Sociedade

Residencial Ventura: MP e Justiça
falham, mas STJ conserta. E agora?

DANIEL LIMA - 13/08/2014

Ainda estou debatendo com meu advogado, Alexandre Marques Frias, o que fazer após obter uma vitória importante no Superior Tribunal de Justiça, em Brasília. Vamos decidir os próximos passos contra o absurdo que vivi nos últimos anos. É muito provável que iremos a instâncias superiores do Ministério Público.


 


O Residencial Ventura, empreendimento eivado de irregularidades, não teve a denúncia deste jornalista devidamente apurada pelo Ministério Público Estadual em Santo André. E ante um erro processual de julgamento impagável tanto da 2ª Vara Criminal de Santo André quanto do Tribunal de Justiça de São Paulo, só escapei de criminalização no STJ.


 


É impressionante como a operação da verdade com suporte de documentação e testemunhos sofre para ter espaço reconhecido neste País. Principalmente quando há poderosos do outro lado da disputa. Principalmente poderosos do mercado imobiliário, grandes financiadores de campanhas eleitorais. 


 


O Residencial Ventura reúne 320 apartamentos de classe média-média no Bairro Jardim, em Santo André. A área pertencia à Família De Nadai. O negócio com os incorporadores e construtores foi liderado por Sérgio De Nadai. Tempos depois, o empresário foi denunciado pela Justiça como integrante da chamada Máfia da Merenda Escolar que atuou em vários municípios.


 


Herança de governador


 


Dizem que Sérgio De Nadai está proscrito do governo de Geraldo Alckmin, que o recebera de herança do governador Mário Covas. Sérgio De Nadai tornou-se milionário com o suprimento de quentinhas à cada vez mais volumosa rede de presídios paulista. Um negócio altamente lucrativo porque qualidade e preço são compulsoriamente antagônicos. O que falta à primeira, sobra ao segundo.


 


Sérgio De Nadai era muito próximo de instâncias diretivas da Cetesb, companhia estadual que atua como xerife do meio ambiente e que foi acionada para liberar o terreno onde se plantou o Residencial Ventura. Há um modus operandi de liberação de áreas ambientalmente comprometidas que foge completamente à lógica de segurança de análise. Já escrevi sobre isso.


 


As raposas cuidam das uvas. Companhias privadas especializadas em preparar laudos técnicos atendem integralmente às premissas de construtores e incorporadoras, que as contratam exatamente para isso. Os preparativos para o lançamento do Residencial Ventura seguiram esse figurino, após interposição da instância municipal. O laudo técnico do Semasa virou estorvo a Sérgio De Nadai e companheiros de negócio. 


 


A construção do Residencial Ventura se deu sobre um terreno comprovadamente salpicado de complicações ambientais. A base dessa informação é de um especialista no assunto. O engenheiro Sebastião Ney Vaz ocupava (e agora voltou a ocupar) a superintendência do Semasa, empresa de saneamento básico de Santo André.


 


No terreno em que se ergueram quatro torres do Residencial Ventura funcionou durante sete décadas a fábrica de produtos químicos Atlântis. O Semasa alertou sobre o risco do empreendimento. As primeiras inspeções ambientais emitiram sinais de inquietação. Sebastião Ney Vaz insistiu na advertência em encontro pessoal com dois dos representantes dos donos do negócio. Tudo Inútil.


 


A festa de lançamento comercial estava marcada para dezembro de 2007. O evento foi comunicado ao superintendente do Semasa pelo representante da Cyrela, uma das incorporadoras, e Sérgio De Nadai. Eles deixaram o gabinete de Sebastião Ney Vaz dando de ombros à advertência do superintendente. Os convites estavam todos na rua, disseram os empresários. Uma semana depois houve farta distribuição de material promocional. Corretores de plantão trabalharam intensamente.  Tudo irregular.


 


Faltam recursos ao MP


 


O material preparado por CapitalSocial foi encaminhado ao MP de Santo André. A instituição tem escassos recursos humanos e materiais. Por isso não efetivou a devassa necessária. Limitou-se burocraticamente a acreditar nas raposas do setor público da Administração do prefeito Aidan Ravin, sucessor do petista João Avamileno. A mesma administração municipal que, tempos depois, envolveu-se em escândalo de liberação de obras mediante propinas que brotavam no Semasa sob nova direção. As informações solicitadas pelo MP à Prefeitura de Santo André obtiveram como respostas relatórios falaciosos. Não interessava ao prefeito Aidan Ravin, como o tempo provou, jogar gasolina no fogo de irregularidades do empreendimento.


 


A penalidade aos empreendedores do Residencial Ventura deveria ser aplicada sem hesitação. Bastaria ouvir Sebastião Ney Vaz, como este jornalista ouviu. Ele assegura que houve ilicitudes na cronologia abusiva do empreendimento. Não se respeitaram critérios sagrados à segurança física e financeira dos adquirentes dos imóveis. CapitalSocial dispõe de provas documentais que lastrearam a matéria denunciatória.


 


Não vou voltar aos detalhes sobre a operação que culminou na aprovação do projeto e na construção do Residencial Ventura. Nos próximos dias pretendo montar um dossiê que remeterei a instâncias ministeriais superiores. O Ministério Público de Santo André fez uma investigação divorciada dos fatos. Mas nem por isso, ou seja, por não atentar às irregularidades, a Justiça em primeira instância de Santo André deveria ter acolhido a queixa-crime da Cyrela contra este jornalista. Nem a segunda instância do Tribunal de Justiça da Capital.


 


Erro flagrante


 


O erro processual foi flagrante, contestado em audiência no Fórum de Santo André. Foi preciso que o recurso em terceira instância fosse julgado para este jornalista se ver livre de um crime que jamais cometeu. Por isso não vou desistir de ir adiante. O Residencial Ventura não é um endereço no qual gostaria de morar, como já escrevi antes. Aliás, entre o Residencial Ventura de classe média-média de Santo André e o Barão de Mauá explosivo de classe popular de Mauá, fico com meu sobrado no Jardim do Mar, em São Bernardo.


Quem me salvou de baita injustiça foi a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça. O ministro Sebastião Reis Júnior, juiz daquela instância, deu provimento ao recurso em habeas corpus, no que foi acompanhado pelos votos dos juízes Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Marilza Maynard.


 


O ministro Sebastiao Reis Júnior escreveu:


 


 Os principais argumentos suscitados pelo recorrente são a existência de vício no instrumento de mandato outorgado pela querelante (Cyrela) aos seus advogados e a ilegitimidade ativa ad causam da querelante para a propositura da ação penal privada (pessoa jurídica – que não pode ser vítima de crime contra a honra). Noticia o recorrente, ainda, que a queixa-crime foi subscrita por advogados que não estavam munidos de procuração com poderes específicos, mas o simples substabelecimento. Na sessão do dia 18/06/2014, a ilustre relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, em considerável pronunciamento, negou provimento ao recurso, decidindo não só pela regularidade do instrumento de mandato outorgado pela querelante a seus advogados, uma vez que a intenção da vítima em processar penalmente o querelado (este jornalista) estaria demonstrada por meio do instrumento de substabelecimento de fls.45/46, mas também pela possibilidade de pessoas jurídicas serem vítimas de crime contra a honra. (...). Visando uma melhor análise da controvérsia, pedi vistas dos autos. (...) É cediço que o substabelecimento é um ato de transferência dos poderes outorgados na procuração inicial para que terceira pessoa possa praticar os mesmos atos, ou seja, é o repasse de poderes. Em decorrência, ainda que o substabelecimento esteja inserido na cláusula ad judicia, há limites objetivos que devem ser observados quando da transferência desses poderes. Ou seja, apenas aqueles originariamente outorgados podem ser transferidos. Consequentemente, não podem ser ampliados pelo substabelecente, visto que lida com poderes e direitos de terceiros, e não próprios. Destarte, o mandatário só pode substabelecer aqueles poderes que lhe foram constituídos pelo outorgante originário, não sendo possível falar em transferência, pelo mencionado instrumento, daquilo que não recebeu. (...). Com isso, entendo que o instrumento de mandato outorgado não atende às exigências do art. 44 do Código de Processo Penal, uma vez que não conferiu poderes especiais para a propositura da ação penal privada e muito menos fez referência ao nome do querelado, ao fato delituoso a ele atribuído, ou ao artigo de lei do enquadramento típico, o que constitui óbice ao regular desenvolvimento da ação penal – escreveu o ministro do Superior Tribunal de Justiça.


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