Não acredite na possibilidade de pagar menos pelo seguro do veículo que o leva a todo canto e a todas as esquinas. Se qualquer um dos municípios da Província do Grande ABC for o endereço que consta da apólice, os custos seguirão mais elevados, superando inclusive a Capital. Não será uma sazonalidade de um ou outro período de diminuição dos casos policiais que alterará as regras do jogo sacramentado por critérios capitalistas das companhias especializadas. Assistencialismo é com o Estado -- e todos sabem os problemas que aparecem, porque lidar com o dinheiro dos outros é fácil.
Não é de hoje que alertamos para esse que é um dos muitos indicadores do chamado Custo ABC. Houve tempo em que a mídia regional abria manchetíssimas para reclamar do que acreditava ser discriminação. Em condições semelhantes envolvendo veículos e condutores paga-se há muito tempo muito mais por uma apólice de seguro na região. E paga-se porque se tem de pagar mesmo. Aqui são muito maiores os riscos de ver alguém levando o veículo na mão grande com uso ou não de violência, o que distingue roubo de furto.
Ainda outro dia alguém de minha família foi convidado a deixar o veículo que usava. Seis horas depois da abordagem nervosa do meliante que se dizia armado mas cuja prova não foi solicitada pela motorista porque nessas horas é melhor não pagar para ver, seis horas depois a Polícia Militar encontrou o veículo numa comunidade de Diadema. Aparentemente intacto. Só aparentemente.
O telefonema do policial comunicando o achado e a intocabilidade do veículo encheram a proprietária do veículo de dupla satisfação. Mas logo o entusiasmo murchou porque as quatro rodas e os quatro pneus não eram exatamente os originais de fábrica. Substituíram os titulares por reservas de quinta categoria. Até agora o veículo está nas oficinas da companhia seguradora porque a demanda por rodas especiais é imensa no mercado paralelo e os fabricantes não dão conta à reposição. E o pior é que tudo isso, ou seja, os subprodutos de criminalidade, se juntam à produção de riqueza e serviços na composição do PIB (Produto Interno Bruto). Mas isso é outro assunto.
Tratamentos distintos
Pelo menos a experiência desagradável de deixar o veículo contra a própria vontade serviu à proprietária para mostrar que há empresas éticas e responsáveis no atendimento à clientela e empresas que maltratam a todos sem pestanejar. A diferença entre o que a Sul-América Seguros ofereceu ao membro de minha família cujo veículo foi encontrado com rodas e pneus para lá de sofríveis e o que essa mesma pessoa viveu nos guichês da Nextel em três oportunidades diferentes de atendimento é algo como deixar o céu e enfrentar o inferno.
A Sul-América deu um show de atenção e desvelo, enquanto a Nextel em Santo André é um convite à irritação, quando não a um boletim policial por abuso da paciência.
De qualquer forma não é nada agradável enfrentar um bandido armado ou não que lhe grita ao ouvido para deixar o carro que ocupa e vê-lo sair a toda velocidade rumo ao desconhecido. Essa forma de delito e também a forma de delito sem uso de violência, apenas com a malandragem de ficar com o bem alheio numa operação furtiva, repetem-se à exaustão na região.
Dados comprometedores
No ano passado a Província do Grande ABC sofreu um bocado nas mãos dos bandidos com vocação à motorização provisória. Ficamos nas últimas posições no ranking do G-20 Paulista, o grupo dos 20 principais municípios paulistas, exceto a Capital, criado por CapitalSocial. Como mostramos em julho deste ano, foram 1.667,97 casos de roubos e furtos para cada grupo de 100 mil veículos na região, contra média de 809,99 casos dos demais municípios paulistas. Nessa contabilidade não entram os dados de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que não constam do G-20. Se entrassem também não mudariam praticamente nada. Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra representam menos de 5% da população e não mais que 2% do PIB da região. Por essas e outras não estão no G-20.
Quando se comparam os integrantes do G-5 (os municípios da Província no G-20) e os demais ocupantes, a diferença é mais que explicativa às razões que nos colocam de quatro ante as companhias de seguros. Basta confrontar os números conjuntos de Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema e Mauá (1.667,97 casos por 100 mil veículos) com os dados dos demais integrantes do G-20 (809,99 casos por 100 mil veículos) para se chegar à diferença de 51,44%. É muito, mas muitíssima diferença. É claro que as apólices de seguro não têm compromisso com filantropia automotiva.
Sabe-se que a Polícia Militar da região está apertando o cerco contra os larápios e conta para tanto com o suporte de nova legislação que inibe a manutenção, quanto mais a proliferação de desmanches, espécies de intermediários entre a bandidagem e o mercado negro de autopeças.
Mas o melhor mesmo é aguardar o balanço desta temporada para avaliar com cuidado até que ponto as medidas vão fazer recuar as marcas nada satisfatórias da região.
Rebaixamento triplo
As três últimas posições do ranking do G-20 na temporada passada foram ocupadas por representações locais (Santo André, Mauá e Diadema, respectivamente em 18º, 19º e 20º lugares), enquanto as outras duas cidades não foram lá essas coisas: São Bernardo ficou em 15º lugar e São Caetano em 14º. Fossem as regras análogas às do Campeonato Brasileiro, teríamos três municípios rebaixados no quesito de furtos e roubos de veículos.
Acredito que as companhias de seguros reúnem divisões estatísticas para definir quem deve pagar mais por uma apólice em condições semelhantes de condutores e veículos. Os dispositivos são vitais para identificar quem é quem. Tanto que enquanto aguardava atendimento na Sul-América e puxava conversa, porque jornalista jamais está de folga, uma das atendentes que se prepara para trocar moradia de Guarulhos por São Bernardo reclamava que teria de pagar R$ 1,2 mil de diferença na apólice de seguro do carro inicialmente cotada naquele Município da Grande São Paulo.
Levando-se em conta que Guarulhos ocupa a 12ª posição no ranking do G-20 de criminalidade no quesito roubos e furtos de veículos em 2013, não é difícil projetar a diferença de cobertura do mesmo veículo se em vez de Guarulhos a nova moradora de São Bernardo contasse com domicílio em Mogi das Cruzes, primeira colocada no ranking do G-20 com 437,61 casos de roubos e furtos de veículos para cada 100 mil veículos no ano passado – 74% menos que a média dos cinco municípios da Província no G-20.
Vale lembrar que não é de hoje que nos preocupamos com esse quesito de desestimulo ao empreendedorismo na região, entre outros efeitos colaterais que atingem a economia e as relações sociais.
Em 2002, por exemplo, mostrei que o custo de apólices de seguro de veículos na região disputava pau a pau com o Rio de Janeiro e a Baixada Fluminense. O proprietário de veículo no Grande ABC corria então risco 18% superior de roubo ou furto em relação à cidade de São Paulo. No ano passado, apesar de mais de uma década de melhora contínua desse indicador no Estado de São Paulo, inclusive na região, a diferença se mantinha em 15% em confronto com a Capital.
Esses 11 anos que separam aquela matéria e o ranking que produzimos em 2013 provam que é mais que improvável uma reversão sustentada de valores monetários a ponto de aproximar a Província do Grande ABC da média de roubos e furtos de veículos de outros territórios. Mas que é sempre bem-vinda a ação mais determinada e organizada da Polícia Militar, inclusive com o uso científico de informações, não resta dúvida. Pelo menos não transmitiremos a ideia de que aperfeiçoamos também nesse campo a imensa capacidade de não enxergar o amanhã.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!