Sociedade

Máfia do Semasa: agora só falta
MP homenagear os mercadores

DANIEL LIMA - 06/05/2015

O promotor criminal Roberto Wider Filho acaba de denunciar 11 envolvidos na Máfia do Semasa, o escândalo do mercado imobiliário de Santo André em muitos pontos semelhante à Máfia do ISS da Capital. A diferença entre um caso e outro é que aqui só os delinquentes do entorno do então prefeito Aidan Ravin constam da denúncia do Ministério Público. Na Capital houve uma enxurrada de mercadores imobiliários levados à Justiça – inclusive o poderoso Milton Bigucci -- embora ainda falte arrastar para valer o então prefeito Gilberto Kassab à zona de esclarecimentos provavelmente complexos. Aidan teria sido, segundo o MP de Santo André, um meliante amador. Kassab seria outra espécie de controlador da gestão pública.


 


Agora só está faltando o Ministério Público de Santo André prestar homenagem aos ladrões engravatados que há muito e muito tempo tomaram conta dos melhores espaços territoriais da cidade em locupletação total, infringindo muitas das regras de uso e ocupação do solo.


 


É inacreditável a qualquer cristão minimamente esperançoso de que os efeitos colaterais da apuração de escândalos no setor imobiliário na Capital e também da Operação Lava Jato não se espalhariam a Santo André. A Máfia do Semasa é apenas uma subdivisão da imundície generalizada que toma conta há muito tempo das terras de João Ramalho. O denunciante Calixto Antônio Júnior disse a este jornalista em matéria publicada neste espaço que o empresário Milton Bigucci, conhecidíssimo na praça porque está metido em várias situações constrangedoras, era um dos corruptores da Máfia do Semasa. Garantiu que prestou informações ao promotor criminal Roberto Wider Filho.


 


Cadê a varredura?


 


Uma fila de mercadores imobiliários que se deliciaram com um esquema que vem de longe, muito antes de o prefeito Aidan Ravin assumir o cargo, constava da relação de negócios obscuros sugeridos por Calixto Antônio. Tanto que ele desafiou as autoridades constituídas a promoveram varredura nos empreendimentos de grandes marcas nos quatro anos anteriores à denúncia.


 


Não é preciso ser do ramo imobiliário para entender do ramo imobiliário. Pelo menos das ramificações danosas do ramo imobiliário. Basta ter disposição, determinação e empenho para saber que Santo André é uma terra de ninguém, ou melhor, é uma terra de alguns iluminados com trânsito livre nos corredores do poder, quando não em locais discretos, em reuniões paralelas e específicas à orquestração de falcatruas. Pois esses mercadores imobiliários não constam da denúncia do promotor criminal Roberto Wider Filho.


 


Para poupar os leitores de recorrerem ao texto completo da matéria que publiquei em dois de agosto de 2012, seleciono alguns parágrafos que dão a dimensão do quanto a denúncia do promotor criminal de Santo André está manquitola, porque não contempla o outro lado do balcão de roubalheiras organizadas. Leiam:


 


 O advogado Antonio Calixto Junior volta às 14h desta terça-feira ao Ministério Público de Santo André para renovar o depoimento prestado ao promotor criminal Roberto Wilder Filho sobre a Máfia do Semasa. (...). Calixto saiu do noticiário político desde que o calendário eleitoral ganhou prioridade e as irregularidades na autarquia de água e esgoto da Prefeitura de Santo André passaram a ser interpretadas como uma agenda incômoda a vários atores políticos. Isolado e cada vez mais preocupado com a própria segurança pessoal, Calixto Antonio Júnior parece disposto a tudo para dar nova dinâmica às denúncias. O chamamento do MP é a oportunidade que aguardava para fortalecer o arsenal de informações que comprometeriam o prefeito de Santo André. Um dos pontos nucleares do depoimento (...) é o manancial de delitos à liberação de grandes empreendimentos imobiliários em Santo André nos últimos anos, durante o período mais fértil do setor embalado por muito crédito. Repetindo o que afirmara no depoimento no Legislativo de Santo André, Calixto vai reiterar ao MP que basta uma devassa nos trâmites burocráticos das 40 maiores obras privadas em Santo André nos últimos anos para escarafunchar meandros da corrupção que emanava, segundo afirma, do chefe do Executivo. O advogado correlaciona algumas irregularidades na aprovação de empreendimentos imobiliários em Santo André ao escândalo em São Paulo envolvendo principalmente empreendimentos de shopping centers. No caso de Santo André, o direcionamento de investigações deve se concentrar nos lançamentos residenciais. (...). No depoimento programado pelo Ministério Público o advogado espera informações sobre a quebra do sigilo telefônico proposto para comprovar as ligações que manteve com o chefe do Executivo e assessores durante o período em que, escalado por Aidan Ravin, atuou diretamente na liberação formal de pagamentos a fornecedores da autarquia e também na concessão de licenças aos empreendimentos imobiliários. (...). Calixto Antonio é enfático ao afirmar que as grandes obras privadas em Santo André jogaram na lata do lixo restrições legais de uso e ocupação do solo, alterando-se completamente as estruturas de plantas, principalmente residenciais. Teria havido um festival de distribuição de vantagens e privilégios por conta de facilidades sob garantia de imunidade fiscalizatória. (...). O assunto é corrosivo porque atinge o núcleo da Administração Aidan Ravin e pode chegar também ao quintal do PT. O alvo principal das denúncias de Calixto Antonio Júnior, Roberto Tokuzumi, então diretor do Departamento de gestão Ambiental do Semasa, mantinha até então contrato de prestação de serviços como pessoa jurídica com a Prefeitura de São Bernardo, comandada pelo petista Luiz Marinho. (...). O mapa da mina de desmascaramentos são as grandes obras imobiliárias, cujas especificidades determinadas pela legislação de uso e ocupação do solo ganharam elasticidade ao sabor de propinas em forma de dinheiro e de farta distribuição de apartamentos. Algo que guardaria semelhança com o escândalo da Administração Gilberto Kassab.


 


Coletiva sem contraditório?


 


Consta que o promotor Roberto Wider Filho anunciou a relação dos 11 denunciados à Justiça numa entrevista coletiva aos jornalistas. A leitura dos textos do Diário do Grande ABC, do ABCD Maior e do Repórter Diário indica que o encontro foi um monólogo comandado pelo investigador do Ministério Público Estadual. Se não o foi, os jornalistas aceitaram passivamente – provavelmente porque despreparados para o que poderia ser um efervescente encontro – o relatório do promotor, em detrimento do contraditório geneticamente explicativo à função de informar.


 


Até pensei em me deslocar àquela entrevista coletiva. Fiz muito bem em ter priorizado outro compromisso no mesmo horário. Não resistiria ao questionamento sobre a imunidade generalizada aos delinquentes do mercado imobiliário, os mercadores imobiliários, como tenho cansado de escrever.


 


É frustrante que a crosta de ladrões engravatados que tornam a mobilidade urbana cada vez pior na região, não apenas em Santo André, saia desse jogo com medalhas no peito. Nem vou lamentar o silêncio vergonhoso de instâncias privadas de Santo André, sobretudo a unidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) comandada por Fábio Picarelli, testemunha de defesa de Milton Bigucci num processo que legitima a idoneidade deste jornalista, ou da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André), entre outras nulidades institucionais que, covardemente, para não dizer conveniência de sempre, legitima a aberração do promotor criminal.


 


O time de 11 delinquentes apontados pelo MP é apenas uma parte do enredo de malandragens expostas no escândalo do Semasa que, com outras roupagens mas seguindo um ritual típico de prostíbulos, segue a deitar e a rolar. 


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