Economia

É melhor São Bernardo e a
região observarem Campinas

DANIEL LIMA - 09/04/2018

Na medida do possível e do necessário, quando não do urgente e do reformador, vamos expor as vísceras econômicas de São Bernardo (e da região como um todo) em confrontos pedagógicos que não dão margem a vadiagens interpretativas. Entenda-se por vadiagens interpretativas tudo que se configura deliberadamente enganador, procrastinador.  Não faltam vagabundos éticos na praça. Todo o mundo sabe disso. O passado já os condenou, mas eles são replicantes. E sem vergonha.

A síntese desse trabalho jornalístico, que começou faz tempo mas ganhou rumo específico na edição de sexta-feira com a prisão do ex-presidente Lula da Silva, é provar que o modelo econômico da Capital Econômica da região é um fracasso consumado – e que se espalhou aos demais municípios locais.  

As razões dessa derrocada são múltiplas, mas a principal é tremendamente lógica: o sindicalismo cutista supostamente socialista e liderado inicialmente por Lula da Silva ao final dos anos 1970 não serve para o desenvolvimento econômico equilibrado tanto quanto as supostas lideranças econômicas que ocupam entidades de classe. Algumas exceções confirmam a regra geral. 

Aqui se formaram castas de trabalhadores que inviabilizam a democratização de investimentos sem riscos maiores aos que já temos particularmente com múltiplas faces.  

Teste para o leitor 

Seria o leitor capaz de responder ao seguinte questionamento com a certeza de quem não está a percorrer um terreno movediço com venda nos olhos? Leiam então: 

 Quem tem mais riqueza acumulada no conjunto da população: um Município que conta com apenas 15% do assalariamento mensal derivado do setor de transformação industrial ou um Município que tem três vezes mais incidência nesse tipo de remuneração? Trocando em miúdos: ganha a corrida de desenvolvimento econômico um Município que não detém a primazia do assalariamento derivado da indústria ou um Município cujos trabalhadores industriais somam mais recursos salariais que as demais atividades? 

Quem respondeu que ganha o Município com maior volume de assalariamento de empregados do setor industrial caiu do andaime da ilusão. São Bernardo conta com 45,82% do assalariamento mensal de trabalhadores vinculados ao setor da indústria de transformação, enquanto Campinas não passa de 15,38%. Entretanto, quando se verifica o desempenho econômico e suas ramificações, em forma de PIB e de potencial de consumo, que é o PIB de riqueza acumulada, quem ganha esse jogo é Campinas.  

Queda do PIB per capita  

Quando Lula da Silva deixou a presidência da República com crescimento de 7,5% do PIB em 2010, São Bernardo registrava R$ 42. 557.432 bilhões. O PIB de São Bernardo de 2015, o mais recente anunciado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) chegou a R$ 42. 745. 533 bilhões. Para se conhecer o PIB de São Bernardo de 2010 é indispensável aplicar a inflação do período, de 40,59%. Com isso, o PIB que São Bernardo deveria ter apresentado em 2015 para não sofrer qualquer prejuízo, R$ 59.828,68 bilhões. Nada menos que redondos R$ 19 bilhões de diferença. Uma queda de 28,55% no período de cinco anos, portanto. 

Agora vamos ao PIB per capita do mesmo período. PIB per capita leva em consideração o PIB geral do Município dividido pelo total de habitantes. Em 2010 São Bernardo contava com 765. 203 mil moradores. Dividindo o PIB de então pelo conjunto de habitantes, chega-se ao valor nominal de R$ 55.615,87 mil por habitante. Já em 2015 o PIB de R$ 42.745.533 bilhões dividido por 816.925 mil habitantes representaria PIB per capita de 52.324,92 mil. A conta, entretanto, não está fechada. A atualização do PIB per capita pela inflação de janeiro de 2011 a dezembro de 2015 significaria R$ 78.190 mil. Ou seja, uma queda de 33,09% no período. No mesmo período, Campinas apresentou crescimento de 3,27%. No PIB Geral, Campinas avançou 4,79% entre janeiro de 2011 e dezembro de 2015.  

Corrida tecnológica 

Não pretendo simplificar fossos que separam economicamente São Bernardo de Campinas. Há variados indicadores que consubstanciam minhas análises. Fico restrito a algumas porque são elementares. O PIB, que mede a geração de riqueza numa determinada localidade é muito respeitado, mas carrega vieses metodológicos contestados. Como a democracia, ainda não inventaram nada melhor. Ou menos ruim. 

Os dados mais atualizados do PIB deixam claro que São Bernardo (e a região como um todo) perdeu a corrida tecnológica para Campinas (e aquela região como um todo). Estamos comendo poeira porque não tivemos capacidade de renovação de matrizes econômicas. Nossa indústria velha de guerra, que sofre com a Doença Holandesa Automotiva, cai aos pedaços. 

A reestruturação das montadoras de veículos e dos sistemistas é uma ótima notícia, mas carrega no ventre de desigualdade o afastamento ainda mais comprometedor das pequenas e médias indústrias, historicamente desprezadas pelas autoridades públicas em geral e também sobrecarregadas de exigências sindicalistas.  

Potencial de consumo 

Num outro indicador, esse mais consolidado ao longo do tempo, porque significa o que chamo de acumulação de riqueza, de uma riqueza que, ao contrário do PIB convencional, não se desmancha por outras localidades, o potencial de consumo da Consultoria IPC é elucidativo: Campinas supera São Bernardo cada vez mais. 

Os dados da Consultoria IPC (com base num agregado de informações de órgãos oficiais) mostram que no ano passado Campinas contava com potencial de consumo per capita urbano de R$ 30.406,85 mil (e R$ 29.538,40 rural), enquanto São Bernardo não passava de R$ 26.313.67 urbano e R$ 14.338,06 rural). No conjunto, o potencial de consumo de São Bernardo somava R$ 21.613.320 bilhões (per capita de R$ 26.144,00), enquanto Campinas somava R$ 35.938.437 bilhões (per capita de R$ 30.394,22 mil). Uma diferença per capita de 14%). 

A distância parece escassa, mas a linha de tempo denuncia que Campinas empreendeu corrida em velocidade muito superior à de São Bernardo na medida em que renovava matrizes econômicas em contraste com o enfraquecimento da Capital Econômica da região. A tendência é aumentar o fosso que as separa. Até porque a vitória campineira de agora reverte uma situação de inferioridade de duas décadas. 

Indústria avassaladora  

Voltando ao campo do assalariamento, o predomínio avassalador do volume de dinheiros recebidos pelos trabalhadores industriais de São Bernardo em relação às demais atividades, com 45,82% de incidência no conjunto da obra, revela o resultado de décadas de pressões sindicais corporativas em favor das respectivas tropas. Sobretudo a tropa automotiva, cujos assalariados são de primeira classe. 

Já em Campinas, de economia mais diversificada, menos dependente de determinada atividade, o peso do assalariamento industrial de 15,38% é suficientemente discreto para não abalar demais o conjunto dos trabalhadores em períodos de vacas magras macroeconômicas. 

Em dezembro de 2016 (últimos dados disponíveis no Ministério do Trabalho), a economia de Campinas girava em assalariamentos em geral, inclusive do setor público, massa de R$ 1.472.709.083,40 bilhão. Desse total, R$ 226.477.973,04 milhões correspondiam ao setor industrial. Em São Bernardo, a massa de salários daquele mês chegava a R$ 907.937.653,20 milhões. O setor industrial consumia R$ 416.080.062,75 milhões. 

Médias enganadoras 

A média salarial geral de Campinas registrava R$ 3.607,30 ante R$ 3.598,80 de São Bernardo. Números semelhantes que enganam incautos. A distância entre a média salarial do setor industrial e do assalariamento envolvendo todas as atividades nos dois municípios mostra o quanto de desigualdade o sindicalismo provocou nesta região: em Campinas a média salarial de trabalhadores industriais em dezembro de 2016 era de R$ 4.179,64, enquanto em São Bernardo era de R$ 5.552,25. 

A distância entre industriários e trabalhadores em geral em Campinas era de 13,70%. Já em São Bernardo alcançava 35,18%. Ou seja: o sindicalismo regional, em larga margem, pensa apenas no próprio umbigo. Sindicalismo cidadão é jogo de palavras vazio.  

Aguarde o próximo capítulo desse confronto inteiramente desigual que precisa ser realçado para reduzir a carga do Complexo de Gata Borralheira da região. O leitor não sabe é o que é Complexo de Gata Borralheira? Vamos explicar mais uma vez nesta semana, porque segunda-feira que vem o lançamento do livro que retirou a máscara de provincianismo do bicho de sete cabeças completa 16 anos. 



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