Economia

Como decifrar os
dados estatísticos?

DANIEL LIMA - 05/05/2000

O comportamento da economia brasileira, observado sob o ângulo estatístico, é uma espécie de cubo mágico -- exige engenho meticuloso na interpretação. Quem se propõe a analisar sem um mínimo de profundidade está arriscado a enrolar-se. As diferentes metodologias e os diversos objetos de coleta de informações podem levar a equívocos. São constantes as armadilhas relativas ao período da apuração das informações e aos indicadores distintos. Por isso, há discrepâncias entre os dados revelados pelo Sebrae (Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa) de São Paulo, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) e a CNI (Confederação Nacional da Indústria). 


 


O Sebrae divulgou no mês passado que as micro e pequenas empresas do Grande ABC registraram crescimento de 14,9% no faturamento, contra média de 8,7% no restante do Estado de São Paulo, comparando o período janeiro-fevereiro de 2000 com janeiro-fevereiro de 1999. Por segmento, as micro e pequenas indústrias do Grande ABC cresceram 27,3%, contra a média estadual de 17%. O Sebrae anuncia que pesquisou 2,2 mil empresas do Grande ABC, entre os segmentos industrial, comercial e de serviços.


 


O que o Sebrae não explicitou é que seus dados são sazonais e, por isso mesmo, devem ser analisados com cautela. Afinal, a entidade compara períodos economicamente distintos. Janeiro e fevereiro do ano passado foram momentos paralisantes na economia nacional, por força da crise cambial, enquanto o mesmo período deste ano captou série de mudanças macroeconômicas.


 


A gerente de Análises do Departamento de Indústria do IBGE, Mariana Rebouças, resume os fatores que determinaram o reaquecimento da economia brasileira: queda dos juros no mercado interno, recuperação do preço das commodities industriais, retomada do crédito internacional, investimentos estrangeiros diretos na produção e o impulso nas exportações como consequência da desvalorização cambial. 


 


A diferença dos números do Sebrae em relação aos dados anunciados pelo IBGE são flagrantes exatamente porque o instituto de estatísticas optou pela lógica de avaliações que considerem a maior consistência do tempo de apuração e análise dos dados. Além do que, se fixou no volume de produção, não no faturamento das empresas. Mesmo se se considerar que o Sebrae pesquisa apenas micros e pequenas empresas do Estado de São Paulo, enquanto o IBGE lança estudos sobre todo o universo de indústrias e abrange integralmente o País, a disparidade de dados é intrigante.


 


O IBGE preferiu o comedimento ao anunciar o reaquecimento do setor industrial. Pela primeira vez em um ano e cinco meses, a produção acumulada de 12 meses apresentou saldo positivo, com expansão de 1,4%. Agosto de 1998, quando começou a crise financeira da Rússia, foi o último mês no período em que o IBGE registrou crescimento. Em relação a janeiro deste ano, a alta verificada pelo instituto em fevereiro foi de 3,1% -- o maior salto de um mês em relação ao anterior desde abril de 1997.


 


O IBGE prevê para março resultado decrescente em relação a fevereiro, sem que isso represente o comprometimento da retomada de alta na atividade industrial no País. A explicação está nos fatores de sazonalidade que inflaram os resultados de fevereiro: além de ano bissexto, fevereiro teve mais dias úteis do que o mesmo mês do ano passado, já que o período de Carnaval foi deslocado pelo calendário gregoriano para março.


 


Como há pesquisas para todos os gostos, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) não deixou por menos e também apresentou no mês passado números formulados pelos seus técnicos. As vendas da indústria brasileira, segundo a entidade, tiveram crescimento de 18,4% em fevereiro último, quando comparadas com o mesmo mês do ano passado. Já a comparação com janeiro deste ano, muito mais realista por causa da crise cambial no primeiro trimestre de 1999, coloca o ritmo de recuperação nos trilhos da serenidade -- houve avanço de 3,18%.


 


Também segundo dados da CNI, a capacidade instalada na indústria brasileira passou de 80,2% em janeiro para 81,6% em fevereiro último. Desde 1992, quando iniciou a série de análises, a entidade não registrava ocupação tão expressiva. Também segundo a CNI, pela primeira vez desde dezembro de 1997 o total de salários pagos subiu em relação ao mesmo mês do ano anterior. Feita com 3,7 mil empresas de médio e grande porte em 12 Estados diferentes, a pesquisa da CNI registrou que fevereiro completou o quinto mês consecutivo de avanço de horas trabalhadas na indústria.


 


O deputado federal Carlos Eduardo Moreira Ferreira, ex-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e presidente da CNI, não tem dúvidas de que a economia nacional está se recuperando de dois anos de mergulho estatístico. Ele se baseia no fato de que a matriz industrial tem peso de 30% no cálculo do PIB (Produto Interno Bruto), que é a soma de todas as riquezas produzidas por uma região. No caso do Grande ABC, o setor industrial é responsável por quase 70% do PIB regional. 


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