Dos oito mil alunos da graduação da UFABC (Universidade Federal do Grande ABC), apenas 233 estão cadastrados na ABRES (Agência Brasileira de Estágios). Em contraposição, a Universidade Metodista de São Bernardo contabiliza 4,3 mil alunos entre 13,6 mil. A diferença é abissal. Menos de 3% dos estudantes da UFABC estão de olho numa atividade econômica que os encaminhem à atividade produtiva convencional, enquanto na Metodista são 31,6%. Dez vezes mais.
Talvez não seja necessário dizer mais nada sobre o legado de Lula da Silva, salvo mudança radical de conceitos pedagógicos. Se dependermos da Universidade Federal sediada em Santo André e com ramificação em São Bernardo, não sairemos da pasmaceira econômica em que nos metemos, com sucessiva perda de competitividade entre regiões paulistas e brasileiras.
Sei que algumas ponderações procurarão minimizar os estragos e, principalmente, os contrastes evidentes da comparação de dados, mas nada resistiria aos números. Sem estabelecer juízo de valor sobre a qualidade de ensino, a Metodista de São Bernardo tem foco bem definido no processo de formação dos estudantes que pagam mensalidades. O centro da meta é o mercado de trabalho. Já a Federal do Grande ABC vive de platitudes acadêmicas que o dinheiro farto do orçamento federal alimenta. O pragmatismo educacional da Metodista tem o contraponto do academicismo da Federal.
Está no jornal Valor Econômico desta terça-feira matéria especial, de página inteira, sobre os sete anos da Universidade Federal do Grande ABC. O texto é marcado por tom festivo a partir da manchete (“Federal do ABC amplia internacionalização”), mas à medida que se escarafuncha a instituição a conclusão é destilada por este jornalista com base no passado que formatou a instalação do que um especialista na matéria cunhou de barriga de aluguel: a UFABC não vai contribuir para mudar a realidade econômica e social da região porque foi concebida por gente sem intimidade e sem compromisso com nossa situação histórica.
A UFABC é uma custosíssima licença poética de brilho acadêmico-cientifico que não reflete nem de longe o gataborralheirismo e o provincianismo deste território. É uma quase inutilidade regional que custa caro. Só no ano passado o orçamento chegou a R$ 217 milhões.
Um time visitante
A reportagem do Valor Econômico destaca o papel de extroversão acadêmica da Universidade Federal do Grande ABC. Entenda-se por internacionalização o fato de que dos quase mil alunos de pós-graduação, mais de 50 são do exterior. Dos 506 professores concursados, 63 são estrangeiros, a maioria com histórico profissional no Brasil e fluente em português.
A reportagem do jornal paulistano também destaca o posicionamento da UFABC no Ranking Universitário Folha (RUF) no indicador internacionalização, à frente da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. O conceito, segundo a reportagem, considera o intercâmbio internacional constante dos alunos, professores e pesquisadores, produção e publicação de trabalhos em nível mundial e ações globais de cooperação acadêmica com universidades estrangeiros para o desenvolvimento de pesquisa. Ou seja: a UFABC é um time visitante de primeira linha, capaz de alcançar extraordinários resultados, mas não sabe e não quer jogar no próprio campo, onde perde de goleada para competidores nacionais.
O Valor Econômico omite que a UFAB não é rival à altura das concorrentes nacionais no critério de inserção no mercado de trabalho. E não venham com papo furado que a instituição mal completou sete anos. Poderia ter chegado há sete décadas que, com o escopo de paetês e serpentinas intelectuais, não alteraria significativamente o quesito de inserção no desenvolvimento econômico regional. Tanto que recebe cotação zero no mesmo Ranking Universitário da Folha quando se afere com agências especializadas o grau de empregabilidade dos estudantes.
Diz também a reportagem do Valor Econômico que 325 alunos da UFABC fazem estágios. A quase totalidade é do curso de engenharia. A Mercedes-Benz tornou-se parceira preferencial. É um oásis de choque de realidade pedagógica e funcional num organismo alheio à competitividade internacional, entendendo-se competitividade internacional como o cruzamento de conhecimento técnico-cientifico-intelectual e demandas do mercado de trabalho. Os asiáticos estão aí a impingir seguidas derrotas porque sabem dialogar com o mercado naquilo que mais interessa nestas alturas do campeonato de uma globalização ensandecida: multiplicar esforços para gerar riquezas e progresso. Mesmo que riqueza e progresso sejam objetos de semânticas ideológicas.
Doenças degenerativas
A Província do Grande ABC desenvolveu ao longo de décadas algumas doenças sociológicas degenerativas, entre as quais suscetibilidade exacerbada a narcisismos autofágicos que supostamente compensariam perdas que se acumulam em variados medidores de eficiência. Elogios de terceiros com certo brilho que visitam a região ganham molduras especiais na parede de uma autoestima em permanente conflito. Por mais meias verdades que possam transpirar, manifestações de terceiros alheios à realidade regional muitas vezes viram mantras que agravam as vulnerabilidades locais. Somos um corpo sempre pronto a novas estocadas deletérias em forma de bênçãos.
O narcisismo em torno da Universidade Federal do Grande ABC, que não conta com mais de 25% de alunos residentes nos sete endereços municipais locais, associa-se ao silêncio envergonhado dos mais bem informados. A UFABC é um território educacional à parte da Província do Grande ABC.
Os administradores petistas locais, que poderiam tentar salvar a pele do legado de Lula da Silva, cujo escopo era outro, de inserção regional, bem que poderiam organizar uma força-tarefa para redirecionar o quanto possível as baterias de resultados em favor da economia. Mas isso parece utopia porque o bunker universitário é monolítico na defesa de conceitos diametralmente opostos às demandas locais.
A UFABC é campeã em internacionalização, mas não passa de lanterninha em sensibilidade econômica regional.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!