Economia

Peregrinação
capitalista

DA REDAÇÃO - 05/03/1997

O brasileiro Fernando Lohmann, cônsul honorário de Cingapura no Brasil, iniciou no último mês peregrinação capitalista no Grande ABC. Representante do governo daquela cidade-Estado do Sudeste Asiático, e atuando em conjunto com a Câmara de Comércio Brasil-Cingapura, Fernando Lohmann quer ver pequenas e médias empresas da região realizando interfaces comerciais com o que chama de porta de entrada para a Ásia. Depois de encontros com os prefeitos Celso Daniel (em Santo André) e Maurício Soares (em São Bernardo), e também de reunião com empresários promovida pela Regional do Sebrae, Fernando Lohmann acredita que desdobramentos vão ocorrer. "A modernização industrial da região pode ter parceria ideal com Cingapura", garante Lohmann. 

Ex-executivo da Interbrás, braço da Petrobrás que o ex-presidente Fernando Collor desativou, e também de outras empresas, o engenheiro eletricista e nuclear Fernando Lohmann conhece a realidade dos tigres asiáticos há 15 anos. Mas é Cingapura que o seduz. Com território físico inferior ao Grande ABC, pois tem 642 quilômetros quadrados contra 841, e com população levemente superior, com 3,0 milhões contra 2,3 milhões da região, Cingapura é uma das vitrines vivas dos efeitos da globalização. 

Os números do seu comércio internacional no ano passado, isto é, o movimento de exportações e importações, de US$ 250 bilhões, supera em duas vezes e meia a performance brasileira. Apesar do volume, o superávit acumulado não passou de US$ 7 bilhões, o que explicita o grau de abertura das relações. 

Pela primeira vez, no ano passado, Cingapura apresentou superávit comercial com o Brasil. Foram US$ 200 milhões de vantagem: exportou US$ 600 milhões, sobretudo eletroeletrônicos, materiais de telecomunicações e de informática, entre outros, e importou U$% 400 milhões, principalmente de commodities agrícolas, semimanufaturados, petroquímicos, alimentos e autopeças. 

A pauta de importações e exportações é reveladora do perfil econômico de Cingapura. Falta-lhe matéria prima abundante no Brasil, mas sobra-lhe capacidade de agregar valor à produção de bens porque conta com invejável estrutura educacional, goza de estabilidade político-econômica e detém infra-estrutura que faz inveja ao Custo Brasil. 

O porto de Cingapura movimenta 13 milhões de containeres por ano, contra menos de dois milhões de todos os portos brasileiros. "Quando digo que Cingapura está aberta aos empresários brasileiros, particularmente aos do Grande ABC, não significa que o relacionamento deve se restringir exclusivamente aos aspectos comerciais. O gerenciamento do porto de Cingapura é o ponto-chave da competitividade e deveria ser estudado a fundo para aplicação no território brasileiro. Privatizar é uma simples transferência de ativo. A gestão do negócio é que faz a diferença"—afirma Lohmann. 

Um tigre robusto 

Cingapura é um tigre robusto também porque sabe poupar à invejável taxa de 48% em relação ao PIB, contra 17% dos brasileiros. Suas reservas cambiais de US$ 80 bilhões superam em mais de 50% às do Brasil. A etnia, segundo o cônsul, também é estratégica para quem quer negociar com o Sudeste Asiático. Cingapura tem três grandes grupos étnicos, formados por chineses, malásios e hindus, o que lhe assegura uma cultura-síntese daquela região. 

Em 1994, quando foi criada a Câmara de Comércio Exterior Brasil-Cingapura, comandada pelo também brasileiro Luiz Ciocchi, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos, a movimentação comercial entre os dois países atingia a US$ 620 milhões. A expectativa é de que os números deste ano garantirão o dobro do montante. 

Fernando Lohmann já promoveu muitas missões comerciais à Cingapura, tanto de empresários como de autoridades públicas. Ele espera encontrar ressonância no Grande ABC. Cláudio Rubens Pereira, diretor da Secretaria de Planejamento de Santo André, presente no encontro com empresários, anunciou ao cônsul gestões da Prefeitura para arregimentar um grupo de empresários. Valter Moura, secretário de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo, também lançou a possibilidade de sensibilizar o empresariado. 

Fernando Lohmann falou durante quase duas horas no encontro com empresários. Foi tão didático quanto eloquente sobre as vantagens da sinergia com Cingapura. Ele recomenda ações cooperativas setoriais. Pequeno e médio empresário que procurar intercâmbio individual vai se dar mal. Lohmann reconhece que levar o Grande ABC a Cingapura para promover parcerias ainda soa abstrato para a maioria dos pequenos e médios empresários. A maioria desconhece aquele pedaço capitalista praticante do livre-mercado. Como o Brasil, de forma geral, único país onde Cingapura se escreve com "C". No resto do mundo, é Singapura mesmo.



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