Sociedade

Cartão vermelho às entidades de
classe vem do passado de inércia

DANIEL LIMA - 22/05/2015

Bater nas associações de classe é um negócio excelente, excelentíssimo, para a alma, para a credibilidade, para o compromisso com a sociedade, mas também é penoso, porque tudo poderia ser diferente. As entidades sociais, empresariais e sindicais da região, com exceções que confirmam a regra, não têm o respaldo dos formadores de opinião. E isso faz tempo. Por isso precisam ser repensadas, atualizadas, monitoradas. Para o bem de todos. Mantê-las protegidas em nome de uma falsidade evolutiva, a falsidade de que seriam importantes demais para sofrerem efeitos de metralhadoras críticas, é uma velha e surrada cantilena que os espertalhões semânticos sempre puxaram da bainha da safadeza.


 


Em 2011, quando ainda mantinha o que chamava de Conselho Editorial desta publicação digital, herdada dos tempos da revista LivreMercado, indaguei a 123 conselheiros sobre a percepção que tinham dessas instituições. Nada menos que 113 responderam à enquete em correio eletrônico. Os resultados foram danosos aos ilusionistas que acreditam gozar de prestígio só porque integram determinadas diretorias e conselhos corporativos.


 


Resultados catastróficos


 


Uma das perguntas que fizemos àqueles conselheiros estava direcionada diretamente às entidades de classe empresarial. Aqueles que assinalaram a alternativa de que eram bastante efetivas e promoviam grandes ações regionais não passaram de 14%. Quem considerava que eram apenas entidades corporativas a olhar para o próprio umbigo chegou a 68% dos apontamentos. Já os mais céticos, que consideravam as organizações empresariais improdutivas, chegaram a 18%.


 


Quando se colocou na mesa de definição o papel das entidades sindicais, os resultados também foram tenebrosos. Apenas 8% dos conselheiros editoriais disseram que eram bastante produtivas para o conjunto da sociedade. Nada menos que 65% optaram pelo enunciado que dava conta de que estavam muito aquém do que a sociedade regional exige. E outros 27% disseram que os sindicalistas cuidavam apenas de seus próprios interesses.


 


As entidades sociais tiveram resultados menos rigorosos: 35% dos conselheiros responderam que eram extremamente participativas e integrativas com o conjunto da sociedade regional, a maioria de 45% afirmou que as associações sociais não saem do próprio casulo, sem se incomodar com a sociedade, enquanto 14% afirmaram que seus dirigentes estavam absolutamente inertes, inclusive intestinamente.


 


Escrevi à época da análise desses números: “A conclusão a que se chega é simples, sem reducionismos maniqueístas: as entidades empresariais e sindicais receberam cartão vermelho sem pestanejar, enquanto as entidades sociais foram primeiramente advertidas com o cartão amarelo, para depois serem expulsas do campo da responsabilidade social.


 


Também escrevi naquele artigo de 2011: “A pauta jornalística precisa se atualizar também, porque está mais que evidenciado que a maioria dos representantes das entidades locais não fala nem mesmo por seus supostos representados, quanto mais pelo universo da população”.


 


Situação grave


 


Alguém tem dúvidas de que nesses últimos quatro anos a temperatura crítica dos formadores de opinião aumentou e com isso provavelmente está a chamuscar ainda mais o grau de avaliação dessas instituições?


 


Por essas e por outras diria sem medo de errar -- porque o gol está escancaradamente aberto a comemorações -- que os veículos de comunicação da região que teimarem em proporcionar tratamento de celebridade a dirigentes que não oferecem respostas às demandas da sociedade estarão condenados a desaparecer da praça, se desaparecer da praça significar um grau mínimo de credibilidade do que levam aos leitores, ouvintes e telespectadores.


 


No fundo, no fundo, o que quero dizer é que os ocupantes das moitas de improdutividades institucionais na região precisam ser devidamente cutucados. Afinal, eles representam duplo prejuízo à sociedade: primeiro porque ocupam espaços apenas formalmente, sem capacidade ou interesse de justificar os desígnios ditados por uma situação econômica grave que vem de longe; segundo porque impedem que haja reoxigenação dos organismos associativos, que poderiam ser ocupados por gente sedenta por mudanças.


 


Os ocupantes dessas moitas protegidíssimas ainda por gente que não entende do riscado de demandas sociais não precisam pedir para deserdar, precisam simplesmente cair na real de que não estão dando no couro para a reforma de que a região carece.


 


Rompimentos necessários


 


Tenham certeza os leitores de que gostaria imensamente de estar a escrever sobre uma revolução regional que desafiaria o lugar-comum de indolência que marca a história da quase totalidade dos municípios brasileiros, igualmente dominados por castas econômicas e políticas que não estão nem aí com o cheiro da brilhantina do desenvolvimento econômico. Contamos com individualidades, inclusive nas organizações classistas muito mal vistas pelos formadores de opinião, que poderiam contribuir imensamente às transformações de que precisamos. Basta que se crie coragem para rompimentos que já não podem esperar.


 


Há de prevalecer num futuro que parece já ter chegado o registro de mudanças substantivas no tecido institucional esclerosado que nos deixaram. Afinal, agora o Diário do Grande ABC entrou na briga por uma região menos corporativista, menos tradicionalista, menos com cara de capitanias hereditárias.  Passar por essa vida como jornalista ou como profissional de qualquer atividade com sede de novidades e ter de encarar uma longevidade de compadrios e favoritismos que parecia interminável seria uma tremenda frustração.


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