Sociedade

Educação é um dos vértices do
hexágono de corrupção pública

DANIEL LIMA - 01/08/2013

O hexágono de corrupção no setor público verde e amarelo tem na área de Educação um dos vértices mais frondosos. Disse isso ontem à noite, com outras palavras, a um auditório lotado de representantes do setor industrial de São Bernardo. Eles tiveram a ousadia de me ouvir num evento preparado pela unidade local do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo). Bastou dormir e acordar hoje para a confirmação imediata de um histórico já vasto de delitos.  Está na edição de hoje do Estadão, sob a manchete “Fraude em fundo da educação se espalha”.


 


Coincidência ou não, no Diário do Grande ABC de hoje encontra-se outra manchete do setor educacional: “Marinho admite que não tem condições de oferecer uniformes escolares em 2013”, referindo-se ao prefeito de São Bernardo. A razão está no corpo da matéria: há impedimentos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo por conta de um processo licitatório considerado irregular, porque viciado.


 


O encontro com representantes do setor industrial de São Bernardo prova que há malucos na direção do Ciesp, porque não sou exatamente um convidado conveniente para discorrer sobre a economia e a sociedade da Província do Grande ABC. Aliás, foi o que disse àqueles convidados. Nem precisei explicar preliminarmente as razões. Bastou que discorresse sobre uma pauta que formulei em cima da hora com algumas dezenas de tópicos que saltam da memória para tentar explicar, entre outras questões, porque a indústria de transformação da região é tão desprezada e tão castigada pelo setor público.


 


Nossos chefes de municípios de hoje (e de ontem) são, como escrevi ainda outro dia, exclusivamente gigolôs. Vivem do orçamento gerado principalmente pelo setor industrial que ancorou na região por conta própria, com a cara e a coragem, sem suporte de políticas públicas locais. O Bairro Cooperativa, em São Bernardo, é um dos exemplos mais emblemáticos do desprezo público, e sobre o qual escreverei outro dia.


 


Malandragens fluviais


 


O hexágono da corrupção conta com Educação e Saúde como carros-chefes oficiais porque as duas pastas têm o respaldo orçamentário constitucional e obrigatório de uma dinheirama que, se não consumida, pode levar o prefeito infrator a complicações enormes, inclusive à inelegibilidade. Completam o esquema de malandragens potenciais e com pesos assemelhados àqueles dois o mercado imobiliário, o mercado de construção civil, o lixo e o transporte urbano. A taxa de desvios sofre de elefantismo genético e incontrolável. Quem foi às ruas naquelas recentes e históricas manifestações não sabe nem um terço da missa. Se soubessem, botariam fogo nas palhoças.


 


Disse no encontro no Ciesp, por conta desses latifúndios de buracos negros do setor público, sempre em conluio com o empresariado que despreza meritocracia e concorrência ética, que a única regionalidade que deu certo historicamente na Província do Grande ABC é representada pela inexpugnável Fundação do ABC, comandada nas últimas temporadas por Maurício Xangola Mindrisz, enviado especial do prefeito Luiz Marinho.


 


A Fundação do ABC certamente não resistiria a uma auditoria externa independente, como propus numa questão da “Entrevista Indesejada” da qual Mauricio Xangola Mindrisz fugiu fragorosamente. O orçamento de R$ 1,2 bilhão para esta temporada é um convite à delinquência múltipla -- entendendo-se delinquência todo ato administrativo e operacional que fuja da bitola da transparência no uso do dinheiro público. E transparência no uso de dinheiro público não tem relação alguma com um Conselho Curador sob encomenda.


 


Uma noite apenas


 


Os convidados do Ciesp de São Bernardo que me ouviram ontem à noite e que me leem agora podem constatar que bastou mesmo uma noite nem sempre bem dormida para a falange educacional mostrar-se completa. Vejam o que está no Estadão:


 


 Principal entrave para a melhoria do Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios (IDHM) no Brasil, a qualidade da educação tem sido afetada por desvios e malversação de recursos destinados pelo governo às escolas. Levantamento da Controladoria-Geral da União (CGU) mostra que 73% das prefeituras fiscalizadas em 2011 e 2012 fraudaram processos de licitação para a compra de serviços de materiais de uso na rede pública de ensino. Os dados constam de relatório sobre a execução de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb), que transfere, anualmente, mais de R$ 100 bilhões para bancar salários de professores, compra de equipamentos e manutenção de atividades como merenda e o transporte escolar. Nos dois últimos anos, a CGU fez auditoria em 64 municípios que usaram dinheiro do fundo, selecionados por meio de sorteio. Em 46 deles, foram detectados problemas nas licitações, como direcionamento, montagem e até simulação dos processos de competição. (...) O órgão de controle do governo aponta vários outros problemas. Nos dois últimos anos, 70% dos municípios fizeram despesas incompatíveis com a finalidade do Fundeb. Em 25% dos casos houve falhas na execução de contratos. É comum o uso do dinheiro sem qualquer controle ou prestação de contas: 32% sacaram dinheiro do fundo na boca do caixa. (...) Segundo a CGU, a falta de fiscalização sobre recursos do Fundeb favorece as fraudes. Embora o órgão faça auditorias pontuais na educação, a lei que regulamenta o fundo não nomeia nenhum ente “supervisor” da execução das despesas em Estados e municípios”. A lei prevê a criação de conselhos para exercer o controle social sobre o uso dos recursos. Mas, segundo a CGU, três em cada 10 não cumprem esse papel.


 


Represálias, represálias


 


A frase que mais ouvi nos bastidores pós-encontro de ontem à noite no Ciesp de São Bernardo tinha a seguinte mensagem: “você disse tudo o que está entalado em mim e que não posso dizer porque sofrerei represálias”. Sei disso fartamente. Até porque sofro com represálias múltiplas dos poderosos encastelados no Poder Público e em instituições que supostamente representariam a sociedade civil mas, no fundo, no fundo, vivem de ensaboamentos e de sem-vergonhice com a classe política.


 


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