Imprensa

Cinco anos para Diário se adaptar
aos conceitos de regionalidade

DANIEL LIMA - 03/03/2004

Tem o presente documento o compromisso de delinear conceitos e programas que pautarão nossa atividade na condução operacional, técnica, orçamentária e gestora dos departamentos editoriais do Diário do Grande ABC. Esse material está sujeito a novas incursões do autor, seja por meio de supressões, seja por emendas, dada a possibilidade de a experiência prática no front se comprovar além ou aquém das expectativas aqui traçadas.


Antecipadamente, podemos afirmar que há enormes probabilidades de as afirmativas aqui impressas estarem subestimadas. O produto editorial da companhia navega nas águas rebeldes de evidente inadequação ao contexto socioeconômico em que vivem os sete municípios do Grande ABC — Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra — distribuídos em espaço metropolitano extraordinariamente ebulitivo e transformador.


Poucos agentes regionais se aperceberam de que o Grande ABC de 2,4 milhões de habitantes e o quarto potencial de consumo do País vive a mais intrigante metamorfose da história, cinco décadas depois de a indústria automotiva aqui se instalar e revirar de ponta-cabeça os cromossomos de uma região então acanhada economicamente. Que perdemos riqueza industrial e ganhamos migalhas de comércio e serviços, todo mundo sabe ou deveria saber. Quase ninguém percebeu, entretanto, que a transposição do Grande ABC industrial para o Grande ABC de serviços alterou o comportamento sociológico da comunidade local.


Vivemos já há alguns pares de anos imensa febre de empreendedorismo de diversos matizes para tentar sufocar os estragos da desindustrialização e o surgimento de imensas ilhas de exclusão social. Nenhuma outra região do País, por não ter as características majoritariamente automotivas do Grande ABC, passou por esse autêntico corredor polonês. E o que o jornal diário da região fez para acompanhar ou mesmo antecipar-se às tendências? Absolutamente nada, ou quase nada, em seu núcleo editorial.


O Grande ABC que viceja pós-demolição de parte de suas indústrias — notadamente de pequeno e médio porte — é um território cuja população se vira como pode como empreendedora formal e informal, já que escasseiam empregos mesmo nos setores de serviços. Nossa demanda por empregos ultrapassa a 30 mil novas vagas por ano, conforme dados estatísticos, mas não conseguimos repor quase nada disso. No ano passado abriram-se pouco mais de oito mil vagas com carteira assinada, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego.


Muito pouco quando se sabe que, além da nova leva de jovens economicamente ativos, encontramos um turbilhão de desempregados cumulativos. Só nos anos 1990 perdemos 100 mil empregos industriais com carteira assinada, aqueles que oferecem as melhores contrapartidas de proteção social negadas pelo Estado. Contingente predominante desses desafortunados recorreu aos negócios próprios. Muitos quebraram a cara porque os grandes conglomerados comerciais e de serviços descobriram nosso potencial de consumo e aqui se instalaram com pompa e circunstância. Contaram para isso com a omissão ignorante, quando não com apoio interesseiro, de governos municipais e entidades empresariais e sindicais. Todos ficaram como baratas-tontas incapazes de reagir de forma minimamente coordenada senão para barrar os novos investimentos — o que seria uma afronta às leis de mercado — pelo menos para erigir redes compensatórias sobre as quais dispensamos detalhes agora, mas que estão presentes nas economias mais maduras.


Pois é esse Grande ABC terceirizado, informal em larga escala, ressentido pelo status desempregador que atingiu duramente quem carregava no uniforme de trabalho logomarcas das montadoras de veículos, é esse Grande ABC profundamente alterado em seu genoma social e econômico que está aí para ser desvendado, para ser modificado permanentemente até exibir novo formato, não essa peça disforme e inquietante que facilmente detectamos no estado de petrificação em que se encontra.


Pois enquanto esse Grande ABC está aí a nos esfregar nas fuças todos os problemas e eventualmente também muitas soluções inovadoras, o jornal vive na mais absoluta inanição editorial. Preferem seus profissionais fechar os olhos, contaminados pela grandiloquência de um passado ainda recente de que devemos nos ombrear às coberturas do noticiário nacional e internacional. Ou acordamos para esmiuçar esse Grande ABC instigante com que nos defrontamos após o período mais dantesco das atividades econômicas, ou seremos literalmente soterrados pelo desconhecimento do que se passa em nossas próprias fronteiras.


Seria trágico não fosse estúpido admitir que às nossas barbas, em 840 quilômetros de território regional, as grandes alterações históricas se passam sem que o veículo de comunicação que lhe emprestou o nome se tornasse capaz de relatar criteriosamente os fatos, de elucidar dramas, de tematizar prioridades, de conjecturar propostas, de cobrar ação de todos que estão encastelados nas frondosas árvores do poder político, econômico e social.


Haveria absurdo maior para a mídia mais tradicional e poderosa do Grande ABC senão continuar observando com certo desdém — quando não com deliberado desinteresse — o que se passa em sua geografia? Que tiro mais estúpido no próprio pé editorial e econômico para a companhia senão a irritante teimosia de seguir o haraquiri de caricaturizar os jornais paulistanos, em vez de esculpir a própria cara? Até quando nossa cultura — e entenda-se cultura nesse caso como o conjunto cumulativo de características sociais e econômicas de nossa região — estará subordinada ao intelectualismo obtuso que aprofunda nosso Complexo de Gata Borralheira mirando a Cinderela da Capital, onde estão os jornais diários mais importantes do País?


Que gataborralheirismo é esse — e trato disso no livro específico sobre a fragmentação social do Grande ABC — que, na tentativa de negar, mais resplandece servilismo à Capital? E quem são os contestadores do Complexo de Gata Borralheira — esse é o nome que dei à obra — senão sabujos da Capital que se fingem de regionalistas? O que vale mais nessas alturas do campeonato: um regionalismo realístico, que não esconde nosso gataborralheirismo mas faz tudo o que é possível para mudar o enredo com pressupostos de modernidade, ou um falseamento do conceito de contemporaneidade que no fundo, no fundo, não busca outra saída senão subjugar nosso gataborralheirismo à predisposição de impor — muitas vezes acriticamente — as supostas qualidades da Capital?


Neste estudo-proposta, questões vinculadas à regionalidade serão suficientemente expostas. É sobre esse eixo que vai girar a roda de transformações conceituais no campo editorial que definirão os agregados de valor na esfera econômica. Traduzindo em miúdos: a mesma estrada de conteúdo que colocaria o jornal na trilha de aproximação mais concreta e sustentável com os leitores permitiria o assentamento de bases estruturais para conquistas econômicas. Essa confluência sem falsas aparências deve mover nossos passos na condução da reviravolta editorial com consequentes ganhos comerciais. Por isso, é imperioso o relacionamento prospectivo entre as duas áreas vitais à consolidação do produto: o editorial e o comercial.


Nossa experiência jornalística e empreendedora à frente da Editora Livre Mercado, onde desempenhamos funções executivas que se consolidaram em torno dos insumos editoriais como as que objetivamos agora nessa nova empreitada, nos ensinou que a animosidade entre editorial e comercial é uma estrada da perdição só frequentada por quem olha atavicamente para o próprio umbigo.


Não temos o menor receio — muito pelo contrário — de imantar as relações com os demais departamentos da companhia, porque os valores que determinarão a interatividade corporativa estarão ancorados nos conceitos que preparamos para o núcleo de insumos editoriais do jornal. Sempre foi assim na Editora Livre Mercado. Os eventuais exageros cometidos pelo Departamento Comercial da Editora Livre Mercado sempre foram olimpicamente neutralizados editorialmente num aprendizado frequente.


Reconhecemos as dificuldades que encontraremos em traçar novo perfil editorial para um produto que — agora me manifesto como jornalista — há muito tempo deixou de justificar a própria denominação. Muitos dos problemas que vivenciamos no Grande ABC de uns tempos a esta parte estão situados na zona de aderência do jornal. Reações e inações de uma sociedade declaradamente à deriva resultam de coragem e identificação editorial que o jornal há muito abdicou. Tem-se a impressão — agora me manifesto também como leitor — que o Diário do Grande ABC sofre com a ameaça de uma permanente espada que lhe cortaria a cabeça e lhe retalharia o resto do corpo. Como justificar, em contrário, posicionamentos erráticos, quando não inconsistentes, e dúbios, quando não omissos?


Somente a prática nos dará mais respostas a perguntas e afirmações que decidimos não provocar neste estudo-análise. Nada é mais emblemático do que o cotidiano de muito trabalho. A função de analista da situação que encontraríamos no campo de batalha em que se constituiria a formatação de um produto regionalmente forte terá de ser nos primeiros tempos igualmente cumulativa de operacionalidade. Dependeremos de informações de terceiros mas fundamentalmente dos nossos próprios olhos e juízo para aferir desconfianças ou poucas certezas com respeito à estrutura funcional do jornal. Não bastasse a demolição de eventuais encastelamentos antiprodutivos, teremos de espichar olhos e preparar ouvidos para o atendimento das demandas externas dos consumidores de informação.


Nada, entretanto, deverá obstar nosso caminho. A retaguarda dos acionistas, plenamente conscientes de que esse é um projeto de reconstrução do produto, não nos deixa dúvida sobre o resultado final. Teremos pelo menos 50 meses iniciais para elevar o produto às raízes de sua própria criação há quase 50 anos, ou seja, voltado à comunidade do Grande ABC. Com a impressionante diferença de que agora vivemos num mundo globalizado que nos cobra múltiplas atenções.


Por isso não podemos perder o foco de um regionalismo contemporâneo. Acreditamos francamente na enorme possibilidade de iniciar e encerrar de forma vitoriosa a contagem regressiva dos 50 anos deste veículo de transcendental importância para a comunidade do Grande ABC. Será uma tarefa árdua, desgastante, maratonística. Não haverá vaga para acomodados. Da mesma forma que não sobrará espaço aos interlocutores da comunidade cuja percepção da realidade crônica do Grande ABC se esgota no levar vantagem em tudo e no compromisso social de quem se descontrai num parque de diversões.


Este é apenas o começo de um provavelmente único plano plurianual editorial concebido na história do Diário do Grande ABC. Através deste documento, creiam, saberemos onde registrar nossos passos nos próximos tempos. Da mesma forma, saberemos onde também deverão registrar seus passos todos aqueles que representam o que chamaria de esgarçado capital social da região — os governos locais, os agentes econômicos e os representantes sociais. Ou seja: a missão histórica que se apresenta a todos que se envolverem nesse projeto ultrapassa a corporação do Diário do Grande ABC porque se sintoniza com os anseios de uma comunidade aparvalhada com as consequências macroeconômicas. Sem paternalismo, sem tutela, porque não poderemos repetir os erros do passado. Somos um produto vocacionado a agitar a sociedade regional. Essa missão precisa ser desempenhada com denodo e perseverança.


 Gestão


O setor de insumos editoriais do Diário do Grande ABC será gerenciado por este profissional com ampla autonomia quanto à metodologia operacional, técnica, financeira e de conteúdo. Sempre que houver transbordamento de funções, o setor editorial sustentará interface com o outro macrogerenciamento da companhia, que envolve os setores administrativo, financeiro e comercial. A conceituação mais detalhada desse receituário de atribuições merece algumas linhas.


A gestão operacional, técnica, financeira e de conteúdo sob controle deste profissional em regime de estreita cooperação dos colaboradores permitirá que se obtenham interações intereditorias. A rígida divisão microgerencial das editorias que compõem o setor de insumos editoriais do Diário do Grande ABC transforma cada departamento em gueto. Economia, Política, Esporte, Setecidades, Cultura, Polícia, Coluna Social, Arquivo, Fotografia, Transporte, Internet, Suplementos Especiais, entre outros departamentos de insumos, não podem estar desgarrados. É algo tão contraproducente quanto um hipermercado entregar o layout de produtos a profissionais de diferentes enfoques.


A gestão de um produto — no caso, o editorial — sem que todas as partes do conjunto estejam doutrinadas a ocupar a mesma frequência provoca ruídos intensos. É prioritária a coordenação geral dos departamentos de insumos para que decisões gerenciais compatíveis com os objetivos editoriais, financeiros e econômicos da companhia não virem pó. Não há segredo algum em construir uma rede de informações extremamente prática de forma a ter à mão o entrecruzamento de organograma e cronograma.


Toda a gestão intelectual do Prêmio Desempenho foi desenvolvida por este profissional, sempre com a colaboração da gerência operacional. O controle é automático por meio de impressos que definem graficamente todas as missões e prazos a serem cumpridos. O que nos primeiros tempos era um tormento, com sobreposições de atividades, com omissões e desperdício de tempo, acabou enquadrado num compartimento de visibilidade plena. Todos os profissionais envolvidos em nossos eventos contam com cópias do que chamaria de mapa de prazos e de tarefas a cumprir. Compartilhamos entre os colaboradores a responsabilidade de sustentar estruturalmente os eventos.


Para quem não tem a dimensão do que significa a estrutura de eventos que realizamos como suporte de marketing do produto, talvez surpreenda afirmar que são perto de 40 quesitos a saltar das planilhas. Sem o uso intensivo desse material básico de controle de tarefas e tempo, não existe a menor garantia de que uma desagradável surpresa nos aguardará durante o cerimonial, como, por exemplo, descobrir que os troféus foram esquecidos na sede da empresa quando o tempo que separa a chegada dos convidados e o início do evento não passa de uma hora.


Nos primeiros tempos do Prêmio Desempenho os profissionais do Departamento Comercial foram aproveitados em algumas funções. A experiência se mostrou duplamente conspiratória. Primeiro, porque os agentes comerciais não participam com regularidade da preparação, já que nem sempre estão na empresa. Diferentemente, portanto, de diversos representantes do pessoal operacional da Editora Livre Mercado, a quem entendemos a missão de construir juntos o PDE, porque seus horários são regulares e internos. Segundo, porque as funções primárias dos agentes comerciais acabavam confundidas no dia do evento. Por isso, nossos contatos publicitários passaram a atuar livremente durante os eventos, atuando unicamente como relações públicas da companhia; ou seja, foram eliminados da estrutura de recursos humanos do acontecimento.


Aliás, as funções dos profissionais de venda durante a entrega do Prêmio Desempenho revelam a característica de interatividade na Editora Livre Mercado. Nada que surpreenda, porque a própria operação promocional e comercial do Prêmio Desempenho oferece a oportunidade de estreitamento entre os setores de insumo e de publicidade. Tudo que tiver possibilidade de agregado de valor entre editorial e comercial implica na mútua ultrapassagem dos limites das duas áreas.


Os aspectos econômico-financeiros inseridos no conjunto de tarefas de gestão editorial deverão ser observados e atacados sob dois pontos. Primeiro, em situação de normalidade, de gerenciamento automático deste profissional. Segundo, em situação pouco convencional, de cooperação com o macrogerenciador administrativo, financeiro e comercial. No primeiro caso, os eventuais remanejamentos internos, frutos de decisões conectadas com os objetivos gerenciais, serão automaticamente aplicados. No segundo caso, de novos aportes ou eventuais restrições orçamentárias, nada que debates dos macrogerenciadores não possam resolver.


Em linhas gerais e para que não fique nenhuma dúvida sobre o ritmo que deverá prevalecer, procuraremos introduzir métodos e objetivos em estreita comunhão com o planejamento aqui exposto. Admitir que deverá haver subordinação aos usos e costumes atuais sem que se procurem dentro das condições legais a transposição para um novo modelo teria efeito de engessamento permanente. A reversão de um quadro em que o produto final — a informação qualificada — está submetido ao torniquete de uma estrutura altamente burocrática supera eventual toque de voluntarismo. O que temos de fato é um caso de emergência. O jornal que vai às bancas, aos endereços comerciais e aos endereços residenciais não pode perder-se no labirinto de práticas antiquadas que sonegam sua própria gênese, ou seja, de veículo de comunicação.


Haveremos de materializar um produto final que reproduza em intensidade muito mais efetiva o universo de colaboradores que constam da folha de pagamento. Um exercício pouco intolerante que confronte o jornal formal que vai ao consumidor e o jornal legal que está espalhado pela Rua Catequese chegará à desagradável conclusão de que há algo de equivocado na companhia. O produto final está em desacordo com o enfileiramento de nomes e funções. Estamos diante de um caso de uma estatalzinha editorial? Desconfio de que provavelmente retirarei esse ponto de interrogação após os primeiros 30 dias de diagnóstico no local. Complicadíssimo mesmo vai ser desativar esse modelo. Nada que o trabalho de uma equipe motivada não possa realizar.


 Regionalidade


É preciso compreender o sentido de regionalidade que aplicaremos na linha editorial do jornal para que não se caia na armadilha do reducionismo simplificador. Regionalidade não tem nada a ver com provincianismo. Não faremos do jornal uma repetição diária dos veículos semanários que vivem e sobrevivem de releases dos governos municipais e de empresas privadas que contam com assessoria de imprensa. O conceito de regionalismo contemporâneo prende-se ao desafio de vasculhar cada centímetro quadrado do território dos sete municípios do Grande ABC sem perder de vista o encaixe metropolitano. Também não poderemos desprezar aspectos nacionais e internacionais. Traduzindo a equação: nosso regionalismo jamais se desgrudaria do ambiente metropolitano e muito menos dos sacolejos globalizantes, mas não cometeria a insanidade de, literalmente, tentar agarrar o mundo, enquanto a essencialidade de sua própria gênese territorial escapa entre os dedos da dispersão.


Teremos, em função das circunstâncias econômicas e financeiras, de promover uma espécie de escolha de Sofia; ou seja, definir um padrão de cobertura predominantemente regional mesmo que isso custe redução do espaço nacional e internacional. Precisamos ganhar o jogo em nosso quintal de forma massacrante, da mesma forma que perdemos quando partimos para a luta em campo adversário. Queira-se ou não, jogar o jogo do noticiário nacional e internacional com os grandes conglomerados de comunicação é uma batalha inglória. O que não significa que devemos abandonar o barco. É evidente que não, até porque a medida contraria o conceito de regionalidade contemporânea. O que temos de executar — e esse é um caso de decantação — é a busca de novas vertentes de cobertura nacional e internacional que fujam da dependência do noticiário das agências. Apresentaremos um projeto específico sobre isso, mas não numa primeira etapa.


O grande mote que pretendemos apresentar é a captura de um regionalismo moderno, instigante e evolucionista. Algo jamais mostrado na história dos jornais metropolitanos presos a pautas federalizadas com soluços, apenas soluços, locais. Faremos um Diário do Grande ABC Metropolitano, ou seja, estaremos conectados permanentemente a tudo que nos rodeia, sobremodo nos campos que mais de perto atingem nossos leitores. Não podemos minimizar o fato de que estamos incrustados numa região metropolitana de 39 municípios e 18 milhões de habitantes, que representam quase metade do PIB estadual e cerca de 20% do PIB nacional. Nosso território preferencial é o Grande ABC. Nosso território complementar é a Grande São Paulo. Somos — a Grande São Paulo — um Estado de Minas Gerais em população e muito mais em economia. Somos quase o dobro dos 420 municípios do Rio Grande do Sul. A Grande São Paulo é um País tratado sem zelo pelos meios de comunicação. O Grande ABC está no interior desse gigantesco painel humano e precisa ser devassado para ser entendido.


Tudo o que estiver ocorrendo na Região Metropolitana de São Paulo deverá nos interessar detidamente. Nossos indicadores sociais e econômicos não podem se circunscrever à geografia do Grande ABC. Temos de correlacioná-los, sempre que possível, com os espaços que nos rodeiam. A influência do Rodoanel Oeste, que contemplou a chamada Grande Osasco, nos abalou fortemente como espaço socioeconômico, conforme mostramos em matéria baseada em dados estatísticos do Instituto de Estudos Metropolitanos. Não podemos ficar desatentos a isso. As autoridades públicas, privadas e sociais precisam reagir ao quadro. Não devemos cair na tentação de nos lambuzarmos com estatísticas domésticas, puramente regionais, quando o mundo que nos envolve proximamente ou não, reage de forma mais incisiva.


Um exemplo do que parece melhorar, mas que não passa de ilusão estatística, está no ranking de criminalidade do Instituto de Estudos Metropolitanos. Apresentamos queda nos registros de homicídios dolosos e também em roubos e furtos de veículos, mas aumentamos os casos de roubos e furtos diversos. Na classificação final, que abarca os três quesitos, perdemos posições e seguimos entre os piores municípios economicamente mais importantes do Estado. Até mesmo São Caetano caiu pelas tabelas.


Como se explica isso? Simples: os investimentos e as ações de combate à criminalidade no Grande ABC não fluíram à altura da maioria dos demais municípios. Ou seja: em termos comparativos, estamos piores do que antes, mesmo que os números absolutos de um ou outro indicador apresentem avanços. Quem sabe e explora a importância da qualidade de vida para atrair e manter investimentos entende o significado dessa equação. Confrontam-se centenas de municípios nos mais diversos quesitos. O capital, como se sabe, não tem fronteiras. E a flacidez do tecido social do Grande ABC converteu-se em adversário à atração de empresas.


Portanto, regionalidade não pode ser confundida com encarceramento territorial. Devemos estar ligadíssimos aos eventos que nos rodeiam, à medida que se operam em áreas mais próximas ou não. Como se explica que Guarulhos está anunciando 13 novas indústrias que no ano passado se beneficiaram de um regime fiscal que abate os custos do IPTU e mesmo do ISS de construção, enquanto nós, depois de quatro anos da instauração de guerra fiscal semelhante no Grande ABC, só enlaçamos uma única indústria, em Ribeirão Pires?


São muitas as explicações, justificativas e desculpas. Tratamos desse assunto na revista, mas quando abordamos num jornal, cuja capacidade de mobilização é a marca registrada dos veículos diários, a probabilidade de mudanças e reações será maior. A tabelinha entre sensibilização de revista e mobilidade de jornal adquire contorno especialíssimo de otimismo sustentado. Atirar sob o tapete o debate em torno de questões como essa — a competitividade regional — é acreditar em Papai Noel.


Somos cidadãos metropolitanos em intensidade quase semelhante à de cidadãos do Grande ABC. As fronteiras locais são mais tênues que as demarcações metropolitanas. A migração diária de trabalhadores que se deslocam internamente entre os sete municípios é mais intensa que a observada em relação a movimentações em direção a outros territórios da metrópole, mas tem-se acentuado o universo de translados menos convencionais. Isso eleva a responsabilidade editorial de transmitir informações mais elásticas sem perder as raízes regionais. É preciso situar o morador do Grande ABC no contexto metropolitano. Explicar-lhe, por exemplo, a vantagem de uma mega-obra viária anunciada por São Bernardo. Ou a construção da Avenida Jacu-Pêssego. O que tanto uma quanto outra vão representar de alternativas de locomoção e também de geração de riquezas.


Há quase duas décadas atravessa parte de nossas fronteiras municipais uma escandalosa serpentina metropolitana, na forma do extenso trecho do sistema de trólebus, que começa na zona leste da Capital, cruza Santo André, São Bernardo e Diadema e desemboca na Capital. Um arco de integração, cujos reflexos sociais e econômicos jamais foram estudados. Quanto das demandas por educação e saúde públicas dos municípios atendidos pelo sistema de trólebus não teria sido adicionado pelas facilidades de transporte?


O que se pretende dizer é que o conceito de regionalidade é tão amplo, contundente e compulsório quanto escamoteador. Exige cuidados especiais para que não seja subvertido. O entendimento será proporcionalmente maior na medida em que se sufocar o simplismo decorrente da falta de informações sistêmicas. Um veículo de comunicação que pretende se posicionar em defesa do território em que atua — e se entenda posicionar em defesa como expressão que não comporta deformações interpretativas voltadas unilateralmente ao cor-de-rosa desavergonhado — deve saber distinguir o momento certo em que uma manchete ou uma foto de primeira página de um treinamento ou de um jogo do Santo André é mais importante que, em situação semelhante, o seria o noticiário envolvendo um dos grandes clubes da Capital. Ou mesmo que uma decisão de um campeonato varzeano com alguns milhares de expectadores tem maior peso que uma decisão da Copa Européia.


O conceito de regionalidade não pode perder de vista uma lógica operacional muitas vezes esquecida e que precisa ser reiterada para que determine o fim de ilusões e desperdícios: temos de extrair de nossos profissionais de comunicação o máximo de informação do território sobre o qual se debruçam cotidianamente. Pretender competir com os grandes jornais da Capital no noticiário nacional e internacional sem contar com a equivalência de recursos humanos e materiais disponíveis é dar um tiro no pé. Afinal, deixamos de explorar as peculiaridades de nosso território, onde vivem nossos leitores e assinantes ávidos por informações regionais qualificadas, e nos perdemos no tiroteio de uma competição desigual.


O investimento de uma pequena ou média metalúrgica de Diadema é muito mais importante que a notícia de novas tragédias na Palestina. A notícia internacional será publicada, evidentemente, mas não pode ganhar em importância para os fatos mais relevantes de nossa geografia. Sempre perderemos a batalha do noticiário nacional e internacional, porque as agências contratadas nos sonegam o filé mignon. Sempre ganharemos a batalha do noticiário regional, porque teremos nossos profissionais cuidando do que interessa de fato ao nosso dia-a-dia.


Não podemos mais ver nossos patrimônios pessoais morrerem — como têm morrido porque ainda não inventaram a fórmula da eternidade física — e simplesmente os ignorarmos por falta de conhecimento regional. Em contrapartida, ativos pessoais nacionais e internacionais acabam por ocupar o derramamento de nossos espaços editoriais. Entregamo-nos a uma globalização de mão única — onde o que vale é a globalização excludente do regionalismo contemporâneo. Os personagens que ajudam a construir de fato a história econômica, social, cultural e política do Grande ABC precisam ser valorizados em suas variadas dimensões. Reconhecer-lhes os méritos tem o significado de erguer espelhos que poderão se multiplicar em defesa da regionalidade.


 Conselho Editorial


Iremos substituir o Conselho do Leitor pelo Conselho Editorial. Não se trata de simples troca de nomenclatura. A mudança é muito mais substantiva, porque invade o terreno do conceito, da especificidade. O Conselho do Leitor é instância estranha no departamento-vitrine da empresa — o editorial — porque atinge diretamente quem está envolvido com o público e, consequentemente, com o produto final. A composição e as funções atribuídas aos conselheiros-leitores são uma anomalia porque agridem e impactam a corporação no que provavelmente deve oferecer como principal predicado: a auto-estima acompanhada de senso de respeito.


O Conselho do Leitor golpeia a auto-estima porque os profissionais acabam avaliados publicamente por leigos no assunto. Por mais que eventualmente haja colaboradores do Conselho de Leitores que possam contribuir para a melhoria do jornal, a exposição de enunciados críticos da forma que se caracterizou — em espaço fixo nas edições de domingo — torna tão ansioso quanto receoso o quadro de colaboradores. As repercussões de intranquilidade e insegurança se refletem no produto final. Chuta-se ladeira abaixo uma bola-de-neve de impropriedades que abalam a unidade da equipe.


Nada mais comprometedor para uma equipe do que se sentir permanentemente ameaçada por avaliações públicas formuladas por não-especialistas. A formalização do Conselho do Leitor nos termos atuais é, portanto, equívoco que será eliminado em sintonia com o encerramento do mandato dos atuais conselheiros. Entretanto, isto não quer dizer que a redação estará imune a avaliações internas e externas. Pelo contrário: estabeleceremos medidas cautelares que permitirão medições permanentes do conjunto da redação e também por editoria sem que a medida tenha qualquer conotação de desconfiança e de desautorização, quando não de subversão dos preceitos profissionais.


Não podemos desconsiderar nessa decisão — aliás, é o ponto nevrálgico da questão — que o conteúdo editorial do Diário do Grande ABC, face as atribulações conhecidas de todos, encontra-se em momento decididamente complicado e, portanto, extremamente delicado. Não é de bom alvitre a adoção de qualquer instância avaliativa — principalmente por leigos — que exponha publicamente ou mesmo internamente os pecados da publicação. Estimula-se a insegurança individual e coletiva, caminho mais curto para a instabilidade emocional e técnica de profissionais que exigem dose diária de estímulo, combinada com senso crítico emanado de quem conhece o ritual da atividade. Ou seja: o Conselho do Leitor seria uma peça de carpintaria editorial aproveitável com adaptações que não convém ressaltar agora, mas num contexto diferenciado do atual. Não existe estrutura técnico-emocional para suportar o strip-tease a que são submetidos os jornalistas por leitores que, por mais boa-vontade e interesse que tenham, nem sempre conseguem retirar as peças com um mínimo de competência. O produto que vai às ruas precisa ser entendido de forma muito mais integrada do que simplesmente numa censura pública ao deslize ortográfico.


Já a introdução do Conselho Editorial significará grande salto de qualidade do jornal rumo à comunidade. Diferentemente do Conselho do Leitor, que vive à caça de descuidos léxicos e analisa superficialmente os assuntos sobre os quais o jornal se dedica a levantar, o Conselho Editorial será integrado por profissionais residentes e atuantes na região. Serão especialistas em diversas áreas. Caberá a esses membros, juntamente com alguns jornalistas da equipe de redação, a tarefa de construir coletivamente um novo perfil de produção do jornal, absolutamente sintonizado com o macroplanejamento editorial.


Caberá ao Conselho Editorial não a procura de escorregões da língua pátria, obrigação técnica de quem está na redação, mas a introdução de conhecimentos específicos na linha editorial do jornal. Os membros do Conselho Editorial que fazem parte da comunidade trarão experiências vividas para o interior do jornal, sempre em encontro coordenado pelo diretor editorial e pelos editores-chefes do Diário do Grande ABC e de LivreMercado. Especialistas em educação, marketing, urbanismo, transporte, segurança, meio ambiente, legislação, economia, entre tantas outras áreas, vão integrar-se à redação como cérebros complementares. Serão espécies de consultores a quem poderemos reservar, também, espaços editoriais como colunistas fixos ou eventuais.


Formularemos um código específico de atuação dos membros do Conselho Editorial. Estabeleceremos algumas condições que darão ao organismo caráter de compromisso exclusivo, evidentemente sem remuneração, mas nem por isso excluído de eventuais programas de compartilhamento de marketing que trataremos de definir na sequência de nossos trabalhos.


Haveremos de tornar o Conselho Editorial tão respeitado que suas repercussões em muito colaborarão para o fortalecimento editorial do jornal e o aperfeiçoamento da linha editorial da revista. Os integrantes do Conselho Editorial serão convidados pelo diretor de redação porque cada peça requisitada fará parte de uma engrenagem de complementaridade temática que não se esgotará nos conhecimentos individuais específicos. Avançará inexoravelmente em direção aos macropressupostos de reorganização da companhia na área editorial.


 Formação profissional


A exemplo do que organizamos entre 1982 e 1983, quando ocupamos posto equivalente ao de chefe de redação, embora a nomenclatura fosse de coordenador de produção, vamos introduzir um mecanismo de seleção e preparação de recém-formados para, mediante necessidades, contratá-los para substituir ou eventualmente reforçar nosso quadro de redação.


Naquela época chamamos de escolinha o que veio a se consolidar como virtuosíssimo modelo de reposição e contratação de jovens valores. A importância dessa iniciativa vai muito além do que alguns supõem restrita a interesses financeiros. Aliás, o viés financeiro é apenas uma fração do conjunto de vantagens da introdução desse processo de depuração e uniformização de recursos humanos da área editorial.


Pesa muito mais em qualquer equação que se desenhe a perspectiva de que essa turma de jovens poderá ter acesso aos quadros de redação sem sofrer impactos emocionais e técnicos que tanto comprometem a qualidade do produto final, isto é, da informação consumida pelos leitores. É enorme a diferença entre o rendimento de um jovem recém-formado e contratado para atuar numa redação sem referenciais da cultura editorial da publicação e um jovem recrutado tendo como base a preparação numa espécie de vestibular. Produtividade é o verbete que, no fim da linha de avaliação, definirá a diferença entre um modelo e outro.


Afastar qualquer possibilidade de ruídos no circuito de informações que devem chegar aos leitores é o pressuposto de, também na seleção e no aproveitamento de jovens talentos, atingir respeitabilidade editorial.


A preparação permanente, sistemática e programática de jovens que ocuparão parte do universo da redação é condição imprescindível à estabilidade do departamento. Não se pode descartar a oxigenação da juventude em qualquer ambiente corporativo, sob o risco de enferrujar a engrenagem. Entretanto, a simples escalação de recém-formados sem o devido preparo técnico, emocional e cultural se revestiria de tiro no próprio pé. Afinal, a contratação pura e simples de novos valores, atirados às feras de um produto que desconhecem, eleva as possibilidades de destruição da auto-estima pessoal e, principalmente, submete o profissional recém-chegado a uma sequência de improdutividades que desarticulam o produto final. E, nesse ponto, mais uma vez, vale a pena enfatizar: o consumidor de informação não pode ser apanhado no contrapé pelo efeito-tobogã de abordagens editoriais desconectadas dos valores exaustivamente enfatizados.


Não se pode nem ao menos conjecturar que jovens eventualmente talentosos sejam escalados para produzir em nome de um jornal quase cinquentenário sem que estejam adequadamente entronizados nos conceitos técnicos e culturais da publicação. O produto que vai às bancas e aos endereços domiciliares e empresariais tem de ser observado sob o mesmo rigor de algo como um laticínio de marca respeitável exposto cuidadosamente na gôndola de um supermercado, de um veículo zero quilômetro que ajuda a compor o ambiente de uma concessionária, de um elenco de estrelas que se confunde com a logomarca de uma empresa de comunicação. Uma publicação que comete erros grosseiros ou omissões incontornáveis sofre fortes arranhões de credibilidade.


 Especialização


É uma jornada longa, complexa, trabalhosa, mas precisa ser iniciada o quanto antes. Estamos nos referindo à constituição de quadros profissionais de redação que serão especialistas nas mais diferentes matérias. O jornalismo mais contemporâneo exige que os profissionais conheçam tanto as técnicas de interlocução com os leitores como uma bateria de questões específicas relatadas pelas fontes de informação. Não podemos ser simples repositórios de declarações. Tratamos dessa questão, com profundidade, no livro “Meias Verdades”. É epidêmico o grau de manipulação de informações. Principalmente nos jornais diários, formulados pela mesmice de reproduzir declarações acriticamente. Não se trata de obstar esse caminho necessariamente pela estrada da opinião, mas pela avenida da interpretação e, principalmente, por um feixe de dados de valor agregado. Aos leitores não se pode atribuir o rótulo de ignorantes. Costumamos dizer que nos compete como profissionais de comunicação muito mais que servir o almoço de informações — temos de digeri-las, metabolizá-las, facilitando o entendimento do leitor.


Poderíamos desfraldar uma série de exemplos de situações em que se manifestam tergiversações descaradas do princípio de bem informar, mas o melhor mesmo é recorrer a “Meias Verdades”. A essência do esgarçamento informativo qualificado está plantada na aridez de conhecimentos dos profissionais de comunicação. A saída é setorizá-los e fazê-los mergulhar fundo nos arquivos, nos livros, enfim, em toda a literatura possível de ser utilizada a qualquer instante.


Um exemplo do que a falta de especialista é capaz de provocar está na área de saúde. A idéia de que um determinado Município está extraordinariamente mais suscetível à demanda de serviços sociais geralmente não corresponde à realidade porque, afinal, é generalizado o descompasso entre a massa de desafortunados que precisam recorrer ao sistema público e a ilha de incluídos que resistiram à onda de desemprego e da perda das chamadas conquistas históricas, especialmente do setor metalúrgico da região. As pequenas e médias empresas industriais praticamente desativaram o ferramental de proteção social constitucionalmente de responsabilidade do Estado. Esse vácuo forçosamente passou a ser preenchido pelo setor público.


Ainda sobre esse aspecto, recentemente à frente do IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos) pudemos comprovar que os investimentos na área de saúde pública no Grande ABC estão longe do imaginado, resultante do noticiário do jornal. A rica São Caetano é a que menos investe por habitante no setor — ao contrário do que aplica na educação, cujos valores são os maiores do Grande ABC. E não se deve correlacionar o baixo valor despendido por São Caetano apenas e exclusivamente ao perfil socioeconômico da população. Há informações que denunciam, sim, o baixo rendimento do Município nesse quesito. Para quem mora em São Caetano e não está gravitacionalmente contaminado pelo ufanismo oficial, a área de saúde é um buraco imenso que precisa de reparos. Os dados do IEME comprovam essa verdade. Não só os dados do IEME, mas o próprio ranking do IDHM, que mede a qualidade de vida dos municípios — São Caetano tem a menor das três médias (as outras são relativas às áreas de educação e renda) exatamente no critério de longevidade.


Esse é apenas um exemplo que pinçamos para justificar e enfatizar a importância de especialistas editoriais. Trata-se de realidade comum nos principais jornais do Primeiro Mundo, mas uma exceção à regra no mercado brasileiro quando se trata de questões relativas à cidadania. Temos sim especialistas em coberturas esportivas, políticas, policiais, econômicas, mas, mesmo assim, com elevada fragilidade informativa. São mais setoristas que especialistas. Profissionais sobre os quais os especialistas do outro lado do balcão — as fontes de informação — geralmente deitam e rolam interesses específicos. A máxima de que jornalista tem apenas de reportar contribui imensamente para que os vieses se ramifiquem insidiosamente. As publicações não contam com mecanismos de segurança contra impostores porque em larga escala não estão preparadas para a contra-argumentação.


Entregar às páginas opinativas dos editoriais a incumbência de eventualmente neutralizar ou reposicionar os efeitos maléficos e distorcivos de fontes de informação viciadas é um comodismo que se instaurou nas redações. O que mais se verifica, também nesses casos, é a complementaridade de disparates porque os editorialistas, cada vez mais próximos do cotidiano das redações, apenas pasteurizam e retroalimentam as informações anteriormente formuladas. Não bastasse isso, é importante ressaltar que, por mais importantes e procedentes que sejam os editoriais, pesquisas comprovam que se tratam de espaços lamentavelmente consultados em proporção bastante inferior ao do noticiário convencional. Ou seja: informações equivocadas que tenham ocupado o corpo da publicação dedicada ao noticiário geralmente se consolidam como verdadeiras e irrebatíveis. O aval do editorial é a força suprema dos veículos. Para o bem e para o mal.


A formação de especialistas é um processo longo e persistente que não se esgota em alguns pares de ano. É uma jornada intensa. Mas bastante compensadora. Os especialistas são uma cabeça-de-obra disputadíssima no mercado de trabalho porque, além da segurança da informação correta, oferecem a contrapartida de alta produtividade. Sim, alta produtividade. Coloque numa disputa por produtividade um especialista que conheça a fundo a área de saúde, suas fontes, dados estatísticos, comparativos, essas coisas, e um faz-tudo ou quase tudo que, perambulando por assuntos diversos, se vê a cada jornada imerso num determinado assunto.


É o mesmo que comparar um mecânico especializado em motores de caminhão e um mecânico escalado um dia para consertar pneus, outro dia para atuar como ajudante de carregamento, num terceiro como mecânico de fato, num quarto como motorista, num quinto com engraxador. O melhor mecânico será aquele que dominar as técnicas de sua atividade e, suplementarmente, atuar em ações-afins que agreguem valor à função principal. O melhor jornalista será aquele que dominar integralmente sua especialidade e jamais se descuidar dos assuntos correlatos. Ganha-se, repito, tempo e um significativo progresso profissional. A especialização não exclui a multiplicação de conhecimentos. Pelo contrário: a notabilidade no específico é um atributo de quem reconhece a importância do periférico afim.


 Multifuncionalidade


A especialização é parente muito próximo da multifuncionalidade. Sem especialistas não se alcança a diversidade funcional. Com vagar, é mais que possível, é certo, que um profissional de jornalismo absorva várias atribuições que o convencionalismo editorial subdivide entre vários colaboradores. As diversas fases que caracterizam a linha de montagem editorial podem ser compactadas com evidentes vantagens de tempo e recursos financeiros. Um mesmo jornalista pode desempenhar funções de pauteiro, repórter, redator, editor, titulista e legendista. E não se observe esse encadeamento como algo tecnicamente inconciliável. Trata-se de gestão compulsória de atributos pessoais. Basta querer. É assim que iniciamos uma revolução na Editora Livre Mercado, onde metade da equipe editorial é formada de jovens ainda inexperientes.


Destacamos esse caráter de juventude que caracteriza parte dos quadros editoriais da Editora Livre Mercado para que não se avoque a impossibilidade de combinar revolução e inexperiência. Os resultados não são semelhantes entre os dois grupos de profissionais. Os jornalistas com maior experiência e que tiveram de adequar-se ao novo modelo, vindos todos do arcaísmo de uma hierarquia atávica, compreenderam a importância de se tornarem donos de cada produto que têm na mão — sim, a eles entregamos a responsabilidade e o prazer de extraírem o máximo de insumos. Quem redige a matéria tem mais facilidades para escolher a foto, sacar um título, optar pela melhor legenda, redigir o texto de chamada de primeira página, coisas assim. Ao editor compete, entre outras tarefas, a homogeneização da linguagem que, por sua vez, é uma das frondosas ramificações da mesma árvore editorial. A isso se dá o nome de personalidade editorial.


A introdução do sistema de multifuncionalidade conjugada com especialização poderá causar certo impacto no início, mas a mensagem que será passada aos profissionais permitirá amortecer eventuais desconfortos. Primeiro porque poucos resistirão à tentação de apropriarem-se de cabo a rabo dos produtos sob sua responsabilidade. Segundo porque a perspectiva favorecerá o enriquecimento técnico. Terceiro porque estará firme no horizonte a oportunidade de a racionalidade associada à qualidade gerar maiores rendimentos salariais porque os mais apetrechados acabarão por galgar os melhores postos. É impressionante como os profissionais que se motivam com a multifuncionalidade — e a motivação é praticamente compulsória — acabam por se preocupar muito mais com o conjunto da obra. Sim, porque eles passam a entender uma das leis soberanas do jornalismo: se a matéria é confusa, o título se torna um tormento e a legenda um desafio.


Não conseguimos enxergar uma redação que não tenha vocação a multiplicar funções. Estamos reproduzindo no campo editorial uma realidade prática do mundo da indústria de transformação. Mais e mais os chãos de fábrica patrocinam cases de engenhosidade funcional. Os núcleos de produção estão sendo ocupados cada vez mais por profissionais doutrinados a exercerem funções correlatas múltiplas. Vivemos tempos ultramodernos em que o conhecimento teórico aliado à funcionalidade prática faz a diferença.


Estabelecer limites fossilizados aos profissionais de comunicação é o caminho mais curto ao desperdício. Quando se descobre capaz de pautar, redigir, corrigir, titular e legendar, não há jornalista que não estufe o peito da auto-estima. Que prazer tem um profissional, se de autocrítica dispor, em simplesmente executar uma dessas tarefas? O mais interessante é que multitarefas se revestem de tanta sinergia individual e coletiva que acabam por agilizar o amadurecimento dos profissionais. Queimam-se etapas. Profissionais mais antigos e que não passaram pela experiência simplesmente acusam as dores do despreparo. Há profusão de casos de bons redatores péssimos titulistas, bons pauteiros péssimos redatores, bons editores e péssimos pauteiros.


 Parceria


As relações corporativas entre Editora Livre Mercado e Diário do Grande ABC vão depender também de áreas além do setor de insumos, mas no que estiver sob nosso gerenciamento não há dúvidas de que prevalecerão medidas cooperativas para racionalizar custos e implementar receitas. O Prêmio Desempenho, realizado há 10 anos pela Editora Livre Mercado e poucas vezes tratado como produto da companhia Diário do Grande ABC, será pela primeira vez compartilhado dentro dos limites redacionais que esperamos frutíferos. Para isso, entretanto, teremos de fazer série de adaptações para corrigir posicionamentos do jornal.


Vamos a um exemplo prático e insofismável: raramente, muito raramente, e mesmo assim sem o conhecimento necessário na formulação dos cases, o Diário do Grande ABC publica reportagens que contam histórias de sucesso de nossos empreendedores privados, governamentais e não-governamentais, marca registrada do Prêmio Desempenho. Prefere o jornal flutuar na superficialidade de noticiário do dia-a-dia, alguns importantes, outros apenas para preenchimento do espaço. Essa deformação é uma das sequelas da escravizante teoria e prática de o jornal pretender competir com os grandes veículos da Capital sem, entretanto, contar com meios materiais e humanos para tanto. Por isso é relevante que o jornal tenha vocação e vontade editorial para acrescentar a livre iniciativa regional — sobretudo de pequeno e médio porte — em seu portfólio de publicações. Não fosse a Editora Livre Mercado — e isso é comprovável com simples ida aos arquivos –, os empreendimentos privados e mesmo os programas públicos e não-governamentais consagrados pelo Prêmio Desempenho seriam desconhecidos do público.


Não é preciso ir longe para pinçar alguns exemplos clássicos de que o Prêmio Desempenho, extensão da linha editorial de LivreMercado, firmou compromisso de reconhecimento dos cases de sucesso na região. Basta ver quantas vezes a Coop, a Bridgestone Firestone e tantas outras empresas regionais tiveram atuações destacadas além do noticiário convencional. Nossa aproximação com a Bridgestone Firestone em 1999 se deveu a um case que escrevemos depois de entrevista com o presidente Mark Emkes, hoje dirigente máximo da companhia nas três Américas. A Reportagem de Capa — “A Lista de Emkes” — foi um sucesso extraordinário, entre outras razões, porque contamos como aquele norte-americano manteve a fábrica de capital japonês no território de Santo André. Ele conseguiu iniciar a injeção de mais de US$ 200 milhões de investimentos em contraposição à sedutora guerra fiscal que pretendia levar a indústria para outro município brasileiro, fértil em isenção de impostos. Mark Emkes acabou eleito Empresário do Ano da Acisa, o case ganhou o título de Melhor dos Melhores do Prêmio Desempenho e o Legislativo de Santo André conferiu-lhe o título de Cidadão Andreense. Tudo depois daquela Reportagem de Capa.


As relações históricas do Diário do Grande ABC com a iniciativa privada no formato proposto e executado pelo Prêmio Desempenho jamais se efetivaram. De fato, o jornal é mais conhecido dessas e de tantas outras empresas apenas pelas publicações nos cadernos de classificados de empregos — muito mais no passado do que no presente, é claro. Esse descompromisso editorial precisa ser reparado com certa urgência, já que o Projeto Diário50Anos depende também da sensibilidade editorial da companhia. Quando os insumos desprezam o território do qual o jornal vive economicamente, optando pelo descarado Complexo de Gata Borralheira de considerar 20 novas mortes no Irã mais importantes que os investimentos de uma metalúrgica de Diadema, o tamanho do rombo de inter-relacionamentos editoriais e comerciais é maior do que se imagina.


Percebe-se, portanto, que há um vácuo dividindo o jornal e a classe empresarial. Foram na realidade poucos os momentos na história do Diário do Grande ABC em que as empresas locais lhe interessavam como nutriente editorial. Lembro que ao assumir a redação do jornal em 1983, quando cuidei pessoalmente da tropa nos aspectos operacionais, sem poder de decisão para implementar estratégias mais profundas, encontramos uma Editoria de Economia com apenas dois profissionais. Quando deixamos o cargo, dois anos depois, tínhamos oito profissionais e confesso, mesmo assim, naquela oportunidade, ainda não foi possível transmitir a importância de um jornalismo econômico regional. Viemos a empreender essa proposta em 1990, quando criamos LivreMercado e ainda estamos amadurecendo o projeto, porque há sempre inovações a ser aplicadas.


Temos muito o que construir na Editoria de Economia do Diário do Grande ABC, para onde haveremos de concentrar não só esforço de descoberta desse filão há muito identificado com a revista do grupo como também da própria dinâmica de recuperação da economia regional mais fortemente abalada pelos sucessivos planos econômicos que nos tiraram parte da riqueza industrial e do potencial de consumo. Quem acompanha diariamente as páginas do jornal sabe o quanto essa editoria está alquebrada. A Economia do Grande ABC praticamente inexiste no Diário do Grande ABC, e quando aparece, se transforma num terror de imprecisões e manipulações de fontes suspeitíssimas. O pesquisador João Batista Pamplona, durante três anos porta-voz da Agência de Desenvolvimento Econômico, foi demitido por causa dos constantes desmascaramentos estatísticos e interpretativos aos quais o submetemos. Durante todo aquele período ele — e outros pesquisadores menos ostensivamente deletérios nas informações — se tornou verdadeiro ídolo dos jornalistas do jornal. Incapazes de compreender as nuances econômicas locais, entregues às baratas de uma hierarquia interna mambembe que simplesmente joga a editoria às traças, e embalados pela cegueira de um triunfalismo pouco lúcido, os responsáveis pela Economia do Diário do Grande ABC cometeram as maiores sandices informativas — documentadas especialmente no livro “República Republiqueta”, que lancei em 1º de abril de 2003 em homenagem sarcástica a todos aqueles que usam a mídia para interesses muitas vezes inconfessos e outras vezes por pura falta de competência.


É por essas e outras razões que convém assinalar neste documento que consideramos improrrogável uma aliança estratégica e operacional entre os membros da redação da revista e do jornal — sempre com cuidados iniciais para que não se gere melindres. Poderemos maximizar a carga horária dos profissionais, bem como as próprias coberturas. Um simpósio que se realize dentro ou fora do território regional e cujo temário é de fundamental importância para a concepção editorial do jornal e da revista — no caso as questões metropolitanas — poderá ter a cobertura de um jornalista da revista, mais enfronhado no assunto. A diferença entre o padrão de cobertura atual e o novo é que o Diário não dá importância ao tema, embora seja o veículo mais importante da Região Metropolitana depois dos diários sediados na Capital. A revista cobrirá o acontecimento, dando-lhe formato de texto adequado de revista, mas o repórter também ocupará espaços nos dias do evento com a descrição da série de debates. Aos poucos incorporaremos aos quadros de Economia do Diário do Grande ABC os preceitos de coberturas regionais, com ênfase nos cases que serão levados ao Prêmio Desempenho, as nuances das ações e inações das secretarias municipais de Desenvolvimento Econômico, ao imbróglio das Regiões Metropolitanas, principalmente da Grande São Paulo, e também aos pequenos negócios que eventualmente não estejam preparados para galgar o Prêmio Desempenho mas que tanto carecem de visibilidade — como fazemos hoje na revista. Enfim, repassaremos ao jornal a cota da cara econômica que tanta falta lhe faz inclusive com objetivos comercias decorrentes da sinergia ética entre os departamentos de redação e comercial.


 Operacionalidade


Somente um diagnóstico que leve em conta o dia-a-dia de produção conseguirá aferir sem maiores riscos o grau de eficiência, de eficácia e de ineficiência do jornal. A diferença entre eficácia, eficiência e ineficiência é a mesma entre um goleador que marca gols em profusão mas inúteis contra adversários de baixo nível e sempre nega fogo quando se vê confrontado com a imperiosidade de decidir; um goleador que distribui artilharia harmoniosamente, sempre nos momentos mais delicados, sempre quando um gol faz a diferença de pontos preciosos; e um goleador em fim de carreira, incapaz de recuperar a velha forma e que, portanto, vive única e exclusivamente do passado. Eficiência é fazer o melhor com mais agilidade, com alta rentabilidade individual, com amplo compartilhamento coletivo. Os artilheiros mais confiáveis são aqueles para os quais não converge toda a atenção de seus companheiros, mas são capazes de integrar-se de tal forma ao conjunto que extraem dessa simbiose os melhores resultados.


Detestamos apressar o passo sobretudo quando não contamos com fluxo de informações que consubstanciem argumentos. Entretanto, nos últimos dias, por força das circunstâncias e depois de receber relatório com nomes, datas de contratação, funções e salários dos profissionais da área de conteúdo do Diário do Grande ABC, chegamos a algumas conclusões precárias mas que, nos primeiros 30 dias de trabalho, poderão configurar-se autênticas veredas sobre as quais introduziremos nossa metodologia. Aparentemente, há número desproporcional de profissionais de áreas-fim em relação às áreas-meio. Profissionais de áreas-fim são aqueles cujos nomes podem diariamente ser identificados pelos leitores, porque têm trabalhos assinados. Profissionais de áreas intermediárias estão na retaguarda. Suas identidades raramente chamam a atenção dos leitores porque o mercado consumidor é implacável com as aparências: não se compra um produto editorial pela retaguarda operacional, mas pelo pelotão de frente dos formuladores de textos e fotografias.


Esse desbalanço — insistimos em dizer que se trata de constatação sujeita a revisão durante o período de diagnóstico — poderia denunciar o enquadramento da área de conteúdo do Diário do Grande ABC na saia justa de um verbete que causa calafrios em quem procura encurtar sempre e sempre e de forma pragmática a distância entre dois pontos: burocratismo. Isso mesmo. Há cheiro de burocratismo no ar — ou melhor, no relatório que recebi e que espero não reúna a amplitude que inicialmente vislumbro. Não consigo entender — e jamais vou ceder à tentação de me convencer de algo absolutamente sem nexo — que jornalistas contratados para escrever e exercer outras funções correlatas não consigam dar o recado inteiro.


Há profissionais no Diário do Grande ABC que simplesmente desapareceram dos radares de identificação explícita do produto. Basta lançar mão da coleção no arquivo e confrontar as assinaturas dos autores das matérias e das fotografias com o quadro de colaboradores. É claro que trabalham, porque senão não estariam na empresa, mas trabalham provavelmente mal: exatamente por serem os mais experientes não conseguem se comunicar diretamente com os leitores, expondo conhecimentos em forma de matérias, de artigos, de posicionamentos que ajudam a dar personalidade ao produto.


O que se passa, então? Na medida em que escrevemos, mais nos arriscamos a garantir que há um emaranhado funcional no setor de conteúdo do Diário do Grande ABC que afronta os critérios de produtividade. Por mais que o cotidiano seja intenso — e o é realmente numa redação de jornal diário — não existe justificativa sustentável para o editor desaparecer das páginas — exceto a burocracia, evidentemente. A multifuncionalidade já mencionada contribuirá imensamente para recolocar as peças nos devidos lugares. Editor que não escreve é como pedreiro que não assenta tijolo, é como cantor que não canta, é como piloto que não dirige; ou seja, é a negação descarada da função.


Provavelmente, muito provavelmente, por força dessas mais que evidentes anomalias estruturais em que se privilegia sobremodo o tecnicismo funcional em detrimento da exploração do potencial de cada profissional, o Diário do Grande ABC apresente a singela marca de conferir a boa parte de seus colaboradores um sistema de banco de horas que premia enormemente a mão-de-obra e sacrifica terrivelmente o produto. Enganamo-nos ao afirmar ainda outro dia que há funcionário da área de conteúdo que já gozou de férias de 60 dias por conta do banco de horas. Desconhecia até então que há situações mais alarmantes — um colaborador teria descansado quase 120 dias corridos.


Não são apenas os dias corridos que corrompem e desmantelam qualquer enunciado voltado à qualidade do produto. Também há operações pinga-pinga, bate-volta, de três, quatro, cinco dias de descanso remunerado. Essa intermitência funcional é quase tão danosa quanto os casos de turismo remunerado. O Diário do Grande ABC talvez tenha se esquecido da lógica acaciana de que, ao desprezar o consumidor de informação em favor de vantagens funcionais a seus colaboradores, o mesmo consumidor surrupiado pela imprecisão das informações também pode — e geralmente o faz — esquecer o jornal. Já imaginaram se uma linha de produção de qualquer coisa menos dependente de cérebro — as linhas de montagem de veículos, por exemplo, cada vez mais automatizadas — também contasse com esse disparate metodológico? É provável que os casos de recall seriam muito mais frequentes e o comprometimento da imagem da companhia não se tornasse apenas uma tempestade passageira. Fossem as férias curtas ou longas no campo editorial uma ousada inovação de se tirar o chapéu, as telenovelas da Globo provavelmente se inspirariam nesse modelo de reformismo funcional, retirando de cena durante vários capítulos importantes personagens de seus dramalhões sempre bem dirigidos. Um jornal não é outra coisa senão uma grande telenovela, com a vantagem de que há novos personagens a cada dia a acrescentar mais interesse dos leitores. Um jornal com uma equipe de colunistas de peso regional, por exemplo, segura a audiência. Como descartar que entre os colunistas estejam os editores, por exemplo?


Ainda sobre essa questão — a questão das férias prolongadas ou intermitentes decorrentes do banco de horas — algumas conclusões emergem menos como especulação e mais como experiência prática. Primeiro: se há profissional cuja dispensa dos afazeres pelos quais foi contratado incide perfil tão escandalosamente antiprodutivo, é sinal de que não faz parte das necessidades vitais da empresa. Segundo: a negativa dessa avaliação, ou seja, de que o profissional em constante vacância funcional não estaria na lista dos improdutivos, requer da estrutura funcional urgente modificação. Qual é a solução? Controlaremos todos os setores de conteúdo da empresa num primeiro instante e, em seguida, repassaremos aos responsáveis por área os conceitos que serão imediatamente aplicados e que, em resumo, constarão do seguinte enunciado: em situação de normalidade, nenhum profissional deve gozar de período de férias ou de qualquer malabarismo de descanso que ultrapasse os limites convencionais ditados pela legislação, pelo bom senso e pelo dogma de que o produto está em primeiro lugar.


Longe de mim imaginar que está em franca evolução na área de conteúdo do Diário do Grande ABC uma grande fuzarca funcional em que, deliberadamente, se construiu um banco de horas cuja finalidade principal seja sangrar a qualidade do produto. Embora essa suspeita seja apenas especulação, não conseguimos encontrar justificativas e explicações para o saqueamento permanente da engrenagem editorial. Quem seria capaz de opor-se à projeção que deslocaria maliciosamente o banco de horas do Diário do Grande ABC para a passarela carnavalesca da locupletação geral e irrestrita dos colaboradores? Como estabelecer e exigir valores laborais à fixação e à manutenção de um núcleo editorial cujo amanhã seja a continuidade do ontem se parte dos colaboradores desaparece da linha de produção e, dadas as peculiaridades do descanso, acaba mesmo sem querer se desvinculando do compromisso social do produto?


 Relacionamento externo


O relacionamento com público externo é uma equação que requer desprendimento. Nem sempre é possível detectar, mas geralmente é viável abortar inescapáveis problemas. Basta querer. Trata-se do distanciamento mínimo dos formuladores editoriais e dos responsáveis acionários pelo produto que vai às ruas e as fontes de pressão. O apadrinhamento de pessoas e entidades é o desvio mais rápido para a acomodação editorial, seguida da desmoralização nem sempre impactante mas sem dúvida suficientemente danosa. Premiar agentes improdutivos com mistificações deliberadas ou acríticas destila indignação mesmo que silente no seio da comunidade que conhece mais de perto o oportunismo de atores que se aproximam da mídia apenas para levar vantagem. Quando esses sanguessugas se cristalizam no poder midiático, acabam por definir o padrão ético-editorial da publicação. Se os improdutivos tomam tanto espaço, como será possível aos eventuais produtivos apeá-los do poder sem correr o risco de antagonizar-se com a mídia?


O Grande ABC vive momento especial demais para permitir a perpetuação dessa tradição arraigada no jornalismo nacional. É preciso dar vez ao reformismo sem, entretanto, cair no viés extremo de fabricar novos agentes. Os relacionamentos institucionais do Diário do Grande ABC — ou seja, as relações da empresa com o público externo formado por administrações públicas, entidades econômicas, legisladores, lideranças sociais e culturais, gestores e produtores acadêmicos, entre tantos — não podem ser confundidos com a linha editorial. É verdade que uma coisa necessariamente não exclui a outra, mas também é fato que uma coisa pode contaminar a outra e destilar, como dissemos, o conceito de que mais importante do que fazer é fazer de conta que se faz, porque sempre haverá um veículo importante para sacralizar o pecado da omissão dissimulada e do despreparo escamoteado.


O jornal, como produto e como instituição, não pode, portanto, construir relações circunstanciais ou efetivas que afetem os insumos editoriais. Dar oportunidade a todos para que participem de uma grande virada institucional do Grande ABC é ação prospectiva que tem o condão de zerar os déficits do presente e do passado. A vantagem de incrementar essa nova empreitada é que os erros acumulados deverão servir de lição. Somente um novo enquadramento editorial que dignifique quem tem garrafas para vender permitirá a reconstrução de relacionamentos entre as instituições mais importantes da região, provavelmente com o Diário do Grande ABC como catalisador dessas operações.


Nada, entretanto, que lembre o fracasso do Fórum da Cidadania, deliberadamente uma ação do jornal que, por não ter tido o controle estratégico recomendado, cometeu o desvio múltiplo de baixa representatividade, politiquismo partidário, afrouxamento institucional, entre outros problemas. Tornar-se o centro nuclear das ações de restauração das forças econômicas e sociais da região não significa afirmar que o Diário do Grande ABC deve paternalizar as entidades. Pelo contrário: nosso regionalismo recomenda que as instituições sintam-se livres de amarras que eventualmente as embalem incondicionalmente e as coloquem, portanto, a salvo de restrições e correções de rumo. Tivesse o Fórum da Cidadania dispensado o hierarquismo do Diário do Grande ABC, cujos vários representantes tutelaram reuniões de forma muitas vezes explícita, outras vezes implícita, provavelmente não se teria desperdiçado o mecanismo até então mais interessante de reação organizada da comunidade. Mesmo considerando-se que o Fórum da Cidadania reduziu-se a apenas um ou dois representantes de cada entidade e que não demorou quase nada para a esfuziante usinagem inicial virar sucata.


A osteoporose econômica do Grande ABC, que perdeu 39% do PIB industrial ao longo dos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso, é a prova cabal de como o Diário do Grande ABC fracassou editorialmente no suposto exercício de atuar como guardião da comunidade, como expressa o mote “100% Grande ABC”. Pior que a perda econômica que só a Editora Livre Mercado detectou e martelou incessantemente é a omissão do jornal em, mesmo com uma afiliada denunciando os descasos econômicos locais, regionais, estadual e federal, manter linha editorial amorfa, defensiva. Ora, isso é a mais irritante prova de que o relacionamento que o Diário do Grande ABC mantinha — e ainda mantém — com a comunidade regional, sobretudo os tomadores de decisão, não valem um tostão furado. Denunciamos à frente da Editora Livre Mercado, em sucessivas matérias, a letargia dos agentes econômicos, governamentais e sociais. Nada que repercutisse na consciência dos responsáveis editoriais do Diário do Grande ABC. Ou se trata de muita incompetência ou os interrelacionamentos beiraram o estapafúrdio, com o jornal se obrigando a omitir-se em assunto tão escandalosamente candente.


De qualquer forma, a crise econômica é mais localizadamente profunda no Grande ABC do que em qualquer outro território do País. Mostramos em análises impressas na revista e também nos três livros que escrevemos nos últimos dois anos as razões dessa diferença. Fundamentalmente a resposta se prende à nossa matriz automobilística. O terremoto macroeconômico que desabou sobre nossas cabeças nos entregou de bandeja o retrato fiel de nossas instituições, todas forjadas no período de riqueza compulsória. Não temos capacidade de reação individual ou coordenada porque as entidades políticas, econômicas, culturais e sociais ainda navegam nas águas passadas dos tempos de glória de investimentos em profusão nesta região. Suas estruturas estão corroídas. Quando muito, essas organizações funcionam como escritórios de prestação de serviços aos associados. Nota zero, entretanto, como organizações preparadas para o jogo da interlocução produtiva com quem decide a sorte de cada um dos 2,4 milhões de habitantes da região. Aplaudimos aventureiros locais e visitantes que nos colocam na boca um torrão de ilusão e execramos os poucos que ousam botar a boca no trombone porque estão cansados de esperar por medidas corretivas. Aos primeiros, lantejoulas; aos segundos, tomatadas e batatadas.


É esse Grande ABC traumatizado pelas políticas econômicas que se seguiram à abertura comercial e inerte em suas representações econômicas, políticas, sociais e culturais que olham para o próprio umbigo, que exige uma nova arremetida editorial. É preciso fazer acordar e vitaminar esse moribundo. E não será com novos lances de compadrios que veremos esse corpo quase inanimado ganhar musculatura de atleta depois de período de tratamento cuidadoso, meticuloso, monitorado pelo bom senso. Ou aplicamos uma nova fórmula de entendimento dos papéis que devem cumprir os agentes individuais e coletivos que compõem o tecido regional, ou estaremos adiando a autópsia de que certamente não haveremos de escapar diante do estouro da boiada da globalização.


O jornalismo politicamente correto praticado há tempos pelo Diário do Grande ABC — em larga escala assemelhado a outras publicações diárias — não pode reincidir na queda no buraco negro de confundir alhos de entidades de vigorosa representatividade com bugalhos de entidades representativas no sentido burocrático do termo. Críticas que se façam a organizações sociais, econômicas e políticas do Grande ABC ainda são confundidas com retaliações pessoais. No nosso caso, até mesmo velhos amigos acabaram se afastando de nosso convívio porque imperou a responsabilidade social inerente do jornalismo. É muito mais cômodo o apadrinhamento dos amigos e dos conhecidos, mas essa fórmula se comprovou nefasta para a região. Quem perde tanta riqueza em poucos anos e se mostra incapaz de qualquer reação — pior do que isso, a maioria procurou esconder a realidade em cada esquina de desemprego e em cada fábrica abandonada — há muito já entregou a rapadura do compromisso com a seriedade e a dignidade. Nossas entidades de classe econômica, política, social e cultural estão vegetando. Mas, com a proteção do jornal, sempre se sentiram, ou pretendiam fazer-se crer, no melhor dos mundos.


 Valor Agregado


Um dos maiores desafios do jornalismo diário moderno — e essa batalha tem sido frequentemente um terror para os editores — é escapar das armadilhas preparadas pela associação do despreparo crítico da maioria dos jornalistas e o apurado senso oportunístico de fontes de informação. É inconcebível que as redações estejam tão vulneráveis para o enfrentamento — é mesmo enfrentamento, tantos são os interesses — do jogo de sedução, de manipulação, de esquisitices que permeia o cotidiano informativo. No livro “Meias Verdades” aprofundo-me sobre o assunto, mas não poderia deixar de testemunhar preocupação em desbaratar os arrivistas que tanto estão comodamente instalados nas trincheiras de redação quanto nas fortalezas das fontes de informação. Uma evidente inversão de papéis quando se tem o público consumidor como maior interessado no assunto, já que as fortalezas de cuidados deveriam estar nas redações e os interesseiros manipuladores do outro lado, como interlocutores de jornalistas.


De maneira geral — e o Diário do Grande ABC consegue infringir a regra ao acentuar ainda mais suas fissuras — os jornais diários são estrepitosamente ludibriados por muitas fontes. Por isso, não se pode abdicar, de forma alguma, de suporte informativo próprio. Os arquivos precisam ser utilizados com muito mais frequência e meticulosidade. É premente que se desconfie de fontes oficiais, de órgãos públicos vinculados ao governo de plantão, e também de entidades empresariais. Indignado com tantas trambicagens, criei o IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos) com um grupo de profissionais de diferentes atividades e cuja essência é desvendar os números mais próximos das necessidades de referências gerenciais dos Executivos e Legislativos do Grande ABC.


Firmar postura de desconfiança dos informantes e, mais que isso, de irreversível consulta aos arquivos, é um desafio às redações. De maneira geral, há preguiça em vasculhar informações suplementares no banco de dados porque nem sempre o terminal de computador é o caminho mais curto entre uma dúvida e uma certeza. A localização da área de arquivos, geralmente distante do front das notícias, inibe ainda mais a sede de complementaridade. Na Editora Livre Mercado implantamos arquivo de mais de mil pastas de temários que vão de Administração Pública a Zoologia. E, mais que isso, adotamos práticas jornalísticas de identificação do material, o que nem sempre é levado em conta nas redações de jornais diários porque os arquivistas não têm a intimidade de quem lida com a notícia.


Um exemplo: será que a localização da pasta das visitas oficiais do governo Lula da Silva ao Grande ABC está à mão num piscar de olhos na estrutura funcional do jornal? Qual seria a identificação que possibilitaria ao jornalista interessado em consultar rapidamente o material? Na Editora Livre Mercado temos uma pasta específica para o assunto. Chama-se Lulacá, inspirada na Reportagem de Capa de novembro de 2002, quando essa expressão foi cunhada pela revista. Pedir a pasta Lulacá significa não mais que 30 segundos para o pleno atendimento. Não é porque seja uma publicação mensal que a revista da Editora Livre Mercado se deixou levar pela letargia. O conceito que arraigamos em nossa equipe é simples: uma revista de qualidade e sem grandes atropelos de fechamento editorial se faz entre outras condições trabalhando-se no mesmo ritmo a cada novo dia. Deixar para a última semana seria um crime contra os leitores. A última semana é para os fatos da última semana. As três semanas anteriores são para os fatos das três semanas anteriores. Elementar.


Outros exemplos poderiam ser citados. Confesso que desconheço peculiaridades dos arquivos do Diário do Grande ABC, tanto o material quanto o digital, mas desconfio de que não sejam integralmente adaptados à praticidade do dia-a-dia. Está aí algo que deveremos conhecer pessoalmente. Embora não seja prioridade das prioridades, deverá ser motivo de preocupação porque tem importância destacada na política editorial de se sair da superficialidade.


Um exemplo de pontualidade de informações: quando um dirigente de entidade empresarial afirma ao jornal que as vendas do varejo vão crescer tantos por cento em determinado período — e isso é comum no jornalismo marqueteiro que se dobra às fontes de informações igualmente marqueteiras — é fundamental que se recorra aos arquivos e se aponte o comportamento do setor nos últimos períodos. A ponderação é mais que obrigatória para retirar dos ombros da publicação as declarações de terceiros. Os leitores atribuem ao jornal e não aos entrevistados boa parte do conteúdo impresso. Por isso o jornalismo diário sofre consequências de critérios nada éticos e estritamente covardes de uma neutralidade que só não é apenas mentirosa porque também é preguiçosa.


O jornal tem, portanto, obrigação de interpor-se no noticiário entre uma versão rocambolesca de fontes de informação desonestas e a realidade dos fatos, sem que isso fira minimamente o conceito de imparcialidade. Aliás, é em nome desse mesmo conceito que o jornalista bem informado tem obrigação de agir. Não se trata de desqualificar e atirar ao lixo a informação incorreta, mas de introduzir no corpo da matéria, de forma interpretativa, o que de fato se está passando na atividade tão barulhentamente festejada. Esse tipo de intervenção ainda é exceção à regra no jornalismo diário porque todos se repetem nos erros, com menor ou maior gravidade. Mas haverá de se tornar rotina quando se abandonarem as estruturas burocráticas que privilegiam os meios e se sacrificam os fins, ou seja, se valorizam os profissionais que não lidam diretamente com a informação e se discriminam aqueles que estão na linha de fogo.


Tudo isso parece simples, é verdade, mas dado o feixe de conservadorismo e burocratismo nas redações, leva tempo para correções sem que recaídas não voltem a atrapalhar. A terapia do valor agregado no noticiário é sacerdócio que precisa ter a participação de todos. Na Editora Livre Mercado, resolvemos espalhar cartazes em defesa da consulta aos arquivos. Nenhum de nossos jornalistas se dirige ao computador sem se dar conta de que à frente, na parede, há um aviso destacando o papel dos arquivos. Não fosse isso suficiente, reiteramos a pregação nas reuniões e também nas próprias incursões que fazemos frequentemente no setor. Tomamos todas as medidas motivacionais necessárias para impregnar no grupo a diferença entre uma matéria comum, do cotidiano, e uma matéria aprofundada.


Quando se escreve sobre a Companhia Cinematográfica Vera Cruz, por exemplo, é inquestionável que as pastas de arquivo estejam acessíveis para o confronto das possíveis novidades em relação a tudo o que já foi publicado. Por mais que o especialista no temário tenha um mundo de informações na memória, nada substitui o manusear de recortes de jornais e revistas. Nesse caso e em tantos outros, o que geralmente ocorre é que o informante de hoje quer esconder a informação frustrada de ontem. Não lhe convém expor as dobras de gordurinha do ufanismo de ontem. No caso específico da Vera Cruz, o que temos aí não é nem mesmo mais aquela companhia que durante cinco anos fez furos no cinema nacional. Da desativada Vera Cruz só temos, de fato, galpões reformados e uma ampla área originalmente frequentada pelas galinhas do magnata Cicillo Matarazzo.


Jornalismo com valor agregado é aquilo que os leitores muitas vezes não percebem, mas que faz a diferença entre a notícia chula e a notícia rica. Se os leitores demoram para perceber quando se tem uma informação mais preciosa, contrariamente a isso eles são rapidíssimos em identificar a ausência de qualificação. Sobremodo quando um outro produto lhe oferece o contraponto. E é exatamente esse outro produto — que precisa ser o jornal da casa, não dos adversários — que temos de construir.


Não aceito matéria-commodity. Tamanho não é documento quando se trata de qualidade. É possível reunir em 20 curtas linhas um manancial de informações que a abundância de 200 linhas seria incapaz de pontificar. O segredo é a metodologia. A combinação de profissionais insaciáveis e desconfiados com um arquivo célere, pragmático, que não frustre tentativas de valorização do produto, torna-se portanto vital à empreitada. Para azar os deformadores do conceito de informar.


 Diário50Anos


O Projeto Diário50Anos é o grande mote que pretendemos introduzir como estratégia para amalgamar o que chamaríamos de nova fase não só dos insumos editoriais sob nosso controle, mas da companhia como um todo. Já imaginaram o que representaria às finanças do Diário do Grande ABC a conexão entre o editorial e o comercial no lançamento do Projeto? Que tal negociarmos a partir de março agora, numa mega-ação, cotas de patrocínio envolvendo o jornal e a revista do grupo? São cotas resgatáveis em 50 parcelas mensais — o período que demarcará o início e o ápice desse definidor do reconhecimento do valor histórico do jornal e da consecução de sua nova política editorial.


Os detalhes dessa operação que forraria as receitas da companhia com previsibilidade de recursos extraordinários, além de capitalizá-la permanentemente, dariam visibilidade editorial aos grandes investidores publicitários. Temos várias idéias a apresentar, mas acho que essa empreitada deverá contar com força-tarefa da companhia de modo que as colaborações possam multiplicar as possibilidades de sucesso. A característica especial desse projeto precisa de entendimento literal, ou seja, é uma jornada longa e desgastante. Os resultados devem ser, em nossa opinião, contabilizados como um núcleo produtivo à parte do cotidiano corporativo, sem, evidentemente, erguer-se uma muralha da China que quebre o alinhamento sinérgico.


Como estratagema de fixação de novos pressupostos aos leitores e anunciantes, o Projeto Diário50Anos se apresenta como a diferença entre um especialista em 100 metros rasos e um maratonista. Precisamos descortinar a simbologia de que temos um compromisso de longo prazo para que os efeitos de curto prazo sejam imediatamente mensuráveis. Não se alcança a suprema glória do maratonismo sem os primeiros passos da quebra do sedentarismo. Não nos interessa também acreditar que uma corrida curta e breve, mesmo que vitoriosa, sustente o esticamento dos projetos. Precisamos sair do vai-e-volta do curtíssimo prazo. Destrinchar um horizonte de 50 meses — para começo de reação — é a plataforma de embarque do novo jornalismo de que tanto prescinde a região.


Não acreditem em fórmulas miraculosas de que um produto editorial com os passivos e os ativos do Diário do Grande ABC seja enquadrado em novos e revolucionários conceitos apenas pela força da inércia da tradição. Costumo dizer que fazer jornal não é o mesmo que fazer pão. Um padeiro mesmo adoentado, mesmo febril, mesmo de mau humor, é capaz de garantir a próxima fornada para uma clientela exigente sem que a qualidade do produto sofra qualquer avaria. A receita previamente concebida mecaniza e padroniza o produto. Já fazer jornal ou revista é outra história. Depende-se demais das condições psicológicas do grupo, além do preparo técnico, evidentemente. Sem metas, sem objetivos, sem desafios, acentua-se dramaticamente o risco de cair na mesmice, no texto burocrático, na flacidez crítica.


Medidas de marketing devem ser preparadas e executadas para tornar o Projeto Diário50Anos muito mais que um mote aos consumidores e anunciantes. A tropa interna precisa participar ativamente. Repassar à corporação os novos desígnios dessa data tão especial, iniciando-se contagem regressiva de compromisso com a melhoria contínua do produto — eis uma maneira de conduzir a todos para uma metamorfose subliminarmente agradável e desafiadora.


A operação Projeto Diário50Anos será compartilhada por colaboradores internos e comunidade. Haveremos de programar com antecedência exatos 50 eventos para as respectivas comemorações em 2008. Teremos um calendário integralmente do Diário do Grande ABC, mas estabeleceremos parcerias. Daremos visibilidade aos parceiros institucionais tanto quanto aos patrocinadores-cotistas. Cada etapa dos 50 programas será uma oportunidade de prospectar novas iniciativas além da circunstancialidade do projeto.


Não poderemos desperdiçar a sinergia do jornal e da revista nessa proposta. As 50 cotas de patrocínio deverão levar em conta a potencialidade complementar dos dois veículos. Há uma notória possibilidade de acrescentar a magnitude do projeto com o acasalamento estratégico entre os dois veículos. A unificação de interesses estará caracterizada publicamente também como novo divisor de águas do relacionamento sempre tumultuado das duas companhias. O recado será entendido pelos consumidores de informação e principalmente pelos investidores comerciais.


Vejo um manancial imenso de subprodutos do Projeto Diário50Anos. Quando outras cabeças se juntarem para formatar o programa de ação, certamente encontraremos motivos de sobra para acreditar na perspectiva de alcançarmos o duplo objetivo, ou seja, de atingir um grau de compromisso editorial com a regionalidade e vasculhar os mais recônditos investimentos hoje distanciados do jornal e da revista.


Temos, portanto, uma grande oportunidade para recuperar o tempo perdido não só em termos de mútua aproximação efetiva do jornal e da revista como, principalmente, e nesse ponto com peso maior do jornal, de comprometimento regional com as empresas locais. Que essa aproximação não se esgote, evidentemente, nos interesses exclusivamente comerciais. Há possibilidades imensas de mostrarmos nosso compromisso de valorização das respectivas logomarcas-parceiras direcionando baterias informativas às atividades daquelas corporações. Um exemplo: um evento estritamente voltado aos colaboradores de determinada empresa — como uma palestra com uma dessas celebridades de auto-ajuda ou coisa assemelhada — e que hoje é praticamente ignorada pelo jornal receberá cobertura específica, provavelmente num espaço especificamente caracterizado ou mesmo na coluna social onde, como se sabe, as figurinhas de sempre se repetem tanto no Diário do Grande ABC quanto nos demais veículos.


O que pretendemos dizer é que a conquista de novas contas comerciais em muito será facilitada e em seguida mantida se o editorial e o comercial seguirem a trilha de entendimento sobre a importância das duas áreas. O conflito ético entre redação e comercial só existe em veículos que ainda não se aperceberam da enorme possibilidade de separar o que é interesse editorial do que é relação comercial. Mais uma vez recorremos à experiência da revista da companhia para assegurar o quanto de evolutivo foram os encaminhamentos nesse sentido.


A informação jornalística só será sacrificada se os próprios responsáveis pela redação se entregarem de mão beijada a eventuais salamaleques comerciais. Traduzir em fato jornalístico qualquer acontecimento corporativo e, com isso, fugir das garras da informação comercial sem tarja é a equação mais simples do mundo para quem se despe de preconceitos. E também para quem sabe que nenhuma informação artificializada com objetivos estupidamente comerciais obterá a credibilidade dos leitores.


É por essas e outras que, repetimos, o Projeto Diário50Anos se reveste do mais importante ferramental de marketing interno e externo de que poderemos lançar mão como companhia, isto é, acima das duas macrodivisões da hierarquia organizacional. Fazer em 50 meses 50 grandes eventos dos 50 anos é o lema que nos moverá a todos para incendiar o ânimo dos colaboradores internos e da comunidade. Que não se perca tempo, portanto, com firulas burocráticas. O plano de ação está indexado à emergência do próprio tempo caracterizador da proposta. De março de 2004 a maio de 2008 são 50 meses revolucionários. Já estamos quase atrasados, portanto.


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