Nos últimos 12 meses, entre fevereiro do ano passado e janeiro deste ano, a indústria de São Caetano demitiu quarto vezes mais que a média da Região Metropolitana de São Paulo, na qual o Município está inserido. Essa contabilidade vale para o emprego formal, com carteira assinada. Emprego formal com carteira assinada faz parte do coquetel de qualidade de vida. Principalmente no setor industrial, que paga salários em média 40% superiores aos das demais atividades. Sem contar benefícios diversos.
Enquanto o passivo registrado pelo Ministério do Trabalho no setor industrial da Grande São Paulo aponta queda do estoque de 1,25%, correspondente a 11.771 trabalhadores, em São Caetano são 5,02%, ou 1.162 desempregos líquidos. A média brasileira é fragilmente positiva, de 0,11%. Na Região Metropolitana de São Paulo, entre os grandes municípios, apenas Osasco tem números negativos semelhantes aos de São Caetano: 5,35%.
Em agosto do ano passado produzi um texto semelhante. A boa notícia – se é possível chamar de boa notícia uma quebra da mobilidade social proporcionada pelo desemprego industrial – é que São Caetano baixou o índice do que chamaria de vazamento de postos de trabalho no setor. Eram mais de 7% no confronto com o resultado nacional.
Efeito General Motors
O que lamento é que há instâncias na região que poderiam ajudar a decifrar o enigma de São Caetano, que se traduz na seguinte pergunta: por que se perdem tantos empregos industriais no Município?
Minha teoria, exposta no ano passado, é que a General Motors e a cadeia de fornecedores locais estão em fase de reestruturação por conta de investimentos na modernização de produtos e serviços industriais. E reestruturação significa reformulação inclusive no conceito de empregabilidade. Quem fica e quem vai embora dependem de muitos fatores, mas o principal é mesmo a qualidade da mão de obra às novas funções tecnologicamente mais avançadas e por isso mesmo redutoras de mão de obra.
A tecnologia desemprega aqui e ali da mesma forma que emprega aqui e acolá. Tudo depende do conjunto da obra. O desemprego num Município pode ser compensado no próprio Município ou em outros territórios. Da mesma forma que pode simplesmente restringir-se ao próprio enxugamento.
Tenho fontes na General Motors de São Caetano a corroborar com essa constatação especulativa. Há evidências que confirmariam a morfologia do desemprego industrial a partir do processo rejuvenescedor da multinacional norte-americana. Não é nada científico, claro, mas de formato empírico sustentável.
Núcleo de inteligência
O Clube dos Prefeitos com que sonho e que está a léguas de distância do que se apresenta a nos tirar o sossego contaria com um núcleo de inteligência ligado diretamente ao emprego na região. A instância setorial abarcaria todas as atividades econômicas, mas principalmente a industrial. Não é possível que, diante do rapa da mão de obra em São Caetano, com índice muito acima do desempenho médio nacional e também dos demais integrantes desta Província, não se tenha diagnóstico preciso.
Mais que isso: por conta do diagnóstico, seria possível construir medidas para estancar e quem sabe recuperar os empregos decepados, realocando-os em funções assemelhadas. Ou melhor: agir preventivamente para evitar as demissões. Ou torná-las menos suscetíveis a fortes impactos.
Sei que os de idiossincráticos de plantão vão dizer que mais uma vez estou tentando jogar nas costas do Clube dos Prefeitos problemas econômicos que supostamente estariam fora do alcance resolutivo. Não e nada disso. O Clube dos Prefeitos está aí ou deveria estar aí para, entre outras tarefas nobres, acompanhar atentamente o movimento das pedras econômicas da região.
Seria essa uma missão muito mais compatível com a situação regional do que produzir masturbações de marketing com a Casa do Grande ABC em Brasília e tantas outras baboseiras que não oferecem respostas factíveis.
Um grupo de elite, de estudiosos, de estatísticos, poderia oferecer resultados em parceria com consultoria especializada. Seria possível obter respostas rápidas, além de contragolpes fulminantes. Quem sabe as razões dos descaminhos de determinada atividade econômicas num universo municipal como de São Caetano pode colaborar para conter a hemorragia?
O emprego industrial é um bem pessoal e coletivo tão sagrado que demandaria inconformismo permanente das autoridades públicas. Daí insistir que a questão deveria ser assunto prioritário do Clube dos Prefeitos. Quem sugerir ao prefeito dos prefeitos Orlando Morando algo nesse sentido vai ter como resposta o descaso.
Se Orlando Morando ouvir uma proposta de criação do Observatório do Emprego na região correrá o risco de uma resposta atravessada. Provavelmente ele responderá o que todos os descuidados com as causas regionais respondem: estão fora do alcance dos municípios e mesmo da região políticas que inibam as demissões industriais, principalmente. Não é bem assim, claro. O Clube dos Prefeitos é uma afronta regionalista numa geografia entregue historicamente ao municipalismo autárquico. O voto está no Município e como tal o Município é a prioridade máxima, quando não única.
Queda acentuada
Quem considerar normal que São Caetano sofra tantas baixas no mercado de trabalho formal do setor industrial certamente é ruim da cabeça ou doente do pé. O saldo negativo de 1.162 postos de trabalho nos últimos 12 meses ante um salto positivo nacional de 7.894 postos de trabalho diz muita coisa.
Se o direcionamento comparativo for centrado apenas na Região Metropolitana de São Paulo, com 11.771 baixas, a participação relativa de São Caetano é de 9,87%. Parece pouco apenas para quem não conhece o complemento dos números: São Caetano participa com apenas 23.147 dos empregos industriais na maior metrópole do País. Ou seja: apenas 2,46% dos empregos formais. São 941.680 trabalhadores industriais no conjunto de 39 municípios da Grande São Paulo.
Dos grandes municípios da Região Metropolitana de São Paulo, Santo André é um dos poucos exemplos de desempenho positivo no emprego industrial nos últimos 12 meses. O saldo do estoque em fevereiro do ano passado é de 0,67% em janeiro deste ano, acima da média nacional (0,11), melhor que a média da metrópole (1,25% negativo) e um pouco acima da média paulista (0,53 negativo).
Calma lá, não soltem fogos. Santo André é um caso especial de desindustrialização tão aguda que, qualquer respiro representa melhora. Mas se alguém mergulhar no passado vai sentir o tamanho do prejuízo, mascarado nestes tempos. A proporção de empregos industriais no conjunto de trabalhadores com carteira assinada em Santo André é de apenas 14 em cada 100. O menor índice regional. “Viveiro industrial” tem tanto significado quanto dizer certas coisas que não posso reproduzir aqui. Não me peçam um exemplo que possa chocar a todos.
Mais que São Bernardo
São Bernardo supera São Caetano escassamente em números absolutos de demissões no setor industrial com carteira assinada (1.177 ante 1.162), mas nos números relativos, que valem muito mais porque fornecem com precisão o ambiente econômico, registrou em janeiro agora apenas 1,58% negativo. Três vezes menos que São Caetano.
Diadema e Mauá também ainda sofrem no apanhado de 12 meses os efeitos da recessão econômica, respectivamente com 1,57% e 3,22% negativos. Ribeirão Pires tem saldo positivo de 0,09, enquanto Rio Grande da Serra acumula perda de 9,46% no período. Rio Grande não deve ser considerada numa análise que tenha grandes municípios como referencial. Só consta de nossos estudos porque faz parte da Província.
Na região que chamo de G-3M, referente aos três municípios mais poderosos do lado Oeste e Leste da Grande São Paulo, além do índice negativo de Osasco, com 5,35%, Barueri aparece com discreto 1,02% negativo e Guarulhos 0,82%. O desempenho de Guarulhos não deixa de ser surpreendente, porque conta com parque produtivo grandioso. São 89.146 trabalhadores formais na indústria, enquanto São Bernardo, Capital Econômica da Província, soma 74.493.
O que separa os dois municípios, além da geografia, é que São Bernardo sofre da Doença Holandesa Automotiva. Guarulhos é uma espécie de supermercado da produção, por isso menos suscetível às sacolejadas setoriais mais intensas da economia.
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