Economia

Indústria de Minas Gerais
atropela Estado de São Paulo

DANIEL LIMA - 05/02/1997

Caminho preferencial das indústrias que deixaram a Região Metropolitana de São Paulo (Grande ABC incluído) nas últimas duas décadas, Minas Gerais é o Estado da Federação que mais cresceu no setor no período de 1985 a 1990. A constatação está em forma de números, que exigem interpretação, de trabalho divulgado pela Confederação Nacional da Indústria. Minas Gerais atropelou os demais Estados com um avanço intra-estadual de 10% no Produto Interno Bruto Industrial, contra queda de 23% do Estado de São Paulo, 22,7% do Rio de Janeiro, primeiro e segundo colocados do ranking econômico nacional, e de 16,6% do Rio Grande do Sul, no quinto posto.


Os números da CNI, entidade empresarial presidida pelo senador Fernando Bezerra, integram o documento denominado Economia Brasileira: Comparações Regionais, cuja segunda edição foi divulgada no mês passado e completa trabalho editado em 1992, ampliado e com várias informações atualizadas até 1995.


A disparada industrial de Minas está baseada numa política bem orquestrada do governo do Estado e que contempla benefícios fiscais, creditícios e de infra-estrutura que sensibilizaram várias dezenas de empresários com fábricas instaladas no Grande ABC. Os números, mesmo que restritos a um período de cinco anos, confirmam mais uma vez o esvaziamento econômico do Grande ABC, analisado com pioneirismo há quatro anos, e atestam reportagem publicada há dois anos com o consultor empresarial Edson Lopes dos Santos, membro do Conselho Consultivo do Livre Mercado, ao denunciar a evasão industrial rumo ao Sul de Minas.


O PIB industrial interno de Minas Gerais participava da distribuição relativa com 36,6% em 1985 mas em 1990 atingiu 39,9%. Com isso, ultrapassou o Rio de Janeiro que caiu de 38,3% em 1985 para 31,2% em 1990. O Estado de São Paulo caiu de uma participação relativa interna de 50,7% para 41,1%. Rio Grande do Sul, quarto colocado do ranking, caiu de 36,6% para 31,4%.


O salto mineiro no PIB industrial contribuiu para reduzir significativamente a diferença que separa aquele Estado do Rio de Janeiro na disputa pelo segundo lugar no PIB real nacional, isto é, a soma de toda a produção e de serviços no País. São Paulo, apesar das perdas industriais relativas, aumentou em 9% sua participação relativa no PIB nacional, passando de 34,07% em 1985 para 37,45% em 1990. O Rio de Janeiro evoluiu também 9%, saindo de 12,78% para chegar a 13,17%. Minas Gerais deu o pinote de 9,67% para 13,12%, o que representa 35,6% de evolução no período, revelando a importância do setor industrial na composição de desenvolvimento. O Rio Grande do Sul manteve o quarto lugar, mas perdeu 8% de participação relativa, caindo de 7,93% registrados em 1985 para 6,61% em 1990.


Diferentemente do Estado de São Paulo, que perdeu participação relativa na indústria mas ganhou no cômputo geral do PIB, o Grande ABC sofreu sangrias econômicas no período, já reveladas e dimensionadas por Livre Mercado e não especificadas pela CNI. Tudo porque o peso relativo do setor industrial para o Grande ABC, quase 80% das receitas tributárias, é de perfil completamente diferente do Estado de São Paulo como um todo, onde há menos desequilíbrio com as áreas de serviços e comércio. A dependência histórica da área industrial coloca o Grande ABC, que tem conhecido certa explosão em serviços e comércio, em situação pouco confortável, porque a compensação não se dá na mesma escala e porque o peso da produção industrial é gigantesco.


Os estudos da Confederação Nacional da Indústria revelam também que a Região Sudeste, composta por São Paulo, Minas, Rio de Janeiro e Espírito Santo, foi a única que cresceu relativamente, agravando em tese os desequilíbrios regionais. De uma participação no PIB de 58,18% em 1985, chegou a 62,60% em 1990. Entretanto, numa comparação do período do estudo, de 85 a 90, o PIB Industrial do Sudeste sofreu fraturas, pois caiu de 45,3% para 38,8%, sobretudo por causa das perdas paulistas, enquanto o Centro-Oeste avançou de 11,1% para 18,2%. As demais regiões também sofreram perdas.
No PIB Real, isto é, envolvendo todos os setores da economia, o Sul brasileiro, formado por Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, caiu de 17,69% para 15,72% no mesmo período. O Centro-Oeste, apesar do crescimento do PIB industrial, também apresentou queda. Em conjunto, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal alcançaram PIB de 6,24% em 1985 contra 5,86% em 1990. Ainda no mesmo período, o Nordeste (Maranhão, Piauí, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia) baixou de 13,55% para 12,58% e o Norte (Roraima, Acre, Amazonas, Pará, Amapá e Tocantins) caiu de 4,35% para 3,24% de participação relativa.


Minas Gerais ganhou no PIB industrial, cresceu no PIB global e evoluiu também no PIB per capita, que é a divisão dos valores produzidos pelo total da população. Os mineiros cresceram 124% nesse quesito durante um período estatístico mais amplo, que começa em 1985 e vai até 1994, passando de R$ 1.343,00 para R$ 3.014,00 sempre em valores corrigidos. O Rio de Janeiro aumentou em 83% seu PIB per capita, de R$ 2.043,00 para R$ 3.744,00. Os paulistas evoluíram 79%, saindo de R$ 2.339,00 e chegando a R$ 4.192,00. Os gaúchos, quinto colocados, foram mais modestos: cresceram 43%, com R$ 1.900,00 em 1985 e R$ 2.730,00 no outro extremo do período.


Se os mineiros ganharam de paulistas, cariocas e gaúchos de goleada no PIB industrial, o jogo ficou parelho no PIB de serviços. Os mineiros continuaram na liderança, com crescimento de 18% no período de estudos, mas bem próximos dos 23% dos cariocas e dos 11% dos paulistas. Os gaúchos ficaram praticamente estacionados.


Embora a Confederação Nacional da Indústria não tenha apresentado em seu trabalho o comportamento do PIB industrial e do PIB global do Brasil até mais recentemente, dados sobre consumo industrial e total de energia elétrica relativos ao período de 1985 a 1995 sustentam a avaliação de que o esvaziamento econômico paulista teve sequência. Na grade de participação percentual do consumo industrial de cada região brasileiro no consumo total de energia, um insumo importante na definição de crescimento econômico, o Sudeste caiu de 56,8% em 1985 para 47,3% em 1995, ou seja, 18%. Exceto o Nordeste, que passou de 50,0% para 57,3%, todas as demais regiões nacionais tiveram perdas no consumo industrial. A grade que trata de consumo total de energia, independente de setor de atividades, também aponta queda paulista no mesmo período, passando de 64,5% de participação nacional para 58,9%. Todas as demais regiões cresceram: O Norte saiu de 3,2% para 5,2%, o Sul de 13,3% para 15,3% e o Centro-Oeste de 4,0% para 4,9%.


Outra grade, agora de participação percentual do consumo industrial da região no consumo industrial do País aponta novamente redução da liderança paulista, dentro da região Sudeste, pois baixou de 67,7% em 1985 para 60,8% em 1995. O Norte cresceu de 3,0% para 6,5%, o Nordeste de 16,1% para 16,9%, o Sul de 11,3% para 13,6% e o Centro-Oeste de 1,9% para 2,2%.


A melhor explicação para o fato de São Paulo ter perdido forte participação relativa interna da indústria, que afetou o comportamento da região Sudeste, e mesmo assim ter apresentado crescimento no PIB global, embora bem inferior a Minas Gerais, é que grande parte das unidades federativas apresenta há muito anos políticas de incentivo econômico, reduzindo e eliminando impostos estaduais e municipais, além de oferecer terras e até galpões industriais. Como o PIB global é calculado com base num coquetel de tributos, que vai do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, passa pelo Imposto de Renda da Pessoa Física, atinge o Imposto Sobre Serviço (ISS), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), entre muitos outros, além da medição do consumo de energia elétrica, São Paulo acaba obtendo resultados tributários melhores, mas longe de servirem como espelho de desenvolvimento econômico.


Tanto é realidade que as mesmas estatísticas da CNI mostram a grade de arrecadação e distribuição do ICMS em 1995. São Paulo é líder nacional com 38,5% de participação relativa, muito à frente de Minas Gerais, com 9,8% e do Rio de Janeiro, com 9,5%. Basta comparar esses números do ICMS com os números do PIB geral, de 1990, para flagrar as distorções. Levando-se em conta que no período de 90 a 95 a economia paulista sofreu novas baixas industriais, atacada pelos flancos da inflexibilidade de não conceder incentivos fiscais estaduais, a participação relativa no PIB global deverá ter sofrido novos arranhões, ainda não mensurados pela CNI.


É verdade que o boom dos setores automobilístico e eletroeletrônico nos 30 primeiros meses do Plano Real, a partir de julho de 1994, deve ter favorecido grandemente os números paulistas, apesar de a globalização ter provocado verdadeira revolução industrial, com processos de enxugamentos dos quadros através de demissões e terceirizações, além de ganhos consideráveis das classes mais populares, com perdas da classe média, diante do quadro de estabilidade monetária.


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