Historicamente fragmentados, os Ciesps (Centros das Indústrias do Estado de São Paulo) do Grande ABC têm ação conjunta de que se orgulhar: a cooperativa de crédito criada pelas regionais de São Bernardo, Diadema, São Caetano e Santo André, que agrega também Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, alcançou resultados expressivos em menos de um ano de atividade. A Sicredi Ciesp ABCD agrega 187 associadas, administra R$ 3 milhões em investimentos e contabiliza inadimplência zero. Isso mesmo.
Os recursos tomados pelas associadas são religiosamente devolvidos nos prazos acertados. A razão do sucesso é simples: para micros e pequenos empresários asfixiados pela alta carga tributária e pela competitividade radicalizada na abertura econômica, a possibilidade de reduzir custos financeiros — foco da cooperativa de crédito — assume caráter emergencial.
Os Ciesps do Grande ABC não inventaram o sistema que torna operações financeiras mais econômicas, mas têm o mérito de mergulhar na idéia defendida pelo conglomerado Fiesp/Ciesp. “No passado, empresas de setores distintos não podiam formar cooperativas de crédito, mas trabalhos de assessoria e convencimento da direção estadual de Ciesp e Fiesp levaram o governo a mudar as regras do Banco Central em 2003” — contextualiza César Garbus, presidente da Sicredi Ciesp ABCD, conselheiro do Ciesp de São Bernardo, do qual foi diretor-titular até o ano passado, e membro da diretoria executiva da entidade em nível estadual.
Dois seguidores
Entre dezenas de ramificações do Ciesp no Estado, apenas duas unidades adotaram cooperativas de crédito nos moldes do Grande ABC. Sertãozinho e Birigui, pólos de agronegócios e calçados. Mas é na região de sete cidades e 2,5 milhões de habitantes que o sistema atinge estágio mais avançado — e não apenas por implodir históricas jurisdições municipais. A Sicredi Fiesp ABCD foi formada em setembro de 2004 por 30 empresários que investiram R$ 5 mil cada, além de R$ 300 mil garantidos pelo Ciesp estadual. Onze meses depois, o aporte inicial de R$ 450 mil foi multiplicado por sete com a adesão de 150 novas empresas. “A cada mês a cooperativa ganha de 10 a 12 associados” — comemora César Garbus.
Antes de entender o crescimento é preciso saber que uma cooperativa de crédito presta os mesmos serviços de um banco. A diferença é que pertence a todos os associados, não visa lucro, usufrui de isenção de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e, por isso, oferece condições vantajosas em relação aos bancos comerciais.
Para se tornar sócio do clube financeiro é preciso adquirir cota cujo valor varia de acordo com o tamanho da empresa: R$ 2 mil para micros, R$ 6 mil para pequenas, R$ 12 mil para médias e R$ 20 mil para as de grande porte. Em todos os casos, é possível depositar 25% à vista e os 75% restantes em 15 parcelas. “O valor da cota fica depositado e é devolvido quando o associado se desliga da cooperativa” — explica Antônio Marcos Garcia, gerente da unidade de atendimento instalada junto à sede do Ciesp São Bernardo, no Bairro Nova Petrópolis. “Felizmente até agora ninguém se desligou” — completa o executivo.
Passaporte de vantagens
Ao adquirir cota, o associado carimba o passaporte às vantagens do cooperativismo. A lista de produtos e serviços isentos de taxa inclui abertura de contas, manutenção de conta corrente, cartão magnético, talão de cheques, internet banking, recebimentos de pagamentos e renovação de ficha cadastral. Além disso, acena com investimentos mais apetitosos e empréstimos menos indigestos que os oferecidos pelos bancos. “Nas aplicações em CDB (Certificado de Depósito Bancário) a remuneração atinge 99% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), melhor do que qualquer operação de renda fixa do mercado” — ressalta o gerente Marcos Garcia.
A lista de produtos e serviços da Sicredi Ciesp ABCD mostra ainda que a taxa sobre o cheque especial é de 4,5% ao mês, de 5% ao mês no cartão de crédito, de 2,7% ao mês para capital de giro em 12 parcelas e de 2,5% ao mês para hot money com prazo de até 28 dias. “A taxa é 30% mais baixa em relação ao mercado para crédito de capital de giro, desconto de duplicatas, crédito rotativo e conta garantida” — sintetiza Marcos Garcia.
A estrutura enxuta também converge para a economia. A agência instalada no Ciesp de São Bernardo (ou unidade de atendimento, no jargão politicamente correto das cooperativas) possui dois caixas e apenas três funcionários, incluindo Marcos Garcia. O mesmo modelo de eficiência será levado a Santo André, onde os diretores projetam a segunda unidade junto ao Ciesp local, como em São Bernardo.
Colchão de reservas
Dos R$ 3 milhões administrados pela Sicredi Ciesp ABC, cerca de R$ 2 milhões estão emprestados e R$ 1 milhão formam o colchão de reservas disponível para saques. Representa a liquidez da cooperativa, no jargão de Marcos Garcia. A inadimplência praticamente zero e atribuída à interação de agentes produtivos e financeiros que se revezam em papéis opostos de credores e devedores, mas acima de tudo usuários de sistema no qual se reconhecem interdependentes.
Não é a toa que a iniciativa leva a marca Sicredi. A sigla para Sistema de Crédito Cooperativo denota uma das principais cooperativas de crédito do País, criada há mais de 100 anos por agricultores do Sul do País e que contabiliza 127 núcleos, mais de 800 unidades de atendimento e cinco centrais administrativas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo. “Em nível nacional o Sicredi administra recursos que totalizam R$ 4 bilhões, dos quais cerca de R$ 2 bilhões estão emprestados” — explica Marcos Garcia.
Ao expertise exógeno é adicionado envolvimento local. A diretoria executiva e os conselhos administrativo e fiscal da Sicredi regional contam com integrantes dos Ciesps do Grande ABC. O conselho de administração se reúne mensalmente para discutir temas como taxas de juro, tarifas, investimentos e contratação de funcionários. Os membros do conselho fiscal se encontram com a mesma periodicidade para verificar contas e checar se o movimento de empréstimos e aplicações responde a parâmetros de sustentabilidade.
Futuro promissor
Marcos Garcia e César Garbus enxergam futuro promissor para a cooperativa na região. “Na Europa, as cooperativas respondem por 30% da movimentação financeira e nos Estados Unidos por 25%. Mas não é preciso ir muito longe. No Sul do País cooperativas de crédito já atuam como balizadores de mercado, isto é, influenciam na taxa cobrada pelos bancos” — ilustra o gerente. “O crescimento é natural porque os associados só têm a ganhar” — raciocina Garbus, que projeta uma agência para cada cidade num futuro não muito distante.
Levando-se em conta as 850 empresas filiadas aos Ciesps do Grande ABC, é possível que a cooperativa multiplique por quatro o universo de 187 filiadas apenas se conseguir adesão total dos quadros da entidade.
Argumentos para arregimentar novos sócios não faltam. “Micros e pequenos empresários sempre tiveram muita dificuldade em obter crédito porque os bancos só se interessam pelas grandes empresas, que oferecem mais garantias e trabalham com volumes maiores. Agora, em vez de recorrer a parentes e amigos, como é comum, podem contar com o apoio de uma instituição financeira formalizada e da qual são donos, mais do que clientes em apuros como se estivessem em busca de favor” — explica César Garbus.
Marcos Garcia lembra ainda que no final de cada exercício contábil anual os associados compartilham sobras financeiras. “Os dividendos que seriam apropriados por acionistas em uma instituição convencional é repartido entre todos os associados” — explica o executivo.
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