Sociedade

E o Prêmio Bernard Madoff vai para
quem mesmo? Basta pensar um pouco

DANIEL LIMA - 06/10/2015

Não tenho faz muito tempo o menor interesse de reproduzir a melhor e mais séria premiação regional que este Pais já conheceu, o Prêmio Desempenho, dirigido por mim durante 15 anos seguidos e por anos e anos submetida de verdadeira a auditorias externas. Convites não faltaram nos últimos anos para reviver aquele evento. Tenho vontade mesmo de criar outra premiação, em contraponto àquela. Algo como o Prêmio Bernard Madoff.


 


Surgiu-me essa ideia ao constatar nestes dias mais um capítulo de enganação generalizada na esteira de eventos que conferem láureas que nem de longe têm qualquer semelhança com a atividade real e obscura de alguns vencedores. São eventos encomendados, os quais, ao contrário do que pensam e acreditam os provincianos destas plagas, também são comuns na vizinha Capital que tanto admiramos inadvertidamente porque parece heresia desconfiar que na Cinderela não exista conchavo a compor grupelhos previamente doutrinados à louvação marquetológica.


 


Traduzindo essa linguagem mais educada: há premiações fajutas em todas as praças desse Brasil varonil porque existe entre organizadores e premiados acordo tácito de fingir que tudo que é dito no palco ou nas coxias é verdadeiro.


 


Alguns eventos desse tipo certamente seriam rechaçados se programados para certos antros de sexo consentido desde que devidamente pago. Pelo menos nesses antros um e outro orgasmos são verdadeiros, mesmo que por descuido.


 


Parece mas não é


 


Não usaria na contrapremiação do Prêmio Desempenho, ou seja, no prêmio destinado a malandros juramentados, nenhuma identificação com alguma personalidade que tenha passado ou esteja na região a provocar sussurros e gemidos de medo, quando não arrepios, porque deram ou estão a dar golpes na praça. Muitos já passaram por aqui e vários estão por aqui a bagunçar o coreto de responsabilidade social, responsabilidade ambiental, responsabilidade de todos os tipos. Gente que posa de mocinho mas não passa mesmo de réplica de Romero Rômulo, o herói-vilão da novela das nove e meia -- aquele que parece mas não é, aquele que nas horas vagas é ativista social mas labute de fato como integrante ambicioso de uma facção criminosa.


 


Cheguei a pensar em utilizar a marca Prêmio Romero Rômulo em vez de Prêmio Bernard Madoff. Refleti muito e preferi mesmo optar pelo malandro estrangeiro. Acho que se fosse levar a sério essa proposta contraventora de promover uma premiação em circuito fechado para homenagear a cada temporada um grande trambiqueiro da praça ficaria mesmo com o Prêmio Bernard Madoff. É melhor ficar com a realidade estrangeira por ser fruto da realidade dos fatos. Romero Rômulo tem tudo de verdadeiro, menos o nome de batismo, ungido num folhetim que traz o submundo -- ou seria o mundo mais claramente formalizado? -- do Rio de Janeiro.


 


Prêmio Bernard Madoff me parece mesmo imbatível. Popularizar a marca na Província do Grande ABC não seria tarefa tão difícil porque, no circuito que interessa, entre os formadores de opinião e tomadores de decisão deste Bicho de Sete Cabeças, muitos dos candidatos já são bastante conhecidos. Bastaria, portanto, consagrá-los oficialmente.


 


Destaque internacional


 


Bernard Madoff, ensina o Google para quem não quer perder tempo, foi o presidente de uma sociedade de investimentos que tem o seu nome e que fundou em 1960. Uma sociedade que se notabilizou como uma das mais importantes da comunidade financeira de Wall Street. Madoff também foi um dos principais nomes da filantropia judaica. Detido em 2008 pelo FBI e acusado de fraude, Madoff teve todos os bens congelados. As fraudes que ele comandou passariam de US$ 65 bilhões. Madoff foi reverenciado durante anos pela mídia norte-americana. Saiu em capas de revistas prestigiadíssimas. Foi fotografado ao lado de figurinhas carimbadas do mundo político e financeiro dos Estados Unidos.


 


Não havia no universo dos negócios dos Estados Unidos ninguém com o porte moral de Bernard Madoff. Por isso a fraude financeira de prometer e não entregar causou estragos de todos os tipos. A Justiça, ao contrário do que vivemos aqui, principalmente na região, não lhe deu trégua. Os fundos financeiros geridos pelos empreendimentos de Bernard Madoff eram tão falsamente robustos como a estrutura de recursos humanos que os sustentava. Descobriu-se que o grupo de executivos de Madoff trabalhava num pequeno escritório. Eram poucos os profissionais da malandragem bilionária.


 


Guardadas as devidas proporções financeiras, há Madoffs espalhados por todos os territórios da região. Uns mais que outros. Uns, inclusive, semelhantemente a Madoff, que levam no bico gente despreparada que lhes confere algum tipo de reconhecimento sem levar em conta informações preciosas que ultrapassam as planilhas de resultados.


 


Rompendo barreiras


 


Acho que durante 15 anos do Prêmio Desempenho acabamos por conferir troféus a alguns Madoffs da vida regional. Apesar de cercar o touro da mentira deslavada e das jogadas de marketing planejadamente orquestradas para vender o que não se tinha, os limites para driblar a rede de proteção daquela premiação não se assemelhavam ao conhecimento divino. Um Conselho Editorial que chegou a contar com 250 integrantes da sociedade regional era um dispositivo e tanto para inibir falcatruas de falsos cases. Exceto se os conselheiros fossem um bando de covardes – avaliação que descarto – picaretas juramentados poderiam chegar ao topo classificatório.


 


É claro que o Prêmio Desempenho (conferido conforme o conteúdo dos cases publicados na revista LivreMercado) não estava a salvo de desgraças no futuro. Um empreendimento vitorioso hoje com todos os méritos pode vir a sucumbir amanhã, inclusive sob o peso de maracutaias posteriores à premiação.


 


Não foi exatamente esse o caso da TAM, companhia aérea que ganhou o prêmio maior da revista Exame e, em seguida, teve uma aeronave espatifada nas imediações do Aeroporto de Congonhas. Um desastre que fez quase duas centenas de vítimas fatais. Uma baita falta de sorte daquela publicação, sem dúvida. O Prêmio Desempenho escapou de algo tão retumbante.


 


O Prêmio Bernard Madoff que poderia ser entregue na região não estaria direcionado a nenhuma área de atividade econômica específica. Seria uma láurea que abrangeria potencialmente protagonistas de todos os setores. Simbolizaria uma advertência pública à pilantragem ao associar duas motivações nobres: impedir que a sociedade continue a ser enganada por traficantes de ilusões e, também, estimular que organizadores de premiações sem critérios substantivos fossem dissuadidos a contemplar esse tipo de delinquente. Afinal, não existe nada mais depreciativo a qualquer premiação que o conhecimento público invisível ou não de que o vencedor não passa de impostor. Um Romero Rômulo de agora. Um Bernard Madoff de sempre.


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