Sociedade

Santo André tem novo ouvidor;
será que terá nova ouvidoria?

DANIEL LIMA - 26/02/2014

Quem vai sair vitorioso de uma disputa surda entre a Prefeitura de Carlos Grana e a Ordem dos Advogados de Santo André? Dizem até que a disputa surda não existe, que é pura encenação, mas há também quem garanta que o relacionamento amistoso entre as partes faz parte das regras convencionais de diplomacia. Imaginar que a OAB de Fábio Picarelli vai sucumbir ao Poder Público, como tantas outras unidades da região aos respectivos paços municipais, é exagerar na dose, defendem muitos.


 


O novo ouvidor de Santo André, José Luiz Ribas Júnior, eleito por unanimidade, promete mudanças. Sabe-se que tem ambições políticas. Sabe-se também que os políticos velhos de guerra, principalmente vereadores, enciumadíssimos, já querem escalpelá-lo. Será que conseguirão? Quando se sabe que acordos interessantíssimos ao Executivo podem se vincular a vetos e pressões, é melhor não duvidar de que legisladores venham a ser atendidos.


 


José Luiz Ribas Júnior entra em campo como ouvidor mas precisa sair de campo em dois anos como importante integrante da sociedade de Santo André que deixou de legado uma ouvidoria de respeito. E ouvidoria de respeito não pode ser desconhecida do público nem da mídia. Tem de ter papel ativo, prospectivo. Será que conseguirá?


 


Numa entrevista ao repórter Leandro Amaral, do jornal Repórter Diário, Ribas Júnior revelou alguns planos e o molejo verbal de quem não quer comprar briga à toa, porque sabe que caminha num fio de navalha. Ribas Júnior tem tarefa adicional, acoplada à dinamização da ouvidoria de Santo André: precisará provar a cada dia, com sua equipe, que não ganhou uma eleição de lavada porque contou com o respaldo total do prefeito Carlos Grana, a quem deveria reciprocidades.


 


A desconfiança é generalizada sobre as poções milagrosas de engenharia político-institucional que Carlos Grana executa com punhos de renda. Ribas Júnior se distanciaria da classe que lhe dá respaldo e da sociedade que clama por um canal decente a reclamações e soluções caso se entregue à sanha do poder monolítico que se pretende consolidar numa Santo André tomada por interesses mesquinhos.


 


Domesticação à vista?


 


Ribas Júnior deixa explicitado o que pensa num amanhã eleitoral ao declarar como declarou ao Repórter Diário que pretende levar a estrutura operacional da ouvidoria em posto avançado no Poupatempo de Santo André, previsto para ser instalado no Atrium Shopping. Ribas Júnior quer ver também a ouvidoria em eventos de grande movimentação de massa. Ribas Júnior quer, portanto, transformar a ouvidoria em ferramenta ativa mais a mão dos contribuintes. É claro que ganharia visibilidade com as agendas propostas. E isso não parece agradar controladores do Poder Público situados tanto no Paço Municipal como no entorno do Paço Municipal. Por isso deverão investir sobre Ribas Júnior para domesticá-lo. Os rebeldes não costumam ter vez ante poderes absolutos. 


 


Quatro dos municípios da Província do Grande ABC contam com ouvidoria.  São espécies de secretarias especiais. Não se tem nenhuma notícia ao longo dos tempos de que uma ouvidoria sequer tenha alcançado registros que fujam do varejismo de soluções de problemas do cotidiano. Há algo de podre numa estrutura pretensamente democrática que se fecha a casos cabeludos de corrupção. Basta lembrar que o escândalo imobiliário em Santo André, durante a Administração Aidan Ravin, até agora impune, jamais teve sequer uma manifestação do ouvidor. Quem defende que saques nos cofres públicos são página virada certamente não apostaria na ideia.


 


Não adianta dizerem como dizem para tentar minimizar as críticas que ouvidor não é controlador. A desculpa esfarrapada cheirará à marmelada. Ouvidor para ser respeitado não pode ficar restrito a ações menores. A legislação que criou essa instância de suposto poder precisa ser reformulada em cada um dos municípios da região. Somente assim a sociedade vai começar a acreditar que não se trata de um jogo de cartas marcadas pelos interesses mesquinhos de se fazer de democrata quando de fato a estrutura legal é de falseamento deliberativo castrador de irregularidades graúdas.


 


Orçamento fortalecido


 


A ouvidoria de Santo André conta com orçamento de R$ 600 mil para esta temporada. É muito pouco para a estrutura legal-administrativa de que precisa, mas suficiente para o que exerce dentro dos espectros concebidos num jogo de cena que precisa ser denunciado e dizimado. Os recursos financeiros poderiam ser muito maiores, com ações reformistas espetaculares, se o Poder Público não brincasse com as expectativas saneadoras da sociedade.


 


Uma ideia que poderia ser adotada não só pelo novo ouvidor de Santo André como nos demais municípios locais seria a vinculação de recursos financeiros escusos à potencialização do organismo. Traduzindo em termos práticos: tudo que as denúncias de uma nova ouvidoria redundasse em penalidades fiscais aos delinquentes da praça (mercado imobiliário, principalmente) reservaria percentual ao fortalecimento da estrutura da própria ouvidoria. Viver de favores orçamentários tem limite explícito, de submissão do ouvidor e assessores. A retroalimentação da máquina de triturar bandidos engravatados de pés sujos seria fantástica.  Será que os vereadores apoiariam a ideia? Tentar não custa, até mesmo para desmascarar os malfeitores eleitos pelo povo e que por isso mesmo em muitos casos acham-se divindades.


 


Ribas Júnior ficará para a história dos ouvidores municipais se no início do mandato que lhe foi conferido num jogo de interesses próprios da democracia, mas com forte influência do Poder Público, decidir apresentar proposta de redefinição dos poderes estatutários. Dar uma observada nos requisitos do Controlador Geral de São Paulo, responsável pelas denúncias que culminaram no desmascaramento de servidores públicos mancomunados com empresários fraudulentos do setor imobiliários é uma sugestão que vale a pena ser seguida e adaptada. Até mesmo para aferir o grau de seriedade daqueles que jactam entusiasmo pela existência da ouvidoria.


 


Ribas Júnior colocou a autonomia da OAB de Santo André na reta. Se existe uma parcela da sociedade regional com massa crítica para mexer com as estruturas de falsidades em que vivemos, não tenho dúvidas que são os advogados. Quem conseguir retirá-los do individualismo mesclado em vários casos de nichos corporativos temáticos merecerá uma estátua. A OAB de Santo André, a mais ativa ou a única realmente ativa entre as OABs da Província, precisa sair do casulo corporativo e jogar-se nos braços da sociedade que carece de representatividade para ganhar coragem e reagir.


 


Santo André precisa de um banho de loja de cidadania para honrar o futuro das novas gerações. Uma nova ouvidoria é muito mais importante que qualquer novo ouvidor que seja eleito no futuro. Ribas Júnior não pode perder essa perspectiva. Até porque a outra significa completa desmoralização individual e institucional. 


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