Sociedade

Defenda começa melhor do que o
esperado: presidente não resiste

DANIEL LIMA - 31/07/2014

O empresário do setor de corretagem de seguros e ativista social Elísio Peixoto renunciou à presidência do ainda não formalizado Defenda Grande ABC. Ele afirmou que tem planos de expansão de seu empreendimento e por isso não teria tempo a uma instituição que se pretende diferenciada na Província do Grande ABC. A explicação de Elísio Peixoto reúne tanta verdade quanto dizer que os próprios norte-americanos derrubaram as Torres Gêmeas porque pretendiam criar ambiente para justificar a morte de Bin Laden.


 


Elísio Peixoto abandonou a presidência porque não suportou a pressão de seguir a linha mestra do Defenda, que consiste em decisões colegiadas. São 15 dirigentes com poderes igualitários. O presidencialismo é apenas de fachada, estatutariamente obrigatório. O Fórum da Cidadania de passado de poucas glórias e muito fracasso ensinou que o seletivismo diretivo é o desfiladeiro do futuro.


 


A debandada de Elísio Peixoto significa perdas e ganhos para o Defenda Grande ABC. Perdas porque ele se mostrou desde as primeiras reuniões uma articulada e cooperativa liderança, principalmente na consecução de medidas técnicas que culminariam na estruturação do estatuto e do regimento interno da instituição. Elísio Peixoto revelou-se disposto a somar. Até que virou presidente.


 


Graças a Elísio Peixoto e a seus dois parceiros mais conhecidos de diretoria, Marcos Buim e Conrado Orsatti, o Defenda Grande ABC saiu do plano das ideias e se deslocou à materialidade legal.


 


O Defenda ganhou com o afastamento de Elísio Peixoto porque ele não entendeu os pressupostos da organização. O coletivismo está acima de tudo. E o tom nas relações que se pretende efetivar com os podres poderes públicos não pode ser de punhos de renda, como se a Província vivesse o esplendor civilizatório em ética e moralidade.


 


Hora da verdade


 


Se o afastamento de Elísio Peixoto é o preço a pagar para o Defenda Grande ABC sustentar a chama de que pode ser realmente um movimento capaz de mudar alguma coisa na geografia de corrupção e desmandos da Província do Grande ABC, nada melhor. E se mais alguns integrantes pensarem como ele, nada melhor que se afastem também. E se todos acharem que é melhor mesmo emparelharem perfil com as OABs, Ciesps, associações comerciais e tantas outras entidades que não saem de seus próprios quadrados, que o Defenda desapareça. Teria sido uma experiência fabulosa.


 


Não é apropriado, portanto, enganar o distinto público. A chamada sociedade da Província do Grande ABC seria utilizada como massa de manobra. E aí o Defenda Grande ABC poderia trocar de denominação. Aplaude Grande ABC é uma das sugestões. Bajula Grande ABC é outra.


 


O que quero dizer com isso é que não tem sentido a Província do Grande ABC contar com qualquer nova instituição que não tenha como núcleo estratégico, tático e operacional a inteligência de ações em associação com distanciamento crítico dos poderes podres públicos. O Defenda Grande ABC que parecia sair da prateleira de projetos de Elísio Peixoto estaria longe disso. O perfil daquele ex-dirigente foi se revelando aos poucos. O inconformismo nos bastidores submergia a odores palatáveis demais nos encontros oficiais.


 


Apresentamos a seguir alguns pontos que levaram o então dirigente do Defenda à linha de tiro de sensibilidade e crítica. Não sei se outros dirigentes tiveram a mesma sensação. Durante todo o processo de formação do movimento não ultrapassei os limites formais de relações, sempre socializadas na Internet e pessoalmente em encontros oficiais.


 


Primeiro ponto: ao declarar na reunião que aprovou apressadamente os insumos do estatuto e do regimento interno que o Defenda procuraria o diálogo com as instâncias sobre as quais lançará redes de desconfiança e monitoramento, soou o alerta de que a linha de atuação seria mais branda e conciliatória do que moderada com viés incisivo, como delineou uma pesquisa interna com dirigentes e associados. Diplomacia pressupõe aproximação além do natural quando estão em choque interesses inconciliáveis. Uma Prefeitura que venha a ser solicitada a explicar o destino do dinheiro de determinada área suscetível à corrupção, com fundamentação de dados, não reagirá de outra forma senão com hostilidade ao monitoramento. Essa é uma equação tão previsível quanto o dia após a noite. Qualquer movimentação diferente emitiria sinais de obscuridades. O caso da OAB de Santo André e da Administração Carlos Grana é emblemático.


 


Segundo ponto: ao procurar este jornalista fora das reuniões programadas para buscar alternativas à estrutura física do Defenda Grande ABC, principalmente no campo imobiliário, Elísio Peixoto mostrou a preocupação com o futuro da entidade. Entretanto, ao abordar a possibilidade de, juntamente com este jornalista e dois de seus amigos de diretoria, Marcos Buim e Conrado Orsatti, manter o controle do Defenda, o então ainda não presidente da entidade revelou uma face de personalização de comando incompatível com os pressupostos fartamente divulgados em mensagens restritas aos associados.


 


Terceiro ponto: um dia após a reunião que aprovou o estatuto e o regimento interno, Elísio Peixoto foi açodado ao agendar reunião para dois dias depois com o chefe do Ministério Público Democrático, em São Paulo. O encontro foi desmarcado porque não houve adesão de companheiros de diretoria em número suficiente. Nada mais lógico. Conciliar agendas em tempo tão curto é pedir demais. Um encontro apenas diplomático não interessava ao Defenda. Ir ao MP sem uma agenda já definida de ações que se pretende realizar é pura perda de tempo. Ou marketing vazio. A espetacularização do Defenda não é apropriada ao compromisso com resultados. A mensagem a levar ao MP Democrático seria enfática: A Província do Grande ABC é uma incubadora de corruptos.


 


Quarto ponto: Durante a reunião de aprovação do estatuto e do regimento interno, Elísio Peixoto revelou o individualismo que pretendia manter oculto ao afirmar que os próximos encontros seriam em horário e em local diferentes dos anteriores, o Centro Empresarial Pereira Barreto, divisa de Santo André e São Bernardo. Não houve consulta alguma aos pares. Uma decisão que interferia no cotidiano de cada dirigente. Santo André é o centro geográfico da Província e como tal é ponto mais apropriado a reuniões regionais. O horário do meio dia às duas da tarde dos debates anteriores aglutinou todos os dirigentes. Uma consulta planilhada poderia ter sido proposta para conciliar eventuais novas propostas. O individualismo se sobrepôs ao conjunto.


 


Quinto ponto: As mensagens trocadas entre os dirigentes do Defenda sempre foram socializadas quando o interesse era comum a todos. Jamais este jornalista enviou qualquer mensagem específica a qualquer um dos demais dirigentes da instituição com abordagem paralela. Elísio Peixoto manteve contatos diversos fora desse padrão de relacionamentos.


 


Sexto ponto: em momento algum durante as reuniões preliminares de criação do Defenda, e mesmo no encontro definidor do movimento, foi mencionada a instalação de comissões provisórias que atuariam nos Eixos Estruturantes. Para surpresa, o regimento interno contempla comissões fora da órbita dos sete espectros temáticos que demarcarão o terreno de atuação do Defenda. Trata-se de um convite à dispersão, à perda de foco.


 


Sétimo ponto: a programação da próxima reunião do Defenda para o dia 12 de agosto, proposta deste dirigente, foi corretamente advertida por um dos destinatários da mensagem como inadequada. A data coincidiria com um evento sobre corrupção no Ministério Público Democrático, em São Paulo, previamente agendado por alguns dos dirigentes do Defenda. A partir dai uma saraivada de propostas alternativas desabou nos computadores. Virou um inferno natural, provocado pela democracia participativa. O presidente Elísio Peixoto ficou à distância, não se manifestou em busca de propor a conciliação de interesses. Não tive dúvida em, com minha assessoria, elaborar uma planilha e enviar a todos os dirigentes. Foram disponibilizadas múltiplas datas, entre 11 e 15 de agosto, de 12h às 14h no Centro Empresarial Pereira Barreto. Todos os dirigentes do Defenda responderam. Menos Elísio Peixoto, Marcos Buim e Conrado Orsatti. As respostas chegaram em menos de duas horas. No dia seguinte, Elísio Peixoto apresentou carta de renúncia e a justificativa adocicada de expansionismo dos negócios. Na realidade, ele se afastou porque o próximo encontro debateria especialmente o regimento interno, contestado por este jornalista por conta de um centralismo contraproducente ao conceito de igualitarismo entre os dirigentes.


 


Oitavo ponto: numa das mensagens enviadas aos dirigentes do Defenda o já presidente Elísio Peixoto travestiu-se de Madre Superiora, de Imperador, ao passar descompostura em todos que advogavam uma linha de conduta institucional que não flertasse com a diplomacia de punhos de renda. Peixoto produziu uma peça moralista contra quem se opunha à linhagem comportamental que ele pretendia explorar. Procurou, no fundo, estigmatizar os opositores, atribuindo-lhes perfil de terroristas, de insubordinados, sem considerar que existe uma linha intermediária entre a lantejoula verbal e comportamental disfarçada de diplomacia e a guerrilha camicase de tratar os podres poderes públicos a cacetadas. O meio de campo entre esses dois pontos chama-se moderação com viés de reformas, como definiram os próprios dirigentes e associados do Defenda.


 


Descuido na preparação


 


Se houve um erro cometido por todos os dirigentes do Defenda Grande ABC ao longo do processo que gerou a aprovação do estatuto social e do regimento interno foi o descuido em não analisar mais detidamente essas ferramentas que conduziriam o destino da instituição. Confiou-se demais na especialidade de Elísio Peixoto. Enviadas pela Internet, as propostas não foram debatidas nas reuniões presenciais. Apenas no encontro que marcou a posse simbólica dos dirigentes tanto o estatuto quanto o regimento interno foram lidos apressadamente. E mesmo assim de forma parcial, dos chamados principais trechos, segundo definição de Elísio Peixoto. Não havia ambiente nem tempo para maiores discussões. E ninguém pensou nisso.


 


Embora atrasada, a tomada de decisão de reformular o regimento interno que reproduz os poderes diretivos que deveriam ficar restritos ao estatuto social era uma medida inadiável. Sob pena de o Defenda Grande ABC perpetuar uma barbaridade funcional que nega olimpicamente a premissa de igualdade entre os 15 dirigentes.


 


O presidencialismo limitado à legalidade do estatuto social se derrete na informalidade do regimento interno, peça complementar apropriada à quebra da burocracia regulamentar, como sempre explicou Elísio Peixoto.


 


Elísio Peixoto preferiu justificar a renúncia buscando um viés de hipocrisia. O compartilhamento de poder o contrariava. O conteúdo da mensagem aos dirigentes do Defenda consolida a linha de atuação que tentaria imprimir. Um conteúdo a léguas de distância de um Defenda Grande ABC tão necessário a mudanças substantivas para golpear sanguessugas que atuam na região.


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