Economia

QUANDO A BANALIZAÇÃO
DA IGNORÂNCIA PREVALECE

DANIEL LIMA - 18/04/2025

A segunda entrevista encomendada, de bandeja, para o secretário de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo fazer um gol de placa e correr para a galera, deu ruim. O podcast do Diário do Grande ABC foi apenas o segundo tempo de horrores de um jogo iniciado com o podcast do ABC-EM-OFF. Trata-se, portanto, de um caso de reincidência. É só dar uma nova oportunidade e Rafael Demarchi vai para o Fantástico.

O problema todo é que Rafael Demarchi, um dos ramais de uma família que fez muito sucesso gastronômico,  é indigesto como fonte de conhecimento. É uma combinação sinistra de ignorância, pretensiosidade, marquetismo, subordinação tácita e ilusionismo. O jovem foi lançado às piranhas da pasta mais importante da Administração do prefeito Marcelo Lima sem ter passado por qualquer divisão de base técnica. São Bernardo é uma cidadela que vive neste século o pior período da história  -- há montanhas de dados e explicações sobre isso nesta revista digital.

Outro fato que precisa ser diagnosticado com extremo cuidado quando se avalia a Administração de São Bernardo é que o prefeito Marcelo Lima tem toda a culpa no cartório de notas medíocres do secretário que escolheu em agradecimento pelo desempenho eleitoral.  

INCOMPETÊNCIA DUPLA

Marcelo Lima é tão incompetente em Desenvolvimento Econômico quanto o titular da pasta de Desenvolvimento Econômico. Afinal, é cúmplice de tantos desajustes entre a realidade e a fantasia, quando não de abusos éticos, expostos por Rafael Demarchi.

Em seguida,  vou comentar sucintamente os pontos mais alarmantes da nova entrevista de Rafael Demarchi. Antes disso, porém, vou explicar a manchetíssima aí em cima, nesta edição em que meu coração e minha alma estão alinhados com Nosso Senhor Jesus Cristo, meu salvador. E a quem devo todos os meus passos e decisões.

A melhor maneira de agradecer por esta vivo, e vivo estou porque Nosso Senhor Jesus Cristo interveio, é continuar minha saga profissional. Custe o que custar.

BANALIZAÇÃO ESPECÍFICA

A manchetíssima aí em cima poderia ser outra, pensada que foi durante passeio  com minhas cachorras. Pensei em algo que emblematicamente lembrasse a filósofa alemã Hannah Arendt e a consagradíssima “Banalização do Mal”. Preferi pegar atalho mais simples. “Banalização da Ignorância” tem tudo a ver com a atual – e bote atual nisso – situação social do Grande ABC.

Aqui nesta terra onde já soaram muitos apitos industriais, chegamos a tal ponto de anestesiamento social que qualquer um pode dizer o que bem entender em nome de qualquer um dos municípios e tudo continuará praticamente igual.  Perdemos a capacidade de reagir. Daí a necessidade de, de alguma forma, manter o rimo neste espaço.

A Banalização da Ignorância verbalizada durante os 48 minutos de nova entrevista de Rafael Demarchi não teria repercussão alguma como desmascaramento daquelas declarações se não houvesse pelo menos um crítico à espreita.

Está tudo dominado pelo politicamente mais que correto, mas o politicamente ajustadíssimo aos interesses pessoais e grupais. Rafael Demarchi faz parte daquele grupamento em fase de consolidação que pretende controlar a vida regional nos próximos 30 anos. Já escrevi sobre isso.

É claro que esse domínio imperialista é dissimulado, mas não canso de alertar às sinalizações e ações nesse sentido. Continuem a discutir apenas a política nacional e façam pouco-caso do que está no nariz de cada um no ambiente local e teremos esse grupo cada vez mais abusado e asfixiante. A ditadura regional está instalada e ninguém se dá conta disso. É dar ou descer. Entenderam?   

LISTA DE IGNORÂNCIAS

Agora, finalmente, vamos aos pontos principais da exibição de Recruta Zero da economia regional. Afinal, quais foram as barbaridades novas e repetidas de Rafael Demarchi? 

1. Rafael Demarchi disse que a maior parte dos empregos de São Bernardo está no setor industrial. Bobagem: o estoque de empregos formais de São Bernardo na área industrial  não passa de 23%. Já foi superior a 70%, meio século atrás. E mais de 30%, no começo deste século. E vai continuar caindo em termos absolutos e relativos.

2. Rafael Demarchi disse que  São Bernardo perdeu “um pouquinho” de empregos industriais para o Interior do Estado e outros territórios nacionais. Bobagem: São Bernardo e o Grande ABC como um todo perderam “muitos empregos” não só para praças externas, mas também por desativação de indústrias locais.

3. Rafael Demarchi disse que a Prologis, empresa especializada em condomínios logísticos, transformará a demolida fábrica da Ford, em São Bernardo, em poderoso endereço econômico. Seriam 25 mil empregos contratados, que, segundo o secretário, mais que compensariam os “cinco mil empregos” perdidos com o fechamento da Ford. A numeralha do secretário não passa de chute furado. Não existe no território nacional um endereço logístico sequer que conte com tanta absorção de mão de obra. 

4. Rafael Demarchi disse também, a propósito do condomínio logístico da Prologis, que nada está assegurado em termos de investimento, porque haveria barreiras (supostamente tributárias) que precisam ser superadas. Disse também que o condomínio estaria sob  risco de não se confirmar ao acrescentar que o prefeito Marcelo Lima estaria superando a dificuldade (nas entrelinhas) herdadas do prefeito Orlando Morando. Sabe-se, entretanto, que a compra do imóvel foi consumada no ano passado, inclusive com o pagamento do ITBI. Rafael Demarchi precisa entender que qualquer alteração na legislação de uso e ocupação do solo e respectivos benefícios para atender suposta reinvindicação de investidores precisará passar pelo corredor legal da isonomia tributária – e também pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Diferentemente disso, os concorrentes já instalados podem ir ao Judiciário e o Tribunal de Contas reagir duramente.

5. Rafael Demarchi disse que nos primeiros quatro anos da Administração de Marcelo Lima (ou seja, insinua o sucesso do prefeito que seria reeleito), nada menos que 100 mil novos empregos seriam contabilizados, muito por conta da multiplicação de condomínios logísticos. O secretário excedeu-se mais uma mais no ilusionismo populista. Novos 100 mil empregos em quatro anos representariam aumento de 33% no estoque de empregos que São Bernardo detém desde que se separou de Santo André e virou Município, em meados do século passado. Uma aberração de projeção.

6. Rafael Demarchi repetiu o que disse no podcast anterior sobre a qualificação logística de São Bernardo, exaltando a proximidade do porto de Santos e do Aeroporto de Guarulhos. O secretário não aprende mesmo: o conceito de logística mudou inteiramente. Não se trata mais de “a menor” distância entre dois ou mais pontos que faz a diferença competitiva, mas “a melhor” distância entre dois ou mais pontos. O Rodoanel Mário Covas acabou com grande parte da capacidade logística da região, como tenho cansado de provar com dados estatísticos. As empresas de logística que se instalaram e pretendem se instalar na região tem como coreografia técnico-funcional o que os especialistas chamam de “última milha”, de entregas urbanas, de baixa quilometragem. Logística voltada à produção industrial, como parte de um todo concorrencial, é outra coisa. E essa outra coisa é uma fratura exposta no tecido regional de trânsito embaralhadíssimo. 

7. Rafael Demarchi disse que após uma visita aos comerciantes de móveis da Rua Jurubatuba, no Centro de São Bernardo, a Prefeitura fará uma ação de valorização da área, com obras e inclusive em totem que consagraria algo como “Capital do Móvel”. Não explicou, o secretário, se São Bernardo seria Capital do Móvel na região, no Estado ou no País. Da forma que se comporta, provavelmente pensou no território nacional.  O secretário desconhece o básico para quem nasceu e vive em São Bernardo. Há 300 anos São Bernardo praticamente não produz móveis. Para os comerciantes sobreviverem à concorrência nacional, cada vez mais atualizada, foi preciso recorrer a terceiros fora da região. O que se vende na Jurubatuba não é quase nada do que se fabrica em São Bernardo. A falência industrial moveleira de São Bernardo começou com a chegada das montadoras de veículos, que estabeleceram novos padrões salariais. A mão de obra trocou de endereço. Um Demarchi político deveria conhecer a história do setor. Talvez tenha se concentrado exclusivamente nos negócios gastronômicos.

8. Rafael Demarchi disse também que ao fim do primeiro mandato de Marcelo Lima o problema de São Bernardo vai ser encontrar pretendentes a emprego, porque desemprego seria ficção. Dispensa-se legenda crítica a isso.

9. Rafael Demarchi falou também sobre o programa Turismo Industrial. Foi mais comedido em relação ao podcast anterior, mas não se conteve sobre supostas qualidades do programa que, de fato, é um fracasso, ou está muito longe do entusiasmo do secretário. Num ponto, entretanto, o secretário foi muito além da imaginação: disse que o Turismo Industrial de São Bernardo é tão extraordinário que se fosse possível contar com rede hoteleira e suporte das empresas, pelo mil 1.000 visitantes diários estariam garantidos. Multiplique por dia útil e se chega a pelo menos 20 mil turistas a cada mês. Delírio completo.  

Vou deixar para outro dia alguns pontos do podcast em que Rafael Demarchi fez declarações menos absurdamente estúpidas.

A Banalização da Ignorância merece prioridade exatamente para que um contraponto de repulsa soe em forma de indignação.



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