Um contingente de 14.097 famílias da Província do Grande ABC (equivalente ao conjunto de moradores de Rio Grande da Serra) engrossou a lista de pobres e miseráveis nesta temporada em comparação ao ano passado. O resultado é consequência da crise econômica do País. E São Bernardo da indústria automotiva em queda há mais de três anos lidera o que pode ser chamado de ranking de desmobilidade social com 10.097 domicílios, o equivalente a 74,04% do total regional desse estrato social.
O tamanho dessa bronca social não pode ser jogado às traças pelo Poder Público. Quando o Brasil vai mal, a Província do Grande ABC consegue ir pior ainda. E os números mostram isso com clareza ameaçadora.
Os dados, com base no Índice de Potencial de Consumo da Consultoria IPC Marketing comandada pelo pesquisador Marcos Pazzini, agrega múltiplas fontes primárias da União. O IPC Marketing é um produto consumido por empresas, organismos estatais e entidades de classe.
Do total de 937.646 famílias nos sete municípios da região, 184.499 pertencem à Classe D/E, de pobres e miseráveis. São Bernardo, capital econômica desse espaço geográfico de 2,7 milhões de habitantes, conta com 30% do contingente de pobres e miseráveis. São 55.561 famílias. Eram 45.123 no ano passado. O crescimento de 23,13% nesse estrato social está muito acima da média nacional de avanço do exército de novos deserdados. A tradução disso é que São Bernardo anda muito pior das pernas do que a média brasileira quando se trata de gerar deserdados.
Sobrepeso alarmante
O outro lado da moeda socioeconômica da região entre o ano passado e o projetado para este ano é que o grupo de famílias ricas aumentou em 2.805 domicílios. E São Bernardo liderou também o ranking, com 1.312 registros. O balanço geral nesse jogo de desigualdade deixa São Bernardo em situação desconfortável: entre 2016 e 2017, para cada nova família que se instalou no andar de cima de renda, na categoria de ricos, outras 7,39 foram atiradas às feras da pobreza. Uma mistura de crise econômica com perda de milhares de empregos e aumento demográfico.
Para se ter ideia do sobrepeso social de custos públicos em São Bernardo decorrentes da massa de deserdados em seu território, os mais de 55 mil domicílios desse estrato social correspondem praticamente aos moradores de São Caetano, que integram 59.251 famílias.
A seguir na toada de agigantamento da população pobre, tendo-se como base de cálculo o resultado dos 12 meses que separam o estudo da Consultoria IPC Marketing, São Bernardo somará em cinco temporadas uma nova população de deserdados equivalente a todos os moradores de São Caetano. Não há recursos públicos, já comprometidos, que sustenta esse descompasso.
Encalacramento econômico
Os números não deixam margem a dúvidas: o principal Município da região está encalacrado economicamente e precisa reagir com força-tarefa integrada por múltiplas instituições públicas, privadas e sociais para dar conta da avalanche de problemas que se acumulam. Qualquer equação que fuja dessa premissa se comprovará mais e mais diversionista. Esse enredo vem do passado.
É por essa e por tantas outras razões que CapitalSocial insiste tanto à imperiosidade de o prefeito Orlando Morando, também titular do Clube dos Prefeitos, mobilizar-se muito além de ações táticas para iniciar nova jornada de desenvolvimento econômico. Sem recuperar a vitalidade de São Bernardo como carro-chefe da região o entorno regional seguirá a colecionar decepções, mesmo que em proporções menos intensas.
A excessiva dependência do setor automotivo, cada vez mais arredio às exigências e à cultura sindicalista, coloca São Bernardo em situação de esquartejamento econômico. Investimentos produtivos rareiam. A massa de trabalhadores industriais persiste em reduzir de tamanho tanto em números absolutos quando relativos. Ou seja: perde seguidamente postos de trabalho nas fábricas e enxuga participação no conjunto de assalariados com carteira assinada, a maioria dos quais deslocada a atividades de comércio e serviços, com rendimentos em média 40% abaixo do trabalhador industrial.
É claro que a riqueza construída por São Bernardo e pela região ao longo de décadas de industrialização não se esgota num piscar de olhos. Há persistente queda de poderio econômico com consequente abatimento social, mas mesmo assim os números relativos favorecem o conjunto dos municípios. Mas a diferença em relação à média nacional já foi muito superior.
Situação complicada
Quando a comparação se dá com os principais municípios do Estado de São Paulo, estudados frequentemente por este jornalista e que formam o chamado G-22, a situação da Província do Grande ABC se torna problemática. Toma-se um banho de realidade porque o eixo de desenvolvimento econômico está cada vez mais convergente a áreas interioranas próximas da Região Metropolitana de São Paulo. Pior que isso: mesmo na metrópole liderado pela Capital do Estado, há inúmeros municípios com desempenho muito superior ao da Província -- casos da Grande Osasco e também da Grande Guarulhos, à Oeste e a Leste.
Para este ano, a Consultoria IPC projeta que a população de famílias ricas da região representará 3,2% do total, enquanto as famílias pobres serão 19,7%. No ano passado eram 3,0% e 18,8% respectivamente. O Brasil como um todo é mais modesto, com 2,4% de famílias ricas e 26,6% de famílias pobres num total de quase 60 milhões de residências.
A situação já foi pior, é verdade. Antes da chegada do PT ao governo federal e da implantação de políticas compensatórias para populações mais sofridas -- e também da euforia consumista --, os pobres da Província do Grande ABC representavam 26,45% das moradias. Esses números referem-se a 2002, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso. Já no Brasil, os pobres representavam 34,40% das moradias. No meio do caminho, antes de chegar a 2017, mais precisamente em 2011, o universo de pobres na região caiu para 10,10% da população, e despencou para 15,10% no Brasil.
E entre os miseráveis um total de 3,47% da população da Província do Grande ABC reunia famílias desse estrato social em 2002, último ano de FHC, contra 12,71% no Brasil. Já em 2011, apenas 0,5% das famílias da região constavam da lista de miseráveis, enquanto o País registrava 0,8%.
A unificação de pobres e miseráveis nos estudos da Consultoria IPC Marketing não altera a ordem dos produtos: os últimos anos de recessão estão devolvendo ao estrato social mais sofrido contingentes caudalosos de moradores.
Só nesta temporada de 2017, em confronto com o ano passado, o Brasil registrou acréscimo de 527.263 famílias na Classe D/E. Eram 15.275.313 domicílios em 2016 contra 15.802.575 em 2017. Um aumento de 3,45%. Bem menos, portanto, que os 8,27% de aumento registrado na Província do Grande ABC entre uma temporada e outra. E muito inferior aos 23,13% de São Bernardo.
No Brasil, no mesmo período, os moradores que galgaram a Classe A, dos ricos, com vencimentos superiores a R$ 20 mil por mês, aumentaram em 46.390 famílias, ou 3,34% do total de domicílios desse estrato social, contra 10,32% na Província do Grande ABC. Os pobres têm vencimentos mensais de até R$ 639,78.
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