Sociedade

Secovi poderia seguir Fapesp e dar
a lista dos delinquentes imobiliários

DANIEL LIMA - 14/10/2014

O Secovi, Sindicato da Habitação da Capital, entidade da qual Milton Bigucci, presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC, é membro vitalício, bem que poderia seguir os passos de transparência da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Não estou sugerindo que o Secovi se meta aonde não entende, até porque o Secovi não trocaria o certo pelo desconhecido. Quero apenas que o Secovi mimetize os bons exemplos em práticas corretivas, predicado que não passa de intenções em forma de promessas que levam os crédulos a imaginar que o mercado imobiliário é um celeiro de lideranças distintas da avacalhação generalizada atribuída à classe política. 


 


A Fapesp denunciou cinco casos de fraude cientifica por parte de pesquisadores beneficiados por financiamento da instituição. O Secovi poderia proceder a uma profilaxia ética nos quadros de associados e dirigentes, eliminando empresas e empresários que participaram ativamente da Máfia do ISS e da Máfia do IPTU na Capital. Talvez o Secovi esteja muito ocupado com a crise imobiliária e não tenho tempo para esse rearranjo. Entretanto, quem sabe umas horas extras fora do campo de batalha do lobby tradicional poderia encaixar um golpe fulminante nos contraventores?


 



Talvez seja porque entre os dirigentes que frequentam aquela casa esteja Milton Bigucci, o presidente Claudio Bernardes não move uma palha sequer para transformar em prática o que virou demagogia deslavada, ou seja, dizer que quer a moralização do mercado imobiliário na Capital. Essa é uma conversa boa para peão dormir depois de uma jornada intensa de trabalho saltando daqui ali para ganhar o pão de cada dia.  


 



Delinquentes protegidos 


 



Mais que não contar com qualquer espirito de varredura ética da Fapesp, implacável até demais com pesquisadores rotulados de fraudadores e plagiadores, o que o Secovi tem demonstrado mesmo é uma vocação extraordinária em rivalizar-se com os políticos na produção de mazelas, quando não de falcatruas. Aliás, os mesmos políticos que o Secovi e seus representantes desandam a dar bordoadas para esconder os próprios fundilhos.  


 



Na ânsia de proteger os delinquentes imobiliários que assaltaram os cofres públicos da Capital, o Secovi acertou-se com a Prefeitura do petista Fernando Haddad, núcleo do escândalo. Tanto que deram um drible na vaca na objetividade delinquencial daquele escândalo. A fajutice instrumental de que o assunto é exclusivamente fiscal e, portanto, deve ser reservado a instâncias que protegem a todos os bandidos da curiosidade da imprensa, subestima o caráter criminal tipificado em forma de corrupção, entre outras irregularidades.


 


Recentemente em editorial o Estadão fez essa abordagem, da qual me aproprio para cristalizar o descaramento do Secovi na tentativa de abafar um caso que teria provocado buraco de R$ 500 milhões aos cofres da Prefeitura da Capital. Números monetários subestimados. A farra entre fiscais e delinquentes do mercado imobiliário foi muito mais intensa, regada a anabolizantes que nem sempre aparecem nos exames de transfusão de dinheiro público para bolsos privados.


 



Qualquer atividade séria e com ressonância social deveria ser submetida à legislação implacável. Uma Lei de Responsabilidade Imobiliária seria a melhor pedida para enquadrar de imediato bandidos espalhados nas administrações públicas e nos lobbies disfarçados de entidades de classe. A medida separaria joios de trigos, tanto no ambiente público quando no classista.  


 



Lista dos corruptos 


 



A primeira providência que o Secovi tomaria se fosse o que deveria ser, não algo cuja pronúncia nominativa pode conduzir o interlocutor leigo a imaginar que se trata de remédio contra ressacada, seria a exposição pública da identidade de todas as empresas do setor, associadas ou não, comprovadamente acumpliciadas com os mafiosos servidores públicos de Capital que se lambuzaram no desvio de dinheiro público para aprovar de empreendimentos imobiliários completamente fora dos padrões legais.  


 



Uma lista das primeiras 40 empresas envolvidas saiu nos primeiros dias nos jornais, mas em seguida desapareceu ante pressão de todos os cantos. Do Secovi aos políticos que dependem de financiamentos eleitorais da construção civil. Sem contar dos departamentos comerciais dos jornais e de outras mídias que deitam e rolar na definição da banda estreita à liberdade de imprensa, submetida à  condicionalidade publicitária.


 



O prefeito paulistano Fernando Haddad e a Controladoria-Geral do Município pareciam decididos a enfrentar a entourage imobiliária que tem no Secovi histórico de centro do poder inclusive no financiamento espúrio de políticos bonzinhos demais na aprovação de uso e ocupação do solo. Bastou que pressões de bastidores apertassem o torniquete de interesses cruzados para que, em nome de uma engenharia tergiversadora, como bem apontou o Estadão, o escândalo caísse na esparrela da burocracia, esterilizando os mandachuvas e os mandachuvinhas dessa orquestração de safadezas. 


 



Pobres dos leitores de jornais que acreditam no poder supremo das redações na definição de pautas. Há exceções à regra, mas a regra é a submissão aos interesses financeiros. O mercado imobiliário é um dos maiores investidores em publicidade dos jornais e revistas e com isso exerce de tal modo o poder de persuasão que é praticamente impossível sustentar um jornalismo a salvo de sequelas.


 



Ambiente manipulado 


 



O esforço que determinados veículos de comunicação fazem para dourar a pílula do desastre imobiliário que o País vive, sem a formalização da bolha tão alardeada mas com a constituição de micos espalhados por todos os cantos, é algo alucinante. Tenta-se pateticamente, com eufemismos e também com caradurismo, negar ou minimizar o desastre à vista de todos. Fosse feita uma pesquisa séria sobre a quantidade de corretores de imóveis que abandonaram o ramo nos últimos meses, o resultado só perderia para o estoque de apartamentos à espera de compradores.  


 



Síntese de bem patrimonial de primeira necessidade na bolsa de conquistas dos brasileiros, o mercado imobiliário maltratado pelos delinquentes só tem a vida boa de indiferença quase absoluta às regras do jogo de responsabilidade social porque a legislação é conveniente e em estreita sintonia com os critérios de reciprocidades de executivos e legisladores lobotomizados pelos recursos legais e ilegais que amealham antes, durante e depois de eleições.  


 



Sem obstáculos a lhes tolher o excesso de materialismo, muitos dos especuladores imobiliários travestidos de empresários imobiliários fazem da sociedade gato e sapato. As facilidades para tanto também estão lubrificadas e industrializadas pela perversa combinação de que grande parte dos delinquentes imobiliários é especialista na atividade enquanto os consumidores de seus produtos são geralmente principiantes, marinheiros de primeira viagem que uma vez na vida e outra na morte têm contato com os agentes do setor.  


 



Minoria com a lei 


 



Mais que nunca o mercado imobiliário carece de mecanismos inibidores e penalizadores das falcatruas que os xerifes do setor não só perversamente negam como as mantêm em pleno funcionamento num eixo de interesses escusos que os colocam como grandes beneméritos. Infelizmente, apenas uma pequena parte dos representantes do setor age dentro de princípios de respeito e atenção à clientela e por isso mesmo se juntam a ela como vítimas de organizações descoladas de mudanças tão apregoadas no ambiente nacional.  


 



Distinguir mercadores imobiliários de empreendedores imobiliários é um desafio permanente mas nem por isso desanimador. Caberia, portanto, ao Secovi e entidades afiliadas, como o Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC, muita contribuição nesse sentido. Quem acredita que isso possa acontecer que levante o braço de idiota.


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