Esfacelado ao longo dos anos de centralismo do presidente Milton Bigucci, o Clube dos Construtores e Incorporadores do Grande ABC pode ingressar no estágio derradeiro de uma decadência mais que anunciada. Esse é o quadro que se pinta caso o dirigente não renuncie ao cargo. A confirmação de que o conglomerado MBigucci participou ativamente da Máfia Imobiliária que atua na Capital, desmascarada pelo Ministério Público paulistano em conjunto com a Controladoria-Geral da Prefeitura de São Paulo, é a gota dágua que faltava para o Clube dos Construtores entrar em parafuso.
Entretanto, não faltam ex-integrantes da direção da entidade, que se afastaram por conta da atuação de Milton Bigucci, e também ex-associados, igualmente decepcionados com o dirigente, que duvidam de uma decisão autoprofilática. Milton Bigucci não arredaria pé da direção do Clube dos Construtores.
Ainda no mês passado, praticamente em surdina, já que foi emitida convocação apenas aos poucos associados, Milton Bigucci sacramentou mais dois anos à frente da entidade. Não houve concorrentes por motivos variados, mas todos giram em torno do desinteresse de integrar uma instituição abalada com as seguidas denúncias de irregularidades envolvendo seu presidente. Tudo isso antes do estouro da bomba da máfia imobiliária de São Paulo, que ganhou manchetíssimas dos principais jornais do País e invadiram o noticiário da televisão e de portais da Internet.
Há, entretanto, quem afirme que o bom senso finalmente chegará à direção do Clube dos Construtores e Milton Bigucci procurará uma saída honrosa. A simples renúncia seria, segundo vários empresários do setor, uma confissão tácita de participação nas lambanças paulistanas, como se já não fossem mais que evidentes as lambanças locais denunciadas pelo Ministério Público do Consumidor e também por CapitalSocial.
Recesso pedagógico
O recesso corporativo do final de ano vai ser pedagógico para Milton Bigucci aconselhar-se sobre o futuro que o aguada no âmbito institucional, à frente do Clube dos Construtores, como também no empresarial, no comando do conglomerado MBigucci. Mas o outro lado da moeda também não pode ser desconsiderado: a possibilidade de deserção de boa parte do quadro de associados da entidade e até de dirigentes e conselheiros daquela instituição.
No meio empresarial imobiliário não há surpresa com a inclusão da MBigucci entre as empresas participantes de operações de corrupção juntamente com fiscais da Prefeitura de São Paulo. A metodologia utilizada por Milton Bigucci sempre foi analisada como ousada, a ponto de flexibilizar conceitos éticos e morais. O que deixou muitos representantes do setor em estado de choque foi o peso do escândalo anunciado e confirmado pelo Ministério Público. Quando o Ministério Público anunciou no começo deste ano que o conglomerado MBigucci é campeão regional de abusos contra a clientela, o noticiário ficou restrito a alguns endereços midiáticos. Agora é diferente. Naquele caso, uma bexiga de ar comprimido explodiu nas mãos de uma criança sapeca. Agora foi uma usina nuclear a ganhar os ares.
Empresários com larga experiência no setor imobiliário da Província do Grande ABC dizem que, se o Clube dos Construtores fosse um navio, já teria ido a pique; se fosse um avião, já teria se esborrachado no solo; se fosse um veículo, teria se arrebentado num poste; mas como é uma entidade classista, praticamente não sobra nada em respeitabilidade quando o próprio presidente debate-se no emaranhado de irregularidades movidas a propinas.
A situação de Milton Bigucci é gravíssima no campo institucional. Mesmo sem o escândalo dos mafiosos imobiliários em São Paulo o dirigente vivia situação incômoda. A disputa pela presidência do Clube dos Construtores, mês passado, foi solenemente ignorada pela maioria dos conselheiros e dirigentes da instituição. O evento foi realizado praticamente sob sigilo. Nenhum comunicado foi emitido à mídia sobre o que supostamente seria um processo de sucessão.
Milton Bigucci agiu nos bastidores durante os últimos meses para sustentar-se no cargo que ocupa há mais de duas décadas. Algumas tratativas foram feitas para que houvesse um novo presidente, desde que politicamente subordinado a Milton Bigucci. Seria uma espécie de Rainha da Inglaterra. Nenhum empresário se submeteu à proposta. Como os opositores, mesmo que desorganizadamente, preferem se afastar a encarar o poderio econômico de Milton Bigucci, a assembleia que decidiu a sorte sucessória não passou de formalidade.
Paradoxo protetor
Há algumas barreiras que, para proteger uma instituição que deveria participar ativamente da vida econômica da Província do Grande ABC, acabam também por assegurar menos contratempos a Milton Bigucci. Traduzindo: embora haja cada vez mais empreendedores do setor que colocam Milton Bigucci como o maior obstáculo à regeneração da atividade na região, sobretudo em defesa de pequenos e médios negócios, eles preferem evitar críticas abertas porque entendem que os rescaldos alcançarão o conjunto da atividade. O paradoxo que protege Milton Bigucci de saraivadas públicas de críticas não deverá se alterar nem mesmo após o escândalo paulistano. Há certo mito de que enfrentar o empresário é tarefa indigesta, tantas são as relações com instâncias públicas e privadas, inclusive com a mídia.
Certo mesmo é que, quando o novo ano chegar, tudo poderá acontecer no Clube dos Construtores e Incorporadores do Grande ABC. Dá-se como inquestionável a criminalização da MBigucci no escândalo da máfia imobiliária e da máfia dos fiscais na Capital. O peso relativo do envolvimento de Milton Bigucci é elevado, mas poderá ser ainda maior ante a iminente confirmação da denúncia comprovada por documentos e testemunhas do arremate ilícito do terreno que pertencia à Prefeitura de São Bernardo e que está sendo transformado no empreendimento Marco Zero, entre a Avenida Kennedy e a Avenida Senador Vergueiro. As digitais de Milton Bigucci e de parceiros de falcatrua são tão explícitas que se avaliam como quase homologatórias as investigações do Ministério Público, seguindo determinação do Corregedor-Geral no Estado de São Paulo.
A expectativa de renúncia de Milton Bigucci ao Clube dos Construtores brota de dirigentes, conselheiros e associados que não gostariam de acompanhar o esticamento de uma crise institucional por muito tempo. Mas não faltam entre opositores vozes a alertar sobre a resiliência do presidente diante de uma adversidade que não comporta mais sofismas e embromações. A tentativa de passar-se por vítima deste jornalista, que denunciou a MBigucci no caso do terreno ilicitamente arrematado, bem como pela insuficiência de qualificação de Milton Bigucci para comandar uma entidade de classe, ruiu de vez entre os mais crédulos agora que o Ministério Público da Capital identificou publicamente os mafiosos imobiliários dentro e fora da Prefeitura de São Paulo.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!