O leitor mais bem informado, exigente e sarcástico provavelmente estará a perguntar, ao ler a manchete deste artigo: “E daí?”. A expressão quer dizer o seguinte: qual é a novidade? Sim, é tão historicamente consagrado que São Bernardo paga em média os melhores salários aos trabalhadores industriais da região, por força do setor automotivo e seus acertos com o Sindicato dos Metalúrgicos, que o enunciado explicitado não carrega nada de novidade. Mas não custa repeti-lo num contexto que embute o esfacelamento produtivo da região que, mais uma vez, se confirmará quando em dezembro próximo sair, finalmente, o PIB dos Municípios Brasileiros, com dados de 2015. Ou seja: sempre com dois anos de defasagem.
Se São Bernardo está na liderança de assalariamento médio regional não é novidade, o que chama a atenção é um desdobramento que o Ministério do Trabalho me fornece em dados brutos que tratei de metabolizar: no G-22, o grupo dos 20 maiores municípios do Estado de São Paulo (fora a Capital e incluindo Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra que completam o time regional) São Bernardo ocupa a terceira colocação.
Mais precisamente São Bernardo ocupa a Série B do G-22, atrás de Paulínia do polo químico-petroquímico e de São José dos Campos do polo aeronáutico. São Caetano é a sexta colocada no G-22, Mauá a 12ª, Santo André a 13ª, Diadema a 17ª, Ribeirão Pires a 19ª e Rio Grande da Serra a última posição.
Custo e produtividade
O assalariamento médio mais atualizado preparado pelo Ministério do Trabalho refere-se a dezembro do ano passado. Os dados foram divulgados na semana passada. O peso do emprego industrial com carteira assinada em São Bernardo é expressivo (e também inibidor a investimentos no setor, porque não há a correspondência de produtividade que absorva o peso relativo maior da mão de obra local). Quando comparado a Santo André, em média o trabalhador industrial de São Bernardo recebe 29,51% a mais ao final de cada mês.
Somente São Caetano também de montadora de veículos (a General Motors) faz concorrência na média salarial de emprego industrial a São Bernardo. Mesmo assim paga 12,64% menos. Uma defasagem de um terço da desvantagem dos trabalhadores de Diadema, que ganham por mês 37,47% menos que São Bernardo.
Quando a comparação envolve trabalhadores industriais de São Bernardo e de Ribeirão Pires a distância sobe para 43,89%. Trabalhadores de Mauá recebem 28,77% em média menos que os de São Bernardo. Rio Grande da Serra apanha de lavada: diferença de 53,24%. Há uma sincronia econômico-geográfica interessante: quanto mais distante de São Bernardo, mais os trabalhadores industriais recebem vencimentos menores.
A exceção é Diadema, vizinha de São Bernardo, mas cujo perfil industrial não tem o peso preponderante do passado de suprimentos automotivos. Essa atividade ainda é expressiva em Diadema, mas as autopeças locais são primos pobres quando comparadas às de São Bernardo.
Massa milionária
Embora se coloque na Série B no Campeonato de Salários do G-22 no setor industrial, a massa de dinheiro que gira na Capital Nacional de Veículos é muito maior que a dos dois primeiros colocados na classificação geral. Basta multiplicar os R$ 5.552.25 de média salarial de dezembro do ano passado de São Bernardo por 74.939 trabalhadores contratados com carteira assinada e confrontos com os resultados de semelhantes contas envolvendo os 37.329 trabalhadores de São José dos Campos que recebem mensalmente R$ 6.139.21 e os 10.065 trabalhadores de Paulínia que recebem a cada mês, sempre em média, R$ 6.759,08.
Façam as contas e chegarão aos seguintes números, como resultado de dezembro do ano passado: São Bernardo contabilizava massa salarial de 416.080.062,75 milhões, contra 68.030.140,20 milhões de Paulínia e R$ 236.599.041,09 milhões de São José dos Campos.
Recomenda-se sempre uma leitura mais atenta, para não dizer crítica, de números que ensejam a grandeza do setor industrial de São Bernardo. Primeiro porque essa grandeza já foi muito maior, com perdão da quase redundância. Segundo porque o PIB (Produto Interno Bruto) do setor industrial tem emagrecido fortemente em São Bernardo ao longo dos anos.
Participação elevada
Esse desastre sugere novas perdas. Do total de 252.289 trabalhadores em todas as atividades econômicas de São Bernardo (inclusive na Administração Pública), 35,30% integram a indústria de transformação. Já na vice-campeã do G-22, São José dos Campos, a participação do emprego industrial na massa de trabalhadores é de 19,42%, resultado de 37.929 empregos industriais no total de 192.181 postos de trabalho. Em Paulínia, a campeã em assalariamento do G-22, os trabalhadores industriais são 24,62% do total de 40.881 postos de trabalho.
Os dados do Ministério do Trabalho revelam também que é um grande equívoco considerar a vizinha Barueri, do outro lado da Região Metropolitana de São Paulo, reduto exclusivamente de serviços, resultado de prática de guerra fiscal nos anos 1990. Em número de trabalhadores industriais Barueri e Santo André estão praticamente empatados. Aliás, a vantagem é leve para Barueri que tem em Alphaville um portentoso núcleo de serviços de valor agregado.
Há 26.384 trabalhadores industriais com carteira assinada em Barueri, contra 25.264 em Santo André. Como o assalariamento médio em Barueri é um pouco acima do de Santo André (R$ 4.068,07 contra R$ 3.913,81), a diferença se alarga na massa salarial mensal registrada em dezembro do ano passado: em Barueri eram R$ 103.263.888,88 milhões, contra R$ 98.878.495,84 milhões em Santo André.
Goleada em Santo André
Filtro os números de Santo André e volto à comparação com São Bernardo para chegar à seguinte conclusão: enquanto a diferença de média salarial de trabalhadores industriais entre os dois municípios em dezembro do ano passado era de 29,51%, quando se trata de massa salarial, ou seja, do total de trabalhadores multiplicado pelo assalariamento médio, a vantagem de São Bernardo passa a 76,23%. Transformando esses números em algo provavelmente mais compreensível: de R$ 514 milhões pagos em assalariamentos em dezembro do ano passado em São Bernardo e em Santo André, R$ 416 milhões ficaram na Capital Automotiva do Brasil.
O assalariamento dos trabalhadores industriais da região em dezembro do ano passado chegou a R$ 863.341 milhões, para um total de 190.737 postos de trabalho. A média geral por trabalhador da região, portanto, estava em R$ 4.526,34. Posicionava-se em quinto lugar na classificação geral, atrás de Paulínia, São José dos Campos, Sumaré e Taubaté. Com 39% dos postos de trabalho no setor industrial da região, São Bernardo participação com praticamente metade (48,20%) da massa salarial.
Voltaremos ao assunto amanhã e em muitas das próximas edições.
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