Flávio Martins, agraciado pelo Diário do Grande ABC com o título de um dos 60 Destaques da história da publicação (é essa a síntese do que o jornal desfila diariamente em entrevistas) saiu do anonimato institucional para ingressar na relação do besteirol regional. Algumas de suas declarações só não beiram o ridículo porque é preciso respeitar os limites do próprio ridículo. Flávio Martins vive em outro mundo. No mundo da lua.
É preciso reproduzir a agressão violenta à inteligência regional que Flávio Martins perpetrou para, em seguida, como se fosse necessário, impedir contaminações. Martins pagou com bobagens um destaque que causa calafrios de calibre semelhante ao que contemplou os ex-prefeitos Gilson Menezes e Aarão Teixeira, além de Valter Moura, eterno presidente da Associação Comercial e Industrial de São Bernardo. Só está faltando Milton Bigucci para enrubescer de decepção os demais (até aqui) anunciados destaques da publicação prestes a completar 60 anos de circulação.
O gataborralheirismo do entrevistado chegou ao extremo da estupidez, quando não da aberração. Vamos lá então com os trechos da entrevista ao Diário do Grande ABC:
Diário do Grande ABC – O que significa ter crescido e participado da evolução do comercio e serviço da cidade?
Flávio Martins – É muito importante e vejo com orgulho nossa participação, primeiro porque entrevimos todo esse espectro de oportunidades que a cidade oferecia, e depois pela confirmação dessas oportunidades com o crescimento vigoroso que Santo André veio a ter em todas as áreas.
Diário do Grande ABC – Quais foram os principais alcances da economia do Grande ABC ao longo dos tempos?
Flávio Martins – Na minha visão, a região mudou o rumo da economia nacional. Tendo em vista a abertura do mercado – especialmente na década de 1990 – com o sofrimento pelo qual veio a passar a indústria da época, especialmente a automotiva. O Grande ABC teve que rever seus rumos e passou seus investimentos às áreas de serviços. Foi de tal forma assertiva essa decisão, que hoje áreas de serviços como um todo, no País, representam algo em torno de 70% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional. Isso demonstra sua dinâmica de administração da região ao País, bem como uma capacidade de buscar rapidamente novas frentes de trabalho.
Usando o arquivo
Há duas maneiras de detonar as barbaridades proferidas pelo representante do empresariado de comércio e de serviços de Santo André. Primeiro, com a produção de arrazoado usando os dígitos e a memória. Segundo, com colagens sobre a economia de Santo André, particularmente de Santo André, que não foge do espectro do perfil regional. Escolhi a segunda opção. Os trechos das análises já publicadas serão antecedidos das respectivas datas. Isso significa que, fosse minimamente apetrechado, Flávio Martins não cometeria tamanhas sandices.
Trechos da matéria publicada em 22 de fevereiro de 2018 sob o título “ICMS: evapora vantagem de R$ 600 mi da região sobre G-3”:
O resultado é dramático, como mais uma prova de que a desindustrialização da região foi e segue sendo uma catástrofe que não encontra antídoto nas autoridades públicas. Nos últimos 22 anos, contando-se a partir de 1995, os sete municípios locais com quase três milhões de habitantes viram evaporar em valores atualizados monetariamente uma vantagem de mais de R$ 600 milhões de repasse do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) em relação às três capitais metropolitanas do Estado de São Paulo – Campinas, Sorocaba e São José dos Campos, igualmente como quase três milhões de habitantes. (...) .
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O eixo de desenvolvimento econômico em direção às regiões de Campinas, Sorocaba e São José dos Campos nas duas últimas décadas, a partir do Plano Real e da abertura mais exacerbada da economia (embora ainda tímida em relação aos níveis internacionais) é uma corrida aparentemente sem limites. A Província do Grande ABC, também Província dos Sete Anões, ostentava ao final de 1995 (portanto há 22 anos) uma vantagem de repasse do ICMS em relação a Campinas, Sorocaba e São José dos Campos de nominais R$ 157.761.729 milhões. Quando se aplica a correção monetária com base na inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) o valor de dezembro do ano passado passa a ser R$ 623.395.472 milhões. (...).
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O ICMS é um dos indicadores do ecossistema de avanço ou degradação de economias municipais, regionais e estaduais. (...) O ICMS declinante seria motivo suficiente para uma ordem unida do Clube dos Prefeitos em busca de saídas para repotencializar as finanças públicas sem recorrer a alquimias verborrágicas. (...) . No período que começa em janeiro de 1996 e termina em dezembro de 2017, Santo André, São Bernardo e Diadema obtiveram receitas de ICMS, numa comparação ponta a ponta, menor que a inflação de 295,15% do período, medida pelo IPCA. (...) Santo André cresceu em termos nominais no período 225,80%. Eram R$ 90.451.158 milhões em 1996 e passou para R$ 294.698.678 milhões em 2017. Se crescesse no ritmo da inflação do período teria chegado a R$ 357.417.750 milhões. Desta forma, arrecadou no ano passado R$ 62.718.072 milhões abaixo de 1995.
Trecho da matéria publicada em 17 de novembro de 2017 sob o título “Celso Daniel ficaria chocado com o fracasso de serviços”:
Celso Daniel estaria envergonhado do sonho de ver Santo André (e a região de forma suplementar) destacando-se no setor de serviços para contrabalançar a desindustrialização que começou para valer nos anos 1980 e se intensificou durante o governo Fernando Henrique Cardoso nos anos 1990. O sonho de ver Santo André recompondo-se economicamente em atividades de serviços com valor agregado, sobretudo de tecnologia, virou pesadelo. No G-22 (grupo dos 20 maiores municípios do Estado, exceto a Capital e contando com a inclusão de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra para completar o time da região), Santo André é apenas a 13ª colocada. Muito distante das primeiras – Barueri, Osasco, Campinas e Piracicaba. São Bernardo, a melhor da região, não passa do sexto lugar, fortemente descolada das primeiras colocadas.
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Ou seja: não oferece perspectivas de virar o jogo no curto prazo. Mais que isso: é possível que a distância se acentue, São raros os investimentos em serviços de valor agregado na região. A intersecção entre indústria e serviços avançados também é baixíssima. Os assalariamentos denunciam. Produzi o ranking do setor de Serviços do G-22 com base nos dados divulgados recentemente pelo Ministério do Trabalho. O resultado tem como âncora a média salarial dos trabalhadores do setor em dezembro do ano passado. Os dados de dezembro deste ano serão conhecidos somente em setembro do ano que vem. Deverão oscilar muito pouco. A grandiosidade torna os movimentos lentos quando vistos num horizonte imediato.
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A média salarial dos trabalhadores de serviços em Santo André em dezembro do ano passado era de R$ 2.580,95. (...). A média salarial em Santo André estava muito abaixo da registrada em Barueri, Município da Grande São Paulo que lidera o G-22 no setor com R$ 3.756,22. (...) Como se observa, a distância entre Barueri e Santo André no setor de serviços é quilométrica. Em valores médios de salários, uma diferença de 31,28%. Na massa de salários gerada nos dois universos de assalariados, Barueri registrava 47,85% de vantagem (R$ 587,581 milhões ante R$ 281.759 milhões) sobre Santo André. Essa diferença é simbólica da qualidade e da quantidade de trabalhadores do setor. (...) com algumas variáveis pouco significativas, Santo André é o retrato da Província que não se preparou para contrapor o setor de serviços ao esvaziamento industrial. A média salarial entre as duas atividades é o retrato do quanto Barueri descarta extremas oscilações. O salário médio do setor de transformação industrial era de R$ 4.068,07 em dezembro do ano passado. Quando contraposto à média salarial de serviços a diferença é de apenas 7,66%. Em Santo André o salário médio da indústria registrava R$ 3.913,81 --- uma vantagem de 34,05% sobre serviços.
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Dessa forma, o quase empate técnico no confronto da média salarial industrial de Barueri com a média salarial de serviços e situação análoga em Santo André é impactante. A massa de assalariamento é bastante desigual. Barueri paga melhores salários (a tecnologia faz diferença). Em Santo André, a soma dos salários dos 109.157 assalariados de serviços e de 25.264 trabalhadores da Indústria alcançava R$ 380,60 milhões em dezembro do ano passado. Em Barueri, a mesma contabilidade que cruzava 156.429 trabalhadores de Serviços e os 26.384 industriários significava massa salarial de R$ 694,912 milhões. Uma diferença favorável a Barueri de 45,23%. A diferença que separa a economia de Barueri de Santo André quando se coloca a massa salarial de dezembro à aferição é maior ainda do que a detectada quando restrita a dois setores (indústria e serviços). Considerando-se todas as atividades, inclusive Administração Pública, a soma de salários dos 254.677 profissionais com carteira assinada de dezembro do ano passado alcançava R$ 1.010 bilhão em Barueri, ante R$ 534,342 milhões em Santo André, resultante de 195.125 carteiras assinadas.
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O assalariamento de serviços representou naquele mês 68,71% da massa de trabalhadores em todas as atividades em Barueri. Em Santo André, o setor de serviços quando contraposto aos demais setores, pagou salários equivalentes a 71,16% da massa geral. O que parece superioridade de Santo André de fato é complicação: o Município outrora “viveiro industrial” conta com predomínio de assalariamento geral de uma atividade que está longe de ocupar os primeiros lugares em valorização dos trabalhadores no G-22. O resumo dessa ópera é que toda vez que alguma autoridade pública vir a público desfilar conceitos sobre a mudança de perfil econômico da região como um todo ou de algum Município em particular, o melhor é ter cautela. A transposição de uma Santo André ou de uma Província industrial para as atividades de serviços dá-se de forma dolorosa. A riqueza industrial que vai embora não está sendo compensada. Muito pelo contrário.
Trechos da matéria publicada em 25 de outubro de 2016 sob o título “Nordestinização da Província aumenta nos últimos oito anos”:
O tom com que os jornais impressos e digitais trataram o crescimento em números absolutos do universo de estabelecimentos de comércio e de serviços entre 2007 e 2015 na Província do Grande ABC, semana passada, mostra que nossa mídia não tem jeito mesmo. Continua a fechar-se à avaliação de dados que terceiros entregam muitas vezes com o propósito de dourar a pílula. Os números do Sindicato do Comércio Varejista do ABC (Sincomércio ABC) me remetem ao passado de quase 20 anos, quando criei um verbete que raramente utilizei em seguida, embora não faltassem oportunidades. Errei redondamente, porque deveria ter insistido em carimbar o que se passa nos dois setores da região. (...) .
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O estudo do Sindicato do Comércio Varejista revela, com base nos dados da RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) do Ministério do Trabalho, que aumentou de 13.425 para 15.510 o total de estabelecimentos na Província. Apenas a inexpressiva Rio Grande da Serra não teve os dados contabilizados. O resultado é crescimento acumulado de 15,5% no período. Ninguém fez as contas, dividindo o crescimento absoluto pelos oito anos do período, o que dá menos de 2% ao ano. Para o assessor econômico do FecomércioSP, Jayme Vasconcellos, “a expansão do comércio reflete o poder de consumo e o crédito disponível no mercado. No momento de bonança econômica, com emprego e renda garantidos, o número de lojas cresce”. Basta uma rápida consulta à tabela e aos respectivos registros de empresas em atividade em 2007 e 2015 para constatar que há segmentos muito acima dos demais.
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Casos de material de construção (24,1%), móveis e decoração (49,5%) e farmácias (26,5%). Também o segmento de vestuário registrou avanço (32,9%). O grande tropeço dos jornais no tratamento festivo é que faltaram referenciais para mensurar até que ponto mais não significa menos ou até que ponto é muito mais. O leitor acredita em que tipo de resposta? Quem sugerir que o crescimento nominal de 15,5% de negócios de comércio e de serviços é uma boa notícia certamente não leu o que escrevi há quase duas décadas completas. Peguei, no caso dos novos dados, apenas um agregado de números consistentes sobre os quais os leitores podem ter completa garantia de que não se trata de trambicagem para defender uma tese a partir de um estudo viciado. Isso não é comigo. Há autoridade públicas às pencas que se dedicam a essa tarefa que geralmente leva no bico os jornalistas incautos. Passei a mão e metabolizei os dados do Valor Adicionado, espécie de PIB (Produto Interno Bruto) preliminar minuciosamente medido pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.
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Nem poderia ser diferente. Valor Adicionado é o indexador principal ao repasse da dinheirama do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) encaminhado aos municípios. Quanto maior o Valor Adicionado – resultado de transformação de matéria-prima em produto final, principalmente – mais os municípios beneficiam-se dos cofres do governo do Estado. Há preocupante incompatibilidade entre o crescimento do número de estabelecimentos durante os oito anos da pesquisa em contraste com o Valor Adicionado da região. Contra o crescimento de 15,5% do número de empreendedores de comércio e de serviços, houve queda de 17,00% do Valor Adicionado. Sem criar riqueza o processo de consumo não se mantém, como está mais que provado pelos rescaldos dos 13,5 anos do governo petista, principalmente nos últimos anos de Dilma Rousseff. (...) . Ora, se criamos mais empreendedores no período, principalmente de pequeno porte, e não lhes foi oferecido algo semelhante em avanço da economia, o resultado da operação só poderia ser mesmo nordestinização, como resultado de um processo de canibalização. (...) . A canibalização de empreendimentos num território regional por si só encalacradíssimo com nova quebra do setor industrial acentua ainda mais o viés de subsistência dos pequenos negócios. Daí a papagaiada em torno do número de estabelecimentos não ter nexo quando se pretende determinar um marco de desenvolvimento econômico.
Trechos da matéria de 12 de julho de 2013 sob o título “Compare Santo André a Sorocaba e entenda nossa desindustrialização”:
O comportamento da indústria de transformação da Província do Grande ABC é preocupante quando enfrenta os principais endereços paulistas, mas particularmente Santo André é ainda mais problemático. Desde a implantação do Plano Real, em meados de 1994, esse que é um dos 20 principais municípios da economia estadual (e que por isso mesmo integra o G-20), só conhece reveses. A queda média anual do PIB industrial, como poderia ser definido o Valor Adicionado, peça-chave à distribuição do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) alcança 2,30 pontos percentuais ou 8,9% no período. Já Sorocaba cresceu ao ano 27,29 pontos percentuais e 105,39%. O rendimento negativo de Santo André só é inferior no G-20 ao de Mauá, também na Província. Comparar o desempenho de Santo André com Sorocaba, por exemplo, é um choque pedagógico à compreensão do deslocamento do eixo produtivo ao Interior do Estado -- especialmente às regiões da própria Sorocaba, de Campinas e de São José dos Campos.
Trechos da matéria publicada em 26 de março de 2012 sob o título “G-20: ICMS de Santo André desaba mais que o da Província em 35 anos”:
Santo André é disparadamente o Município que mais sofreu os efeitos da desindustrialização na Província do Grande ABC nas últimas três décadas e meia. O mapa do G-20 preparado por CapitalSocial e que envolve os 20 maiores municípios paulistas, exceto a Capital, não dá margem a dúvidas: entre 1976, ano-base dos estudos, e 2012, os cinco municípios da Província do Grande ABC que integram o Clube dos 20 perderam conjuntamente 47,78% de participação no índice de repasse do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Santo André está muito à frente dos demais em perdas. Se o leitor fosse convidado a projetar um número que pudesse dimensionar o quanto Santo André perdeu de participação no ICMS desde metade da década dos anos 1970 certamente erraria feio.
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Afinal, foram nada menos que 73,83% no período. Ao contrário do que procuram manipular agentes políticos disfarçados de técnicos, a derrama é um processo, não uma etapa de duração breve e dolorida. Santo André foi caindo pelas tabelas de forma inapelável e praticamente não reagiu para amenizar a perda do poderio econômico no período. Exceto durante alguns dos anos sob o comando de Celso Daniel, principalmente na metade dos anos 1990.
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(...) Em contraste com a situação de enfraquecimento econômico da Província do Grande ABC ao longo de três décadas e meia, o conjunto dos municípios que integram o G-20 demonstra vitalidade impressionante. Enquanto o G-5 (formado no interior do G-20 por Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema e Mauá) perdeu de 1976 até 2012 nada menos que 47,78% de participação relativa na ainda principal fonte de arrecadação municipal, os demais municípios do G-20 alcançaram crescimento de 54,42%. Quando se trata do G-7 (os sete municípios da Província, incluindo-se Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que não constam da lista do G-20), a perda é semelhante ao G-5 no período: 46,92%.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?