Se todo especulador imobiliário fosse obrigado a utilizar tornozeleira eletrônica que emitisse sons carnavalescos provavelmente poucos conseguiriam incomodar tanto os vizinhos de trabalho e de domicílio como Milton Bigucci, presidente do Clube dos Construtores do Grande ABC, entidade que tem outro nome de batismo mas cuja denominação explicativa e apropriada é mesmo Clube dos Especuladores Imobiliários.
Milton Bigucci é espécie de Espertíssima Trindade do setor, porque é um péssimo conselheiro aos compradores de imóveis quando trata de valores do metro quadrado. Vou explicar por que Milton Bigucci é Espertíssima Trindade, já que parece estar devidamente claro as razões de sugerir o uso de tornozeleira eletrônica. Quem imaginou outra coisa possivelmente recorre a Sigmund Freud. Se é que me entendem.
Fosse apenas presidente do conglomerado MBigucci, o milionário e intolerante Milton Bigucci apenas teria seguido a rotina dos empresários do setor que se utilizam da mídia e de outros mecanismos exploratórios para inflar o valor do metro quadrado construído do mercado imobiliário. Trata-se de uma versatilidade um tanto quanto distorcida do conceito de moralidade, mas faz parte do jogo do capitalismo. Nada impede, portanto, que o empresário Milton Bigucci atue também como corretor de imóveis. O problema é que a Espertíssima Trindade se manifesta de forma irregular e antiética, para dizer o mínimo, quando ele faz uso da mídia como presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários.
Atuação escandalosa
O conflito de Milton Bigucci múltiplo como presidente de uma empresa de construção, corretor de imóveis e suposta liderança de classe (apenas supostamente, porque a entidade que dirige é um farrapo de institucionalidade) é tão notório quando escandaloso. E seria mesmo que não transgredisse as regras de um capitalismo minimamente saudável. O que não é o caso em se tratando de avaliação do espaço territorial de negócios, matéria-prima dos empreendimentos imobiliários. Como se já não houvesse um acumulado de ônus do empresário no Ministério Público, no Judiciário e também em instâncias administrativas do poder público municipal, caso da Máfia do ISS na Capital.
Ainda recentemente, na sanha de judicializar a liberdade de imprensa com responsabilidade social que este jornalista exerce há 50 anos, Milton Bigucci ingressou na Justiça com mais uma queixa-crime para tentar me calar ou me trancafiar numa prisão qualquer, ou mesmo levar ao público sentença judicial que só Deus sabe como se cristalizou.
Milton Bigucci não gostou das críticas deste jornalista à entidade que dirige. Quando ele entrou com a queixa-crime, ainda não me utilizava da expressão “Clube dos Especuladores Imobiliários”. Imaginem então o que anda a pretender após este jornalista abandonar de vez a nomenclatura daquela farsa institucional e também aposentar uma identidade que criou em seguida, no caso Clube dos Construtores.
Clube dos Especuladores é perfeito no encaixe. Quem ainda duvida não pode deixar de consumir este artigo. O que se pode falar de um presidente de uma entidade que lhe serve para dar ares de institucionalidade junto à mídia, principalmente, quando de fato a utiliza para especulação imobiliária graduadíssima?
Agora, números manipulados
Ainda outro dia – e agora chego finalmente às provas do crime de que o acuso – Milton Bigucci deu uma entrevista a uma emissora de televisão afirmando que o preço do metro quadrado médio na Província do Grande ABC é de R$ 5 mil na área habitacional, para apartamentos novos. Anteriormente, fizera o mesmo.
Hoje o Diário do Grande ABC (e outros jornais) traz numa das páginas de economia dados da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), em parceria com o portal Zap Imóveis, sobre o preço do metro quadrado construído em 20 cidades brasileiras. Santo André, São Bernardo e São Caetano estão na lista. Os números se assemelham às informações de Milton Bigucci, a Espertíssima Trindade. O valor do metro quadrado em São Caetano em maio é de R$ 5.691, em Santo André de R$ 4.982 e o de São Bernardo de R$ 4.704.
São números com certo grau de superavalização, porque se tratam de ofertas disponíveis na Internet, não de venda consumada. Há uma gordura de pelo menos 20%, para ser generoso. Liquidações de construtoras e incorporadoras em apuros chegam a 40%. Nem a MBigucci escapou de feirões para desovar encalhes. A especulação, portanto, segue a campear num ambiente de PIB contracionista, de emprego que se esfarela e de política que se amesquinha ainda mais.
Perguntaria então os leitores onde está a lógica de chamar neste caso o presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC de especulador incontestável. Uma resposta tão fácil quanto roubar doce de criancinha. O passado de Milton Bigucci o condena. Ele faz no passado o que pratica no presente. É a força da natureza. Como o escorpião que pegou carona no sapo na travessia do rio.
Responsabilidade social
Milton Bigucci especula sempre como dirigente de classe de uma atividade com forte imbricamento social. Comete crime contra a economia popular. Se agisse dessa forma delitiva apenas como empresário e como corretor de imóveis, os outros dois lados da Espertíssima Trindade, correria na mesma raia da maioria dos profissionais do setor e, portanto, não poderia ser distinguido em meio à multidão. Mas como dirigente classista que se utiliza da boa fé da mídia pouco especialista no assunto, ele comete crime e simboliza a organização que dirige desde muito antes do Muro de Berlim vir abaixo.
Vamos à primeira das escorregadelas de Milton Bigucci como agente imobiliário para provar que se utiliza de maquiavelismo ou ignorância para transformar o setor em imensa bolsa especulativa. São muitas as provas do crime, mas recorro apenas a uma matéria publicada na edição de 1º de outubro de 2012, do jornal Diário Regional. Está lá, em manchete: “Preço de imóveis do ABC deve estabilizar em 2012”. Vou transcrever apenas os trechos que dizem respeito ao valor do metro quadrado construído:
Segundo dados da Acigabc, a região central de São Caetano liderou o ranking do metro quadrado residencial mais caro da região, com preço médio de R$ 5,5 mil. São Bernardo e Santo André empataram na segunda colocação, com R$ 4, 8 mil o metro quadrado. Diadema aparece em seguida, com R$ 4,3 mil. (...) Para quem busca comprar um terreno ou mesmo um imóvel já construído, os números ainda assustam, mas para Bigucci o valor cobrado está de acordo com o mercado. “Acho o preço justo pela grande concorrência entre as construtoras e pela alta dos valores dos terrenos e dos materiais de construção”, avaliou o dirigente, pontuando que há perspectiva de crescimento do setor para 2012 – afirmou o jornal.
Valorização constante
Nos anos seguintes, Milton Bigucci seguiu desfilando números sempre crescentes de valorização do metro quadrado médio de imóveis na Província do Grande ABC. Números muito acima da inflação do período. Um estrondoso trambique avaliativo. Basta utilizar do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Ampliado) entre o mês anterior à publicação daquela matéria e abril deste ano, quando fechou a tabela de avaliação do índice FipeZap. Quem o fizer vai pegar o presidente do Clube dos Especuladores de cueca de imprevidência informativa.
Notem que o cálculo, repito, está indexado à inflação do período de setembro de 2012 a abril deste ano. Quem acompanha o noticiário sobre o mercado imobiliário sabe que todas as fontes afirmaram ao longo dos anos que a valorização se sustentou muito acima da inflação. Apenas nos últimos meses há uma corrida quase que na mesma velocidade -- ainda segundo as fontes suspeitas que dirigem o setor-- com levíssima supremacia da inflação. O que também não corresponde à realidade: enquanto a inflação sobe demais o metro quadrado construído desaba ante o excesso de ofertas.
Inflando valores
Fomos às contas e descobrimos que o IPCA acumulado no período mencionado – sem incluir maio, já nas contas do FipZap -- chegou a 20,8%. Como Milton Bigucci afirmou lá atrás que o metro quadrado médio construído em São Caetano estava avaliado em R$ 5,5 mil, agora teria de estar, no mínimo, em R$ 6.640. Como está, mesmo com especulação notória, em R$ 5.691, a perda no período para quem acreditou que imóvel seria um grande negócio chega a 14,3%. No caso de Santo André, ainda seguindo as declarações de Milton Bigucci, o preço do metro quadro construído em setembro de 2012 de R$ 4,8 mil chegaria a R$ 5.798 com a simples correção pelo IPCA. Hoje, segundo a FipeZap, não passa de R$ 4.982. Uma diferença de 14%. Já em São Bernardo, cujo valor do metro quadrado avaliado por Milton Bigucci em setembro de 2012 era igualmente de R$ 4,8 mil, e hoje é de R$ 4.704, a perda com o deflacionamento do valor original que alcança R$ 5.798 chega a 19%.
Ou seja: ao mensurar essa massaroca de dados, a conclusão a que se chega quando se comparam as informações de Milton Bigucci na origem dos valores e os valores atuais é que a compra de imóvel novo para residência se tornou uma grande roubada. Os compradores perderam e continuarão a perder, porque agora a porca da especulação do passado começou a torcer o rabo diante da recessão econômica ditada por um consumismo sem base produtiva.
Financiando a especulação
Como a maioria dos adquirentes de imóveis só fechou negócios por conta de financiamento bancário, tudo indica que, quando a ficha da desvalorização ditada pela especulação começar a cair, não faltarão arrependimentos e exasperações. Eles pagarão em algumas dezenas de anos prestações infladas na origem de valores estratosféricos ditados por especuladores imobiliários em geral, mas principalmente por especuladores imobiliários travestidos de dirigentes de classe como Milton Bigucci.
Deixo para outra edição as barbeiragens de aconselhamento (aconselhamento?) de Milton Bigucci sobre o mercado imobiliário na área comercial. É impressionante a capacidade do dirigente em errar o alvo sempre a favor da especulação e em detrimento da confiança e do bolso dos investidores.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!