O Ministério Público Estadual instalado na Província do Grande ABC está muito aquém das necessidades. Falta infraestrutura física e de recursos humanos. Por isso, as demandas não são atendidas e quando o são, em muitos casos, como os envolvendo matérias deste jornalista, o atendimento é precário. As instituições da Província que quase nada fazem além de aparecer em colunas sociais deveriam se unir para fortalecer o Ministério Público. Essa é uma das propostas cruciais que proporei aos dirigentes do Diário do Grande ABC -- board no qual estou ingressando -- como política editorial voltada à cidadania.
A quem interessa o Ministério Público fragilizado? Como silenciar ante a precariedade sistêmica que emperra engrenagens sabotadoras da celeridade e da justeza de investigações. Minha experiência profissional em vários casos indica que o MP está desaparelhado para desenvolver funções investigatórias na região quando confrontado com a sobreposição de casos. As exceções confirmam a regra e a realidade.
É preciso ter vocação a camicase ou a idiota juramentado para insistir em reportagens e análises que contemplam falcatruas sobretudo no setor imobiliário. O Ministério Público não presta conta alguma na região. Prevalece um autoritarismo desestimulador a iniciativas que contribuam ao fortalecimento da instituição. A raiz desse transparente desinteresse de integração com peças de um quebra cabeça social que não estão subjugadas pelos poderosos de plantão é principalmente a carência material e de recursos humanos. Fontes não me faltam para dar essa conotação à atuação do MP.
Transferindo problema
Cheguei a ouvir de um atendente do Ministério Público Estadual de Santo André, ao cobrar a ação da instituição no escândalo do Residencial Ventura, que a denúncia foi repassada a outro ramo da instituição que por sua vez nada pode fazer porque não havia meios para tanto. O resultado da operação é que o MP atuou de forma tão flácida que serviu mais como assessoria de defesa dos fraudadores da legislação de uso e ocupação do solo em Santo André.
Havia tantas vertentes à condenação dos infratores que a questão ambiental denunciada como irregular pelo Semasa e estranhamente, na sequência, liberada ao empreendimento sem os devidos reparos, se tornou café pequeno. Pior que isso: como o MP não executou a função que lhe competia e, mais que isso, deu aval àquele empreendimento, só não me trumbiquei na Justiça porque houve um erro processual na origem da queixa-crime apresentada contra mim.
O escândalo do Marco Zero, de Milton Bigucci, será abordado ainda mais detalhadamente nos próximos dias. O engavetamento do processo é algo inacreditável, contra o qual estou tomando iniciativas legais. Não tenho dúvida de que o MP Estadual de São Bernardo, mais especificamente a 12ª Promotoria de Justiça, não contou com condições mínimas para investigar aquele leilão de cartas marcadas. Sozinho, como jornalista, produzi penca de irregularidades cometidas, comprovadas por documentos e testemunhas, mas nada resistiu às esfarrapadas argumentações dos fraudadores, muitas das quais pateticamente contraditórias.
Não fosse persistente e resiliente, sugeriria aos jornalistas em geral que atuam na região o abandono dos pressupostos da profissão para se dedicarem a plantar alface.
Entretanto, uma lufada de esperança de dias diferentes me demove dessa ideia. O Diário do Grande ABC traz hoje uma manchete de página interna que trata da denúncia do próprio jornal sobre empreendimento da Tecnisa em Diadema. Simplesmente se esqueceram de construir, como contrapartida às obras, uma rua entre as avenidas Fábio Eduardo Esquivel e Ulysses Guimarães, no Bairro de Piraporinha.
Estrangulamento viário
O Condema (Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente) revelou na edição de hoje do jornal que o empreendimento está irregular. Imaginem os leitores o tamanho da encrenca em termos de mobilidade urbana quando se sabe que estão sendo construídos 1,6 mil apartamentos. Serão por volta de cinco mil novos moradores na área. Pontos de estrangulamento do trânsito são como pedras nas águas. Os efeitos se irradiam. Um congestionamento na rua da frente tem origem na rua mais da frente ainda. E assim se constrói o caos.
Isso se chama impacto de vizinhança, algo para o qual os administradores públicos em geral não dão a menor bola ou, muito pelo contrário, dominam toda a bola. Há irregularidades potenciais espalhadas por toda a Província do Grande ABC. Posso, de imediato, citar três casos notórios sobre os quais não tenho notícias de atuação do Ministério Público e muito menos das autoridades municipais: o empreendimento Marco Zero, da MBigucci, entre a Avenida Kennedy e a Avenida Senador Vergueiro; o conjunto de apartamentos e salas comerciais do empreendimento Domo, no entorno do Paço Municipal, com dezenas de torres; e o empreendimento localizado ao lado do Shopping ABC, em Santo André, com quase uma dezena de torres de apartamentos.
Quem é do ramo imobiliário, ou seja, quem vive intensamente o dia a dia desses negócios, como os corretores de vendas, poderia multiplicar os pontos nevrálgicos de entupimento do sistema viário da região por causa de irregularidades geralmente originárias nos bastidores das administrações públicas. Ou os leitores acreditam ingenuamente que a Máfia do ISS em São Paulo é um filhote único da corrupção que permeia as atividades imobiliárias?
Financiamento clandestino
O financiamento eleitoral clandestino e também o oficial está intimamente ligado à estrutura de sedução dos agentes imobiliários que atuam na marginalidade ética. O Secovi, o Sindicato da Habitação de São Paulo, ao qual está vinculado o Clube dos Especuladores dirigido por Milton Bigucci, já foi denunciado pelo MP da Capital como fomentador de financiamento eleitoral fora da legislação.
Se o Ministério Público quiser ir adiante para desmascarar dezenas de pontos de estrangulamento da mobilidade urbana decorrente de falcatruas imobiliárias basta sair a campo e ouvir quem entende do assunto, como tenho feito. Sugiro até uma marca para a iniciativa. Que tal Operação Andaime? Garanto que alguns magnatas do mercado de construção civil vão atualizar passaportes se a iniciativa tiver alguma correlação com os rigores da Operação Lava Jato.
Uma campanha em defesa do Ministério Público na Província do Grande ABC é o mínimo que as instituições locais devem promover. Vou propor ao Diário do Grande ABC que tome essa iniciativa. Será um experimento e tanto para saber quem é quem no comando de entidades sociais, políticas, sindicais e econômicas da região. Um bom teste em defesa da cidadania.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!